CALADOS ELES CANTAM (TÃO) BEM

A Assembleia Nacional angolana aprovou hoje, na generalidade, uma proposta de lei que cria mais duas províncias e 161 novos municípios, com votos contra do grupo parlamentar da UNITA, maior partido da oposição que o MPLA ainda permite.

A proposta, que começou a ser discutida quarta-feira, num debate bastante acalorado, com perto de 40 intervenções, foi aprovada com 101 votos a favor do MPLA (partido no Poder há 49 anos) e do misto Partido de Renovação Social (PRS) e Frente Nacional de Libertação de Angola (FNLA), 79 contra da UNITA e duas abstenções do Partido Humanista de Angola (PHA).

A nova lei prevê que Angola passe a ter a partir do próximo ano 20 províncias, mais duas que as atuais, 325 municípios e 375 comunas.

O ministro de Estado e chefe da Casa Civil do Presidente João Lourenço, Adão de Almeida, disse que a proposta inicialmente previa a divisão das províncias do Moxico, Cuando Cubango, Lunda Norte, Malanje e Uíje, mas foram priorizadas nesta fase apenas as duas maiores.

“O que se propõe é dividir a província do Moxico, a maior do nosso país, em duas, sendo o Moxico, com sede no Luena, e Cassai Zambeze, com sede no Cazombo”, enquanto a divisão do Cuando Cubango, dará origem a Cubango, com sede em Menongue, e Cuando, com sede em Mavinga.

O governante lembrou (conforme instruções do Presidente do MPLA, general João Lourenço, estribado na opinião do Presidente da República, general João Lourenço, do Titular do Poder Executivo, general João Lourenço, e do Comandante-em-Chefe das Forças Armadas, general João Lourenço) que estas duas províncias, isoladamente, são maiores que os 12 países africanos menos extensos em conjunto. E que, entre os 27 países da União Europeia, 19 são menos extensos que estas duas regiões de Angola. A originalidade aritmética de Adão de Almeida é digna de La Palice.

Relativamente a alguns atuais distritos, comunas e localidades, a proposta prevê elevar a municípios um total de 161 localidades, passando o país a ter 325 municípios.

Hoje, na retoma dos trabalhos, o grupo parlamentar da UNITA exigiu do deputado do MPLA, Osvaldo Caculo, um pedido de desculpas, por considerar que os chamou de “macacos”, ao dizer: “Enquanto a UNITA continuar a herdar o comportamento do macaco, segundo o qual, estraga sempre o verde para nunca comer o maduro, a UNITA nunca será poder”.

Convenhamos que em matéria de símios, por uma questão de ADN e de similitude intelectual, a Osvaldo Caculo (como a muitos outros) só lhe faltam as penas para ser, de pleno direito, um dilecto descendente de King Kong (em versão micrómega, claro).

Outro momento de destaque foi um ponto de ordem solicitado pela deputada Albertina Ngolo, da UNITA, porque o ministro de Estado e chefe da Casa Civil do Presidente, Adão de Almeida, considerou que a “obsessão” pelas autarquias locais desviou a discussão do tema.

Segundo Albertina Ngolo, foi o Governo que deu uma data indicativa e repetida, em 2018, pelo Presidente, para realizar as primeiras eleições em 2020.

“Adão de Almeida reafirmou a vontade do Presidente angolano em institucionalizar o poder local, ironizando: “o grupo parlamentar da UNITA, bastante interessado na implementação das autarquias apresentou duas propostas de lei (…), [e] o Presidente da República, desinteressado, apresentou 11 propostas de lei”.

“Portanto, quem quer, apresentou duas, quem não quer, apresentou 11”, disse, anunciando que estão em preparação mais três propostas de lei do pacote legislativo autárquico.

Na sua declaração de voto, o deputado do PRS, do grupo parlamentar misto PRS/FNLA, Benedito Daniel, disse que as dinâmicas do desenvolvimento demográfico, social, cultural e económico, mudaram e exigem alterações na organização político-administrativa, o que não quer dizer que ficam reduzidas desigualdades e índices de pobreza.

