PALHAÇADA “MADE IN” CPLP

O ministro da Defesa Nacional e dos Veteranos da Pátria angolano, João Ernesto dos Santos (foto), destacou hoje em Luanda a importância da cooperação no sector da Defesa no seio da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP). Quem diria?

O governante angolano, que intervinha na cerimónia de abertura da XXII reunião de ministros da Defesa da CPLP, disse que “estamos certos que as comissões de defesa e segurança visam promover a paz e a estabilidade mundial, pelo que devem ser o estandarte a ostentar e enaltecer face aos desafios do presente e do futuro”.

“Os laços que ligam os nossos países e povos têm vindo a intensificar-se na base do respeito pela soberania e independência de cada um, no interesse de uma cooperação mutuamente proficiente”, acrescentou.

João dos Santos ‘Liberdade’ sublinhou também a importância da cooperação e da coordenação entre os países da CPLP (caso, recorde-se, da Guiné Equatorial) na promoção da segurança e da defesa de todos, e deu como exemplo a disponibilidade de Angola no envio de “contingentes e apoio logístico” para a Guiné-Bissau e Moçambique.

“Quando foi necessário estivemos e continuamos prontos a ajudar os Estados-membros da comunidade, enviando contingentes militares e apoio logístico, quando a situação assim nos aconselhou, como foi o caso da missão angolana de apoio à reforma do sector humanitário da Guiné-Bissau”, destacou o ministro de Angola, país que preside actualmente à CPLP.

“E na República de Moçambique, quando foi assolada pelo ciclone Idai e actualmente na província de Cabo Delgado, onde temos uma componente militar, que se cinge apenas às suas acções no posto de comando das operações auxiliar de Informações para as Forças Armadas da Defesa de Moçambique, bem como na projecção de Força de Estados Membros da SADC [Comunidade de Desenvolvimento da África Austral] em apoio ao processo de pacificação e estabilidade daquela parcela do território moçambicano”, acrescentou.

João Ernesto dos Santos recordou que no passado dia 29 de Março, formalmente e apenas dar um ar de democraticidade ao regime, os deputados angolanos aprovaram o pedido de autorização do Presidente João Lourenço (que é Presidente do partido maioritário, o MPLA) para a prorrogação de estada por mais três meses dos militares angolanos em Moçambique.

“Na história do passado recente há registos de convivência entre os nossos povos que naturalmente estão determinados ou destinados a partilhar um futuro comum de solidariedade e entreajuda, facilitado pelo idioma e a defesa dos valores comuns”, frisou.

João Ernesto dos Santos salientou ainda que ao longo dos 25 anos de existência da cooperação no sector de defesa da CPLP, Angola “apresentou múltiplas iniciativas de cooperação progressiva e mutuamente vantajosa no domínio da defesa, com os ministérios homólogos e respectivas Forças Armadas” que, concluiu, “contribuíram para a coesão na actuação das nossas instituições”.

O ministro angolano destacou também a realização dos exercícios “Felino”, dos quais duas edições decorreram em Angola, e que visam, em teoria e em tese política inconsequente, preparar o Estado-Maior de uma Força de Tarefa Conjunta e Combinada (FTCC), no âmbito da CPLP, para – supostamente – atingir, manter e optimizar a capacidade de participar em missões de Apoio à Paz e de Assistência Humanitária, aos níveis operacional e táctico. “Foram um valioso contributo na consolidação do projecto da nossa comunidade”, sintetizou.

Para se verificar como esta gente gosta de brincar com coisas que deveriam ser sérias, eis “ipsis verbis” um texto publicado no Folha 8 em 12 de Setembro de 2016:

«O exercício militar Felino 2016, inserido nesse paquiderme branco que dá pelo nome de Comunidade de Países de Língua Portuguesa (CPLP), arrancou hoje na Praia, Cabo Verde, com a participação de 90 militares dos nove países que integram a organização dita lusófona.

O exercício, que tem como objectivo desde que nasceu há 16 anos a preparação de uma força conjunta da CPLP, optimizando a sua capacidade de intervenção em missões humanitária e de paz.

