Há (mesmo) muito mais vida
para lá do tal… “irritante”

A propósito da contínua e acelerada peregrinação de políticos portugueses a Angola, o Folha 8 está a publicar a opinião de alguns reputados especialistas. Depois do Professor Universitário e Deputado da UNITA eleito pelo Círculo Eleitoral Provincial de Cabinda, Raul Tati, segue-se a de Eugénio Costa Almeida, Investigador angolano do Centro de Estudos Internacionais do ISCTE-IUL(CEI-IUL).

«O Jornal Folha 8, convidou-me a elaborar uma análise àquilo que denomina de «correria de políticos portugueses a Angola», recordando, por certo, as recentes viagens dos dois líderes oposicionistas portugueses, em contraponto a, até há pouco, nenhuma – pelo menos oficial – de membros do Governo português.

Até há pouco, porque por quando da visita da líder do CDS-PP, Assunção Cristas, na mesma data, o Ministro da Defesa português esteve em Luanda, em visita oficial, naquela que foi a primeira desde, como recordamos, a visita de uma personalidade portuguesa oficial, que ocorreu com a ida do Presidente Professor Marcelo Rebelo de Sousa – o Ti Celito – por quando da tomada de posse presidencial, do Presidente João Lourenço.

Depois disso, e, em grande parte, devido ao processo jurídico – que decorria em Portugal, por causa de uma eventual acusação de corrupção – que impelia sobre o antigo Vice-presidente Manuel Vicente, houve um completo deserto de contactos oficiais.

Até com a exoneração (por rotação diplomática) do embaixador de Angola, em Portugal, levou que o nosso indigitado representante estivesse em suspenso, sendo que só, recentemente, recebeu indicações para entregar as suas credenciais em Lisboa.

Tudo, repito, devido a uma “irritante” situação que era o processo jurídico que ocorria sobre o engenheiro Manuel Vicente.

Em Maio passado, o Tribunal de Relação de Lisboa, decidiu reconhecer a imunidade do antigo Vice-presidente e ordenar o envio do processo, como Luanda sempre o exigiu, aos Tribunais angolanos a quem reconheceu idoneidade para o julgar e, caso disso, o condenar.

Foi a “libertação” das “suspensas” relações oficiais entre os dois países. A partir daí, começou o corrupio.

Só que, ao contrário do que se pensava, e do que, por certo, pensaria o Governo português, não foi o primeiro-ministro luso o primeiro contemplado com o convite par ir – de imediato – a Luanda.

Note-se, nem o primeiro-ministro português, nem ninguém, em especial, “exceptuando” o Ministro da Defesa luso, Azeredo Lopes, que foi a Angola no âmbito dos acordos de cooperação militares que existem entre os dois Países e que implicava a assinatura do Programa-Quadro de Cooperação para 2018-2021.

Acabou por ser notícia oficial porque o Ministro português foi recebido no Palácio da Cidade Alta pelo Presidente João Lourenço que, até à sua nomeação e tomada de posse, era o então Ministro da Defesa de Angola e, como tal, conhecia e conhece bem os dossiês sobre a Defesa Nacional, além de, principalmente, com a recepção – de cerca de uma hora, creio, e de surpresa, dado não estar programada, – ao Ministro Lopes, deu, digamos, o pontapé na crise institucional entre os Governos dos dois Países.

Que me recorde, foi, até agora, a única presença de um membro oficial do Governo português em Angola…

Mas se esta é e foi a única visita oficial de representantes de São Bento (palácio-sede do Governo português, liderado por António Costa), já a nível privado e partidário a Oposição tem seguido a habitual linha que sempre a caracterizou: visitar sem pruridos e sem se preocupar com quem está no Poder, Angola e as instituições públicas privadas angolanas.

Foi assim, como iniciei, com a primeira visita não-oficial da líder do CDS-PP, na oposição, a luandense Assunção Cristas – aproveitou para (re)conhecer a idade que a viu nascer e de quem terá recebido o nome, Assumpção, – em Maio, quase em simultâneo com a decisão do Tribunal de Relação de Lisboa, sobre o caso do engenheiro Manuel Vicente –; felizmente que acredito em coincidências, caso contrário, iria dizer que a Justiça estava em conluio com a Política, tal o dito e perfeito sincronismo de datas…

Mas antes de entrar nestas visitas e – porque é importante dada as boas relações entre a direita portuguesa e o MPLA – o que elas, normalmente representam em teros partidários (e oficiais e oficiosos), recorremos uma frase, que retenho de memória, do primeiro Presidente de Angola, Dr. António Agostinho Neto (1922-1979), em que dizia preferir falar e negociar com os partidos de direita portugueses do que com os da esquerda, porque aqueles não (con)tinham, ainda, os pruridos da descolonização e de temerem que, quaisquer relações, pudessem ser vistas como ingerência ou interferência nos assuntos internos de Angola; ou seja, e ele chegou arreferir isso, já tinham passado os traumas da descolonização e não viam que as relações implicassem uma eventual neocolonização como pareciam ver e manter os partidos de esquerda portugueses.

