A vice-directora do Fundo monetário Internacional (FMI), Antoinette Sayeh, veio a Luanda divulgar a sua última e inédita descoberta: a roda. Por outras palavras, destacou o que – afinal – os angolanos já sabem há quase 50 anos. Ou seja que a diversificação económica leva tempo e que (pudera!) o Governo do MPLA continua a tentar descobrir se vale a pena plantar as couves com a raiz para baixo…
Antoinette Sayeh, que participou num debate sobre a diversificação económica (ainda não alcançada ao fim de 50 anos) promovido pela Universidade Católica de Angola (UCAN), disse que há dois tipos de políticas para promover a diversificação económica — horizontais e verticais — e que Angola pode aprender lições de outros países altamente dependentes do petróleo. E então as couves?
Entre estes apontou a Malásia e destacou os efeitos benéficos das políticas horizontais, entre as quais estão as políticas de estabilidade macroeconómica, desenvolvimento do capital humano e redução da burocracia que criam um ambiente favorável ao investimento.
Já no caso das políticas verticais que incluem, por exemplo, parcerias público-privadas, zonas económicas especiais ou incentivos fiscais, com medidas desenhadas para sectores específicos, o FMI recomenda uma avaliação cuidadosa, medindo os prós e os contras e a eficácia face às deficiências no mercado que se pretende colmatar.
No caso dos incentivos fiscais, avisou que estes nem sempre são necessários e podem não se justificar num país com falta de receitas fiscais, além de serem subjectivos e mais susceptíveis à corrupção.
“Por isso, devem ser implementados de forma muito transparente”, recomendou a economista liberiana que foi também ministra das Finanças do seu país.
Quanto à diversificação económica, “é preciso pensar no longo prazo, porque não acontece de um dia para o outro”, e este é um dos aspectos em que “Angola precisa de reflectir”, sublinhou Antoinette Sayeh.
Já para o economista e director do Centro de Estudos e Investigação Científica da UCAN, Alves da Rocha, é preciso abandonar a “visão extremamente económica e redutora” da diversificação económica, que deve ser encarada nos seus aspectos antropológicos e sociológicos
Alves da Rocha – que lamentou a ausência do ministro do Planeamento, Vítor Hugo Guilherme, no debate para o qual tinha sido convidado – realçou que a diversificação em Angola “não está a acontecer”, acrescentando que o Estado continua a ter muitos vectores que obstaculizam a livre iniciativa, nomeadamente a burocracia.
Por outro lado, Antoinette Sayeh reconheceu os esforços das autoridades angolanas em termos macroeconómico, realçando que se “começou a fazer um caminho”, defendendo a continuação das reformas.
Para o economista Precioso Domingos, outro dos membros do painel, a diversificação demora ainda mais tempo quando é levada por “más ideias”, embora concorde que a estabilidade macroeconómica é um dos pontos de partida.
O também consultor observou que a economia angolana não cresce desde 2014 e destacou que o país não é livre em termos económicos.
“O facto de as empresas privadas serem autorizadas a operar não significa que estamos numa economia de mercado. Não é possível ter um planificador central que pensa por todos nós e vai escolher os sectores de actuação”, criticou, acrescentando que, ao contrário do que acontece noutros países, “(em Angola) os ministros não vão a debates, é de lamentar”.
DIVERSIFICAÇÃO (IN)IMPUTÁVEL DA ECONOMIA
O Presidente da República, João Lourenço, acordou no dia 9 de Junho e fez-se luz. Determinou aos membros do Executivo, maior celeridade no processo da diversificação da economia em curso (lento, parado ou a andar para trás), tendo sublinhado a necessidade de o país produzir mais, independentemente do sector petrolífero.
O executivo angolano (do MPLA há 49 anos) disse que esperava financiar, em 2022, pelo menos 500 projectos no âmbito do programa de apoio à diversificação da economia e exportações e levar a reconversão da economia informal a todo o país.
Os objectivos foram elencados pela secretária de Estado para a Economia, Dalva Ringote, que apresentou em 4 de Janeiro de 2022, em Luanda, as perspectivas de implementação do Programa de Apoio à Produção, Diversificação das Exportações e Substituição das Importações (Prodesi) e do Programa de Reconversão da Economia Informal (PREI).
Os 500 projectos, dos 1.022 aprovados em 2021, no âmbito do Prodesi contavam com várias facilidades de acesso ao crédito que totalizam 743 mil milhões de kwanzas (1,2 milhões de euros) para a sua operacionalização.
Dalva Ringote sublinhou que o acesso ao financiamento iria ser acompanhado de forma a assegurar que os recursos financeiros seriam alocados aos projectos identificados.
A secretária de Estado adiantou que existia também a perspectiva de desembolsar uma segunda tranche de aproximadamente de 2 mil milhões de kwanzas (3,2 milhões de euros) através do Fundo Activo de Capital de Risco Angolano (FACRA), direccionados para pequenas e médias empresas, empreendedores e operadores de microcrédito, com a expectativa de financiar mais 1.683 projectos, os mesmos de 2021, beneficiando sobretudo jovens e mulheres.
No que diz respeito ao acesso ao mercado interno, cadastraram-se 35.241 no Portal da Divulgação da Produção Nacional, abaixo da meta inicial de 40 mil produtores, indicou a governante, acrescentando que deveria ser restruturada em 2022 a marca “Feito em Angola” para dar maior visibilidade aos produtos nacionais.
