AMOR ETERNO ATÉ QUE A VERDADE OS SEPARE

O Presidente angolano, general João Lourenço, gaba o estado das relações com Portugal (ele quer dizer os elevados índices de bajulação tuga) nas vésperas de receber o (ainda) primeiro-ministro português (António Costa) e apela a um maior investimento das empresas portuguesas para diversificar a economia do seu país. Ou seja, para que os portugueses façam o que fizeram até à altura em que venderam Angola ao MPLA.

O Presidente dono de Angola, numa entrevista conjunta concedida à Lusa e ao Expresso, diz que “as relações estão muito boas, nunca estiveram tão bem quanto agora, precisamos é de aumentar o investimento português em Angola e onde for possível”.

Dizendo esperar da visita de António Costa, entre 5 e 6 de Junho, “o reforço das relações de amizade e de cooperação económica entre os dois países”, João Lourenço vê no aumento de uma linha de crédito para investimento um incentivo à deslocação das empresas, que incluiu nos aspectos da “mobilidade económica”.

Um dos acordos que será assinado em Luanda durante a visita de António Costa é precisamente o aumento da linha de financiamento de 1,5 mil milhões para 2 mil milhões de euros, negociado no início de Abril numa visita do ministro das Finanças português, Fernando Medina.

Esta linha de financiamento permanente garante o pagamento à empresa em caso de incumprimento do Estado angolano e permite financiar projectos definidos Angola. Incumprimento do reino do MPLA? Isso é uma ofensa à honorabilidade do regime que, como se sabe, mente às segundas, quartas e sextas e vigariza às terças, quintas e sábados. Domingo é dia de descanso.

Segundo João Lourenço, o crédito à exportação “incentiva a deslocação das empresas portuguesas para Angola, uma vez que elas se sentem mais confortáveis e com a garantia de que o que vêm fazer a Angola fica coberto por esse crédito”. Pudera!

Para o presidente do partido que está no Poder há 48 anos, esse crédito deverá ser utilizado “em princípio”, para a construção de infra-estruturas, nomeadamente a construção da Basílica da Muxima e um conjunto de estradas nacionais.

Além disso, João Lourenço assinalou em particular alguns sectores da economia nos quais Luanda gostaria de ver um maior investimento português.

“Onde pretendemos maior investimento privado estrangeiro é, nomeadamente, na agro-pecuária, turismo – onde o investimento português é mais baixo comparativamente com investimentos em outros países – (…), na agricultura, nas pescas, nas indústrias, fora a indústria petrolífera”, indica. Ou seja, em (quase) tudo.

O general que diz ter visto roubar, ter participado nos roubos e ter beneficiado dos roubos, mas que não é ladrão, gostaria também de ver os investidores portugueses a adquirir mais activos que estão a ser alienados, no quadro das actuais privatizações.

“Há um conjunto grande de activos na esfera pública que queremos passar para a esfera privada, os investidores portugueses estão convidados a habilitarem-se à compra desses mesmos activos”, destaca ainda.

E sublinha: “O investimento português não tem baixado, mas nós não estamos ainda satisfeitos, pensamos que ainda há muito espaço para crescer, pode haver muito mais do que aquele que Angola tem recebido”.

De acordo com o chefe de Estado angolano (não nominalmente eleito), depende apenas da capacidade do empresariado português aumentar a sua presença, porque – insiste – “o interesse [de Angola] nunca deixou de existir, o interesse sempre foi grande”.

Nesta entrevista, o Presidente João Lourenço reconhece também que Luanda está “em falta” para com algumas empresas portuguesas relativamente a créditos por liquidar, estando ainda por pagar cerca de 100 milhões de euros da chamada “dívida certificada”, a que é reconhecida pelo Estado angolano. Coisa pouca, obviamente.

“Estou a referir-me à dívida certificada, que anda à volta dos 500 milhões de euros, um pouco mais de 500 milhões”, diz, assinalando que, desse valor, Angola pagou quase 400 milhões.

“Isto significa dizer que estamos em falta para com algumas empresas portuguesas no valor de cerca de 100 milhões de euros, isso com relação à dívida certificada”, afirma o dirigente angolano.

Quanto à dívida “não certificada”, diz que ela ascende a cerca de 200 milhões de euros, que ainda precisam de ser validados pelas autoridades angolanas.

Outro dos aspectos relevantes da relação entre os dois países é o que diz respeito ao destino das participações da Sonangol, no Millennium BCP e na Galp, bem como da Efacec.

Sobre a decisão da Galp de alienar os blocos petrolíferos que detinha em Angola, João Lourenço limitou-se a dizer: “é evidente que se permanecessem seria melhor, mas eles terão as suas razões para se terem retirado”.

Já no que respeita à possibilidade de a Sonangol vir a alienar as suas participações naquelas empresas portuguesas, João Lourenço disse que não há qualquer decisão. “Se algum dia houver esse interesse da parte da Sonangol, esse interesse será manifestado, se não acontecer, está tudo bem, vamos continuar”, diz.

