O Governo angolano reviu a previsão de défice orçamental para este ano, antecipando agora um excedente de 2,6% do Produto Interno Bruto, adiantou hoje o secretário de Estado do Tesouro e Finanças de Angola, Ottoniel Santos. Como se trata de uma previsão, é possível que as contas tenham contado com a ajuda dos dedos dos pés… sem necessidade de os peritos terem de se descalçar.
“Devido ao impacto negativo causado pela pandemia de Covid-19 em 2020, tivemos um desequilíbrio orçamental de 1,5%, ainda assim melhor que a previsão do Orçamento, que apontava para 4%, mas para este ano, apesar de o Orçamento apontar um défice de 2,3%, as mais recentes previsões apontam para um resultado positivo de 2,6% do PIB”, disse o governante.
Falando em nome da ministra das Finanças na apresentação do Banco Africano de Desenvolvimento (BAD) da Estratégia para a Governação Económica em África (SEGA) entre 2021 e 2025, Ottoniel Santos vincou que esta revisão das perspectivas “significa que este ano Angola vai regressar à trajectória de exercícios orçamentais positivos que começou em 2018 e terminou em 2020”.
Na intervenção, o governante passou em revista as principais reformas do país, desde a estratégia de sustentabilidade da dívida até ao programa de privatizações, passando pelo combate à corrupção e aos efeitos da pandemia nas contas públicas do país.
“Para uma economia como a nossa, que não cresce desde 2016, défices sistemáticos nas contas públicas podem levar a uma trajectória insustentável da dívida, e é por isso que é muito importante gerir prudentemente as contas nacionais e ter fortes instituições e bons sistemas de governação”, salientou Ottoniel Santos.
O BAD apresentou hoje a SEGA, que “antevê uma África governada por governos transparentes e responsabilizados e por fortes instituições capazes de conduzirem um crescimento sustentável e inclusivo, capaz de sustentar economias resilientes”, de acordo com o documento.
O objectivo, conclui-se, é “guiar as operações do banco no aumento da eficácia do sector público a nível nacional e sub-nacional, estimular a transformação estrutural e garantir que os cidadãos, comunidades e grupos cívicos participam na governação do sector público”.
De acordo com o secretário de Estado do Tesouro e Finanças, o BAD tem uma carteira de 1,2 mil milhões de dólares, cerca de mil milhões de euros, activa no país, dividida entre várias áreas, com 45% deste valor, equivalente a 531 milhões de dólares (448 milhões de euros) a ser aplicado em projectos na Energia.
O BAD é uma entidade financeira multilateral vocacionada para financiar o desenvolvimento, cujos accionistas são os governos africanos e outros países não regionais, como por exemplo Portugal.
O Governo estimou no dia 16 de Outubro de 2018 que a dívida pública do país rondava os 70.000 milhões de dólares, garantindo que o Programa de Estabilização Macroeconómica “vai reduzir o peso da dívida”, prevendo para 2019 um Orçamento sem défice. Boas contas. Nem sequer era um défice pequeno. Era, pura e simplesmente, sem défice. Agora vamos passar de défice a excedente orçamental de 2,6% este ano. Para o ano estaremos no paraíso.
A situação foi relatada por Aia-Eza da Silva, secretária de Estado para o Orçamento e Investimento Público, quando procedia à apresentação do Quadro Macroeconómico 2019 e os Limites da Despesa para Elaboração do Orçamento Geral do Estado (OGE) 2019.
Aludindo aos 83 programas estruturantes constantes no Plano de Desenvolvimento Nacional (PDN) 2018-2022, a governante recordou que, no documento, estavam expressos limites para as despesas, tendo exortado os ministros e governadores provinciais a estabelecerem prioridades.
“O plano é o mundo ideal, é o mundo em que, se pudéssemos, realizaríamos tudo. Mas, depois, temos de caminhar no mundo real, que é a limitação dos recursos que temos”, afirmou.
Apesar da subida do preço nos mercados internacionais do “Brent”, índice de referência das exportações do petróleo em Angola, a secretária de Estado para o Orçamento pediu “ponderação”, recordando que o país se endividou muito nos últimos anos.
“Lembram-se que andamos a pedir muitos empréstimos, a nossa dívida governamental hoje está a rondar os 70.000 milhões de dólares. Não conseguiremos resolver isto se se continuar a fazer a despesa com o dinheiro que estiver a ganhar hoje”, disse.
“O Governo empenhou-se num Plano de Consolidação Fiscal, no quadro do Programa de Estabilização Macroeconómica (PEM), e estamos a querer provar à sociedade e aos parceiros financiadores de que estamos sérios no nosso plano”, acrescentou.
Falando num encontro de auscultação com os parceiros sociais do Governo sobre a proposta do OGE 2019, Aia-Eza da Silva salientou que o PEM visa, entre vários propósitos “reduzir o nível de dívida” que o país tem.
“Não queremos continuar envolvidos em défices fiscais. Se ponho a despesa que o Governo todo pede para 2019 no OGE, ficamos com um défice fiscal que é próximo dos 10% do Produto Interno Bruto (PIB)”, explicou.
No domínio dos pressupostos de referência para o OGE de 2019, a secretária do Estado para o Orçamento angolano fez saber que o exercício económico do próximo ano “provavelmente não terá défice”.
“O OGE não terá défice. Mas, depois, os governantes e sociedade civil virão a nós e dirão: ‘se não há défice podemos fazer despesas’. Quer dizer que a receita está já a ficar maior à despesa”, vaticinou.
Segundo as projecções do Governo, reveladas pelo próprio Titular do Poder Executivo, a economia angolana poderia registar, em 2019, um défice igual ou inferior a um 1% do PIB e um aumento das receitas fiscais na ordem de 9,8%.
De acordo com o também Chefe de Estado, a redução do défice implicará menor necessidade de endividamento do Estado, com efeitos positivos em toda a economia, sobretudo no que diz respeito à redução das taxas de juros a serem praticadas no mercado nacional.
No seu discurso sobre o Estado da Nação, João Lourenço lembrou que em 2017 houve um défice de 5,7% do PIB, contra 3,4% de 2018 (abaixo do previsto no OGE desse ano).
Recorde-se que, no dia 3 de Outubro de 2018, o Conselho Nacional de Concertação Social (CNCS) referiu que no domínio das finanças, o quadro macroeconómico para o próximo ano previa um défice de 0,9% do PIB.
Aia-Eza da Silva observou que o excedente das receitas dos Orçamentos, a partir de 2019, servirá para liquidar as dívidas contraídas pelo país em anos anteriores.
“O que não podem esquecer, sobretudo nos próximos dois ou três anos, é o passivo. Vamos ter as contas acertadas, bonitas para 2019. Todavia, todo o excedente que se conseguir dessa receita vai para começar a liquidar o passivo”, argumentou.
Por sua vez, o ministro de Estado para o Desenvolvimento Económico e Social de Angola, Manuel Nunes Júnior, que presidiu ao encontro, referiu que, em relação à dívida pública, “só será pagável de maneira sustentada se o país crescer”.
“Se o país não crescer, teremos uma situação bastante difícil do ponto de vista fiscal. Há uma regra básica que indica que, se a taxa de juro com que nós pedimos emprestado for superior à taxa de crescimento económico, estaremos numa situação complicada”, salientou.
“Temos de garantir que o nosso crescimento económico seja suficientemente dinâmico para permitir que esta dívida seja paga com nova riqueza criada pelo crescimento económico”, concluiu.
Folha 8 com Lusa