ATÉ EM PENSAMENTO MENTEM

O presidente angolano, João Lourenço, anunciou hoje que o executivo está a fazer um “investimento colossal” na área da saúde e anunciou que serão iniciadas as obras de seis novos hospitais em 2022. Previsivelmente o número de pobres passará de 20 milhões para 0 (zero), a malária será extinta, serão criados milhões de empregos e os dias passarão a ter… 24 horas.

João Lourenço, que se dirigia à (sua) Nação no discurso que marcou hoje a abertura do ano parlamentar, salientou que nos últimos quatro anos foram feitos investimentos importantes no sector da Saúde, prevendo iniciar no próximo ano as obras de construção dos hospitais de Viana, Cacuaco, Cunene, Ndlantando, Sumbe e Caxito, cada um deles com pelo menos 200 camas.

“Hoje, mais do que nunca, estamos a reforçar os cuidados primários de saúde e a aumentar o acesso da população aos médicos de família nos municípios” disse ainda o chefe do governo, acrescentando que estão a ser mobilizados recursos financeiros de linhas de crédito, para a construção dos hospitais da Catumbela, Bailundo, Dundo, Malange, Uíge a reabilitação e ampliação do Hospital Américo Boavida e a conclusão do Hospital Geral de Mbanza Congo.

“Com este investimento colossal em infra-estruturas de saúde a este nível central e provincial que poderá ficar concluído entre 2023/2024, a nossa perspectiva é passar para a fase seguinte, investindo em unidades menores de proximidade, na rede de cuidados primários de saúde, no município e no bairro”, disse João Lourenço.

O presidente destacou também o empenho do executivo no combate aos efeitos da seca, com vários projectos em curso, incluindo as barragens do N´Due e Caluqueve na bacia do rio Cuvelai, cuja conclusão no prazo de 2 anos, “resolverá em termos muito significativos o problema da falta de água no Cunene”

João Lourenço assinalou que, além da pandemia da Covid-19, as calamidades naturais que assolaram o país agravaram o nível de vulnerabilidade das populações com destaque para o fenómeno da seca na região sul do país, com maior incidência nas províncias do Cunene, Namibe, Huíla e Cuando Cubango.

O executivo acudiu “de maneira emergencial à situação da seca no sul de Angola com um apoio em bens alimentares de cerca de 2.120 toneladas que beneficiaram a mais de 778.867 famílias”, enunciou.

A estiagem registada entre os meses de Setembro de 2020 a Fevereiro de 2021, afectou as culturas e causou a morte de animais, principalmente na região Centro e Sul do País, estimando-se que tenha afectado de forma directa cerca de 945.244 famílias camponesas.

João Lourenço falou também sobre os programas que o executivo tem desenvolvido para reduzir a pobreza como o Kwenda, cuja execução permitiu até agora o registo de 414.285 agregados familiares do total de 1.608.000 pessoas, que recebem uma renda trimestral de 25.500 Kwanzas por família (36 euros).

Seis por meia dúzia… a pólvora

O Governo do MPLA, no Poder há 46 anos, prevê criar 83.500 empregos, até 2021, no âmbito do Plano de Acção para a Promoção da Empregabilidade (PAPE), aprovado em Abril de 2019, anunciou o Ministério da Administração Pública, Trabalho e Segurança Social angolano. A promessa, feita em 2017 por João Lourenço, era a de criar 500 mil empregos na legislatura.

Em comunicado, o ministério afirmou que os postos de trabalho seriam criados no quadro do PAPE, cuja estratégia de operacionalização foi apreciada durante a oitava reunião da comissão económica do Conselho de Ministros que, como se sabe, conseguiu descobrir que antes de morrem todos os angolanos estavam… vivos. Todos mesmo!

“A estratégia apresenta um modelo de empregabilidade com padrões de qualidade de referência internacional e o foco é a criação de empregos para jovens angolanos”, lê-se na nota, que cita declarações da ministra da Administração Pública, Trabalho e Segurança Social, Teresa Dias.

Fomentar o empreendedorismo no seio dos jovens, “nos domínios técnico-profissional e de gestão de pequenos negócios, e contribuir para o processo de promoção da inclusão financeira, fiscal e social da juventude”, constituem os objectivos do PAPE.

Segundo o ministério, o plano de acção, que também visa a “melhoria do rendimento familiar”, está alinhado com os programas de apoio à Produção, Diversificação das Exportações e Substituição das Importações (Prodesi), de Reconversão da Economia Informal (PREI) e Integrado de Desenvolvimento do Comércio Rural (PIDCR).

