O Governo angolano prevê recorrer a um financiamento de Espanha para reabilitar a Central Hidroeléctrica da Matala, construída em 1958 na província da Huíla, no sul, obra que dois anos depois de ter sido entregue ainda não avançou.
De acordo com informação do Governo, com data de Maio, a barragem em causa, construída no período colonial, ainda assume um “importante papel” na irrigação de campos agrícolas na região, além da prevista geração de 40,8 MegaWatts (MW) de electricidade.
A primeira fase da modernização foi concluída em 2015, por empresas canadianas, e, no ano seguinte, o grupo espanhol Elecnor foi escolhido pelo Governo para assegurar a fase seguinte da reabilitação, ao nível dos equipamentos electromecânicos e da subestação eléctrica, trabalhos avaliados em 106,9 milhões de euros.
Contudo, segundo a informação mais recente do Governo angolano, a empreitada “continua por financiar”, apesar de manter-se a Elecnor como a empresa seleccionada para obra.
Entretanto, o ministro da Energia e Águas de Angola, João Baptista Borges, divulgou esta semana um acordo para uma linha de financiamento à empreitada com origem em Espanha.
Esta segunda etapa passa ainda pela construção da subestação que vai permitir ligar a produção de electricidade daquela barragem às redes das cidades do Lubango, capital da província da Huíla, e de Moçâmedes, capital da província do Namibe.
No documento assinado pelo então Presidente José Eduardo dos Santos, que a 25 de Maio de 2016 autorizou a contratação da Elecnor pela Empresa Nacional de Produção de Electricidade, é explicado que a obra, justificada pelas projecções de crescimento da procura de energia eléctrica a médio e longo prazo, vai “proporcionar, entre outros benefícios, uma contribuição significativa para o desenvolvimento económico e social do país”.
O plano do governo para o sector eléctrico, a desenvolver entre 2018 e 2022, prevê, entre outros investimentos, intervenções em quatro pequenas barragens com capacidade entre 0,9 e 14,4 MW de energia e que foram danificadas durante a guerra civil angolana (1975-2002), bem como a construção de várias mini-hídricas.
A Central Hidroeléctrica da Matala está a produzir apenas 20 MW de energia, através de três grupos geradores, distribuída pelo município da Matala e pelas cidades do Lubango e do Namibe.
Situada a cerca de 225 quilómetros a jusante da barragem do Gove, na extremidade do Alto Cunene, aquele aproveitamento foi a primeira grande estrutura a ser concluída naquela bacia, há 60 anos.
Milhões desviados da SODEMAT
Recorde-se que o antigo Presidente do Conselho de Administração da Sociedade de Desenvolvimento Agrícola da Matala (SODEMAT), Luís Arsénio Salvaterra dos Santos, foi detido no início de Março deste ano, juntamente com outros três administradores, acusados do crime de peculato. O antigo PCA ocupou também o cargo de director da agricultura e desenvolvimento rural, nos consulados de Dumilde Rangel, Kundi Paihama e Ramos da Cruz.
De acordo com o sub-procurador-geral da República na província da Huíla, Hernâni Beira Grande, os detidos foram acusados de terem desviado 3,2 milhões de euros.
Os acusados estiveram à frente da gestão da SODEMAT no período entre 2006 e 2012 e são visados pelo alegado desvio de quatro milhões de dólares (3,2 milhões de euros).
O sub-procurador-geral da República explicou na altura que “competia ao conselho de administração gerir todos os negócios sociais, efectuar as operações relativas à materialização do objecto social, dentro dos limites legais e da escritura da sociedade”, o que “não veio a acontecer”.
“Por isso, os valores acabaram por ser utilizados indevidamente em benefício dos arguidos, razão da existência desse processo-crime”, apontou Hernâni Beira Grande.
Dezembro de 2006
O perímetro irrigado da Matala, uma área agrícola com sete mil hectares de terra arável na província da Huíla, foi invadida desde meados de 2006 por construções anárquicas, denunciou em 13 de Dezembro desse ano o administrador do município, Manuel Capenda.
Gerido pela SODEMAT, o perímetro possui seis mil hectares de terra para produção agrícola e mil especificamente para multiplicação de sementes. O administrador fez saber que por debaixo das novas construções anárquicas estão cabos de alta tensão, já que a área está localizada nas imediações da Central Eléctrica da Barragem da Matala, o que representa um grande perigo.
Manuel Capenda, que não fez referência ao número de casas já construídas e que medidas a administração vai tomar, denunciou igualmente a existência de grupos de indivíduos não identificados que sabotam equipamentos no zona do perímetro irrigado.
Dezembro de 2008
U m dos 14 municípios da Huíla, a Matala, registou neste ano movimentações descritas como fazendo parte dos planos do governo central e provincial para fazer da zona um “pólo de desenvolvimento”, um dos únicos na região sul do país.
A Matala ganhava vantagem perante outros municípios da província e mesmo da região devido a factores estratégicos que começaram a ser reunidos desde o tempo colonial, alguns dos quais relançados na segunda metade da década de noventa, depois de anos de abandono devido à guerra
Eis alguns dos pontos que deram vantagens à Matala.
Nunca foi ocupada pela guerrilha, tendo inclusive servido de posto avançado do comando da Região Sul das Forças Armadas Angolanas. Ai estava colocado do COP – Huíla, o comando operacional, tendo uma base logística própria com estruturas, transportes, pessoal e linha de orientação.
Possuía um dos melhores aeródromos no interior da região (Namibe, Huíla, Cunene e Kuando Kubango), aqui perdendo apelas para Mavinga, Cuito Cuanavale e Jamba.
Tinha e tem um clima propício a produção de várias espécies agrícolas, com destaque para cereais e citrinos. Teve durante muitos anos uma indústria transformadora de tomate para conservas. Zonas como Capelongo e “Castanheira de Pêra” continuam a ser importantes áreas de produção agrícola.
Possui um dos maiores e mais cobiçados (por fazendeiros com conexões ao poder) caudais de irrigação de Angola.
Possui a estratégica barragem da Matala. A sua estrutura de apoio incluiu expatriados de várias origem, com destaque para brasileiros, russos e portugueses, animando a economia local. Muitos dos expatriados vivem na zona anos a fio sem se deslocarem para as suas zonas de origem.
Beneficiou da criação de uma estrutura orgânica própria para a gestão do município, em paralelo à própria frágil administração municipal. A SODEMAT teve como gestor Sabino Ferraz, um economista que já foi assessor do presidente da República. Terá sido por sua sugestão que em 2001, no auge do conflito armando em Angola, o chefe de Estado, José Eduardo dos Santos, reunião o Conselho de Ministros na Matala, naquilo que se chamou na de “Presidência Aberta”. Foi uma das raras vezes em que este órgão se reuniu fora de Luanda.
A gestão da SODEMAT foi depois entregue a um engenheiro agrónomo huilano, Luís Arsénio Salvaterra dos Santos, que durante vários anos ocupou o cargo de director da agricultura e desenvolvimento rural, nos consulados de Dumilde Rangel, Kundi Paihama e Ramos da Cruz.
Foto: Pedro Parente/Angop
Folha 8 com Lusa e Serra da Chela