POLÍTICOS NA “NUVEM”, POVO NA LIXEIRA

O Governo angolano vai investir 89 milhões de dólares (83,2 milhões de euros) para construir a infra-estrutura da Nuvem Nacional de Angola, formar técnicos e armazenar e unificar serviços governamentais. É uma “exigência” do MPLA para abrir o paraíso…

O projecto, que resulta da assinatura, em Dezembro de 2021, de um memorando de entendimento entre o Governo de Angola e a multinacional Presight, foi hoje apresentado em Luanda, numa cerimónia que contou com a presença do ministro das Telecomunicações, Tecnologias de Informação e Comunicação Social, Mário de Oliveira.

O ministro referiu que, com a concretização do projecto, o Governo pretende promover o desenvolvimento digital da economia nacional, uma melhor percepção do cidadão sobre a governação e eficiência governativa, aproximando mais os cidadãos das acções governativas, cultivar talentos locais no uso das TIC (tecnologias da informação e comunicação) e serviços de nuvem, bem como estabelecer uma base para a transformação digital em toda a indústria angolana.

“Trata-se de uma nuvem governamental unificada construída sobre ‘data centers’ [centro de dados] do Governo para fornecer mais de 80 serviços”, referiu Mário de Oliveira, salientando que o projecto prevê a migração das aplicações existentes e implementação de novas aplicações para a nuvem (‘cloud’) unificada governamental.

Em declarações à imprensa, o director-geral do Instituto Nacional de Fomento da Sociedade de Informação (INFOSI), André Mpumba Pedro, referiu que o projecto será criado num prazo de 15 meses, devendo ser concluído entre Fevereiro e Março de 2024.

André Pedro disse que será construído de raiz o principal ‘data center’ (no Camama), e reabilitado o actual ‘data center’ secundário, o ‘backup’ junto do Instituto de Telecomunicações.

Os centros de dados, que vão ocupar uma área de 5.320 metros quadrados, vão albergar 204 armários de servidores, promovendo uma redução de custos na máquina funcional das comunicações electrónicas do Governo de Angola.

“Aquilo que queremos fazer com a construção dessa infra-estrutura é reduzir a quantidade das filas na obtenção de serviços electrónicos do Governo de Angola, eliminar as limitações que têm existido na obtenção de serviços nas inscrições de concursos públicos, por exemplo”, explicou o responsável.

O director-geral do INFOSI sublinhou que a previsão do Governo é a satisfação do cidadão, na busca dos serviços electrónicos do Governo de Angola, nomeadamente facilitar a população na obtenção de certos serviços públicos, como inscrições em concursos públicos, obtenção do bilhete de identidade, emissão de passaportes, entre outros.

André Mpumba Pedro realçou que, com a nuvem governamental, o Estado pretende reduzir ao máximo um problema que os cidadãos registam quando se deslocam a algumas instituições do Estado e até privadas, da falta de sistema, para o fornecimento de serviços.

“Queremos reduzi-la ao máximo, retirando quase que a completa dependência de um sinal de Internet para que haja o fornecimento do serviço público electrónico. Aquilo que se pressupõe é criar essa rede privativa do Estado, interligar departamentos ministeriais ao ‘data center’ do Governo e por esta via ter essa rede privativa completamente separada do serviço de Internet”, frisou.

O projecto, prosseguiu o responsável, visa igualmente a redução de custos e sobreposição de investimentos na construção de centros de dados, exemplificando que actualmente, para manter a licença para que os dados electrónicos estejam invioláveis, o ministério tem o custo anual que ronda os 15 milhões de kwanzas (27.815 euros).

O INFOSI foi criado a 20 de Abril de 2016, através do Decreto Presidencial nº 86/16, como resultado da fusão do Centro Nacional das Tecnologias de Informação (CNTI) e do Instituto de Telecomunicações Administrativas (INATEL). Esta fusão resultou da necessidade de se racionalizar os recursos humanos e materiais adstritos ao CNTI e ao INATEL, no âmbito da prossecução das respectivas atribuições.

