ANTES A MORTE DO QUE A ESCRAVATURA

A UNITA, o maior partido da oposição que o MPLA ainda permite em Angola, lamentou hoje que os “filhos de Angola” continuem a enfrentar dificuldades de vária ordem, sobretudo o “não usufruto cabal dos direitos fundamentais”, volvidos 61 anos do início da luta armada de libertação do país.

Numa mensagem por ocasião do 61.º aniversário do início da luta de libertação nacional de Angola, que hoje se assinala, a UNITA refere que o 4 de Fevereiro de 1961 foi um “ato heróico”.

Segundo a UNITA, os actos desencadeados há 61 anos e outros que se seguiram culminaram com a independência do país, em 1975, “mas os filhos de Angola continuam enfrentando dificuldades de vária ordem”.

Destas dificuldades, assinalam, “destacam-se o não usufruto cabal dos direitos fundamentais e a não satisfação das necessidades básicas para a larga maioria da população de Angola”.

“É nossa convicção de que os verdadeiros nacionalistas e patriotas bater-se-ão sempre para a construção de um verdadeiro Estado democrático e de direito que seja capaz de garantir os direitos fundamentais de todo o cidadão a fim de realizar os anseios e sonhos da almejada nação angolana”, lê-se na mensagem da UNITA.

Angola assinala o 61.º aniversário do início da luta de libertação nacional, feriado nacional, em homenagem aos nacionalistas angolanos que em 4 de Fevereiro de 1961 atacaram cadeias e casas de reclusão, em Luanda, para libertar presos políticos do regime português.

O acto central alusivo à data decorreu na cidade de Saurimo, província da Lunda Sul, e foi presidido pelo ministro de Estado e chefe da Casa Militar do Presidente angolano, general Francisco Pereira Furtado.

Os acontecimentos que marcaram o início da luta de libertação nacional em Angola “devem constituir uma verdadeira herança para a actual geração de modo a se consolidar o patriotismo, a unidade nacional, o Estado democrático e de direito e o bem-estar comum dos angolanos”, disse o ministro na sua intervenção.

“Angolanos de mãos dadas para o futuro” é o lema das celebrações do 4 de Fevereiro de 2022.

No que ao MPLA respeita, há factos (que oculta) que essa de “angolanos de mãos dadas para o futuro” é uma mentira que tem, pelo menos, 46 anos de vida, tantos quantos o MPLA leva de poder.

Foi a partir dessa inspiração que o MPLA também resolveu matar milhares e milhares de outros angolanos.

O que a memória nos diz

Estávamos em Agosto de 2015. A UNITA recusava a autoria de um alegado plano para atentar contra as instituições do Estado (MPLA) e a tomada do poder pela força. Isto porque, segundo as etílicas e paranóicas teses do regime, um golpe de Estado estaria ali mesmo nas esquinas de Luanda.

A posição foi assumida no dia 15 de Agosto de 2015 em conferência de imprensa pelo secretário-geral do partido, Vitorino Nhany, que visou denunciar o que apelidou de um “plano macabro” das autoridades angolanas (MPLA) para imputar à UNITA as referidas intenções.

Tal como nos velhos tempos, o MPLA dizia na altura e diz hoje que a UNITA é a culpada de tudo. Não se sabe bem se, um dia destes, ainda vai descobrir que o Galo Negro é responsável pelo massacre do 27 de Maio de 1977. Nunca se sabe.

O que se sabe, no período anterior à morte de Jonas Savimbi, é que as balas das FAPLA/FAA só matavam os terroristas da UNITA, enquanto as das FALA só matavam civis.

Segundo Vitorino Nhany, o então presidente da UNITA, Isaías Samakuva, escreveu ao Presidente José Eduardo dos Santos para “denunciar a falsidade” de um documento forjado, supostamente produzido pelos Serviços de Inteligência do Presidente da República, mas atribuído ao Gabinete de Estudos, Pesquisas e Análise da UNITA – GEPA.

“O presidente Samakuva escreveu ao senhor Presidente da República para repudiar o objectivo velado de tal documento e garantir-lhe categoricamente que o documento é absolutamente falso”, referiu Vitorino Nhany.

O Secretário-geral da UNITA afirmou ainda que o documento “é falso” no seu conteúdo, autoria e origem que lhe é atribuída.

Para a UNITA, o objectivo da elaboração de tal documento visou a extorsão de dinheiro do Orçamento Geral do Estado “alegando que precisam de milhões de dólares para abortar tais planos da UNITA”.

O dirigente da UNITA sublinhou que as acusações não visam criar tensões no país, mas alcançar entendimento. “Não estamos a esconder, estamos a informar, de novo, o próprio Presidente da República para buscarmos diálogo”, salientou.

Igualmente com intenção de buscar diálogo, Vitorino Nhany disse que em Maio de 2015 foi endereçada uma carta ao Secretário-Geral do MPLA, partido no poder desde 1975, para a discussão de assuntos que afectam o país.