Angola continua a registar, para além de 20 milhões de pobres, uma elevada taxa de desemprego que afecta sobretudo jovens, situação que resulta da crise económica, financeira, cambial e de competência que o país vive há 46 anos e que se acentuou desde finais de 2014, devido à queda do preço do petróleo no mercado internacional. A situação, segundo as autoridades, também foi agravada pela pandemia de Covid-19, uma enfermidade “abençoada” pelo Governo/MPA porque está a servir para justificar tudo, nomeadamente para explicar que o Governo trabalha para os poucos que têm milhões e não para os milhões que têm pouco ou… nada.

Em Abril de 2019, João Lourenço terá descoberto uma receita miraculosa. Ora então, depois de se saber que a taxa de desemprego cresceu 8,8% nos últimos dois anos, atingindo 28,8% da população activa, eis que o Presidente aprovou um decreto que previa a disponibilização de 21 mil milhões de kwanzas (58,3 milhões de euros) para combater o desemprego, dando cumprimento (isto é como quem diz!) à promessa feita em 2017 de criar os famigerados 500 mil empregos na legislatura.

No decreto 113/19, de 16 desse mês, João Lourenço aprovou o pomposo Plano de Acção para Promoção da Empregabilidade (PAPE), que prevê que os empregos “deverão ser criados e absorvidos pelo sector produtivo da economia e não pela administração pública, como muitas vezes se afirma”.

A verba será proveniente do Orçamento Geral do Estado (OGE) e do Fundo de Petróleo, lê-se no documento, que adianta que o PAPE servirá de “instrumento de gestão operacional destinado a fomentar e apoiar o espírito de iniciativa na juventude”.

O plano pretende (pretendia, pretenderá) apoiar também os empreendedores já estabelecidos e os emergentes, bem como formar jovens empreendedores nos domínios técnico-profissional e de gestão de pequenos negócios, e deverá contribuir para o processo de promoção da inclusão financeira, fiscal e social dos jovens, além de fomentar o cooperativismo e o associativismo juvenil.

“Contribuir para a melhoria do rendimento familiar” e, consequentemente, “para o crescimento e o desenvolvimento socioeconómico do País”, e “para o processo de combate à fome e à pobreza”, são outros dos objectivos do PAPE, que pretende ainda “valorizar o exercício das profissões/ocupações, úteis à sociedade”.

Na perspectiva do Presidente, o diploma deverá também “contribuir para a bancarização e educação financeira das famílias” e para “o processo de reconversão da economia informal para a formal”.

“Apesar da grande oferta de mão-de-obra existente”, refere-se no decreto, “o sector produtivo da economia não tem capacidade para absorver a força de trabalho disponível, resultando numa taxa de desemprego estimada em 21%, segundo dados do INE, tratando-se de uma situação de desemprego estrutural”.

O documento adianta tornar-se “necessário, a curto e médio prazos, implementar programas e medidas de redução do desemprego em combinação com os demais sectores ministeriais, em domínios como a agricultura, pescas, pecuária, construção civil, energia e águas, turismo e outros, propondo-se o ajustamento dos perfis profissionais dos cidadãos às reais necessidades do mercado de emprego e da economia”.

Isto será feito, perspectiva o Governo, “pela via da formação e requalificação profissional, seguramente, uma medida de política destinada a combater este desemprego estrutural e com grandes oportunidades de obtenção de resultados nos curto e médio prazos”.

Os jovens desempregados e os que estão à procura do primeiro emprego foram, são ou serão, o público-alvo do PAPE, que se destina igualmente aos jovens formados com necessidade de obter equipamentos e ferramentas para o exercício de uma actividade geradora de emprego e renda, e àqueles que já exercem uma actividade profissional e que precisam de reforço em equipamentos e ferramentas ou de aperfeiçoamento técnico e capacitação no domínio da gestão.

O programa será desenvolvido em todo o território nacional por um período de três anos, e o acompanhamento e avaliações das acções realizadas e do impacto na comunidade será da responsabilidade do Instituto Nacional de Emprego e Formação Profissional, INEFOP, envolvendo os demais sectores.

Cerca de 83.500 jovens serão directa e preferencialmente abrangidos pelo PAPE, incluindo 12 mil jovens capacitados nos domínios do empreendedorismo e gestão de negócios, 15 mil capacitados em cursos de curta duração, três mil inseridos no mercado informal, através da reconversão de pequenas actividades geradoras de ocupação e renda, e 1 500 formados nos níveis 3 e 4 de Formação Profissional, inseridos em programas de estágios profissionais. Além destes, o PAPE prevê conceder 10 mil microcréditos e distribuir 42 mil “kits” profissionais aos jovens em diferentes profissões.

