A Arábia Saudita vai financiar com 110 milhões de dólares (cerca de 100 milhões de euros) a construção da cidade industrial da Catumbela, província de Benguela, litoral sul de Angola, adiantou hoje o enviado especial do rei daquele país árabe.
Ahmed Bin Abbulazizi Kattan (foto), conselheiro do Tribunal Real da Arábia Saudita, foi hoje recebido em audiência pelo Presidente de Angola, João Lourenço, avançando à imprensa, no final do encontro, que “o Governo da Arábia Saudita tomou a decisão de conceder o empréstimo de 110 milhões de dólares ao Governo angolano”. Democraticamente, como é timbre do regime angolano, o encontro que oficializa mais um fiado foi testemunhado por entidades independentes, o Presidente do MPLA e o Titular do Poder Executivo.
Segundo o representante saudita, o empréstimo tem como objectivo a materialização da cidade industrial da Catumbela que, assim, se “junta” à Califórnia de Benguela, outra emblemática promessa de João Lourenço.
“Abordamos igualmente muitas questões importantes, nomeadamente como reforçar a nossa cooperação nos mais variados domínios”, disse o enviado especial do Rei da Arábia Saudita, salientando que também informou o chefe de Estado angolano, que deverá ser aberta, o mais breve possível, uma embaixada em Luanda, de acordo com orientação do monarca.
No encontro, o Presidente angolano ficou também a saber como decorrem os preparativos da cimeira Arábia Saudita-África, que se realiza em Novembro naquele país do Médio Oriente.
Angola e a Arábia Saudita, ambos os países produtores de petróleo, assinaram, em Setembro de 2018, o Acordo Geral de Cooperação no domínio Técnico e Científico, a base de alavanca dos sectores da formação de quadros e do desenvolvimento das ciências.
Em Janeiro de 2019, João Lourenço apelou a empresários dos Emirados Árabes Unidos (EAU) para investirem “sem medo” em Angola, “país de grandes oportunidades” e que, em pouco tempo, “criou um ambiente de negócios favorável”.
João Lourenço respondia a questões colocadas num painel sobre o Futuro e Desenvolvimento de África com o seu homólogo do Mali, Ibrahim Boubacar Keïta, na abertura da Cimeira sobre Futuro Sustentável, enquadrada na Semana da Sustentabilidade de Abu Dhabi.
Priorizando as áreas de exploração petrolífera, turismo, agricultura e indústria, João Lourenço indicou, porém, que o investimento é bem-vindo “em qualquer outro domínio”.
O chefe de Estado de Angola lembrou outra prioridade do executivo que lidera, o “combate efectivo” à corrupção e à impunidade, com o objectivo de moralizar a sociedade e melhorar o ambiente de negócios.
Segundo João Lourenço, a corrupção era, foi, um dos “maiores males” com que “a classe política, ou parte dela”, lidava na gestão do erário público e que, como consequência, acabava por afectar a sociedade, no seu geral.
A aposta na diversificação económica, insistiu, “é fundamental” para priorizar a redução da dependência do petróleo, pelo que, no apelo aos empresários dos EAU, o Governo está a incentivar uma maior presença do sector privado na economia do país e “reduzir a excessiva intervenção do Estado”.
Antes das perguntas do empresariado local, e numa intervenção de fundo na cimeira mais centrada sobre o continente africano, João Lourenço defendeu que, para se desenvolver, África terá de vencer os desafios do analfabetismo, electrificação e industrialização.
“África precisa de vencer três grandes desafios: acabar com o analfabetismo, electrificar-se e industrializar-se para se desenvolver. Para isso, precisamos de (…) mão-de-obra qualificada, quadros superiores, cientistas e investigadores, valorosas peças de arte, matéria-prima em estado bruto, e até fortunas pessoais que deviam servir as nossas economias e que continuam a sair de África para o resto do mundo em condições desfavoráveis”, sublinhou.
Segundo João Lourenço, África precisa de fazer “o inverso”, atrair para o continente o que há de melhor no mundo, como o conhecimento, os avanços da ciência e da tecnologia, o capital, o investimento privado e ‘know-how’ para transformar localmente as matérias-primas.
“Por outras palavras, precisamos de industrializar o nosso continente. Só assim vamos criar riqueza e bem-estar para os nossos cidadãos e emprego como principal fonte para todas as oportunidades”, sustentou.
Manifestando-se “optimista” em relação ao futuro de África, o Presidente angolano indicou que o sonho do desenvolvimento “é realizável” se tiver em conta que outros continentes, como a Ásia, conseguiram dar o salto em menos de meio século”, passando de importadores a exportadores de alta qualidade.
Angola abriu uma representação diplomática nos EAU em 2004, através de um consulado geral, que passou, quatro anos depois, ao estatuto de embaixada. Os dois países cooperam nas áreas de petróleo, gás, agricultura, entre outras.
Angola e os EAU são membros da Organização dos Países Exportadores de Petróleo (OPEP) e rubricaram dois acordos, em Junho de 2015, sendo um de cooperação económica e técnica e outro de criação da comissão mista entre os Estados.
Os direitos humanos no mundo árabe são baseadas, tal como em Angola, na Constituição que supostamente promete tratamento equitativo de todas as pessoas, independentemente de raça, nacionalidade ou status social.
Apesar disso, tal como em Angola, a Freedom House afirma: “Formas extremas de censura são amplamente praticadas, especialmente em relação a questões como a política, a cultura, a religião, ou qualquer outro assunto que o governo considere politica ou socialmente sensível”.
Organizações de direitos humanos relatam assiduamente violações dos direitos humanos nos países árabes, a ponto de a Human Rights Watch denunciar que nos Emirados Árabes Unidos, por exemplo, mais de 300 mil trabalhadores estrangeiros sobrevivem em condições descritas como inumanas.
O artigo 25 da Constituição dos Emirados Árabes Unidos prevê o tratamento equitativo das pessoas em relação à raça, nacionalidade, convicções religiosas ou status social. No entanto, na realidade, há muito poucas leis anti-discriminação e os estrangeiros são considerados uma subespécie.
Baya Sayid Mubarak, cônsul da Índia, disse em tempos que o chamado milagre económico no Dubai se deveu ao exército de trabalhadores indianos, mal pagos e que sobrevivem sem os mínimos padrões de dignidade. “São verdadeiros escravos”, disse o cônsul.
As injustiças nos países árabes têm atraído a atenção de vários grupos de direitos humanos, que tentam levar esses países a tornarem-se signatário, entre outras, das convenções fundamentais da Organização Internacional do Trabalho, o que permitiria – por exemplo – a formação de sindicatos. Os governos (onde é que nós já vimos isto?) nega qualquer tipo de injustiças, garantindo que são um paradigma da legalidade.
Um relatório da Human Rigths Watch revelou diversas violações sistemáticas dos direitos humanos contra trabalhadores imigrantes e as disparidades no tratamento social das populações nos Emirados Árabes Unidos (EAU), Omã, Arábia Saudita, Qatar, Bahrein e Kuwait, todos países membros do Conselho de Cooperação do Golfo (GCC).
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