O Parlamento angolano, esmagadoramente dominado pelo MPLA, recomendou ao Governo (do MPLA) a melhoria dos “instrumentos que conduzem à avaliação positiva e transparente das contas públicas” durante a aprovação do relatório de execução do Orçamento Geral do Estado (OGE) do último trimestre de 2020.
Os deputados apresentaram várias recomendações ao relatório de execução do OGE referente ao quarto trimestre de 2020 que constam de um projecto de resolução elaborado pelas comissões especializadas do Parlamento.
Os deputados apontaram a necessidade de se “melhorar os instrumentos que conduzem à avaliação positiva e transparente das contas públicas” e continuar a apresentação em tempo oportuno dos relatórios de balanço de execução trimestral à Assembleia Nacional.
Continuar com as iniciativas para “dinamizar” a actividade do sector não petrolífero e conferir maior nível de arrecadação de receitas fiscais não petrolíferas “sem ferir os objectivos de maior racionalização e eficiência da política de despesas públicas” constam igualmente das recomendações.
A necessidade de se “intensificar as medidas de manutenção e exploração de novos blocos para contornar o cenário de tendência crescente de queda dos níveis de produção petrolífera” também estão entre as recomendações dos deputados.
O projecto de resolução sobre a apreciação do relatório de execução do OGE referente ao quarto trimestre de 2020 foi aprovado com 129 votos a favor, 39 votos contra e sem nenhuma abstenção durante o último dia da 13ª reunião plenária da Assembleia Nacional.
A secretária de Estado das Finanças para o Orçamento, Aia Eza da Silva, que apresentou o relatório aos deputados, referiu que nesse período foram executadas receitas de aproximadamente 3,1 mil milhões de kwanzas (4 milhões de euros), sendo 48% de receitas correntes petrolíferas e não petrolíferas e 52% receitas de capital.
Esta execução da despesa, explicou, “significou menos de 18% em relação ao período homólogo de 2019, onde executamos mais 18% do que em 2020”.
A execução da despesa “foi de 4, 6 mil milhões de kwanzas (6 milhões de euros), sendo que 35% foram despesas correntes e 65% foram despesas de capital”, mas essa execução da despesa, observou, significou aproximadamente 36%, maior execução do que a executada no período homólogo de 2019.
A despesa do sector social, seguido dos sectores de defesa e segurança e o sector dos assuntos económicos lideram as despesas por função, sendo que a execução de despesa de capital foi maioritariamente Programa de Investimento Público (PIP).
“Como sabemos o PIIM (Programa Integrado de Intervenção nos Municípios) tem sido a principal despesa do PIP, mas também tivemos outras despesas principalmente no sector da energia e águas e no sector dos Transportes”, realçou.
Aia Eza da Silva referiu também que nesse período o país emitiu uma dívida interna no valor de 1,2 mil milhões de kwanzas (1,5 milhões de euros), mas, frisou, o serviço “foi superior a esta arrecadação” porque houve “um serviço de dívida 1,9 mil milhões de kwanzas (2,5 milhões de euros)”.
“O mesmo aconteceu também em relação à dívida externa, os desembolsos que tivemos de, aproximadamente, 183 mil milhões de kwanzas (240 milhões de euros) foram inferiores ao serviço que tivemos de executar de aproximadamente 570 mil milhões de kwanzas (757 milhões de euros)”, acrescentou.
Recorde-se que Assembleia Nacional aprovou a Proposta de Lei do OGE para 2021, com 141 votos a favor (pudera!) do MPLA e da FNLA (partido que já não existe… embora os seus membros ainda não saibam), 48 contra da UNITA e da CASA-CE e deputados independentes. Abstiveram-se os eleitos do Partido de Renovação Social e um deputado independente.
O OGE para o exercício económico de 2021 com receitas fixas e despesas estimadas em 14,7 mil milhões de kwanzas (19,3 mil milhões de euros), foi elaborado com o preço de referência de 39 dólares o barril de petróleo, reflectindo um aumento de 9,9% comparativamente ao OGE revisto em vigor.
Na declaração de voto, o grupo parlamentar da UNITA disse que votou contra porque o OGE para 2021 não apresentava, de modo claro, uma estratégia de política económica, para a promoção do crescimento real do Produto Interno Bruto, no sector petrolífero, baseando-se em objectivos, cujas metas continuam inatingíveis, na medida em que o cenário macroeconómico do presente orçamento “traz uma trivial maré de incertezas”.
De acordo com a segunda vice-presidente do grupo parlamentar do maior partido da oposição que o MPLA ainda permite que exista em Angola, Navita Ngola, o voto não foi favorável também por causa da inscrição de projectos no OGE com valores exíguos, que depois seriam alterados no quadro da execução orçamental.
