O Governo angolano manifestou hoje preocupação com a “fraca adesão” ao Programa de Apoio ao Crédito (PAC), que disponibiliza 2 mil milhões de dólares (1,8 mil milhões de euros) para o sector produtivo, pois foi concedido “apenas 5%”. Importa reconhecer que o Governo do MPLA ainda não começou a governar o país pois, compreensivelmente, está há 44 anos a acumular experiência para tentar começar a governar num dos próximos anos…
“Temos identificado recursos no montante de 2 mil milhões de dólares a esta data temos perto de 50 mil milhões de kwanzas [95,4 mil milhões de euros) das várias informações que temos dos vários bancos de financiamento aprovado, isso perfaz uma taxa muito baixa de 5%”, afirmou Sérgio Santos, secretário de Estado da Economia.
Para o governante angolano, que apontou a necessidade de se encontrar rapidamente o crescimento do volume do crédito concedido “com parceria forte”, o sector privado precisa de ocupar o espaço e a oportunidade que existem, porque, observou, “não é o Estado que vai produzir”.
Sérgio Santos falava na apresentação dos recursos financeiros disponíveis para financiar o sector privado, no montante de 2 mil milhões de dólares, enquadrado no Programa de Produção Nacional, Diversificações das Exportações e Substituição das Importações (PRODESI).
Angola gastou 1,3 mil milhões de dólares (1,171 mil milhões de euros) de Janeiro a Outubro com importação de bens alimentares, entre arroz, açúcar, leite e cebola, anunciaram as autoridades, considerando que o país tem capacidade para produzir esses bens. Esses e muitos outros. Mas, tal como o Governo ainda não começou a governar, os potenciais investidores também estão na expectativa.
Segundo o secretário de Estado, apesar dos processos e regras dos bancos, instituições com recursos financeiros directos do Estado destinados para o PAC, o Governo e as empresas precisam “de quebrar essa letargia na nossa actividade económica no país”.
“O dinheiro está aí, temos de nos estruturar para ter acesso ao dinheiro, porque estamos a gastá-lo em volume significativo com a importação e não podemos continuar com essa situação”, referiu Sérgio Santos.
O sabão, sal, arroz, farinha de trigo, açúcar, carapau, carne de frango, óleo de palma e de soja, lixívia, alho, batata rena, cebola, água de mesa, cenoura, mandioca, ovos constam da lista dos 54 produtos elegíveis ao crédito no âmbito do PRODESI.
Apelo à memória de Sérgio Santos
O secretário de Estado da Economia, Sérgio Santos, disse no passado dia 12 de Novembro que o país (referia-se a Angola) registou, no primeiro trimestre do ano, uma redução de cerca de 50% das suas importações, fundamentalmente nos produtos da cesta básica. Isto porque… faltaram divisas para pagar ou quem desse fiado.
Sérgio Santos falava à margem do projecto de capacitação e qualificação dos recursos humanos, no quadro do Programa de Apoio à Produção, Diversificação das Exportações e Substituição das Importações (PRODESI).
Segundo o Secretário de Estado da Economia, as dificuldades na obtenção de divisas para as importações têm potenciado a produção local, com destaque para os produtos da cesta básica.
O governante frisou que o país regista uma maior oferta de produtos, nomeadamente galinhas, milho e batatas. Então estávamos safos. Galinhas, milho e batatas já dão para os autóctones se aguentarem e baterem palmas ao Governo.
“Ainda não estamos nos níveis que desejamos, porque esse aumento da produção vai fazer-se de forma acentuada. Mas conseguimos identificar uma tendência para que se produza mais em Angola”, disse Sérgio Santos, citado pela Angop.
Sem dados referentes ao restante do ano, Sérgio Santos explicou que o segundo trimestre registou uma significativa queda das importações, devido ao aumento da produção local. Então como é que ficamos?
“Ainda temos importação de outros produtos que são de origem nacional, como a mandioca, mas ainda temos a importação da farinha, fuba de bombó, milho, que não se justifica, porque temos capacidade de moagem, água, terreno, disponibilidade de trabalho suficiente para produzir internamente”, disse Sérgio Santos, juntando à lista o sal, como produto que já não deve ser importado.
O governo, destacou Sérgio Santos, está a fazer esforços para a melhoria das infra-estruturas, vias secundárias e terciárias, na implementação do Programa Integrado de Intervenção nos Municípios (PIIM), com vista a minimizar a precariedade das vias, um dos impedimentos no escoamento dos produtos do campo.
Seis por meia dúzia ou dois vezes três?
Recorde-se que este Governo afirmou que pretende cortar para metade, até 2022, os recursos cambiais utilizados na importação de produtos da cesta básica, redução que deverá ser coberta pelo aumento, na mesma proporção, da produção nacional.
Da cesta básica, saliente-se, não faz parte a incompetência dos membros do MPLA que se governam, há 44 anos, à custa dos angolanos, nomeadamente dos 20 milhões de pobres.
O objectivo consta do famigerado PRODESI, aprovado e publicado em Julho de 2018 pelo Governo, que pretende melhorar o funcionamento dos serviços de apoio ao exportador, a competitividade do país e promover a substituição de importações por produção nacional na agricultura, pecuária, pescas, indústria, saúde, formação e educação.
