O Governo angolano quer (é, pelo menos, o que diz) retirar, entre outros grupos-alvo, taxistas, empregadas domésticas e vendedores de rua, do mercado informal, que absorve cerca de nove milhões de pessoas, um terço da população de Angola. Não o faz por uma questão de equidade social mas, apenas e só, porque quer arrecadar dinheiro dos impostos que, desta forma, não consegue fazer.
Segundo o secretário de Estado do Trabalho e Segurança Social de Angola, Manuel Moreira, a título de exemplo, só o sector de táxis, ainda informal, representa anualmente um negócio de 1.000 milhões de dólares (cerca de 900 milhões de euros) em que o Estado se vê privado dos respectivos impostos.
“O Plano de Acção para a Promoção da Empregabilidade (PAPE) – aprovado a 21 de Abril passado pelo Presidente, João Lourenço, que disponibilizou 58,3 milhões de euros para promover o emprego] -, entre as várias actividades ou atribuições que tem, uma delas é a questão da certificação e formalização da economia informal”, sublinhou Manuel Moreira.
Destacando os domínios dos táxis, empregadas domésticas e os vendedores de rua ou em mercados municipais e provinciais, Manuel Moreira admitiu que o caminho é “problemático”, mas sublinhou que se pretende trabalhar com várias entidades e associações para combater o mercado informal e formalizar a economia.
“Nesta economia informal, há grupos alvo. Um deles é o dos taxistas, outro o das empregadas domésticas, vamos trabalhar com os mercados municipais e provinciais, uns formais outros informais, e, depois, vamos, no âmbito do que é a demanda da economia, criar perfis profissionais que se adeqúem a essa promoção de empregabilidade”, referiu o governante.
“Isto vai contribuir fortemente para a criação de emprego, porque estamos a falar de uma economia informal na ordem dos 60 a 70%, o que significa dizer que estas pessoas têm rendimentos, têm meios de trabalho, têm horários, só não fazem parte da economia, e não cumprem as obrigações fiscais nem as parafiscais, nomeadamente as relacionadas com a segurança social. É um problema de hoje”, acrescentou.
Segundo Manuel Moreira, e citando dados recentes do Instituto Nacional de Estatística (INE), estima-se em cerca de nove milhões de cidadãos que labora no mercado informal, pelo que o desafio é “grande”.
Instado a explicar como pode ser feita a formalização das profissões, Manuel Moreira exemplificou com o caso dos táxis, havendo já conversas com as respectivas associações.
“Queremos pegar nos taxistas, dar-lhes formação específica – conduzir pessoas não é o mesmo que conduzir carga ou animais -, e atribuir a carteira profissional que o habilita ao exercício da actividade. Com isso, a partir do momento em que se atribui a carteira profissional, formaliza-se a actividade”, respondeu, admitindo que, a partir daí, começa um “novo problema”.
“Aí teremos de resolver a situação a nível de alguns ministérios, porque vamos precisar da Justiça, das Finanças, do Comércio, dos Transportes, enfim, para que aquela actividade seja rapidamente formalizada, sem grandes dificuldades, para que, depois, possa então passar a contar para as estatísticas, para o PIB (Produto Interno Bruto) e para a economia”, sublinhou.
Segundo Manuel Moreira, e continuando no sector dos táxis, a respectiva associação estimou em cerca de 1.000 milhões de dólares o volume bruto que rende a actividade anualmente – “por aí podemos ver o quanto o Estado não capitaliza nesses casos”.
Manuel Moreira reconheceu que a taxa de desemprego – o INE indicou a 20 de Abril passado que se situa nos 28,8% – não reflecte a real situação económica do país, porque tem de se considerar que o sector da economia informal “emprega muita gente”.
Com um esforço combinado entre o sector público e privado, considerou, é possível “amenizar a questão do desemprego”, disse, apontando o PAPE, que apresenta acções muito concretas para ajustar perfis profissionais dos jovens aos sectores da Indústria, Turismo, Agricultura, Comércio e Pescas.
Com a aprovação do PAPE, que tem a vigência de três anos, João Lourenço pretende combater o desemprego, dando cumprimento à promessa feita durante a campanha eleitoral das eleições de Agosto de 2017 de criar 500.000 empregos até final da legislatura. A verba de 58,3 milhões de euros será proveniente do Orçamento Geral do Estado (OGE) e do Fundo de Petróleo.