“Entendemos esse exercício como um acto de predisposição ao roubo e ao desvio do erário. Entendemos que devem ser inscritos projectos exequíveis e prioritários que contribuam para o relançamento da economia de forma eficaz e eficiente”, referiu. De facto, reconheça-se que o MPLA tenta, desde 1975, “relançar” a economia de forma eficaz e eficiente. No entanto, continuam a achar que, ao contrário do que lhes foi ensinado pelos colonos portugueses, as couves devem ser plantadas com a raiz para cima…
Por sua vez, o grupo parlamentar da CASA-CE considerou que o OGE para o exercício económico de 2021 se mostrava incapaz e inadequado “para reduzir a condição de extrema pobreza e miséria em que boa parte dos angolanos estão mergulhados”.
Mas, desde quando é que que reduzir a pobreza e a miséria é um prioridade para o MPLA? Importa reconhecer (e enaltecer) o esforço do governo de João Lourenço para ensinar os angolanos a viver sem ficarem doentes e sem comer. Trata-se, aliás, de uma experiência que envolve milhões de angolanos (cerca de 20 milhões). Persistente como é, o MPLA não se deixa derrotar pelos que quando estão quase a sabe viver sem comer… morrem.
De acordo com o deputado Manuel Fernandes, a teoria de que grande parte da dotação deste OGE privilegiou o sector social, “na verdade, mais do que as percentagens expressas neste diploma legal deviam beneficiar de projectos concretos para melhorar a qualidade dos serviços a prestar que se reflictam na vida dos cidadãos mais desfavorecidos”. Engano. Angola só tem favorecidos.
“O voto contra da CASA-CE assenta no facto de o OGE para 2021 pecar em termos de dados não financeiros, sendo que as informações que nele constam não são suficientemente claras e abrangentes em relação ao que será a aplicabilidade do dinheiro público”, adiantou. Mas também queriam o quê? Sendo o MPLA Angola e Angola do MPLA, sendo o Presidente do MPLA também Presidente da República e Titular do Poder Executivo, não tem que prestar contas aos escravos do reino.
Por seu turno, Benedito Daniel, do PRS, disse que se absteve por entender que o debate sobre a proposta do OGE é uma oportunidade da participação activa do cidadão na governação e na gestão do interesse público e bem comum, o que considerou não se ter verificado.
“Isso requer uma postura de diálogo aberto do executivo, para que haja um exercício conjunto entre o executivo, o legislativo e o cidadão, para a construção de consensos, tendo em conta que partimos ou temos opções diferenciadas quanto às prioridades”, indicou.
Por outro lado, o deputado do MPLA, Paulo Pombolo, disse que aprovar o OGE para 2021 significa entre outros o reforço da diversificação da economia (com as couves plantadas com a raiz para cima), a reanimação do sector produtivo nacional, apoio à classe trabalhadora, manutenção e criação de novos postos de trabalho, sobretudo para os jovens.
“Atendendo à redução das receitas resultantes da queda do preço do barril do petróleo, principal fonte de receita fiscal, e agravada com o surgimento da pandemia Covid-19, o OGE para 2021 é realístico, prudente e contribuirá para que as receitas previstas cubram na realidade as despesas previstas neste orçamento”, disse, repetindo as ordens superiores do Presidente… do MPLA.
Paulo Pombolo criticou os partidos da oposição que votaram contra a proposta do OGE, lembrando que não havia registo na Assembleia Nacional de votos favoráveis da oposição concernente ao Orçamento Geral do Estado.
“Ao votar contra, a oposição está a dizer não, à melhoria de condições de saúde, educação, trabalho, acesso à água e energia, de responder inclusive às pressões causadas pela pandemia e negar que o executivo crie as condições para aquisição das vacinas tão logo estejam disponíveis”, salientou o deputado que até consegue contar até dez sem se descalçar (se for até 12 já é mais complicado…)
Em declarações à imprensa, a ministra das Finanças, Vera Daves, disse que a execução do OGE para 2021 “é um desafio a que todos devem lançar mão, unir esforços, ter empenho, enfoque, para assegurar que as expectativas que estão a ser criadas agora com a sua aprovação não sejam goradas”.
“Mais importante agora é assegurarmos que tudo o que projectamos se concretize, tanto do lado da receita como do lado da despesa e que toda a despesa que seja executada seja de acordo com a lei, respeitando as boas práticas de contratação pública, para que o resultado final seja a melhoria efectiva da condição social e económica de vida de todos os angolanos”, disse.
Folha 8 com Lusa