COMPRAR, TOMAR CONTA E… NÃO PAGAR

A ministra das Finanças de Angola, Vera Daves de Sousa, mostrou-se hoje preocupada, em Luanda, com o incumprimento de sujeitos que adquiriram activos do Estado a prestações, com cerca de 14,1 mil milhões de kwanzas (24,5 milhões de euros) em falta.

Vera Daves de Sousa, em entrevista à RNA, disse que o Instituto de Gestão de Activos e Participações do Estado (IGAPE) está a acompanhar a situação “milimetricamente” e vai propor aos órgãos competentes sobre qual será o posicionamento caso se mantenham esses incumprimentos.

“Temos uma performance que diria positiva, 52% de implementação. Já temos 73 activos vendidos, temos um encaixe financeiro de facto de cerca de 73 mil milhões de kwanzas (127,1 milhões de euros) e depois temos também encaixe valorado em activos e que fazem parte do balanço de instituições do Estado ou do próprio Estado”, referiu.

A titular da pasta das Finanças frisou que o que é necessário agora “é acompanhar de perto essa questão dos incumprimentos”.

“Temos prestações que estão aí a vir, 100 mil milhões de kwanzas (174,1 milhões de euros) para receber. Temos possibilidade no fim de serem exercidas opções de compras de fábricas que estão a ser geridas, vamos ver se quem as está a gerir decide comprar ou não e temos que acompanhar de perto esses 14,1 mil milhões de kwanzas de prestações vencidas”, salientou.

Contudo, Vera Daves de Sousa fez um balanço positivo do processo, considerando exigente o ano em curso, com 68 activos para venda ou no limite início de venda, estando propostos para o arranque a comercialização da ENSA, empresa seguradora, o Banco Angolano de Investimentos (BAI), o Banco Caixa Geral Angola e a Bolsa de Dívidas e Valores de Angola (Bodiva).

Vera Daves de Sousa anunciou a reestruturação de cinco fundos de garantias, com um trabalho em curso para a sua condensação. Segundo a ministra, a maior parte dos fundos presta contas, apesar de nem todas terem a qualidade necessária.

“Têm qualidade deficiente muitas delas e nós temos, sempre que isso acontece, sinalizado e quando essa prestação não é feita também temos sinalizado”, indicou.

A governante admitiu que monitorar esse número de fundos é desafiante, por isso foi tomada a decisão de reestruturar o quadro dos fundos, condensando-os.

“Para serem em menor número e não haver dispersão de vigilância, nem dispersão de recursos, nem dispersão de esforços”, frisou.

“E é esse caminho que estamos a procurar trilhar para os condensar. Enquanto isso não acontece vamos focar naqueles que têm gerado valor de alguma forma, cujas iniciativas estão aí e são visíveis”, acrescentou.

O Fundo de Garantia de Crédito foi um dos apontados pela ministra como estando “efectivamente a conceder garantias para alguns financiamentos que são dados a nível da banca”.

“O FADA [Fundo de Apoio ao Desenvolvimento Agrário] está efectivamente a financiar actividades relacionadas ao sector agrícola, tractores e também alguns projectos relacionados à agricultura familiar, temos também o FACRA [Fundo Activo de Capital de Risco Angolano], que também está activo e tem prestado o seu contributo, se bem que em menor dimensão, de modo que aqueles fundos que nós notamos que há iniciativas activas em curso, nós nos propusemos, em 2022, em fazer um aporte adicional de capital, que não prejudica a reestruturação que deve continuar a ser feita”, referiu.

De acordo com a ministra, a reestruturação vai ser feita numa lógica de seis meses por fundo, uma após outra, com prioridade para o fundo para as infra-estruturas.

“Fechamos uma reestruturação depois partimos para outra até fechar os cinco fundos que queremos que passem a existir”, sublinhou.

Ministra vai avisando o dono dela e do país

Recorde-se que em Dezembro do ano passado, Vera Daves, enviou uma carta à Presidência da República (cujo Presidente, João Lourenço, também é Titular do Poder Executivo) para alertar os governantes sobre a necessidade de seguirem as regras da contratação pública e evitar os ajustes directos. Também foi dado conhecimento ao Presidente do MPLA, João Lourenço.

“Reportamo-nos a um conjunto de procedimentos de Contratação Simplificada, pelo critério material, e de Contratação Emergencial, superiormente autorizados pelo Presidente da República”, afirmou Vera Daves, na missiva enviada ao secretário do Presidente da República para os Assuntos Jurídicos.

“Muitos dos Procedimentos de Contratação Pública simplificada e emergencial aprovados por despacho de Sua Excelência Titular do Poder Executivo apresentam-se em desconformidade com a Lei de Contratação Pública (LPC), por não reunirem os pressupostos para a sua adopção”, avisou a ministra das Finanças.