O INFOSI tem por missão a execução e distribuição dos serviços públicos de tecnologias de informação e de telecomunicações administrativas definidas pelo Executivo no âmbito das políticas e estratégias de desenvolvimento, conhecimento e a promoção da inclusão digital.

Internet… potável! Políticos (in)imputáveis

Em Julho de 2020, o ministro das Telecomunicações Tecnologias de Informação e Comunicação Social, Manuel Homem, defendeu, em Luanda, a promoção do acesso à Internet em todos os estratos sociais e em todo o país. Embora dê jeito haver electricidade, crê-se que o Governo a vá tornar “potável” através de ligação a candeeiros a petróleo ou a velas de cera…

Tal como hoje com “a primeira nuvem nacional” por todos os cantos e esquinas do país multiplicaram-se as manifestações de júbilo e elogios à tese de Manuel Homem. A população dos Gambos, por exemplo, e daquelas localidades do Cuando Cubango, onde morreram crianças devido à fome, receberam a notícia com muita alegria. Foram imediatamente comprar computadores para os filhos e velas para fornecer energia para os computadores poderem funcionar.

Alguns pais, pouco informados sobre e ciclópica capacidade do governo, perguntam se as crianças, para terem acesso a electricidade, irão ligar os computadores no tronco ou nos ramos das árvores. Esquecem-se, lamentavelmente, que a os computadores podem funcionar ligados a candeeiros ou a velas de cera.

Manuel Homem, que falava à imprensa no termo de uma visita de constatação ao INFOSI, considerou que a expansão do sinal da Internet deve permitir e facilitar o acesso a todos. “Temos de continuar a trabalhar na promoção do acesso à Internet em todos os estratos sociais por via dos programas de massificação e inclusão digital em curso um pouco por todo o país”, frisou o então ministro sem que alguém lhe lembrasse que não fica bem falar de coisas como electricidade (mesmo que na versão “potável”) a um povo que tem 20 milhões de pobres. Isto se é que esses pobres são gente, se é que são… angolanos.

Na altura, Manuel Homem manifestou-se, igualmente, satisfeito com o nível de organização do Instituto Nacional de Fomento da Sociedade de Informação do ponto de vista técnico e administrativo, o que vai facilitar o processo de apoio à modernização dos sistemas da administração pública em curso no país, no âmbito dos programas e projectos de massificação digital.

Com a implementação dos Programas e Inclusão Digitais, o Governo tem vindo a desenvolver o Projecto “Angola Online”, que na altura já permitira montar 111 pontos públicos de acesso à Internet, em todo o território nacional.

Acresce que, com esse acesso à Internet, os nossos pobres podem mostrar ao mundo que são dos melhores na disciplina basilar implementada pelo MPLA há 47 anos e que, por isso, constitui o seu ADN: Aprender a viver sem comer. É claro que o resultado não é 100 por cento positivo. Isto porque muitos quando estavam quase, quase mesmo, a saber viver sem comer… morreram.

Manuel Homem disse ainda que, além do Projecto “Angola Online”, existem outros, com destaque para “Andando com as TIC”, que permitiu, igualmente, melhorar os índices de acesso às tecnologias de informação e comunicação nas zonas mais recônditas do país.

O então ministro garantiu, igualmente, estarem criados os programas e plataformas tecnológicas em todos os departamentos ministeriais e instituições públicas para a realização de reuniões e outros encontros de trabalho.

“Estão criadas as condições para assegurar que os serviços públicos continuem a funcionar de forma normal”, disse.

Por outro, reconheceu a necessidade de se continuar a imprimir esforços para garantir que mais serviços possam surgir com o ambiente digital, de maneira a garantir que os cidadãos, em casa, com ou sem Covid-19, continuem a realizar contacto com a administração pública de forma mais célere e segura.

Tudo passa, ou fica, pela Internet

No dia 22 de Fevereiro de 2017, o Governo do MPLA (que outro poderia ser?) aprovou, em reunião do Conselho de Ministros, a estratégia do sistema de pagamentos móveis, que permite aos cidadãos realizar essas operações através de um telemóvel. Recordam-se?

