O Presidente angolano, João Lourenço, convidou, hoje, a visitar o Centro Especializado de Pandemias e Endemias, inaugurado em Calumbo, município de Viana, aqueles que criticaram a aquisição pelo Governo de um complexo residencial com este efeito.
“Com relação a este centro, dizer que houve muita polémica quando se anunciou a decisão da construção desta unidade. A resposta aos polémicos é o que estamos a apresentar hoje, portanto, venham ver, esta é a resposta”, disse João Lourenço em declarações à imprensa, à margem da inauguração do centro.
Em causa está a polémica que se levantou, em 2020, quando o Governo anunciou a autorização para a compra deste complexo residencial, um imóvel com 200 residências, pelo valor de 24,9 milhões de dólares (21,5 milhões de euros), conforme Despacho Presidencial nº 65/20.
As críticas vindas de organizações da sociedade civil e de partidos políticos, entre os quais a UNITA (o maior partido da oposição que o MPLA ainda permite), que questionou a compra das casas, que custaram ao Estado 114 mil euros cada.
“As casas em questão são de baixa renda e o seu valor real de mercado é de apenas oito milhões de kwanzas [12.600 euros]”, referiu na altura o maior partido da oposição angolana, indicando ter pedido uma avaliação a especialistas independentes, pelo que estariam “a ser demasiadamente sobrefacturadas”.
A ministra da Saúde de Angola disse na cerimónia de inauguração que o centro dispõe de 1.316 camas para quarentena, isolamento e internamentos.
Sílvia Lucuta acrescentou que nesta primeira fase, a nova infra-estrutura conta também com 73 leitos para cuidados intensivos, 91 para cuidados intermédios, distribuídos por adultos e crianças.
“Esta unidade possui também uma área de tratamento da função renal contínua intermitente, um banco de sangue, incluindo a implantação de um desleucocitador, minimizando os riscos adversos, garantindo uma transfusão sanguínea segura”, referiu.
A infra-estrutura erguida numa área de 15,7 hectares, conta igualmente com serviço de triagem, laboratório, imagiologia, fisioterapia, psicologia, farmácia, serviços de apoio, reservatório de água com capacidade para 500 mil litros, um heliporto, morgue e um posto policial, informou Sílvia Lutucuta.
Promessas acasalam com as mentiras
O convite de João Lourenço foi oportuno. Ficam a faltar outros convites, nomeadamente aquele em que vai fazer a Oposição (política e social) engolir em seco quando mostrar a criação de pelo menos (pelo menos, note-se, anote-se e relembre-se) meio milhão de empregos, bem como dados sobre a redução em um quinto a taxa de desemprego e institucionalização do rendimento mínimo social para as famílias em pobreza extrema (temos apenas e graças à divina actuação do regime do MPLA 20 milhões de pobres).
Mas o MPLA está no poder desde 1975 e nos últimos 18 anos o país está em paz total, dirão os mais atentos e, por isso, cépticos. Mas o que é que isso interessa? Desta vez é que vai ser. O que realmente conta é continuar a ser dono do país. E disso o MPLA não abdica.
Os discursos de João Lourenço são (já foram mais, é verdade) marcados por uma insistente propaganda de combate à corrupção (onde Angola está no top mundial dos mais corruptos), que diz colocar em causa “a reputação” de Angola no plano internacional.
“Se tivermos a coragem, a determinação, de combatermos a impunidade, com certeza que conseguiremos combater a batalha da luta contra a corrupção”, apontou João Lourenço que, aliás, ainda não explicou (nem vai explicar) como é que era antes de ser eleito o 21º homem mais rico de Angola.
Reduzir a taxa de incidência da pobreza de 36% (segundo as deficientes contas do regime) para 25% da população, do índice de concentração da riqueza de 42,7 para 38, e “criar e implementar o Rendimento Social Mínimo para famílias em situação extrema de pobreza” são – repete João Lourenço – objectivos. Como é que isso se consegue? JLo não explica. Nem precisa de explicar. Aos escravos basta saber que “o MPLA é Angola e que Angola é do MPLA”.