Por isso, talvez, que as relações entre a direita portuguesa e o MPLA – oficialmente, um movimento/partido de esquerda e que pertence à Internacional Socialista – foram sempre amplas, descomplexadas e, digamos, livres.

É certo que, oficiosamente – digamos assim – dois importantes factos contribuíram, de facto, para este “alinhamento”: Bicesse (estava em Portugal um governo de direita liderado por Cavaco Silva e que tinha como interlocutor o então Secretário de Estado da Cooperação, Durão Barroso) e o apoio que o “então” PS português dava à UNIAT e ao Dr. Jonas Malheiro Savimbi (à época, o inimigo dos sucessivos Governos angolanos do MPLA).

Ora, depois a visita de Assunção Cristas, considerada importante e muito proveitosa, e que esta recordou que, apesar de ter se encontrado com as 3 maiores organizações políticas de Angola, com assento parlamentar, MPLA, UNITA e CASA-CE, servir para mostrar e realçar a “preocupação do seu partido em situar o relacionamento este com os três maiores partidos em Angola, ao nível do próprio relacionamento entre Estados”, também não deixou de recordar que as relações entre o CDS-PP e o MPLA sempre foram boas, principalmente, desde que estas começaram a ser efectivas com a visita do então líder do CDS-PP Paulo Portas – e reforçadas quando este foi ministeriável – e solidificadas com a primeira participação de um representante oficial do CDS-PP, Hélder Amaral. num Congresso do MPLA, em Agosto de 2016.

Como na altura Assunção Cristas se justificou, por esta presença, no primeiro convite que o CDS-PP alguma vez havia recebido por parte do MPLA, – e, no meu entender, deve ser mesmo assim, gostemos ou não, – “o que está aqui em causa é o aprofundar de relações entre países em prol dos portugueses, das empresas que exportam para Angola, dos portugueses que vivem em Angola”. E a visita agora, serviu, espera, que seja, não só “uma voz do estabelecimento de pontes, da concórdia, de um clima positivo entre os dois países e isso também se faz dialogando com os vários partidos, cada um nas posições que ocupa” como ajudar com a sua experiência e conhecimento, segundo Raul Danda, à “realização das primeiras eleições autárquicas, previstas para 2020, e o assunto sobre o repatriamento de capitais”.

Ora, como se sabe, as relações oficias entre os dois Estados já começava a sentir efeitos do processo sobre o engenheiro Manuel Vicente…

Depois, da visita de Cristas, ocorreram várias visitas de políticos e políticos-empresários portugueses a Angola.

A última, e uma vez mais, com ressonância em Portugal, foi do líder do maior partido oposicionista português, PPD-PSD, Rui Rio.

Segundo rezam as estórias – na política portuguesa são mais as estórias que as histórias – Rui Rio terá ido a Luanda, de surpresa, nas palavras do comentador político residente da SIC e antigo líder do PSD.PP; Marques Mendes, e sem conhecimento ou aviso prévio ao primeiro-ministro português – uma vez mais viu-se preterido temporalmente por terceiros e Rio terá firmado que não disse nem teria de dizer nada a António Costa –, tratar das relações, contribuir e ajudar para que “as relações entre Angola e Portugal possam melhorar”.

Pois, tal como Cristas, também Rio, que, ao contrário daquela, terá tido relações com o Presidente João Lourenço e com o presidente do MPLA (presumo, José Eduardo dos Santos), considera que o “simbolismo” dos encontros, evidenciando que isso é “bom para o PSD”, mas “acima de tudo, bom para Portugal” até porque, segundo Rio, estes encontros, nomeadamente com João Lourenço, servirão para “que as relações entre Angola e Portugal têm agora uma “estrada aberta” pela frente”.

São mais as estórias que as histórias que estes rodopios de políticos portugueses em Angola nos contam.

E se tivermos em linha de conta que nos corredores da política portuguesa correm estórias – uma vez mais – que a ancestral amizade pessoal entre Rio e Costa, do tempo que eram líderes camarários das duas principais urbes portuguesas os levará à (re)criação– caso o PS ou o PSD não obtenham maioria absoluta nas próximas eleições – do Bloco Central, alguém acredita que Costa não soube mesmo e antecipadamente desta visita? E que, repetindo, ao contrário de Cristas, Rio foi recebido na Cidade Alta só porque há uma boa e antiga relação entre o PPD-PSD e o MPLA? Para isso, bastava as conversas com Eduardo dos Santos.

