Um país de faz de conta

O presidente da Associação dos Advogados Forenses de Angola avisa que a luta contra a corrupção anunciada, propalada, propagandeada pelo Governo “não é possível” com a falta de condições nos tribunais. Ou seja, para além de ser uma estratégia de marketing poderá ser (é) um nado-morto.

Em entrevista à Lusa, Tiago Ribeiro frisou que concorda com a necessidade de se combater a corrupção, contudo alerta que é preciso reformas na justiça. Ou seja. fava jeito que Angola fosse o que (ainda) não é – um Estado de Direito Democrático. E mesmo assim…

“Porque, para mim, a pessoa muito importante no tribunal é o oficial e o escrivão, mas são esses oficiais, que para se deslocarem no cumprimento das suas tarefas, irem citar as pessoas, os cidadãos, notificar os advogados, não têm condições, tiram do seu bolso, do seu salário”, referiu. Pois é. O melhor mesmo, como defende o MPLA (a organização que mais corruptos tem por metro quadrado), é não… nem sair de cima. Todos ficam com a ideia que a cópula está em andamento mas, na verdade é uma encenação de eunucos.

O associativista, há mais de três décadas no exercício da advocacia e dois à frente da associação, criada em Dezembro de 2018, sublinhou o facto de várias vezes audiências terem sido adiadas, “porque o oficial não notificou as partes”.

“E confirma que não notificou, porque não tem dinheiro. O meu salário já está esgotado, onde é que vou tirar dinheiro e muitas vezes os oficiais andam nas viaturas das partes, isso não dá dignidade. Se lhe for dado um valor para deslocação, vamos julgar, condenar, essa pessoa como incorreu na corrupção? Não!”, disse.

Tiago Ribeiro é de opinião que para acabar com o que chamou de “crise dos tribunais”, com a morosidade dos processos, é preciso um orçamento próprio para os mesmos. Não podem depender do executivo, situação que foi já resolvida com a independência financeira conferida aos tribunais, em Junho de 2019, pelo Ministério da Justiça e dos Direitos Humanos.

“Porque já houve alturas em que os magistrados não conseguiam extrair uma sentença dos seus computadores, porque não há tinteiro, papel, já aconteceu várias vezes”, contou. Lindo. Lindo. Um país de faz de conta, no seu melhor.

Para Tiago Ribeiro, é preciso o envolvimento dos titulares das várias pastas ministeriais, que através de palestras mensais nas administrações, nos ministérios, com todos os trabalhadores, falem sobre o combate à corrupção. E que, por exemplo (isso é que era bom!), expliquem que, ao contrário do que o MPLA diz, quem viu roubar, quem ajudou a roubar, quem beneficiou do roubo é mesmo… ladrão.

“Que ninguém deve guardar o documento do cidadão na gaveta (para ser subornado), porque ninguém tem dinheiro para corromper, (a corrupção) surge por necessidade”, salientou.

O dirigente realçou que “quem promove a corrupção é próprio Estado, porque nas instituições do Estado, nas administrações municipais, não se dá celeridade aos processos”, fomentado por isso o crescimento da maior “instituição” nacional (made in MPLA) que dá pelo nome de “corrupção”.

“Tenho clientes que requereram atestado de pobreza e não conseguiram, 15 dias, um mês e não conseguiram, acabaram por desistir, não pode ser, tudo isso é que cria a corrupção, então devia haver palestras nos ministérios, nas administrações municipais, nos governos provinciais, para dizer que o funcionário tem o seu salário e deve ser desse salário que vive”, sublinhou.

E, já agora, dizer aos 20 milhões de pobres que devem continuar a aprender a viver sem comer e a morrer sem ir ao hospital. É claro que também os podem informar que há muita comida nas novas Lojas do Povo criadas pelo MPLA – os contentores do lixo.

O Presidente angolano (não nominalmente eleito), Titular do Poder Executivo e líder do MPLA (partido no Poder há… 45 anos), João Lourenço, diz que o seu país (o dos angolanos é outro) tem hoje “uma melhor apreciação da gravidade” da corrupção e afirma que o seu partido “não tem de que se envergonhar” na luta contra si próprio, ou não fosse o pai e a mãe da corrupção.

Contudo, o presidente do MPLA (general, ex-vice-presidente do MPLA, ex-ministro da Defesa de José Eduardo dos Santos, deputado entre 1984 e 1992, presidente do Grupo parlamentar do MPLA entre 1993 e 1998, 1.º vice-presidente da Assembleia Nacional entre 2003 e 2014) reconhece que, 19 anos depois do fim do conflito armado em Angola, desenvolveu-se “um outro constrangimento tão prejudicial para o país quanto a guerra, que tomou de assalto os cofres do Estado” e parte relevante da economia: a corrupção. Corrupção que João Lourenço não tem coragem de dizer que está no ADN do MPLA e que o MPLA é, repita-se, o partido com mais corruptos por metro quadrado.

“Hoje, melhor do que há três anos, o país tem uma melhor apreciação da gravidade, da seriedade e da profundidade do abismo cavado pela corrupção em Angola”, disse o Presidente, que chegou ao topo do poder em 2017, depois de décadas a ver roubar, participar nos roubos, beneficiar dos roubos mas, mesmo assim, diz que não é “ladrão”.

João Lourenço assume o papel do MPLA na luta contra a corrupção, apesar de este ser o partido que está à frente dos destinos de Angola desde 1975 e de muitos dos seus anteriores dirigentes serem agora alvo das investigações para o seu suposto combate. Só escapam os que, entretanto, deixaram de ter coluna vertebral, testículos, e cérebro, tornando-se em autómatos ao serviço do novo representante de Deus em Angola.

“O mérito do MPLA consiste no facto de, enquanto partido governante, ter orientado o Executivo a encetar esta cruzada de luta contra a corrupção, mesmo sabendo do presumível envolvimento de militantes e dirigentes seus nos mais diferentes escalões da hierarquia partidária”, admite João Lourenço, aplaudindo a coragem das “vozes discordantes da sociedade civil”, que condenam este problema há vários anos. Coragem que, contudo, quer agora substituída pela bajulação.

“O MPLA não tem de que de envergonhar, antes pelo contrário, com esta nossa postura de coragem e de total transparência, só temos de nos orgulhar e andar de cabeça cada vez mais levantada”, diz o presidente do partido. Nisto tem razão. Quanto mais levantada estiver a cabeça, mais improvável é verem o que se passa no país real, nos caixotes de lixo que são o “self-service” de milhões de angolanos.

O Presidente do MPLA (e cada vez menos presidente dos angolano) promete uma “agenda política que fortaleça o patriotismo, o respeito ao primado da lei, o respeito pela diferença, que promova a tolerância política e a reconciliação nacional”, dizendo que a sua causa é a do “desenvolvimento económico e social de Angola”.

O país de todos nós, e não apenas o dos angolanos de primeira (os do MPLA), ganharia se fossem divulgadas, as muitas actas produzidas, no tempo do ex-vice presidente da Assembleia Nacional, João Lourenço, espelhando o seu inconformismo contra a corrupção, peculato e nepotismo praticados, unicamente, por José Eduardo dos Santos favorecendo os filhos, família e excluindo camaradas do seu partido, que são miseráveis, rotos e esfarrapados, como os vinte milhões de pobres.

O problema está que nesses 38 anos, todos os “joões lourenços” do MPLA eram consciente e milionariamente surdos, cegos e mudos. Tal como acontece hoje.

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