Em declarações à imprensa no final da reunião, o então ministro das Telecomunicações, o celebérrimo “telstariano” José Carvalho da Rocha, disse que o decreto presidencial que aprovou o sistema de pagamentos móveis de Angola foi aprovado com o objectivo de se colocar à disposição da população mais um sistema de pagamento assente nas redes de telemóveis.

Permitirá a todos os que “são detentores de um telemóvel” fazer “algumas transacções, usando o dinheiro electrónico que há-de vir”.

“Com isto queremos também ajudar a consciencialização da população, ajudar à redução do dinheiro físico e permitir com que nas suas transacções as pessoas cada vez mais usem dinheiro electrónico, tal como cada vez mais já se faz em muitas regiões, em muitos países africanos”, referiu o ministro.

Também nessa segunda reunião ordinária do Conselho de Ministros, liderada pelo então Presidente da República, José Eduardo dos Santos, foi aprovada a servidão radioeléctrica de Angola – uma zona de exclusão -, na comuna da Funda, município de Cacuaco, nos arredores de Luanda, local onde estava a ser construído o Centro de Emissão e Controlo do Satélite (Angosat) angolano.

José Carvalho da Rocha explicou que a servidão radioeléctrica vai evitar a emissão de radiações electromagnéticas, estando em funcionamento o referido centro, que interfiram nos sinais a serem emitidos pelo satélite angolano.

“Também queremos evitar que haja obstáculos naquela região, que façam com que o sinal que seja emitido possa ser atenuado. Este diploma vem de facto proteger aquela região e também irá proteger outras regiões, onde forem construídos centros da mesma natureza, porque estamos a prever que num futuro distante o país terá necessidade de construir centros redundantes àqueles que nós temos na Funda e naturalmente precisamos de proteger essa região”, frisou.

Como especialistas em questões “telstarianas”, o então ministro José Carvalho da Rocha, manifestou-se no dia 19 de Junho de 2018 preocupado com o “uso indevido” das novas tecnologias, sobretudo a Internet, defendendo uma “educação contínua” para o efeito.

“Preocupa-me o uso indevido que cada vez mais as pessoas fazem das tecnologias de informação. Particularmente a Internet é uma infra-estrutura para humanidade e temos que saber usar e não usar para muitos fins inconfessos que temos estado a verificar”, disse o governante.

Falando aos jornalistas à margem da cerimónia de abertura do Fórum Internacional de Tecnologias de Informação – Angotic 2018, que decorreu em Luanda, o ministro apontou a necessidade de reforçar a educação para o uso das ferramentas tecnológicas.

“Temos estado a trabalhar primeiro na educação das pessoas, para o uso das novas tecnologias. Para o respeito do próximo. Temos estado a trabalhar igualmente na produção de legislação que cada vez mais possam proteger as pessoas”, adiantou.

De acordo com José Carvalho da Rocha, o sector que dirigia desenvolve um conjunto de acções, nomeadamente a produção de leis, no intuito de “permitir com que as pessoas usem cada vez mais de forma segura as redes sociais e uma educação permanente e constante”.

É o caso, referiu, da Lei da Protecção de Dados e da Lei de Protecção das Redes e Sistemas, acrescentando que estava igualmente a ser preparada a nomeação dos “órgãos gestores da Agência de Protecção de Dados” e que o próprio Código Penal vai “regular igualmente o mau uso” das novas tecnologias.

Questionado sobre a realidade do país em relação aos crimes cibernéticos, o governante sustentou que têm sido criadas infra-estruturas “no sentido de tornar a rede cada vez mais segura”.

A preocupação sobre o uso impróprio das tecnologias de informação no país, sobretudo a Internet e, através desta, as redes sociais, foi ainda manifestada por outro perito (no MPLA são todos peritos), o então governador da província de Luanda, Adriano Mendes de Carvalho, exortando à “ponderação” dos utilizadores.

“Agora se não sabermos usar, logicamente que vamos ter uma componente extremamente distorcida com relação a tudo que pretendemos. É preciso sabermos usar as ferramentas que temos para não ferir sensibilidades”, adiantou.

Folha 8 com Lusa

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