O MARTÍRIO DE UM GRANDE HOMEM

«Savimbi – Um Homem no seu Martírio» é o título do livro do jornalista e escritor luso angolano Xavier de Figueiredo, que será lançado, em Lisboa, no dia 27 de Fevereiro, com apresentação de Isaías Samakuva, o dirigente da UNITA que sucedeu a Jonas Savimbi após a sua morte em combate em 22 de Fevereiro de 2002, em Lucusse.

O MPLA tentou eliminar Jonas Savimbi ainda no tempo da guerra colonial, o que supostamente só não aconteceu por intervenção do Exército português ocorrida no seguimento de informações verificadas que atribuíam tal missão a um dos seus 16 esquadrões infiltrados no Leste, o “Angola Livre”.

A revelação, baseada em testemunhos de oficiais portugueses à data destacados no Leste de Angola, é apresentada no livro de autoria do jornalista Xavier de Figueiredo, “Savimbi um Homem no seu Martírio”, como a primeira de posteriores tentativas do MPLA e do regime da sua criação para eliminar o líder da UNITA.

A intervenção do Exército português, materializada no patrulhamento de áreas circundantes daquela em que se sabia estar situada a base da UNITA em que Savimbi se encontrava, tinha por objectivo prevenir aproximações de forças do MPLA. A estratégia colonial de extirpação da insurreição surgida no Leste constituiu o elemento determinante da iniciativa. O MPLA, visto como uma ameaça maior, em termos de força e alianças externas, era o alvo principal da contra-subversão dos portugueses. A rivalidade que de antemão se sabia existir entre o MPLA e a UNITA aconselhava a tentar evitar o desaparecimento desta como forma de manter aceso um foco adicional de pressão sobre aquele em que o exército português estava concentrado.

O MPLA via na UNITA um empecilho à sua implantação no Leste quando aí se infiltrou – o que ocorreu depois dela e quando ela já aí estava organizada e activa. Na sua visão das coisas, eliminar Jonas Savimbi, para o qual olhava como “único elemento unificador da UNITA”, era uma maneira de provocar o desaparecimento da mesma, até pelo obstáculo aos seus planos de expansão para o planalto central que identificava nela. Savimbi e a maior parte dos dirigentes da UNITA tinham estreitas afinidades com as populações do planalto central. O MPLA precisava sobremaneira que a abertura da nova frente (IV Região) fosse bem sucedida, sobretudo como forma de compensar os revezes sofridos antes no Norte e em Cabinda.

Xavier de Figueiredo considera propagandística a versão disseminada pelo MPLA segundo a qual a manobra do Exército colonial de “protecção” da UNITA ocorreu no quadro de conluios que a serem verdadeiros a desqualificariam como movimento de libertação legítimo. Em abono da sua versão das coisas apresenta muitos factos concretos, entre eles o de que, no seguimento do colapso do MPLA no Leste, consumado em 1971/72, um novo comandante militar português dessa área, brigadeiro Abel Hipólito, ordenou em Janeiro de 1974 o lançamento de uma operação, de seu nome “Castor”, destinada a aniquilar a UNITA, a qual resistiu.

No seu livro, Xavier de Figueiredo aponta outras tentativas do regime do MPLA com a finalidade eliminar Savimbi. Considera, mesmo, que a sua morte, em 2002, constituiu, na prática, uma espécie de consumação da antiga intenção de o eliminar. A versão do governo de que se tratou de uma “morte em combate”, terá sido, como o autor da obra considera, apoiado em elementos que descreve, um subterfúgio da sua conveniência. O propósito era dissimular a referida intenção, conferindo-lhe o carácter de um episódio ocorrido no plano de um combate que um governo legítimo movia contra um movimento sedicioso armado, do qual Jonas Savimbi era o chefe.

O autor situa as tentativas de eliminação de Jonas Savimbi no quadro de uma persistente campanha de propaganda, desinformação e acções especiais de segurança que tinha por fim desacreditá-lo e ostracizá-lo. É nesta campanha, descrita com muito pormenor, que reside o enfoque da obra. A natureza e o alcance da campanha variou conforme as circunstâncias e em razão delas o interesse do regime. O ponto de vista do autor é, porém, o de que a narrativa que foi servindo de suporte à campanha do MPLA não tinha correspondência com a realidade.

Na sua perspectiva Savimbi foi um líder em cujas altas qualidades os dirigentes do MPLA sempre viram uma ameaça de peso – primeiro à sua conquista do poder, depois à sua sobrevivência. A via revolucionária de inspiração soviética, através da qual o MPLA tomou o poder em 1975, foi um “estratagema” destinado a evitar eleições previstas no Acordo de Alvor. A UNITA apresentava boas condições para vencer o pleito eleitoral. A identificação que a campanha sempre se aplicou a fazer entre Jonas Savimbi e um ror de vilanias – morreu como um terrorista da laia de Bin Laden – foi uma habilidade destinada a ocultar/manipular o génio e a energia de Savimbi, bem como o prestígio externo que chegou a alcançar.

A atenção ou mesmo a admiração que Savimbi mereceu da parte de grandes personalidades internacionais, entre as quais Nelson Mandela, ou o “grand seigneur” que foi Houphouet Boigny, entre outros, é apontada por Xavier de Figueiredo como uma negação da má reputação em que a propaganda do regime o colou. Savimbi também tinha defeitos e cometia erros, como o próprio reconhecia. A maior parte daqueles que a propaganda lhe atribuiu eram, porém, produto de manipulações calculadas para o chamuscar e dessa maneira ocultar as suas altas qualidades como líder político. Como, de resto, se vai cada vez mais reconhecendo em resultado de um processo de reabilitação da sua memória em curso na sociedade angolana.

O livro:

“Savimbi, um Homem no seu Martírio”, 300 páginas, edição da Guerra & Paz.
– Prefácio de João Soares; posfácio de Liberty Chiyaka.
– À venda nas livrarias (em Portugal) a partir de 20 de Fevereiro.
– Lançamento público no dia 27 de Fevereiro, em Lisboa. Apresentação a cargo de Isaías Samakuva.

O autor:

Xavier de Figueiredo, é um jornalista veterano, nascido em Angola (Huambo), cuja vida profissional, iniciada no antigo diário “A Província de Angola”, de Luanda, foi quase toda exercida no campo dos assuntos africanos. Nos últimos 40 anos fundou e dirigiu em Portugal várias publicações de informação estratégica – África Confidencial, África Focus e África Monitor.

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