Na perspectiva do Presidente, o diploma deverá também “contribuir para a bancarização e educação financeira das famílias” e para “o processo de reconversão da economia informal para a formal”.
“Apesar da grande oferta de mão-de-obra existente”, refere-se no decreto, “o sector produtivo da economia não tem capacidade para absorver a força de trabalho disponível”, pelo que terá de se resolver “uma situação de desemprego estrutural”.
Para o primeiro ano de execução do PAPE, o Governo estima um custo superior a 7.600 milhões de kwanzas (21,1 milhões de euros), estando igualmente prevista a possibilidade de outros financiamentos alheios ao OGE e ao Fundo do Petróleo.
Desemprego, miséria, pobreza… MPLA
A criação de pelo menos (pelo menos, note-se, anote-se e relembre-se) meio milhão de empregos, reduzir um quinto à taxa de desemprego e instituir o rendimento mínimo social para as famílias em pobreza extrema (temos apenas e graças à divina actuação do regime 20 milhões de pobres) foram propostas solenemente apresentadas e subscritas por João Lourenço.
Mas o MPLA está no poder há quase 44 anos e nos últimos 17 o país está em paz total, dirão os mais atentos e, por isso, cépticos. Mas o que é que isso interessa? Desta vez é que vai ser. A montanha de propaganda está a parir um paraíso, a da vida real nem um ratinho vai parir. Mas o que realmente conta é continuar a ser dono do país. E disso o MPLA mão abdica.
Reduzir a taxa de incidência da pobreza de 36% (segundo as deficientes contas do regime) para 25% da população, do índice de concentração da riqueza de 42,7 para 38, e “criar e implementar o Rendimento Social Mínimo para famílias em situação extrema de pobreza” são – repete João Lourenço – objectivos. Como é que isso se consegue? JLo não explica. Nem precisa de explicar. Aos escravos basta saber que “o MPLA é Angola e que Angola é o MPLA”.
“Erradicar a fome em Angola”, aumentar em cinco anos a esperança de vida à nascença, elevando-a para 65 anos, reduzir a taxa de mortalidade infantil (uma das maiores do mundo segundo organizações internacionais que não leram o manifesto do regime) de 44 para 35 por cada mil nados-vivos e de crianças menores de cinco anos de 68 para 50 por cada mil nados vivos, são outras metas do MPLA de João Lourenço.
Como vai fazer isso? Isso não interessa saber. Aliás, as promessas não carecem de justificação nem de explicações sobre a forma de serem cumpridas.
No plano económico, e com o país a tentar recuperar da crise financeira, económica e cambial de 2015 e 2016 (que só atingiu os angolanos de segunda categoria), João Lourenço avisou que as empresas públicas deficitárias serão entregues à gestão privada, para que deixem de “sugar os recursos do erário público”.
Não fosse apenas mais um capítulo do anedotário do regime e, certamente, os angolanos até ficariam sensibilizados com essa de “sugar os recursos do erário público”. Por outras palavras, promete acabar com aquilo que, ao longo de quase 44 anos, foi a única estratégia do seu MPLA: “sugar os recursos do erário público”.
Entre os fundamentos macroeconómicos, JLo promete “melhorar o que está bem e corrigir o que está mal”, assume o compromisso de atingir uma média de crescimento anual “não inferior a 3,1%” do PIB, reduzir a taxa de inflação a um dígito ou duplicar a receita tributária não-petrolífera.
Tudo isto já não são bem promessas do MPLA de João Lourenço. São, antes, um atentado à inteligência dos angolanos e a passagem de um atestado de matumbez também às organizações internacionais que dão cobertura ao regime, mostrando que preferem trabalhar com um partido (MPLA) incompetente às segundas, quartas e sextas e que às terças, quintas e sábados procura esconder essa incompetência (ao domingo… descansam).
Sobre a criação de 500 mil novos empregos em cinco anos, João Lourenço diz que será concretizada pela capacitação do empresariado privado, mas sem apresentar uma medida concreta. Ele bem perguntou aos seus assessores políticos, nomeadamente portugueses e brasileiros, como é que isso se alcançaria. Mas eles apenas responderam: “Não se preocupe, os escravos são matumbos”.
Folha 8 com Lusa