O candidato presidencial Venâncio Mondlane convocou hoje marchas pacíficas em Moçambique para segunda-feira repudiando o homicídio de dois apoiantes, dizendo, citando a bíblia, que o “sangue” das vítimas “tem de ser vingado”, responsabilizando as Forças de Defesa e Segurança (FDS).
Mondlane afirmou durante uma vigília com dezenas de pessoas no local do homicídio dos dois apoiantes, em Maputo, que, “tal e qual a palavra de Deus dizia que o sangue de Abel tinha de ser vingado, este sangue tem que ser vingado, e está nas vossas costas [FDS]. Fiquem a saber que vocês têm nas vossas costas o sangue destes jovens, mas o sangue destes jovens é o início de uma etapa que só Deus sabe como é que ela vai terminar”.
“Na segunda-feira vai ser a primeira etapa, pacífica, em que nós vamos paralisar toda a actividade pública e privada. Vamos para a rua com os nossos cartazes, vamos manifestar o nosso repúdio”, anunciou ainda Mondlane, garantindo que a greve, no sector público e privado, que tinha pedido para segunda-feira, em contestação aos resultados preliminares das eleições de 9 de Outubro, é para manter, passando agora para a rua.
“Não se isentem. Foram as vossas forças (…) voltaram a cometer um grande crime”, acusou Venâncio Mondlane, garantindo ter provas da acusação às FDS, que inclui a polícia.
“Se quiserem usar violência [polícia], podem usá-la, mas fiquem saber que depois da vossa violência há de vir algo extraordinariamente mais forte do que vocês todos e vão-se arrepender disso, do mesmo jeito que na década de 60, Eduardo Mondlane, Samora Machel, Joaquim Chissano e tantos outros pegaram armas porque havia gente que estava jorrar sangue de jovens inocentes aqui nesta mesma cidade, hoje vocês estão a substituir os opressores de ontem”, acusou.
“Então não esperem que o vosso final seja diferente dos opressores de ontem, da mesma maneira que vocês libertaram os opressores de ontem nós, hoje, podemos nos libertar dos opressores de hoje e temos capacidade de o fazer. Estamos em superioridade numérica”, avisou, numa declaração emocionada à comunicação social.
A polícia moçambicana confirmou hoje que a viatura em que seguiam Elvino Dias, advogado do candidato presidencial Venâncio Mondlane, e Paulo Guambe, mandatário do Podemos, partido que o apoia, mortos a tiro, foi “emboscada” e um terceiro ocupante ferido.
O crime aconteceu cerca das 23:20 de sexta-feira (como o Folha 8 noticiou), na avenida Joaquim Chissano, centro da capital, e segundo a polícia um outro ocupante, uma mulher que seguia nos bancos traseiros da viatura, foi igualmente atingida a tiro, tendo sido transportada ao Hospital Central de Maputo.
O advogado Elvino Dias, conhecido defensor de casos de direitos humanos em Moçambique, era assessor jurídico de Venâncio Mondlane e da Coligação Aliança Democrática (CAD), formação política que apoiou inicialmente aquele candidato a Presidente da República de Moçambique, até a sua inscrição para as eleições gerais de 9 de Outubro ter sido rejeitada pela Comissão Nacional de Eleições (CNE).
Venâncio Mondlane viria depois a ser apoiado na sua candidatura pelo partido Povo Optimista para o Desenvolvimento de Moçambique (Podemos), cujo mandatário nacional das listas às legislativas e provinciais, Paulo Guambe, também seguia na viatura alvo do crime.
As eleições gerais incluíram as sétimas presidenciais – às quais já não concorreu o actual chefe de Estado, Filipe Nyusi, que atingiu o limite de dois mandatos – em simultâneo com as sétimas legislativas e quartas para assembleias e governadores provinciais.
A CNE tem 15 dias, após o fecho das urnas, para anunciar os resultados oficiais das eleições, data que se cumpre em 24 de Outubro, cabendo depois ao Conselho Constitucional a proclamação dos resultados, depois de concluída a análise, também, de eventuais recursos, mas sem um prazo definido para esse efeito.
As comissões distritais e provinciais de eleições já concluíram o apuramento da votação das eleições gerais, que segundo os anúncios públicos dão vantagem à Frente de Libertação de Moçambique (Frelimo, partido no poder desde a independência) e ao candidato presidencial que o partido apoia, Daniel Chapo, com mais de 60% dos votos, embora o candidato presidencial Venâncio Mondlane conteste esses resultados, alegando com os dados das atas e editais originais da votação, que recolhe em todo o país.
Venâncio Mondlane garantiu na quinta-feira, na Beira, centro de Moçambique, que após o anúncio dos resultados das eleições gerais vai recorrer ao Conselho Constitucional, com as atas e editais originais da votação.
O Governo português, a União Europeia e as representações diplomáticas em Maputo dos Estados Unidos da América, Canadá, Noruega, Suíça e do Reino Unido condenaram estes assassínios, por entre apelos a uma investigação cabal e rápida.