Não terá sido mais um secretário particular a preparar a próxima e primeira visita oficial de António Costa a Angola?

Estórias de rodopios que a História, um dia, clarificará!

Mas há algo, e importante, que devemos ter em linha de conta nas relações entre Angola e Portugal, ou entre organizações políticas e empresariais (e seus representantes) angolanas e portuguesas.

Independentemente dos oportunismos, políticos, económicos e sociais que existam – e existem – nestas visitas meio-públicas, meio-privadas, e políticos e políticos-empresários a Angola;

Independentemente das críticas que façamos – e temos de fazer, pelo menos, nós enquanto angolanos – quanto à opacidade das, ou de muitas, políticas governativas que o MPLA tem praticado – a esperança é que o Presidente João Lourenço consiga levar por diante as suas reformas, não só governativas, como, e principalmente, partidárias, caso seja eleito presidente do MPLA – seja a nível nacional ou local;

Independentemente de tudo isto – u talvez por causa disto – a verdade é que estas visitas servem par mostrar algumas realidades que, por certo, não seriam realçadas se não as houvessem.

É que, além das conversas com o partido maioritário e com membros governativos, os “visitantes” lusos têm mantido conversas com os partidos da Oposição nacional – apesar de quase inócuos, muitas vezes, até pela sua menoridade representativa a nível da Assembleia Nacional, eu quero acreditar que são Oposição e querem trabalhar e batalhar como tal – permitindo que certos aspectos e problemas políticos e sociais angolanos – até porque a comunicação social os acompanha – sejam partilhados para o exterior, ajudando, como se deseja, o país a se desenvolver social e politicamente dentro de uma Democracia plena estável e robusta.

Para isso, que as visitas – sejam dos políticos portugueses, sejam de outras nacionalidades, – não se cinjam às TV´s e aos seus interesses partidários internos, mas para ajudar, como Cristas o afirmou na sua visita, ajudar

E, finalmente, não esquecer que as relações entre Estados são sempre as mais importantes e predominantes e que as relações inter e intrapartidárias devem suprir, sempre e unicamente, aquelas.

Para isso, convém que estas, as relações inter e intrapartidárias não sirvam de e como veículo de propaganda política portuguesa à custa de passeios e rodopios por países terceiros, no caso, e porque está na linha da frente e porque é palco de vários encontros políticos e económicos internacionais: Angola.

Angola precisa de viajantes e de muito rodopio e correrias de visitantes sim, mas de turistas que ajudem a desenvolver uma das mais importantes indústrias deste século e de criação de muita mão-de-obra: o turismo.

Mas, não é o deste tipo e correrias e rodopio: políticos portugueses em Angola para consumo interno português!»

Nota: O autor é Investigador angolano do Centro de Estudos Internacionais do ISCTE-IUL(CEI-IUL); Doutorado em Ciências Sociais, na especialidade de Relações Internacionais, pela UL-ISCSP; e Pós-Doutorando da Faculdade de Ciências Sociais da Universidade Agostinho Neto e um dos mais credenciados especialistas em assuntos africanos, nomeadamente lusófonos.

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One Thought to “Há (mesmo) muito mais vida
para lá do tal… “irritante””

  1. Universidade de Michigam

    Se se aperceberem de uma frase julgo de um toinicista Carlos Queiroz selecionador do Irão ainda recente apôs o encontro que a equipa perdeu , empatou ,relembro disse que pertencia” a uma cultura de vencedores, que tinha sido criado numa cultura vencedora ” foi o que ele disse; para pasmo de todo o mundo porque ficamos a pensar que raio de cultura era aquela que se referia?, vencedores ou destruidores?..de vencedores não sabemos,mas que lá que no hino e quem o fez dizem que são herois [isso também qualquer faz de bandeja hinos heroícos com palavras megalomanas]também não sabemos porquê, que se gafanham muito nas palavras lá isso sabemos;mas vencedores tem muito que se diga;que são chatos, isso são; que chateiam, também é uma viriosilidade;que têm manias;todo o mundo sabe;que se fazem mais do que são; também estamos de acordo;agora vencedores? vencedores ou destruidores; porque aquilo que a historia nos contou até hoje é que destruiram mais que venceram, prejudicaram mais do que lucraram.é neste contexto que queremos saber que raio de cultura era aquela que se referia.[ de vencedores ou pedintes ou pedinchas, uma cultura de vencedores não produz emigrantes , porque se fosse de vencedores ninguém imigrava,eram vencedores,não precisam de imigrar]

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