Em causa estava (está), acrescentou Vera Daves de Sousa, a falta de consulta prévia ao Ministério das Finanças relativamente à atribuição de contratos que são publicados no Diário da República, e que tornam nula qualquer posição das Finanças depois de terem sido publicados.

“O Ministério das Finanças não tem sido previamente consultado quanto aos mesmos, tomando apenas conhecimento da autorização do titular do poder executivo, ficando assim sem margem de intervenção através do Serviço Nacional de Contratação Pública (SNCP)”, referiu a ministra, acrescentando que, “por outro lado, em muitos casos, sobre os referidos despachos do Titular do Poder Executivo, recai o despacho do ministro de Estado e Chefe da Casa Civil, orientando à sua publicação”.

Na carta, Vera Daves, que em vários momentos nos últimos meses tem alertado publicamente para a necessidade de garantir que a contratação pública segue as regras e que tem cabimento orçamental prévio, recordou que “em anos anteriores (2018)”, antes de o Presidente da República assinar qualquer despacho relativo à contratação pública simplificada ou emergencial, ou seja, por ajuste directo, a Presidência remetia às Finanças, “para um parecer prévio sobre a conformidade, legalidade e regularidade do referido despacho, incluindo a existência de orçamento para a execução dos projectos”.

No documento, datado de 7 de Dezembro, a ministra das Finanças solicitou a intervenção do secretário dos Assuntos Jurídicos “para efeitos de alinhamento, antes de se submeter à assinatura do Titular do Poder Executivo os despachos referentes aos procedimentos, no sentido de se evitar a prática de actos ilegais e/ou irregulares aquando da tomada de decisão de contratar e subsequentes actos”.

A nova lei dos contratos públicos entrou em vigor em Janeiro de 2021, apresentando várias novidades, como a criação de um procedimento de contratação emergencial e um procedimento dinâmico electrónico, permitindo agilizar a contratação de bens e serviços em época de pandemia.

O procedimento de contratação emergencial é um procedimento simplificado destinado a situações de emergência, com causa não imputável à respectiva entidade pública contratante, que apenas poderá a ele recorrer quando não possam ser comprovadamente cumpridos os prazos ou formalidades previstas para os restantes procedimentos de contratação pública, ao passo que o procedimento dinâmico electrónico simplifica a contratação realizada através de um leilão electrónico.

Entre as principais novidades elencadas estão, além dos novos procedimentos de contratação pública, a simplificação e a criação de um novo regime sancionatório, que vai de 550 a 3.300 dólares (454 a 2.724 euros) para pessoas singulares e de 2.750 a 16.500 dólares (2.270 a 13.622 euros) para empresas.

Transparência (quando existe) significa confiança

A transparência no processo de realização da despesa pública representa para o Estado angolano um compromisso de confiança para a sustentabilidade das finanças públicas, com vista à concretização dos ditames da equidade na redistribuição dos rendimentos nacionais, disse, em Luanda, o secretário de Estado do Tesouro, Leonel Silva. Isto em, em, em… 2014.

Ao intervir no lançamento do Portal de Contratação Pública, por ocasião da semana das finanças públicas, Leonel Silva disse que a igualdade e concorrência no fornecimento de bens e serviços ao Estado têm reflexos na promoção e dinamização do mercado da contratação pública que leva à realização da despesa pública a preços mais competitivos, garantindo maior eficiência e qualidade dos bens e serviços adquiridos.

Leonel Silva referiu que a modernização e actualização dos instrumentos de aquisição pública visam a criação de sistemas informáticos de acesso público, contribuindo para a reforma da administração pública e, consequentemente, o seu alinhamento e projecção aos níveis de exigência internacional, representando para os cidadãos a satisfação das suas necessidades.

Sublinhou, recorde-se que isto foi em… 2014, que o Portal de Contratação Pública contribui como um veículo de informação para a abertura nacional e internacional do mercado de contratação pública.

No mercado de contratação pública, a disponibilidade de informações simétricas permite aos fornecedores vender os seus produtos a um universo mais dilatado de entidades públicas contratantes e, a estas, adquirir bens e serviços a preços mais competitivos, frisou Leonel Silva.

Na ocasião, a directora da Contratação Pública, Rosária Filipe, sublinhou que o Portal da Contratação Pública juntava-se ao leque de instrumentos que vão sendo continuamente colocados à disposição dos intervenientes e do público, por forma a uniformizar boas práticas em matéria de contratação pública, através da disponibilização de informações pertinentes sobre o estado da contratação pública.

“É nosso entender, ver consolidada, cada vez mas, a ideia de que apenas com rigor e transparência na contratação pública se alcançará a sustentabilidade da mesma“, disse.

Informou ainda que a contratação pública visa promover a concorrência e competitividade entre os fornecedores do Estado, aumentar a transparência e conformidade com os requisitos ligados à contratação pública e também auxiliar na uniformização das políticas, processos e procedimentos da contratação pública.

Folha 8 com Lusa

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