Já quanto ao destino da Efacec, que foi nacionalizada por Portugal, João Lourenço assegura que o Governo português “não deu passo nenhum sem consultar as autoridades angolanas”.

“No quadro da recuperação de activos, o importante é que Angola não perca e, em princípio, temos assegurado que Angola não vai perder. Eu não posso, ao meu nível, entrar no detalhe, a única garantia é que devo dar é que os interesses de Angola estarão sempre salvaguardados”, conclui.

FRENTE CÍVICA (PORTUGAL) NÃO BAJULA

A Frente Cívica apela ao primeiro-ministro que durante a visita oficial a Angola obtenha garantias formais do Estado angolano quanto ao julgamento do ex-vice-presidente Manuel Vicente, acusado de ter corrompido o procurador Orlando Figueira.

Numa carta enviada ao primeiro-ministro, António Costa, a Frente Cívica lembra que o ex-vice-presidente Manuel Vicente foi acusado de ter corrompido o procurador português Orlando Figueira para que arquivasse investigações de branqueamento de capitais em que este era visado.

A associação recorda igualmente que Orlando Figueira foi condenado a seis anos e oito meses de prisão por se ter deixado corromper, mas Manuel Vicente, acusado de ser o corruptor activo, nunca foi julgado, tendo o seu processo sido enviado para julgamento em Angola há cinco anos. O julgamento ainda não aconteceu.

“A condenação de Orlando Figueira valida a convicção do Ministério Público de que Manuel Vicente terá sido efectivamente o autor e instigador de um crime de corrupção que, para seu benefício pessoal, feriu o coração da Justiça portuguesa e a própria soberania de Portugal como Estado de Direito. Por esta razão, o julgamento de Manuel Vicente impõe-se e é urgente”, escreve a Frente Cívica.

No entendimento da associação, cabe a António Costa, que “celebrou publicamente a decisão de delegar no Estado angolano o julgamento de Manuel Vicente”, obter garantias do seu julgamento.

“Corromper um procurador da República não é um mero “irritante”, é um crime grave – que justamente levou a uma condenação pesada do procurador corrompido. O acusado corruptor tem de ser julgado pelos crimes que lhe são imputados. Permitir que Angola abuse da confiança que lhe foi dada por Portugal, deixando o caso na impunidade, seria subscrever uma ofensa grave e frontal à soberania portuguesa”, sublinha a associação.

A Frente Cívica diz também que “caso Angola não esteja em condições de garantir um julgamento célere e justo do seu ex-vice-presidente, caberá a Portugal fazer regressar o processo aos tribunais nacionais, como previsto na lei, para que se faça justiça.

Assim, a associação apela ao primeiro-ministro que no âmbito da visita a Angola na próxima segunda e terça-feira peça formalmente ao Estado angolano “garantias específicas e precisas de que será respeitada a delegação do processo e de que o julgamento de Manuel Vicente será levado a cabo, com garantias de independência dos tribunais angolanos, em prazo específico – e breve – , que deverá ser indicado”.

A carta foi também enviada à procuradora-geral da República, Lucília Gago.

MATUMBOS, MAS NÃO TANTO

O Presidente angolano considera que Isabel dos Santos é “apenas uma” entre vários cidadãos a contas com a justiça e não é sua rival, rejeitando acusações (mais do que verdadeiras e comprovadas) de perseguição política.

“Eu não a vejo como minha rival política. Perseguição política? Persegue-se um opositor e os opositores do MPLA são conhecidos”, afirma o chefe do executivo angolano, na referida entrevista conjunta à Agência Lusa e jornal Expresso.

A empresária e filha mais velha do ex-presidente José Eduardo dos Santos está na mira da justiça em vários países, sob acusações de corrupção e peculato, tendo as autoridades angolanas solicitado, há seis meses, a ajuda da Interpol para localizar e prender provisoriamente Isabel dos Santos, sem que se conheçam mais desenvolvimentos do caso.

“Vamos deixar que a Interpol faça o seu trabalho. Costuma-se dizer que a justiça às vezes é lenta a agir, confiamos na idoneidade e capacidade da Interpol em cumprir o seu papel”, diz João Lourenço, acrescentando que “há trâmites a seguir”, pelo que é preciso “aguardar pacientemente pelo desfecho”.

O general chefe do executivo angolano refuta alegações de perseguição política, como se tem queixado a empresária, salientando que há muitos cidadãos que estão a braços com a justiça e o caso de Isabel “é apenas mais um”.

Quanto ao processo relativo ao ex-vice-presidente de Angola, Manuel Vicente, João Lourenço realça que se tratou de “um caso de soberania” e que não foi Angola que provocou o que ficou conhecido como “irritante” entre os dois países.

