TURISMO DE JOGO NUM PAÍS FAMINTO

O Instituto de Supervisão de Jogos (ISJ) angolano arrecadou cerca de 5,8 mil milhões de kwanzas (10, 6 milhões de euros) em Imposto Especial de Jogos (IEJ) no terceiro trimestre de 2022, anunciou o Ministério das Finanças, órgão que tutela o ISJ.

A Folha de Informação Rápida (FIR) sobre o comportamento da receita do sector dos jogos refere que o volume de arrecadações representou um incremento de 185% em relação ao igual período de 2021.

Pelo menos 26 entidades autorizadas a operar em Angola em três segmentos de jogos, nomeadamente jogos de fortuna e azar, jogos sociais (mais explorados na componente de apostas desportivas) e jogos online contribuíram para crescimento das receitas do IEJ.

Os jogos sociais lideraram a lista de arrecadações com uma participação de 81% (4,7 mil milhões de kwanzas) e os restantes 19% foram de contribuição da modalidade dos jogos de fortuna e azar.

A operadora Primeira Aposta (Premier Bet) foi a que mais contribuiu, neste período, entre os operadores que exploraram a modalidade de jogos sociais e remotos em linha, seguida da operadora Mota, Tavares & Barros (Elephant Bet).

Segundo a FIR, o incremento registado na arrecadação do IEJ deve-se “essencialmente” ao aumento dos serviços de supervisão e fiscalização no sector, pela obrigatoriedade de reporte diário e trimestral de informação contabilística e estatística das entidades licenciadas.

O estreitamento da relação entre o ISJ e os operadores de jogos e o aumento da colaboração entre o órgão regulador dos jogos e a Administração Geral Tributária (AGT) angolana também concorreram para o alargamento das receitas.

“O sector dos jogos de forma global, directa ou indirectamente, arrecadou nos primeiros noves meses de 2022 aproximadamente 7 mil milhões de kwanzas que vêm da arrecadação do IEJ, receita parafiscal (taxas, multas e emolumentos) e outros impostos”, refere-se na nota.

Para as entidades angolanas, a aprovação da futura Lei de Actividade de Jogos, já em sede da Assembleia Nacional do MPLA (parlamento), “terá grande impacto na organização do sector e deve consagrar maior capacidade de fiscalização tributária” ao ISJ em coordenação com a AGT – Administração Geral Tributária.

O Instituto de Supervisão de Jogos substituiu a Empresa Nacional de Lotarias na função de regulador, supervisor e fiscalizador dos jogos de fortuna e azar do país, conforme decisão do executivo angolano.

O ISJ foi criado por decreto presidencial de 14 de Outubro de 2014, ficando na tutela directa, segundo o seu estatuto orgânico, do Ministério das Finanças.

Com sede em Luanda, tem como atribuições a regulamentação e supervisão das actividades de jogos de fortuna ou azar em Angola, “em conformidade com a política económica e financeira nacional”, além de impulsionar “o desenvolvimento equilibrado e eficiente do mercado” e a definição de regras para o “bom funcionamento do sector de jogos e actividades afins”.

A fiscalização e normalização do funcionamento das empresas intervenientes no sector, bem como dos diversos agentes “intervenientes no mercado de jogos”, é outra das missões, a par do poder de sancionar, em caso de infracção.

Ao ISJ caberá a função de emitir parecer técnico sobre estudos e projectos relacionados com a exploração da actividade do jogo em Angola, mas também na formulação de propostas para o regime tributário do sector.

Deverá ainda “colaborar com os demais órgãos no combate ao branqueamento de capitais e financiamento ao terrorismo”, lê-se no estatuto orgânico do ISJ.

O funcionamento deste instituto será assegurado através de transferências do Estado, entre outras receitas, mas também com recurso a prémios de concessão (20 por cento) e pela receita bruta mensal da concessionária (10%), estabelece o mesmo documento.

Casinos? Quantos mais…

O director nacional do Ministério do Turismo de Angola afirmou no dia 6 de Maio de 2019 que iria recomendar ao Governo que acelerasse o processo da lei de jogos no país, a exemplo de Macau, a capital mundial do jogo. Era mesmo disso que o país precisava. Isto, é claro, se os angolanos puderem “frequentar” os caixotes de lixo junto aos casinos. E potenciais clientes autóctones são mais de 20… milhões.

“Uma das recomendações que vai constar no relatório da delegação angolana é acelerar o processo da lei de jogos em Angola porque todos os dias a delegação angolana ia visitar casinos e vimos a loucura do quanto se gasta dinheiro e do quanto se ganha dinheiro”, afirmou Jorge Manuel Calado, à margem do encerramento do “Colóquio sobre Turismo, Convenções e Exposições para os Países de Língua Portuguesa”, em Macau.

“Vou transmitir aos meus colegas do Ministério das Finanças, das Lotarias de Angola e da Casa de Jogo que é preciso criar, estudar, sensibilizar e fazer com que os jogos sejam, de facto para Angola, um desenvolvimento económico”, frisou o responsável angolano.

Na altura, Jorge Manuel Calado faz um balanço muito positivo da estadia no território asiático: “Vou levar para Angola a experiência que Macau transmitiu principalmente da inovação do turismo e no turismo de jogos”.

O director nacional do Ministério do Turismo de Angola ressalvou que, apesar de o país já ter “alguns casinos que funcionam a meio gás”, a aposta no turismo de jogo “dará ao país benefícios lucrativos altos”.

A visita ao território por parte da delegação angolana foi por isso importante para articular planos de formação de quadros na área do turismo de jogos.

