2024, O ANO DE JOÃO LOURENÇO… EM PORTUGAL!

O Chefe de Estado angolano, João Lourenço, aceitou (na condição de ser acompanhado pelo Presidente do MPLA e do Titular do Poder Executivo) o convite para visitar Portugal em 2024, anunciou, em Luanda, o presidente da Assembleia da República Portuguesa (e putativo candidato à sucessão de Marcelo Rebelo de Sousa), Augusto Santos Silva.

No final da audiência com o Presidente angolano, aquele que é a segunda figura do Estado português disse que durante o encontro, entre outros assuntos, foi feita uma breve abordagem acerca da cooperação bilateral, sublinhando que “as relações são absolutamente excepcionais”.

Santos Silva lembrou que ao longo deste ano as três principais figuras do Estado português, nomeadamente, o Presidente da República, presidente da Assembleia e o primeiro-ministro, que ao contrário de Angola são três pessoas diferentes, visitaram oficialmente Angola.

Reiterou inda que as relações estão fortificadas a todos os níveis, sendo “sabido, público e notório que o relacionamento entre os dois Presidentes é fortíssimo”, o mesmo acontecendo com o chefe do Executivo luso, António Costa.

Augusto Santos Silva ressaltou a cooperação entre os dois parlamentos, considerando serem, igualmente, boas, facto reflectido na comemoração, em 2023, dos 20 anos da assinatura do acordo entre ambos as assembleias.

“Há 20 anos que as duas assembleias cooperam, e, no que diz respeito às questões da mobilidade, economia, política e diplomacia a nossa relação não podia ser melhor, e vivemos hoje talvez o momento mais alto, em muitos anos da relação entre Portugal e Angola”, frisou.

Por uma questão de justiça, pergunta-se: Quem (para além de Santos Silva e António Costa) melhor do que Marcelo Rebelo de Sousa para falar do MPLA sem falar dos angolanos, ou seja falar dos 20 milhões de pobres e das crianças que são geradas com fome, nascem com fome e morrem pouco depois com… fome?

Segundo Marcelo Rebelo de Sousa, os portugueses têm sido, no quadro europeu, “praticamente cavaleiros andantes isolados nas relações entre a Europa e África”, seja para dar cobertura às constantes violações dos direitos humanos em Angola ou na “lusófona” Guiné Equatorial.

Espanha “avançar para um conhecimento maior da economia, da sociedade de outros países africanos, e grandes países africanos e potências regionais, como é o caso de Angola e para Moçambique, é muito bom para todos, muito, muito bom para todos”, considera Marcelo Rebelo de Sousa.

Para o Presidente da República lusa, “os portugueses que lá estão e a actividade económica portuguesa que lá está, está, está bem, é fundamental e vai aumentar”. Tem razão. Basta, para isso, Portugal não falar do que não interessa ao seu amigo general João Lourenço (fome, direitos humanos, democracia, liberdade, estado de direito, Cabinda etc. etc.), mantendo sempre – como agora fez Santos Silva – o rabinho entre as pernas.

No entender de Marcelo, “o haver actividade espanhola, italiana ou francesa – que houve noutros tempos, sobretudo na África Ocidental, e diminuiu – é bom, porque isso permite uma ligação entre a Europa e África que não está a funcionar em muitos casos”.

“E ao não funcionar significa que estamos a perder a grande vantagem que levou a que Portugal organizasse as duas grandes cimeiras Europa-África, com outros países europeus a acompanharem mas assim um bocadinho relutantes. A Espanha ter percebido isso é muito bom”, acrescentou.

Marcelo Rebelo de Sousa defendeu que é preciso “investimento e cooperação económica que crie condições para os africanos poderem viver e procurar a sua realização em África”.

Sem isso, “depois não se queixe a Europa das migrações, dos problemas de instabilidade política, militar, social que obrigam a intervenção de forças destacadas e de missões de paz europeias em África”, disse. E disse muito bem, sendo que quase parece que Portugal não faz parte dessa Europa. E se calhar não faz!

De acordo com o chefe de Estado, para Portugal tem sido “difícil explicar isto” a muitos países europeus que não têm “tradição de conhecimento da realidade africana”. E Portugal tem essa tradição? Se calhar teve, mas já não tem.

E não tem porque:

Alguém ouviu Marcelo Rebelo de Sousa, António Costa ou Santos Silva, dizer que 68% da população angolana é afectada pela pobreza, que a taxa de mortalidade infantil é das mais altas do mundo, com 250 mortes por cada 1.000 crianças? Alguém o ouviu dizer que apenas 38% da população angolana tem acesso a água potável e somente 44% dispõe de saneamento básico?

Alguém ouviu Marcelo Rebelo de Sousa, António Costa ou Santos Silva, dizer que apenas um quarto da população angolana tem acesso a serviços de saúde, que, na maior parte dos casos, são de fraca qualidade? Alguém o ouviu dizer que 12% dos hospitais, 11% dos centros de saúde e 85% dos postos de saúde existentes no país apresentam problemas ao nível das instalações, da falta de pessoal e de carência de medicamentos?

Alguém ouviu Marcelo Rebelo de Sousa, António Costa ou Santos Silva, dizer que 45% das crianças angolanas sofrerem de má nutrição crónica, sendo que uma em cada quatro (25%) morre antes de atingir os cinco anos? Alguém o ouviu dizer que, em Angola, a dependência sócio-económica a favores, privilégios e bens, ou seja, o cabritismo, é o método utilizado pelo MPLA para amordaçar os angolanos?