Já o deputado Américo Chivukuvuku, do grupo parlamentar da UNITA, justificou o voto contra, declarando que esta proposta de lei “não é prioridade, não é urgente, não é determinante para a eficiência e eficácia da governação e não é importante para o desenvolvimento do país”, terminando a intervenção com gritos de apelo dos seus colegas para “autarquias já”.

O deputado Virgílio Tyova, do grupo parlamentar do MPLA, disse que o voto foi favorável porque “concretiza o programa do Governo do MPLA”, votado maioritária e fraudulentamente pelos angolanos nas eleições de Agosto de 2022, consolida o processo de desconcentração administrativa e promove uma gestão mais harmoniosa das unidades territoriais.

No dia 22 de Dezembro de 2023, o Conselho da República de Angola concordou com a iniciativa de alteração da Divisão Política e Administrativa (DPA) do país para 20 províncias e 325 municípios. Recordemos que em 2018, João Lourenço notificou o Conselho da República para comunicar aos conselheiros que as eleições autárquicas seriam em… 2020!

O Conselho da República, órgão de mera e formal consulta do Presidente angolano, é composto pela vice-Presidente da República, presidente da Assembleia Nacional, Procurador-geral da República, líderes de partidos com assento no parlamento, membros do Governo e outras personalidades convidadas por João Lourenço, onde se inclui o Presidente do MPLA, o Titular do Poder Executivo e o Comandante-em-Chefe das Forças Amadas.

ASSANHADAMENTE CONTRA AS AUTARQUIAS

O Presidente da República, ao anunciar no estrangeiro, Dakar-Senegal, de forma discricionária as eleições autárquicas, sem consulta aos parceiros internos deixou um sinal claro de ser adepto ferrenho da intolerância, arrogância e desrespeito, inclusive, mostrando não ser um político, guardião da própria palavra. Recordam-se?

Vamos aos factos:

a) Em 2018, João Lourenço notificou o Conselho da República para comunicar aos conselheiros que as eleições autárquicas seriam em 2020;

b) O Jornal de Angola (do MPLA), titulou no 23 de Março de 2018, em texto assinado por João Dias: AUTARQUIAS EM 2020;

c) Em 28 de Abril de 2018, demonstrando ter toda a lição estudada e organizada, Adão de Almeida disse: “As próximas eleições autárquicas previstas para o ano de 2020 no país serão a maior reforma do aparelho da administração pública após a independência”. Adão de Almeida o então ministro da Administração do Território e Reforma do Estado, actual ministro de Estado e chefe da Casa Civil da Presidência da República.

d) No 28 de Junho de 2018, o professor universitário da Faculdade de Direito, Carlos Teixeira, numa aula magna, na Faculdade José Eduardo dos Santos, no Huambo, sob o lema a “Institucionalização das Eleições Autárquicas” sugeriu que “a implementação das autarquias em Angola, a partir de 2020, deveria basear-se num modelo assente na realidade histórica e antropológica dos angolanos, evitando, assim, imitações de países com realidades diferentes”.

e) No plano partidário, numa demonstração de o seu líder não ser mentiroso, nem andar nos trilhos, assanhadamente, em 17 de Maio de 2019, o coordenador do grupo de acompanhamento do Bureau Político do MPLA na província do Cunene, Pedro Neto, disse em Ondjiva, “que as eleições autárquicas de 2020, são para vencer, mas para tal exige espírito de sacrifício e seriedade em todas as tarefas do programa do partido”.

f) Aos 23 de Julho de 2020, o presidente da Assembleia Nacional, Fernando da Piedade Dias dos Santos, considerou “cedo falar-se em adiamento das primeiras eleições autárquicas, previstas para 2020, até porque a Assembleia já aprovou várias leis que conformam o pacote legislativo autárquico, faltando apenas uma”.

g) No dia 26 de Outubro de 2022, o Presidente da República confrontado com a promessa não cumprida, da realização, em 2020, das eleições autárquicas, disse, não fosse variar, a uma emissora estrangeira, que não seriam em 2023, mas: “quando houver condições. Como sabe o pacote legislativo autárquico não está terminado. Enquanto isso não posso assanhadamente – se me permite a expressão – convocar eleições”.

