PRIORIDADE MÁXIMA PARA A CIMEIRA EUA-ÁFRICA

Angola prepara-se para acolher a 17.ª Cimeira de Negócios Estados Unidos da América-África, a ter lugar em Junho de 2025, em Luanda. Para o efeito, o Presidente da República, João Lourenço, determinou a criação de um grupo de trabalho, encarregue de preparar, coordenar e organizar as tarefas inerentes às responsabilidades de Angola.

De acordo com o Despacho Presidencial n.º 204/24 de 3 de Setembro, o grupo de trabalho será coordenado pelo ministro de Estado para a Coordenação Económica, José de Lima Massano, tendo como adjunto o titular da Indústria e Comércio, Rui Miguêns de Oliveira.

O grupo integra ainda os ministros das Relações Exteriores, Interior, Finanças, Planeamento, Transportes, Telecomunicações Tecnologias de Informação e Comunicação Social, Saúde, Cultura, Turismo, governador da província de Luanda, secretário do Presidente da República para os Assuntos Económicos e o Presidente do Conselho de Administração da Agência de Investimento Privado e Promoção das Exportações (AIPEX).

Para o apoio será criado um grupo técnico, coordenado pelo ministro da Indústria e Comércio e com a integração dos secretários de Estado dos departamentos ministeriais referidos, dois técnicos da Casa Civil do Presidente da República e peritos para assegurarem a execução e acompanhamento pontual das atribuições da comissão.

A medida enquadra-se nos esforços do Executivo para garantir o crescimento económico e o desenvolvimento do país, com a diversificação da economia e a melhoria do ambiente de negócios.

O Executivo considera que a promoção do investimento e a cooperação com parceiros internacionais são benéficas para a concretização dos diversos projectos do país, na medida em que permitem a transferência de conhecimentos e competências, e facilita o acesso às redes de distribuição globais de bens e serviços.

Em Julho, o CEDESA (Centro de Estudos para o desenvolvimento económico e Social de África) afirmava a propósito do tema “EUA e o Corredor do Lobito”:

«Dá ideia que numa primeira fase, os Estados Unidos não perceberam os movimentos de João Lourenço. Estava-se no final da Administração Trump, que não tinha qualquer interesse em África, ainda havia, embora em degradação, uma ideia de cooperação entre a América e a China, e a Rússia não tinha invadido a Ucrânia. África e Angola, em particular, não interessavam aos americanos, excepto às tradicionais petrolíferas.

«No entanto, tudo mudou no início da década de 20. A situação geoestratégica mundial colocou África, de novo, como campo de conflito de interesses, quer na obtenção de matérias-primas (área em que a China estava avançadíssima, e em que os EUA passaram a ter interesse, para garantir a sua autonomia estratégica), quer na contagem de apoios para a Guerra da Ucrânia e suas sequelas. Nesse sentido, com um novo embaixador dos EUA em Angola, Tulinabo S. Mushingi, e a persistente aproximação de Luanda a Washington, os americanos perceberam que tinham um possível novo e poderoso aliado em Angola.

«Daí que Angola aparentaria tornar-se um dos mais fortes aliados dos Estados Unidos em África. Símbolos disso foram a viagem de João Lourenço a Washington para um encontro na Casa Branca com o Presidente Joe Biden (Dezembro de 2023), e as constantes visitas de autoridades americanas a Luanda (Antony Blinken, cinco senadores americanos, Samantha Power, Lloyd Austin, entre outros).

«Muitos projectos foram anunciados, destacando-se o famoso Corredor do Lobito, que se tornou a bandeira desta cooperação intensa Angola-EUA.

«Não entrando agora numa aprofundada descrição deste projecto, o essencial a reter é que se trata duma via de comunicação ferroviária que liga o interior africano, englobando a República Democrática do Congo, Zâmbia e a própria Angola ao porto do Lobito. Ainda recentemente, foi divulgada a Parceria para Infra-estrutura e Investimento Global (PGII) sobre a mobilização até a presente data de 4.9 mil milhões de dólares, apresentada como um passo significativo dos Estados Unidos da América, da União Europeia e dos parceiros privados para reforçar o compromisso com o desenvolvimento sustentável e a integração regional, beneficiando Angola, Zâmbia e a República Democrática do Congo. E na recente cimeira do G-7, em Puglia, Itália, os líderes das economias mais avançadas do Ocidente reafirmaram o apoio a projectos de infra-estruturas de vários milhares de milhões de dólares em toda a África, a fim de concretizar o potencial económico e a transformação do continente, especificando o Corredor do Lobito como máxima prioridade.