“Erradicar a fome em Angola”, aumentar em cinco anos a esperança de vida à nascença, elevando-a para 65 anos, reduzir a taxa de mortalidade infantil (uma das maiores do mundo segundo organizações internacionais que não leram o manifesto do regime) de 44 para 35 por cada mil nados-vivos e de crianças menores de cinco anos de 68 para 50 por cada mil nados vivos, são outras metas do MPLA de João Lourenço.
Como vai fazer isso? Isso não interessa saber. Aliás, as promessas não carecem de justificação nem de explicações sobre a forma de serem cumpridas.
No plano económico, e com o país a tentar recuperar da crise financeira, económica e cambial que só atingiu os angolanos de segunda categoria, João Lourenço avisou que as empresas públicas deficitárias serão entregues à gestão privada, para que deixem de “sugar os recursos do erário público”.
Não fosse apenas mais um capítulo do anedotário do regime e, certamente, os angolanos até ficariam sensibilizados com essa de “sugar os recursos do erário público”. Por outras palavras, promete acabar com aquilo que, ao longo de 46 anos, foi a única estratégia do seu MPLA: “sugar os recursos do erário público”.
Entre os fundamentos macroeconómicos, JLo promete “melhorar o que está bem e corrigir o que está mal”, assume o compromisso de atingir uma média de crescimento anual “não inferior a 3,1%” do Produto Interno Bruto (PIB), reduzir a taxa de inflação a um dígito ou duplicar a receita tributária não-petrolífera.
Tudo isto já não são bem promessas do MPLA de João Lourenço. São, antes, um atentado à inteligência dos angolanos e a passagem de um atestado de matumbez também às organizações internacionais que dão cobertura ao regime, mostrando que preferem trabalhar com um governo ditatorial do que com um sério e democrata.
Sobre a criação de 500 mil novos empregos em cinco anos, João Lourenço disse que seria concretizada pela capacitação do empresariado privado, mas sem apresentar uma medida concreta. Ele bem perguntou aos seus assessores políticos, nomeadamente portugueses, como é que isso se alcançaria. Mas eles apenas responderam: “Não se preocupe, os escravos são matumbos”.
Hoje, no plano da transformação da economia, ainda e quase só assente nas exportações de petróleo, é definido pelo MPLA o objectivo de, em cinco anos, elevar a produção anual de cereais em Angola de dois milhões para cinco milhões de toneladas ou a de leguminosas para um milhão de toneladas anuais, “criando excedentes para a reserva alimentar nacional”, e reduzindo em 15% as importações de leite. O oásis está mesmo aí.
No sector da indústria extractiva, além da produção diamantífera, com a perspectiva de 13,8 milhões de quilates por ano, a presente legislatura, segundo o MPLA, ficará marcada pela estreia na extracção de ferro (1,7 milhões de toneladas/ano), de ouro (25,6 mil onças/ano) ou de fosfato (1,3 milhões de toneladas/ano).
Nos petróleos, o compromisso é de apostar no gás natural e na exploração do pré-sal, além de construir pelo menos uma nova refinaria, face às necessidades de produtos derivados, bem como reduzir em 15% a mão-de-obra especializada estrangeira e inserir 30% de novas empresas nacionais na indústria do crude angolano.
São ainda prometidas medidas que permitam, além da diversificação económica, colocar Angola pelo menos 12 lugares acima da actual classificação internacional no ambiente de negócios, para chegar ao 168.º lugar nesta lista do Banco Mundial.
Elevar a 95% a taxa de cobertura do ensino primário a crianças em idade escolar, a 60% no ensino secundário e de 200.000 para 300.000 o número de estudantes no ensino superior no país, são outra metas que o MPLA promete.
Até lá os angolanos continuarão a ser gerados com fome, a nascer com fome e a morrer pouco depois… com fome. E tudo isto acontece porque o Povo é teimoso e não segue com rigor as recomendações do MPLA de João Lourenço. Se o fizesse já teria aprendido, por exemplo, a viver sem comer.
Folha 8 com Lusa