Depois dos dados acima, quem mente? Quem é o mentiroso de pai e mãe? Quem é o assanhado contra a realização das eleições autárquicas? Porque é que um problema tão sensível, não foi primeiro tratado com os partidos com assento parlamentar; com o Conselho da República; com o próprio MPLA, antes de o fazer no estrangeiro? A responsabilidade presidencial impunha. Se fosse um presidente sério e intelectualmente honesto.

Banalizar as instituições e as eleições autárquicas, aguardadas desde 1975, conjugá-las na terceira pessoa do plural, no futuro indefinido é de uma gravidade sem precedentes.

A fala de um Presidente da República, no estrangeiro, deve ser despida de emoção, para não passar a imagem do que facto é a realidade, ou seja de claro desrespeito pelos órgãos de soberania do Estado; partidários e a sua própria condição. De 2018, 2019, 2020 as promessas emergiram, sem nunca terem sido cumpridas. Em 2022, para não variar, afastou assanhadamente a realização em 2023.

A falta de humildade democrática e a arrogância constituem os maiores defeitos de João Lourenço. Nunca um democrata e conciliador faria, no exterior, revelações, a um órgão de comunicação estrangeira, de tamanha relevância.

Ingénuos todos quantos acreditam não serem, como as fraldas, descartáveis, os políticos do regime. Eles não estão, no poder, para servir, mas para se servirem, escancarando aos seus os cofres públicos. As garantias não sendo palavra de honra, devem ser honra de palavra, para não constituírem crime não só de responsabilidade, mas, também, de burla político-eleitoral, passível de procedimentos cabíveis a nível da Constituição e da Lei.

A realização de eleições nos municípios, seriam, indubitavelmente, a criação de zonas tampão, capazes de frear a batota generalizada, através de órgãos democraticamente eleitos pelas populações locais, nas diferentes circunscrições administrativas do país.

As autarquias condicionariam o sequestro eleitoral doloso da CNE (Comissão Nacional Eleitoral), sucursal servil e canina do MPLA e incompetente, acusada de, pela lei da batota, ter cometido crimes eleitorais e criminais gritantes, ao ponto de ter tido pânico da confrontação das Actas-síntese…

Este simples procedimento afastaria as suspeições de o MPLA ter ou não sofrido uma estrondosa derrota, através do voto livre do eleitor e da UNITA/Adalberto da Costa Júnior ser a legítima vencedora das eleições de 24 de Agosto de 2022, mas não estar a governar, nem a presidir ao país, face o império da força.

A não implantação das autarquias deve-se à maldade política do MPLA, que escreve e fala para inglês ver, mas não consegue, depois implantar o dito, quando desde 1975 tem, na Lei Constitucional (aprovada exclusivamente, pelo seu comité central), as autarquias locais, consagradas no art.º 51.º: “ As autarquias locais têm personalidade jurídica e gozam de autonomia administrativa e financeira”, igualmente, na Lei 23/92 de 16 de Setembro, no art.º 145.º: “A organização do Estado a nível local compreende a existência de autarquias locais e de órgãos administrativos locais”, blindado pelos artigos seguintes (146.º, 147.º), logo, sabe do assunto, mais do que os demais partidos políticos.

Como se pode verificar, os constantes adiamentos fazem parte do império da má-fé, ditadura, cleptocracia, sequestro dos órgãos de soberania, medo de perder a hegemonia, enfim, são uma clara e inequívoca fraude.

Folha 8 com Lusa

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