“Foram as autoridades judiciais portuguesas que entenderam levar à barra dos tribunais [portugueses] um governante daquela craveira. Não estou a imaginar Angola a ter a ousadia, por exemplo, de levar a tribunal um José Sócrates se, eventualmente, ele tivesse cometido algum crime em Angola. Felizmente, o desfecho foi bom (…) se tivesse demorado mais tempo talvez tivesse deixado mazelas, mas devo garantir que não deixou nenhumas”, comenta.

O Ministério Público português imputou a Manuel Vicente crimes de corrupção activa, branqueamento de capitais e falsificação de documento, um processo que foi remetido em 2018 para Angola, mas que se tem arrastado, segundo o procurador-geral angolano, Hélder Pitta Gróz, devido à imunidade de que gozava o antigo vice-presidente.

João Lourenço prefere não comentar o caso, que “está na justiça”, mas espera que os órgãos judiciais façam “a parte que lhes compete”, escusando-se a abordar a relação que mantém actualmente com o antigo homem forte da Sonangol, já que está “absorvido 24 sobre 24 horas” com as questões do Estado.

Questionado sobre o relacionamento com Álvaro Sobrinho, empresário luso-angolano e antigo director do Banco Espírito Santo em Lisboa e do banco BES Angola (BESA), vincou que precisa de ter motivos para deixar de ter relações com as pessoas.

“Ele não foi julgado, não foi condenado, se ele aparecer aqui não vou virar-lhe as costas com certeza, até prova em contrário é um cidadão livre”, respondeu, dizendo que é a justiça que tem de se pronunciar sobre o BESA, tal como em relação aos restantes casos.

“Na Europa, não é normal pedirem-se contas aos chefes de Estado sobre casos de corrupção, ninguém pergunta ao Presidente Marcelo sobre o caso José Sócrates. No entanto, às vezes entende-se que em África é diferente, particularmente em Angola”, contesta, afirmando que “não é justo este tipo de tratamento diferenciado”.

Quanto à luta contra a corrupção, reconhece que, apesar dos esforços, este problema não vai desaparecer e lembra que está apenas há pouco mais de cinco anos à frente dos destinos de um país que está prestes a celebrar o 50.º aniversário da independência.

“Não se pode esperar que em cinco anos se acabe com a corrupção, nem sei mesmo se algum país acabou, na verdadeira acepção da palavra com a corrupção. Há em todo o mundo”, notou, sublinhando que o problema “não é haver corrupção, é haver impunidade”.

MENTIR (TAMBÉM) SOBRE… 2027

O dono do reino angolano promete que vai “continuar a servir o país em 2027” e escusou-se a responder (puder!) se vai tentar concorrer a um terceiro mandato, actualmente proibido pela constituição.

“Em 2027, vou continuar a servir o meu país, onde for chamado. Estamos muito longe dessa data, não estamos em período eleitoral, não é sensato falar em apresentação de candidaturas”, disse João Lourenço.

“Quando chegar esse momento – que está muito longe ainda -, o MPLA (no poder desde a independência) saberá escolher o melhor candidato e quando o fizer vai ter a preocupação de não atropelar nem a Constituição, nem a lei”, respondeu o chefe de Estado a propósito de um eventual terceiro mandato presidencial, tendo em conta que a actual Constituição angolana prevê apenas dois mandatos de cinco anos cada.

Quanto à realização de eleições autárquicas, prefere não falar em datas “porque é arriscado”, mas assegura que não serão afectadas pela nova divisão político-administrativa, que visa entre outras alterações, o aumento dos atuais 164 para 581 municípios, já que esta reorganização territorial não envolve o poder autárquico.

“Eu não posso convocar eleições autárquicas sem ser com base na lei”, insistiu, alegando que a conclusão do pacote legislativo autárquico está ainda dependente da aprovação de algumas leis na Assembleia Nacional que “não depende apenas de um partido político”.

João Lourenço disse ainda que não vira as costas ao diálogo com a oposição e que o MPLA (Movimento Popular de Libertação de Angola), partido que lidera e está no poder em Angola desde a data da independência, em 1975, está disponível para debater outras propostas.

“Eu falo com toda a gente, até falo com pessoas da oposição que não são os líderes porque pedem audiência e regra geral eu recebo”, realçou o dirigente. Mas, continuou, “não se queira pensar que tudo o que vem da oposição é bom”.

“Eles são livres de fazer as propostas que quiserem e discutir connosco e depois a gente aceita ou não aceita. É isso que está a acontecer com o pacote legislativo autárquico”, afirmou, considerando que “não é realista” fazer, pela primeira vez, eleições autárquicas em todo o país como defende a UNITA.

Nas últimas eleições em Angola, o MPLA perdeu a maioria constitucional e qualquer alteração às limitações dos mandatos presidenciais ou outras questões da constituição terá de ser viabilizada pela UNITA. Isto se, entretanto, o MPLA não inviabilizar a própria UNITA.

Folha 8 com Lusa

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