Alguém alguma vez ouviu Marcelo Rebelo de Sousa, António Costa ou Santos Silva, dizer que, em Angola, o acesso à boa educação, aos condomínios, ao capital accionista dos bancos e das seguradoras, aos grandes negócios, às licitações dos blocos petrolíferos, está limitado a um grupo muito restrito de famílias ligadas ao regime no poder?

Alguém ouviu Marcelo Rebelo de Sousa, António Costa ou Santos Silva, dizer que Angola é um dos países mais corruptos do mundo e que tem 20 milhões de pobres?

Ninguém ouviu. Dir-se-á, e até é verdade, que esse silêncio é condição “sine qua non” para cair nas graças dos donos do dono do nosso país, até porque todos sabemos que nenhum negócio se faz sem a devida autorização do general João Lourenço.

Portugal consegue assim não o respeito mas a anuência do regime para as suas negociatas. Esquece-se, contudo, de algo que mais cedo ou mais tarde lhes vai sair caro: o regime não é eterno e os angolanos têm memória.

Marcelo Rebelo de Sousa (tal como António Costa e Santos Silva), ao elogiar o “projecto de paz, de democracia, de regeneração financeira, de desenvolvimento económico, de combate à corrupção” protagonizado pelo Presidente do MPLA, João Lourenço, mostrou várias vezes que não sabe o que diz nem diz o que sabe. Mas não está só. Quando se está no Poder todos são bestiais. Quando deixam de estar são, regra geral, bestas. José Eduardo dos Santos que o diga, José Sócrates que o diga.

Todos nos recordamos de, numa intervenção durante um jantar oficial oferecido por João Lourenço, no Palácio Presidencial, em Luanda, Marcelo Rebelo de Sousa o saudar como “o vulto cimeiro de um novo tempo angolano”. Não se terá lembrado de o propor para um Prémio Nobel, mas quando “descobrir” que existem 20 milhões de angolanos pobres… vai propor. Justamente, acrescente-se.

“Vossa excelência protagoniza-o com um projecto de paz, de democracia, de regeneração financeira, de desenvolvimento económico, de combate à corrupção, de afirmação regional e mundial. Nós, portugueses, seguimos com empenho essa aposta de modernização, de transparência, de abertura, de inovação, de acrescida ambição”, afirmou Marcelo Rebelo de Sousa, bem ao estilo dos sipaios coloniais, mas com uma substancial diferença. Estes eram obrigados a bajular, o presidente português não é obrigado a isso. Ou será que é?

Segundo o Presidente português, João Lourenço protagoniza “um novo tempo angolano, na lúcida, consistente e corajosa determinação de aproveitar do passado o que se mantém vivo, mas, sobretudo, entender o que importa renovar para tornar o futuro mais possível, mais ambicioso e mais feliz para todos os angolanos”.

Continuemos, para memória futura, com o brilhantismo bacoco de Marcelo. Diz ele que, da parte de Portugal, Angola conta com “o empenho de centenas de milhares que querem contribuir para a riqueza e a justiça social” com o seu trabalho, bem como “das empresas, a começar nas mais modestas, no investimento e no reforço do tecido socioeconómico angolano” e também com “o empenho das instituições públicas portuguesas, do Estado às autarquias locais”.

“Podem contar connosco na vossa missão renovadora e recriadora. Portugal estará sempre e cada vez mais ao lado de Angola”, acrescentou Marcelo Rebelo de Sousa, fazendo aqui e mais uma vez o exercício de passar aos angolanos um atestado de menoridade e matumbez.

Portugal, por sua vez, conta com a “incansável solidariedade” de Angola. “Contamos com os vossos trabalhadores, as vossas empresas, as vossas instituições públicas, a vossa convergência nos domínios bilateral e multilateral. Temos a certeza de que Angola estará sempre e cada vez mais ao lado de Portugal”, prosseguiu Marcelo no seu laudatório e hipócrita exercício de servilismo.

De acordo com o Presidente português, este “novo momento na vida de Angola” coincide com “um novo ciclo” nas relações bilaterais. “E nada nem ninguém nos separará, porque os nossos povos já estabeleceram o seu e o nosso caminho”, considerou Marcelo, sentindo o umbigo aos saltos, alimentado pela esperança de que os portugueses não acordem e os angolanos nunca lhe cobrem a cobardia. Mas vão cobrar.

“Porque estamos mesmo juntos, na parceria estratégica, na cooperação económica, financeira, educativa, científica, cultural, social e política. Porque no essencial vemos o mundo e a nossa pertença global e regional do mesmo modo, a pensar na paz, nos direitos humanos, na democracia, no direito internacional, no desenvolvimento sustentável, na correcção das desigualdades”, argumentou aquele que, em matéria de bajulação, bateu todos os recordes anteriores.

No final da sua intervenção, de cerca de sete minutos (que entrará para o “Guinness World Records” por ser o que mais bajulação fez em tão curto espaço de tempo), Marcelo Rebelo de Sousa disse que “a história faz-se e refaz-se todos os dias e nuns dias mais do que noutros”, acrescentando: “Estes que vivemos são desses dias”.

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