«Muitos observadores têm assegurado que se trata duma resposta a um domínio mineiro chinês de África. Dificilmente, será assim, uma vez que uma boa parte dos minérios que se pretende transportar pelo Corredor estão em minas debaixo do controlo chinês. Embora, segundo o Wilson Center, a China controle actualmente apenas cerca de 8 por cento do sector mineiro de África, menos de metade dos seus concorrentes ocidentais, o certo é que tal representa ainda assim um aumento em relação aos 6,7 por cento em 2018. E naquilo que diz respeito aos potenciais beneficiários do Corredor do Lobito, o que preocupa os EUA é o monopólio da China sobre a mineração na cintura de cobre de África (República Democrática do Congo e Zâmbia) e os seus recentes investimentos substanciais na produção de lítio no Zimbabué, que detém as maiores reservas de lítio de África. Estes investimentos permitem à China ditar a cadeia de abastecimento global de baterias renováveis e veículos eléctricos (EV).

«Na RDC, o país com as maiores reservas mundiais de cobalto e cobre de alta qualidade, a China possui actualmente 72% das minas de cobalto e cobre, incluindo a mina Tenge Fungurume, que sozinha produz cerca de 12% da produção mundial de cobalto. As operações mineiras da China nestes três países conferem a Pequim uma liderança significativa na produção de semicondutores e baterias e, portanto, no domínio das tecnologias de segurança climática. Isto deixa o resto do mundo cada vez mais dependente da inovação e da indústria chinesa para impulsionar as transições energéticas globais e enfrentar as alterações climáticas. Além disso, na RDC, a China possui pelo menos 7 entidades de processamento de cobalto, mas envia principalmente minerais brutos de volta à China para processamento e fabrico, a fim de satisfazer a procura global de minerais críticos e produtos acabados.

«Naturalmente, estes dados sobre a influência da China da mineração na RDC e Zâmbia, permitem perceber que o Corredor do Lobito nunca será uma alternativa americana ao domínio chinês dos minérios centro-africanos. Na verdade, para ter sucesso comercial, os transportes americanos precisarão do concurso dos mineiros chineses.

«Fontes bem colocadas informam-nos que o objectivo é menos o transporte de minérios e mais a criação duma área de desenvolvimento agro-industrial paralela ao corredor, cujos produtos serão escoados pelo mesmo. É neste objectivo, que entra a opção americana pelo Grupo Carrinho. Na recente cimeira do G7, já mencionada, foi anunciado um relevante financiamento ao Grupo Carrinho, considerada empresa angolana líder no sector agro-industrial, para desenvolver o Corredor do Lobito. Aparentemente, o Grupo Carrinho, uma espécie de empresa “querida” dos americanos, tem como função transformar Angola em um hub alimentar regional, com investimentos destinados à construção e aquisição de infra-estrutura para armazenamento de produtos alimentares[8]. Torna-se assim, este Grupo Carrinho, uma peça chave da estratégia americana para África.

«Mesmo assim, contudo, há que notar que mesmo na estrutura actual do Corredor, há uma empresa chinesa relevante, a Mota-Engil, que embora tenha um nome português, tem como acionista de referência o Estado Chinês. A verdade é que a China Communications Construction Co., Ltd. detém 32,41% do capital social, e o próprio CEO da Mota-Engil, Carlos Mota Santos, já admitiu que a CCCC é detida pelo Estado da República Popular da China.

«Portanto, no final do dia, o Corredor do Lobito nunca será um projecto norte-americano para contrapor à China, mas seguramente, para ter sucesso, terá de ser um projecto cooperativo sino-americano. Se isso é ou não possível, veremos no futuro.»

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