E O PRIMEIRO “DÍZIMO” FOI PARA… EDUARDA RODRIGUES

A Procuradora Eduarda Rodrigues, directora do Serviço Nacional de Recuperação de Activos da Procuradoria Geral da República, viu o seu trabalho compensado com a atribuição, a título definitivo, de uma milionária residência no luxuoso condomínio Malunga Residence, em Talatona, em Luanda.

Por Graça Campos (*)

A imponente casa passou para a esfera da funcionária da Procuradoria Geral da República por via do Instituto do Fomento Habitacional.

Peritos em imobiliária avaliam o seu preço em mais de 1.500.000.000,00 (mil e quinhentos milhões de kwanzas), uma “ninharia” que, ao câmbio da moeda da União Europeia, superaria os 2 milhões de euros.

A generosa oferta feita a Eduarda Rodrigues faz parte dos “dízimos” ao poder judicial que o Presidente João Lourenço institucionalizou por decreto.

De 16 de Março de 2021, o Decreto Presidencial n.º 69 aprova o regime de Comparticipação “atribuída aos órgãos de Administração da Justiça pelos activos, financeiros e não financeiros, por si recuperados”.

Nos termos desse instrumento, é estabelecido que “é atribuída aos órgão de Administração da Justiça uma comparticipação de 10% do valor líquido do activo de todos os activos por eles recuperados” e, ainda, que a referida “comparticipação é repartida por dois órgãos de administração da justiça (nomeadamente a Procuradoria Geral da República e os tribunais), quando o activo recuperado for declarado perdido a favor do Estado, mediante decisão condenatória”.

Alguns dos mais renomados juristas do país, nomeadamente os criminalistas Sérgio Raimundo, Luzia Sebastião e Bangula Quemba bem como o constitucionalista Leandro Ferreira viram no diploma presidencial um ardil para a “domesticação” do poder judicial.

“Trata-se de acto corrupção. Não há dúvida que o poder judicial fica de joelho perante o poder político”, foi nestes termos categóricos que o principal rosto do Escritório de Advogados Sérgio Raimundo & Associados.

Para esse advogado, também conhecido por ter entre os seus clientes uma “subespécie” humana a quem o Presidente João Lourenço atribuiu a designação de “marimbondos”, o Decreto Presidencial 69/21 torna juízes e magistrados como “partes interessadas na apreciação e decisão da relação material controvertida, o que coloca em crise a imparcialidade e objectividade que devem nortear a actividade jurisdicional, como pressupostos para a tomada de uma decisão justa”.

Eduarda Rodrigues, que agora viu o seu trabalho “reconhecido”, tem se repetido na violação de uma condição, existente no mesmo Decreto, de que só há lugar a comparticipação “quando o activo recuperado for declarado perdido a favor do Estado, mediante decisão condenatória”.

Com os olhos postos nos tais “10% de comparticipação”, a Direcção Nacional de Recuperação de Activos (SNRA) tem “engordado” o património do Estado com bens de propriedade comprovadamente alheia.

Em Fevereiro deste ano, o SNRA arrestou o edifício CIF TWO e entregou-o de bandeja ao Ministério das Finanças. Três pisos desse edifício (7,8 e 9) pertencem a um ente privado.

Eduarda Rodrigues e seus ignoraram todas as provas documentais apresentadas pelo advogado Amaral Gourgel em como os já referidos pisos pertencem à Sojoca, uma empresa privada angolana.

Também várias vezes alertada para a existência de fracções detidas por particulares no CIF Two, a ministra das Finanças ignorou igualmente os avisos. Vera Daves ordenou a imediata ocupação de todo o edifício, alojando nele, entre outros serviços, a Direcção Nacional do Património do Estado do Ministério das Finanças.

Completada a “ocupação”, aos proprietários e funcionários da Sojoca foi vedado o acesso aos seus próprios escritórios.

Repetidas vezes ignorado, quando não mesmo espezinhado pela ministra Vera Daves e por Adilson Sequeira, chefe da DNPE, o advogado Amaral Gourgel demandou o Tribunal Supremo em busca da justiça que lhe foi deliberadamente negada pela dupla Eduarda Rodrigues/Vera Daves.

No dia 31 de Agosto, a Câmara do Cível, Administrativo e Aduaneiro do Tribunal Supremo deferiu, por via do Acórdão 151/21, a providência cautelar interposta pelo representante da Sojoca.

No Acórdão, os autores consideram que a “propositura da presente acção seria desnecessária caso os princípios conformadores da administração pública fossem minimamente respeitados”.

Ou seja, a arbitragem do Tribunal Supremo teria sido desnecessária se a Direcção Nacional de Recuperação de Activos da PGR e, sobretudo, o Ministério das Finanças tivessem atendido as reiteradas e documentadas reclamações da Sojoca e seu advogado.

O Acórdão da Câmara do Cível, Administrativo e Aduaneiro do Tribunal Supremo deferiu, por via do Acórdão 151/21 suspende a “eficácia do acto administrativo praticado pela Ministra das Finanças, consubstanciado no Ofício n .º 0406/54/01/GMF-MINFIN, de 03 de Março de 2021”, que coloca os referidos pisos do edifício CIF Two ao serviço da Direcção Nacional do Património do Estado.

Em Agosto, pouco depois de ser notificado da decisão judicial, o advogado Amaral Gourgel disse ao Correio Angolense que intentaria uma acção cível contra o Ministério das Finanças reclamando indemnizações pelos danos morais e patrimoniais sofridos pela sua cliente Sojoca nos longos meses em que os seus escritórios estiveram ocupados pela DNPE.

Não se sabe em quê rubrica do seu orçamento o Ministério das Finanças se apoiará para reparar os danos provocados por não haver agido de acordo com os “princípios conformadores da administração pública”.

Nos casos em que é penalizado por alguns dos seus funcionários violarem os “princípios conformadores da administração pública”, o Estado deveria responsabilizar individualmente os seus agentes envolvidos.

A actuação prepotente e desrespeitadora da lei, em que a Procuradora Eduarda Rodrigues se vem distinguido, é explicitamente encorajada pelo Decreto Presidencial 69/21.

Com a oferta de milionária casa à Eduarda Rodrigues, confirma-se a velha máxima segundo a qual, em alguns casos, “o crime compensa”.

(*) Artigo publicado hoje no “Correio Angolense”

Foto: Folha 8

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