Além dos beneficiários directos, pretende-se com a distribuição dos ‘kits’ profissionais, promover o associativismo e, beneficiar indirectamente cerca de 243 mil cidadãos, pois serão disponibilizados os meios para brigadas de três a cinco profissionais.

De acordo com o diploma, “o ano de 2019 é crucial, pois será o de lançamento e poderá amortecer a pressão social provocada pela situação de desemprego”, pelo que os recursos para o efeito serão assegurados essencialmente no âmbito da Lei de Bases da Protecção Social.

Para o primeiro ano de execução do PAPE, o Governo estima um custo superior a 7 mil e 600 milhões de kwanzas (21,1 milhões de euros), estando igualmente prevista a possibilidade de outros financiamentos alheios ao OGE e ao Fundo do Petróleo.

A criação de pelo menos (pelo menos, note-se, anote-se e relembre-se) meio milhão de empregos, reduzir um quinto à taxa de desemprego e instituir o rendimento mínimo social para as famílias em pobreza extrema (temos apenas e graças à divina actuação do regime 20 milhões de pobres) foram propostas solenemente apresentadas e subscritas por João Lourenço.

Mas o MPLA está no poder há quase 46 anos e nos últimos 19 o país está em paz total, dirão os mais atentos e, por isso, cépticos. Mas o que é que isso interessa? Desta vez é que vai ser. A montanha nem um rato vai parir. Mas o que realmente conta é continuar a ser dono do país. E disso o MPLA mão abdica.

Estas medidas, entre várias dezenas, integraram (note-se, anote-se e relembre-se) o manifesto eleitoral do partido no poder desde 1975.

Reduzir a taxa de incidência da pobreza de 36% (segundo as deficientes contas do regime) para 25% da população, do índice de concentração da riqueza de 42,7 para 38, e “criar e implementar o Rendimento Social Mínimo para famílias em situação extrema de pobreza” são – repete João Lourenço – objectivos. Como é que isso se consegue? João Lourenço não explica. Nem precisa de explicar. Aos escravos basta saber que “o MPLA é Angola e que Angola é do MPLA”.

“Erradicar a fome em Angola”, aumentar em cinco anos a esperança de vida à nascença, elevando-a para 65 anos, reduzir a taxa de mortalidade infantil (uma das maiores do mundo segundo organizações internacionais que não leram o manifesto do regime) de 44 para 35 por cada mil nados-vivos e de crianças menores de cinco anos de 68 para 50 por cada mil nados vivos, são outras metas do MPLA de João Lourenço.

Como vai fazer isso? Isso não interessa saber. Aliás, as promessas não carecem de justificação nem de explicações sobre a forma de serem cumpridas.

No plano económico, e com o país a tentar recuperar da crise financeira, económica e cambial de 2015 e 2016 (que só atingiu os angolanos de segunda categoria), João Lourenço avisou que as empresas públicas deficitárias serão entregues à gestão privada, para que deixem de “sugar os recursos do erário público”.

Não fosse apenas mais um capítulo do anedotário do regime e, certamente, os angolanos até ficariam sensibilizados com essa de “sugar os recursos do erário público”. Por outras palavras, promete acabar com aquilo que, ao longo de quase 46 anos, foi a única estratégia do seu MPLA: “sugar os recursos do erário público”.

Entre os fundamentos macroeconómicos, João Lourenço promete “melhorar o que está bem e corrigir o que está mal”, assume o compromisso de atingir uma média de crescimento anual “não inferior a 3,1%” do Produto Interno Bruto (PIB), reduzir a taxa de inflação a um dígito ou duplicar a receita tributária não-petrolífera.

Tudo isto já não são bem promessas do MPLA de João Lourenço. São, antes, um atentado à inteligência dos angolanos e a passagem de um atestado de matumbez também às organizações internacionais que dão cobertura ao regime, mostrando que preferem trabalhar com um partido (MPLA) corrupto às segundas, quartas e sextas e que às terças, quintas e sábados procura esconder essa corrupção (ao domingo… descansam).

Sobre a criação de 500 mil novos empregos em cinco anos, João Lourenço diz que será concretizada pela capacitação do empresariado privado, mas sem apresentar uma medida concreta. Ele bem perguntou aos seus assessores políticos, nomeadamente portugueses e brasileiros, como é que isso se alcançaria. Mas eles apenas responderam: “Não se preocupe, os escravos são matumbos”.

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