“Foi bom estar em Macau 15 dias porque uma das questões que Angola precisa é a formação de quadros” e “a formação de quadros em Macau é muito alta, o turismo interno é elevadíssimo”, destacou Jorge Manuel Calado.

Outro dos destaques das duas semanas da estadia dos representantes lusófonos foi a sessão de apresentação dos produtos turísticos dos países de língua portuguesa, que decorreu na 7ª Expo Internacional de Turismo de Macau. O evento contou com 835 expositores, com todos os países lusófonos presentes, e com o dobro da área de exposição de 2018, atingindo os 22.000 metros quadrados. Cada um dos oito países lusófonos teve a oportunidade de realizar uma apresentação sobre as mais-valias turísticas que os países têm para oferecer.

Três dos pontos destacados pelos representantes lusófonos foi o reforço do intercâmbio entre as universidades, a concretização de planos ao nível da formação e as oportunidades para os países de língua portuguesa com a criação do “megamercado” da Grande Baía, uma metrópole mundial que junta nove cidades chinesas, Macau e Hong Kong, com cerca de 70 milhões de habitantes.

Recorde-se que, segundo os peritos (que, como se sabe, estão todos no Governo do general João Lourenço), o futuro modelo de exploração dos “jogos de fortuna ou azar” em Angola deverá entender os casinos como “espaços de auto-regulação, protegendo os bens jurídico-penais” e “funcionando como âncoras de cultura e entretenimento”.

A concepção moderna é a de que os casinos são “pontos de cultura, lazer e diversão, munidos, para este efeito, de espaços para conferências, salões para exposições, cinemas, espectáculos culturais, gastronomia”, sublinhou Vera Daves de Sousa, então (ainda) secretária de Estado das Finanças e do Tesouro de Angola, na abertura do “Primeiro encontro com os operadores económicos do mercado de jogos”, que se realizou em Luanda.

“É precisamente este o modelo que desejamos para o nosso mercado de fortuna ou azar”, acrescentou a governante, anfitriã do evento, que teve como objectivo principal, estabelecido pelo próprio Governo, “discutir e recolher soluções” que o ajudem a regular o sector dos jogos sociais e a criar “um ambiente favorável à implementação de projectos empresariais”.

Vera Daves de Sousa salvaguardou que o futuro quadro legislativo deveria entender os casinos como “espaços de auto-regulação, protegendo os bens jurídico-penais”, e considerou “fundamental” que se encontrem modelos que “demonstrem ser possível reduzir as consequências potencialmente negativas do exercício da actividade de exploração dos jogos de fortuna ou azar”.

Para isso, disse, “o Estado, com uma c fiscalizadora eficiente, tem de ser capaz de conter todos os efeitos potencialmente negativos que esta actividade pode, eventualmente, desencadear, a que acresce a sua frequente associação ao crime organizado”.

Por outro lado, acrescentou a governante, o futuro modelo angolano de exploração do jogo deverá “maximizar os impactos positivos” da actividade, nomeadamente “o fomento do turismo, a geração de empregos, sobretudo para os jovens, e o desenvolvimento socioeconómico regional”.

“O jogo é um fenómeno que precisa de ser analisado de forma holística pelos Governos, isto é, integrando as ópticas constitucional, civil, penal, sociológica, administrativa e tributária, de modo a que seja possível garantir uma legislação que transmita certeza e segurança jurídica aos investidores”, concluiu a então secretária de Estado, hoje ministra.

A maioria das 14 operadoras, que detêm 60 casas de jogos, que actuam no país, na sua maioria na província de Luanda, exerce as suas actividades sem visibilidade requerida, uma situação que vai obrigar o regulador a actuar de forma diferente, garantiu o director-geral adjunto do Instituto de Supervisão de Jogos, Ngouabi Salvador.

Nesta altura, grande parte das operadoras ganham dinheiro em Angola e exportam os capitais para outros países.

“Há actualmente, uma falta de informações fiáveis relativas aos principais indicadores de imposto económico, financeiro e social deste sector”, admitiu Ngouabi Salvador.

Na sua opinião, a situação agrava-se ainda pelo facto da maioria destas operadoras não apresentarem a sua contabilidade organizada, bem como o incumprimento do pagamento de impostos conforme a Lei 5/16, de 17 de Maio, Lei da Actividade de Jogos.

A título de exemplo recorde-se que o Instituto de Supervisão de Jogos encerrou no dia 13 de Setembro de 2018, em Luanda, um casino da empresa chinesa “Long Cheng Hui Suo” e confiscou mais de 11 milhões de kwanzas e 1.291 dólares. O casino funcionava no shopping “Cidade da China”, junto à via expressa, e foi encerrado por funcionar sem estar legalizado.

O casino, instalado num edifício que dispunha de hospedaria e restaurante, foi encerrado pelo Instituto de Supervisão de Jogos na presença de agentes da Polícia Nacional, dos Serviços de Migração e Estrangeiros e de Protecção Civil e Bombeiros.

Além do dinheiro confiscado, o Instituto de Supervisão de Jogos apreendeu mesas de jogos, incluindo uma “roleta russa”, computadores, um servidor da sala de vigilância, fichas e dezenas de baralhos de cartas.

O proprietário do casino recusou-se, por algumas horas, a abrir um dos compartimentos, no qual foram encontrados posteriormente vestígios de queima de vários documentos.

Os 60 funcionários do casino, maioritariamente angolanos, aproveitaram a ocasião para pedirem auxílio às autoridades por estarem sem salários há mais de três meses. Os trabalhadores disseram que o casino era maioritariamente frequentado por cidadãos asiáticos e arrecadava milhões de kwanzas por dia.

Artigos Relacionados

Leave a Comment