O exercício decorre no continente fictício (tal como a CPLP) “Gama”, “instalado” em três pisos do edifício do Estado Maior General das Forças Armadas (EMFA) e onde, ao longo de duas semanas, os militares serão confrontados com situações simuladas de incidentes para testar a capacidade de reacção das diversas forças.

Todas as acções serão executadas com recurso a mapas, cartas e meios de comunicação e, os cenários simulados no formato Exercício em Carta (EC), serão depois aplicados na modalidade Exercícios com Forças no Terreno (EFT).

“Encontrámo-nos perante um dos mais importantes eventos da CPLP, a realização de um exercício militar multinacional, que evidencia a determinação dos nossos países em desenvolver um esforço comum no sentido de conferir maior projecção e visibilidade às capacidades da comunidade em matéria de segurança colectiva e cooperativa”, defendeu o Chefe de Estado Maior das Forças Armadas de Cabo Verde (CEMFA), Anildo Morais.

Anildo Morais falava na cerimónia de abertura do Felino 2016, ao início da manhã na cidade da Praia perante os militares das delegações de Angola (9), Brasil (17), Guiné-Bissau (5), Guiné Equatorial (7), Moçambique (2), Portugal (10), Timor-Leste (10) e São Tomé e Príncipe (2).

Tretas habituais e pouco inovadoras

Sabemos que essa coisa da memória é uma constante chatice. Tal como a coluna vertebral e outros “instrumentos” que são cada vez mais decorativos. Mas, mesmo assim, respeitando todos aqueles, e são cada vez mais, que não têm esses predicados, continuamos a valorizá-los como membros de uma minoria.

Recordamo-nos que o chefe do Estado Maior General das Forças Armadas portuguesas (CEMGFA) considerou em 24 de Setembro de 2008 estarem criadas as bases da doutrina militar para o emprego de uma força conjunta da CPLP.

Luís Valença Pinto regozijou-se na altura com a participação, pela primeira vez, de forças de todos os países que compõem a CPLP no exercício Felino concluído então na área militar de S. Jacinto, em Portugal.

No balanço que fez desse exercício conjunto, o CEMGFA considerou que o Felino 2008 permitiu lançar as bases de doutrina militar para criar uma força conjunta que possa ser activada para missões de paz, sob a égide das Nações Unidas.

“Portugal ensinou e aprendeu muito e a conduta táctica permitiu recolher referências para essa doutrina militar, cujas bases deverão ser testadas em 2009, em Moçambique”, disse Luís Valença Pinto, acrescentando que a construção dessa doutrina militar é condição de base para o emprego comum de forças da CPLP, já que há países de dimensão muito diferente e com realidades distintas das de Portugal, como elemento da NATO.

O CEMGFA salientou que, devido à cooperação militar, seria viável até aqui uma intervenção bilateral ou trilateral, mas não a oito, do ponto de vista militar, dada a necessidade de harmonizar conceitos, técnicas e tácticas, que foi o objectivo do Felino 2008.

No terreno desde 2000, os Felino visam treinar o planeamento, a conduta e o controlo de operações no quadro da actuação de resposta a uma situação de crise ou guerra não convencional, por parte das Forças Armadas dos estados-membros da CPLP.

Em teoria, e é só disso que vive a CPLP, as forças Felino poderiam actuar por livre iniciativa da CPLP quando a situação é de crise num dos seus estados-membros.

Em termos políticos, de acordo com o especialista angolano em Relações Internacionais Eugénio Costa Almeida, “o grande problema da CPLP é não ter, ao contrário da britânica Commonwealth ou da Communauté Française, um Estado com capacidade de projecção e liderança que defina e determine as linhas de actuação da Comunidade, tal como faz Londres ou Paris”.

O facto, “ainda não ultrapassado e se calhar de difícil solução, de a CPLP não falar a uma só voz, de não ter uma voz de comando que determine o rumo a seguir, leva a que, em situações de crise num dos seus membros, sejam terceiros a resolver o problema”, diz Eugénio Costa Almeida.

E, assim, enquanto os militares da CPLP brincam aos… militares, recorrentemente na Guiné-Bissau os militares, ou similares, vão-se exercitando com as AK-47 e por falta de alvos convencionais… matam-se uns aos outros.»

Folha 8 com Lusa

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