Quanto ao PREI, que foi lançado no Mercado do “30” em Luanda, e no âmbito do qual foram cadastradas em 2021 mais de 41.000 empresas individuais, incluindo vendedores de bancada, ambulantes e feirantes, o objectivo era expandir para as restantes províncias.
O Ministério da Economia e Planeamento (MEP) apresentou em Dezembro de 2020, em Luanda, o Relatório de Balanço do Programa de Apoio à Produção, Diversificação das Exportações e Substituição das Importações (Prodesi 2020). Já então nada foi dito se, por descoberta do Governo, já se estava a plantar couves com a raiz para baixo.
Segundo o MEP, eram cinco pilares deste programa do Governo, nomeadamente “O acesso ao crédito”, “Aumento da produção e da produtividade”, “Acessos aos mercados interno e externo”, “Capacitação e qualificação”, e “Melhoria do ambiente de negócios e Perspectivas para o primeiro Semestre de 2021”.
Na sessão, então presidida pelo ministro da Economia e Planeamento, Sérgio dos Santos, foram também distinguidas as entidades que tiveram alto desempenho nos diferentes domínios do Prodesi em 2020, certamente com destaque para o mais emblemático cérebro do nosso país, o Presidente João Lourenço.
Aliás, João Lourenço já explicou que o “Executivo idealizou e concebeu o programa a que entendeu chamar de Prodesi, mas a materialização desta mudança de paradigma só seria possível com actores não estatais, no caso, o empresariado privado nacional e estrangeiro”, acrescentando que, “hoje, apesar de persistirem ainda constrangimentos de vária ordem, para além dos decorrentes da Covid-19, é justo reconhecermos publicamente que o empresariado privado respondeu positivamente, tem vindo a realizar investimentos em diferentes ramos da nossa economia, com resultados satisfatórios e visíveis aos olhos de todos”.
Tão visíveis sobretudo em termos estatísticos que, convenhamos, não são prova de mais fácil acesso a esses bens (equidade social), como comprovam os 20 milhões de pobres que abastecem a sua cesta básica nos caixões de lixo. Ou seja, tendo João Lourenço quatro refeições por dia e a Maria Zungueira nenhuma, a média estatística (feita, por exemplo, pelo INE) apresentada pelos génios do Governo revela-nos que cada um deles tem duas refeições por dia…
O Ministério da Economia e Planeamento disse até que queria desenvolver, até ao final de 2020, um guia para investidores, destacando oportunidades nas fileiras prioritárias identificadas pelo Prodesi. O que anda a fazer, há 49 anos, o MPLA? Anda a dizer que um dia vai “melhorar o que está bem e corrigir o que está mal”.
“Em concreto, serão identificados um conjunto de oportunidades de investimento em infra-estruturas, que poderão constituir projectos de parcerias público-privadas, nas áreas de energia eléctrica, água, transportes, pescas e plataformas logísticas”, lê-se no relatório de balanço do Prodesi, então apresentado em Luanda.
A “inexistência de informação clara e precisa sobre a criação de uma empresa”, e todas as questões inerentes a cada sector, bem como a intenção de divulgar oportunidades de investimento em Angola e a “fragilidade das infra-estruturas existentes, justifica a existência de um documento com toda a informação de apoio”, refere o documento.
Pois é. Então o que é mesmo que o MPLA anda a fazer desde 1975 e João Lourenço desde 2017, como Presidente da República não nominalmente eleito, Presidente do MPLA e Titular do Poder Executivo?
O Ministério da Economia e Planeamento considerou também que o país “deve continuar a apostar” na melhoria do ambiente de negócios, nos domínios da criação de empresas, pagamento de impostos, entre outros, apontando várias iniciativas nesse âmbito e reformas promovidas entre 2019 e 2020.
O estudo refere que nesse período decorreu a reorganização interna do Guiché Único do Empreendedor no modelo de Janela Única, eliminou-se o alvará comercial para as actividades de baixo risco e o requisito de registo estatístico no processo de abertura de empresas.
No domínio do registo de propriedade, o órgão ministerial assinalou que foi implementada uma nova plataforma denominada SIRP (Serviço Integrado de Registo Predial) nas conservatórias de registo predial e obtenção da certidão predial online e aprovada a nova tabela de emolumentos do registo predial.
A inauguração da sala do tribunal especializada em matéria comercial, industrial e propriedade intelectual na província de Luanda consta também das acções que visam a melhoria do ambiente de negócios em Angola que, certamente, estarão 100% operacionais quando o MPLA completar 100 anos de governação ininterrupta (já só faltam 51 anos…).
A institucionalização do Comité Nacional de Facilitação de Comércio Externo foi outra das medidas, um verdadeiro ovo de… João.
De acordo com as autoridades angolanas, a componente do acesso à electricidade, um domínio que para muitos empreendedores “ainda encarece os custos de produção”, beneficiou também de “avanços” nos últimos anos.
Segundo o relatório do Prodesi, “foram melhorados os procedimentos e tempos para obter uma ligação de electricidade, reduzidos os custos para obter uma nova ligação à rede eléctrica”, entre outros. Importa, contudo, enaltecer que os problemas de electricidade (48 anos depois da independência) se justificam porque o MPLA inventou a electricidade… potável.