GREVE CONTRA A ESCRAVATURA

Os trabalhadores paralisaram “na totalidade”, no início da segunda fase da greve geral, segundo as centrais sindicais, que acusam o Governo de estar “indiferente” às famílias angolanas que não conseguem ter três refeições por dia. Nada de novo no que ao governo do MPLA respeita. Ou seja, continuam a acreditar que o Povo está no bom caminho para aprender a viver sem… comer.

Teixeira Cândido, um dos porta-vozes das centrais sindicais angolanas, diz que “os colegas perceberam a mensagem e se percorrerem os hospitais, escolas, repartições públicas, notários, [serviços de identificações], tribunais, há de facto uma paralisação total”.

O sindicalista afirmou que a greve não resulta de uma mera vontade dos trabalhadores angolanos, mas sim da “indiferença do Governo angolano perante as preocupações constantes do caderno reivindicativo das centrais sindicais”.

Os trabalhadores “estão a ser empurrados a proceder assim face à indiferença do Governo perante as preocupações constantes do caderno reivindicativo das centrais sindicais e temos que cumprir esta fase até ao dia 30 de Abril”, realçou.

Os trabalhadores angolanos cumprem hoje o primeiro dia da segunda fase da greve geral, convocada pela Central Geral de Sindicatos Independentes e Livres de Angola (CGSILA), a União Nacional dos Trabalhadores Angolanos – Confederação Sindical (UNTA-CS) e a Força Sindical – Central Sindical (FS-CS) e que deve decorrer até ao dia 30 deste mês.

Aumento do salário mínimo, ajuste do salário da função pública e redução de impostos estão entre as exigências no caderno reivindicativo remetido ao Presidente angolano, João Lourenço, em Setembro de 2023, com conhecimento directo do Presidente do MPLA, do Titular do Poder Executivo e até do Comandante-em-Chefe das Forças Armadas.

Para Teixeira Cândido, também secretário-geral do Sindicato dos Jornalistas Angolanos, o Governo está “indiferente” às preocupações dos trabalhadores, “razão pela qual não negoceia e não tem apresentado propostas que se aproximem minimamente das exigências das centrais sindicais”.

“Esta é uma resposta ao custo de vida, pela incapacidade de não podermos prover à nossa família com o mínimo durante 30 dias. Esta é a realidade transversal, de Cabinda ao Cunene hoje é um luxo ter três refeições”, lamentou o sindicalista.

Recorde-se que Angola tem 20 milhões de pobres, sendo que muitos deles conseguem enganar a fome graças ao abastecimento que conseguem nas “lojas do Povo” (potenciadas pelo general João Lourenço) e às quais os angolanos chamam, com toda a propriedade, lixeiras…

No caderno reivindicativo, as três centrais sindicais exigem o aumento do salário mínimo nacional, dos atuais 32.000 kwanzas (35 euros), para 245.000 kwanzas (268 euros), proposta flexibilizada, entretanto, para 100.000 kwanzas (109 euros), um reajuste do salário da Função Pública, na ordem de 250%, e a redução em 10% do Imposto sobre o Rendimento do Trabalho (IRT).

O executivo decidiu propor um salário mínimo em função da dimensão da empresa, nomeadamente 48.000 kwanzas (52 euros) para as pequenas empresas, 70.000 kwanzas (76 euros) para médias empresas e 96.000 kwanzas (104 euros) para as grandes empresas, o que foi rejeitado pelos sindicatos.

ESTÁ DIFÍCIL VIVER SEM COMER

Em Luanda, vendedores e compradores dos principais produtos da cesta básica queixam-se da subida de preços, que aumentam todos os dias, e – tal como faziam com o anterior “pai” José Eduardo dos Santos – apelam agora à intervenção do actual “pai” João Lourenço para travar os aumentos… que o próprio “pai” ordenou.

Recordemos o texto que se segue e publicado pelo Folha 8 em 16 de Junho de 2023:

«A vendedora de frescos a retalho Catarina Oliveira assume a preocupação e pede a intervenção do Presidente angolano, igualmente Presidente do MPLA e Titular do Poder Executivo, para travar a subida dos produtos da cesta básica, que quase duplicaram, receando o agravar da fome em casa. Continua a ser difícil ao Povo aprender a viver sem comer. Mas estão a tentar.

O recurso à “sócia” (juntar valores com outros compradores para adquirir um mesmo produto), cuja adesão “quadruplicou”, é, por isso, cada vez mais uma alternativa para garantir o sustento mínimo.

Num armazém de frescos, na conhecida zona da Arosfram, rua direita do Mercado dos Kwanzas (município do Cazenga) os preços dos produtos são afixados na parede em papéis brancos, e a tinta nítida revela que se trata mesmo dos mais recentes.

Ali acorreu Catarina de Oliveira, com 25.000 kwanzas (33,7 euros), que disse não terem sido suficientes para comprar sequer a metade de produtos que adquiria anteriormente em valores mais reduzidos. Recorde-se que, segundos os donos do país, o MPLA é o povo e o povo é o MPLA.