“A resposta fez-nos crer haver intenções de se adiar o encontro solicitado para as calendas gregas, o que por métodos diplomáticos significará, negar”, frisou o político.

A finalizar, Vitorino Nhany apelou à opinião pública nacional e internacional para a importância do assunto, que acredita tem, entre outros, o objectivo de “forjar um motivo para uma purga militar ou criminal contra a direcção da UNITA”.

E o culpado é…

Nada disto é novo. Em plena campanha eleitoral de 2012, o MPLA defendeu que a UNITA deveria pedir desculpas a algumas famílias devido ao que fez no passado.

Na altura, o secretário para os Assuntos Políticos do MPLA em Luanda, Norberto Garcia, virou-se para o passado no ataque à UNITA. É natural. Desde logo porque, como bem sabem os angolanos, o MPLA nunca – mas nunca – fez mal ao Povo.

Aliás, como todo o mundo sabe e nunca deve ser esquecido, tudo o que de mal se passou, passa ou passará em Angola é culpa da UNITA.

Mas há mais factos que dão razão às teses do MPLA. Todos sabem que a UNITA é que foi responsável pelos mais de 80.000 angolanos torturados e assassinados em todo o país depois dos acontecimentos de 27 de Maio de 1977, acusados de serem apoiantes de Nito Alves ou opositores ao regime.

E só por ter um espírito reconciliador, democrático e benemérito é que o MPLA, seguindo ordens superiores, não refere que a UNITA foi também responsável pelo massacre de Luanda que visou o seu próprio aniquilamento e de cidadãos Ovimbundus e Bakongos, onde morreram 50 mil angolanos, entre os quais o vice-presidente da UNITA, Jeremias Kalandula Chitunda, o secretário-geral, Adolosi Paulo Mango Alicerces, o representante na CCPM, Elias Salupeto Pena, e o chefe dos Serviços Administrativos em Luanda, Eliseu Sapitango Chimbili.

E é esse mesmo filantrópico espírito que evitou que ele dissesse os nomes de alguns angolanos que, esses sim, representam o povo angolano. A saber, entre muitos outros: Lúcio Lara, Iko Carreira, Costa Andrade (Ndunduma), Henriques Santos (Onanbwe), Luís dos Passos da Silva Cardoso, Ludy Kissassunda, Luís Neto (Xietu), Manuel Pacavira, Beto Van-Dunem, Beto Caputo, Carlos Jorge, Tito Peliganga, Eduardo Veloso, Tony Marta, Agostinho Neto, João Lourenço.

Como evitou que se fale dos que não são angolanos, mas apenas oportunistas e criminosos. A saber, entre outros: Alda Sachiango, Isaías Samakuva, Alcides Sakala, Jeremias Chitunda, Adolosi Paulo Mango Alicerces, Elias Salupeto Pena, Jonas Savimbi, António Dembo, Arlindo Pena “Ben Ben”, Adalberto da Costa Júnior.

Mas, apesar desta postura, o MPLA tem na manga muitas outras provas. Um dia destes vai provar que o massacre do Pica-Pau em que, no dia 4 de Junho de 1975, perto de 300 crianças e jovens, na maioria órfãos, foram assassinados e os seus corpos mutilados no Comité de Paz da UNITA em Luanda… foram obra da UNITA.

Como irá provar que o massacre da Ponte do rio Cuanza, em que no dia 12 de Julho de 1975, 700 militantes da UNITA foram barbaramente assassinados, perto do Dondo (Província do Cuanza Norte), perante a passividade das forças militares portuguesas que garantiam a sua protecção, foi obra da UNITA.

Mas a lista é interminável. Entre 1978 e 1986, centenas de angolanos foram fuzilados publicamente, nas praças e estádios das cidades de Angola, uma prática iniciada no dia 3 de Dezembro de 1978 na Praça da Revolução no Lobito, com o fuzilamento de 5 patriotas e que teve o seu auge a 25 de Agosto de 1980, com o fuzilamento de 15 angolanos no Campo da Revolução em Luanda. Responsável? A UNITA.

Foi, aliás, a aviação da UNITA que, em Junho de 1994, bombardeou e destruiu Escola de Waku Kungo (Província do Cuanza Sul), tendo morto mais de 150 crianças e professores; que, entre Janeiro de 1993 e Novembro de 1994, bombardeou indiscriminadamente a cidade do Huambo, a Missão Evangélica do Caluquembe e a Missão Católica do Cuvango, tendo morto mais de 3.000 civis.

Por alguma razão premonitória, no dia 24 de Fevereiro de 2002 alguém disse: “sekulu wafa, kalye wendi k’ondalatu! v’ukanoli o café k’imbo lyamale!” (morreu o mais velho, agora ireis apanhar café em terras do norte como contratados.)

Sekulu esse que também dizia: «Ise okufa, etombo livala» (Prefiro antes a morte, do que a escravatura).

Folha 8 com Lusa

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