“Hoje eu vim com 25.000 e fiz apenas ‘sócia’ de rabinho [de porco], uma caixa de carcaça de frango de 12.500 kwanzas [16,8 euros] e fiquei apenas com 4.000 kwanzas em mãos, a situação está mal, tenho filhos, marido sem emprego, vamos fazer como?”, desabafou, em declarações à Lusa.

Sentada à entrada do armazém e ladeada de jovens, que com machados aguçados esquartejavam as carnes frescas, Catarina Oliveira explicou que se socorreu da “sócia”, a que se juntaram mais três compradoras com 5.000 kwanzas (6,7 euros) cada para adquirir a caixa de “rabinho”.

“Antes, com 12.500 kwanzas eu comprava duas a três caixas, Presidente [da República] tem de nos ajudar, pai, está mal tem de nos ajudar mesmo, estamos a confiar contigo pai, ajuda”, apelou.

Naquela superfície comercial, a caixa de carcaça de frango de 15 quilogramas já custa 12.500 kwanzas, 10 quilogramas de rabinho de porco valem 15.800 kwanzas (21,3 euros), a caixa de 10 quilogramas de coxa de frango está a 13.200 kwanzas (17,8 euros), enquanto 10 quilos de fígado de vaca estão em 12.200 kwanzas.

Estes preços, segundo os consumidores, quase que duplicaram, se comparados com os praticados há mais de um mês, ocasião em que a caixa de coxa de frango custava 8.000 kwanzas (10,8 euros), recordou Cláudia Almeida.

“Está tudo alto, anteriormente comprávamos a coxa a 8 mil kwanzas, mas agora está a 12.00 kwanzas ou 13.000 kwanzas, comprávamos o saco de arroz a 7.000 kwanzas [9,4 euros], mas neste momento está a 14.000 kwanzas”, disse Cláudia Almeida.

A enfermeira de 49 anos, que acorreu à zona da Arosfram para adquirir produtos para a casa, apontou a escassez de divisas no mercado como factor para o aumento dos preços, referindo que gastou hoje duas vezes mais do que no mês passado. Mesmo fazendo “sócia”, a profissional de saúde garantiu que “foi mesmo o dobro”.

“Quando cheguei ao armazém, assustei-me com o preço, sinceramente não estava a acreditar”, lamentou. “A situação é preocupante e acho que há pessoas que não vão comer, se as coisas continuarem a subir diariamente há pessoas que não vão comer”, referiu a enfermeira, criticando também a precariedade dos salários.

A subida do preço dos frescos foi confirmada por um dos funcionários do estabelecimento, Vitorino Kanangwa, justificando a medida pela escassez do dólar no mercado angolano e a subida do preço do combustível.

Os preços altos estão a afugentar os clientes e consequentemente reduzir a facturação: “Sim, a procura reduziu, praticamente os clientes começaram a limitar-se por causa dos preços e diminuiu a nossa facturação e esses dias estamos a ter pouca venda”, declarou Kanangwa à Lusa.

Diversos produtos que compõem a cesta básica também são vendidos em grande parte dos armazéns localizados na área que circunda o Mercado dos Kwanzas, um dos mais antigos da capital angolana, onde os preços também dispararam.

“Os preços estão muito alterados, desde o mês passado começaram a subir os preços, aqui o saco de arroz (de 25 quilogramas) já estava a 8.500 kwanzas e agora está a 14.000 kwanzas e está difícil, e depois esses dias temos poucos clientes”, contou Isabel Afonso.

A funcionária do caixa do armazém referiu que a subida dos preços resulta da escassez do dólar, sendo que o arroz, o óleo e o açúcar “estão agora com pouca saída devido aos preços altos”.

A procura por bens de primeira necessidade nesses armazéns é visível pelo número de pessoas que entra e sai do espaço, muitos de mãos vazias e até “indignados” com a subida dos preços, como desabafou Joana Nâmbua Lopes.

“Estamos a sofrer muito, como é que o arroz vai subir até 15.000 kwanzas? Querem nos matar devagar, se querem nos matar que nos matem já todos, a situação está mal, estamos a sofrer muito”, queixou-se.

A “zungueira” Odete Daniel apontou que as vendas foram condicionadas devido ao processo de reordenamento do comércio na capital, e acrescentou que “levou um susto” ao ver o actual preço da caixa de massa alimentar fixado em 5.400 kwanzas (7,2 euros) contra os anteriores 3.100 (4 euros).

“É complicado, já não nos querem na ‘zunga’, a comida é essa que está cara e ficamos como? Vamos morrer de fome”, atirou a vendedora ambulante.

Catarina Oliveira, tal como os demais vendedores e compradores, apontou igualmente a escassez do dólar como uma das razões para o escalar de preços de bens de consumo na capital angolana.»

Folha 8 com Lusa

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