Desde logo, segundo o documento, estão previstos incentivos fiscais e cambiais à diversificação das exportações e apoios ao fomento das indústrias consideradas prioritárias.
“A implementação do programa tem como prioridade a execução de iniciativas que permitam a obtenção de resultados imediatos. Paralelamente, serão criadas condições de fundo para que os impactos gerados perdurem no tempo de forma sustentada”, lê-se no documento. É claro que, no caso, “imediato” não significa “que se segue (sem intervalo no tempo ou no espaço)”.
Para 2018, o objectivo do PRODESI era cortar em 15% os gastos de divisas (euros e dólares) com a importação de produtos da cesta básica, essencialmente alimentos, e o crescimento na mesma percentagem da produção nacional (em toneladas). Esses valores deverão duplicar em 2020, chegando aos 50% dois anos depois.
No meio desta brincadeira de mau gosto surge a explicação paradigmática que serve para tudo, até para ter no governo uma seita de incompetentes: Angola vive uma profunda crise financeira, económica e cambial, decorrente da quebra para metade, entre finais de 2014 e 2017, das receitas com a exportação de petróleo, devido à baixa da cotação do barril de crude no mercado internacional, que por sua vez reduziu fortemente a entrada de divisas no país.
A exportação de petróleo ainda garante mais de 95% das receitas angolanas, peso que o Governo pretende (diz há várias décadas) redistribuir, sobretudo com o incremento da agricultura.
A (nova) Lei do Investimento Privado, que liberaliza os investimentos no país por estrangeiros, a simplificação do pagamento de impostos, a reforma do sistema de Justiça, para dar celeridade aos processos e introduzindo salas comerciais, bem como a criação de um portal único e uma “via verde” para as exportações são medidas previstas ao abrigo do PRODESI, algumas a implementar com o apoio do Banco Mundial.
Entre as metas do programa contam-se a subida nos rankings internacionais de competitividade e no Investimento Directo Estrangeiro, que nos últimos anos tem estado em queda, em Angola.
O documento aponta, “como referência”, que no ano de 1974, no período colonial português, as exportações dos 15 principais produtos não petrolíferos representaram cerca de 44% do total das exportações angolanas. Somaram, à data, 554,1 milhões de dólares, o que “representaria hoje 27 vezes o total das exportações em 2016”, que foram de 142 milhões de dólares (retirando petróleo e diamantes).
“Mesmo considerando que o contexto e os factores de competitividade de 1974 são diferentes do momento actual, é inegável admitir que o potencial de exportação nacional é evidente”, lê-se no documento.
O café é um dos produtos agrícolas que mais sentiu a quebra na produção, com o Governo do MPLA a prever uma produção média anual, até 2022, entre as 4.000 a 6.000 toneladas, valor distante das 240.000 toneladas de 1973.
Promessas também se exportam?
Os peritos do governo destacam a inovação na indústria, a agricultura e a mobilização dos recursos internos como fundamentais para a recuperação e diversificação da nossa economia.
Inovar na indústria? Desenvolver a agricultura? Mobilizar os recursos domésticos? É obra. Quem diria? É a descoberta de um verdadeiro Ovo de Lourenço (ex-Ovo de Colombo). Como é que ninguém se lembrou disto até agora?
É evidente que os angolanos já estão habituados a descobertas desta índole, sejam os protagonistas internos ou externos. Tratam-nos como matumbos mas, como somos bem educados, até nem os mandamos dar uma volta ao bilhar grande.
Vejamos o exemplo que nos é dado pelo próprio Presidente da República, João Lourenço, quando nos brinda com a tese de que o desenvolvimento económico e social do país só pode ser feito com a participação do empresariado privado. É obra!
O Titular do Poder Executivo falava, no dia 5 de Janeiro de 2018, numa audiência com empresários nacionais no Palácio Presidencial, a quem informou que o Estado tem outras responsabilidades e que compete ao sector privado da economia criar empregos e produzir bens e serviços.
Como não poderia deixar de ser, cientes de que há 44 anos que os nossos governantes preferem ser assassinados pelo elogio do que salvos pela crítica, os empresários consideraram positivas as expectativas criadas pelo Executivo, para o relançamento da produção interna, a diversificação da economia nacional e o desenvolvimento económico e social do país.
Mas há mais exemplos. O ministro de tudo e mais alguma coisa, Manuel Nunes Júnior, por exemplo, disse que Angola precisa de melhorar o ambiente de negócios e tornar o processo de aplicação de capitais no país mais célere e eficiente, para atrair o investimento directo estrangeiro.
Como é que, até agora, ninguém tinha pensado nisso? É, com certeza, uma descoberta que vai originar teses de doutoramento (no mínimo) nas principais universidades do mundo, para além de merecer o prémio Nobel da Economia. A escolha não será, contudo, fácil, tantos são os casos merecedores desse, e de outros, prémios.
Segundo Manuel Nunes Júnior, que no dia 15 de Fevereiro de 2018 discursava na abertura do seminário nacional de auscultação de empresários sobre o PRODESI, o país precisava também de introduzir ajustamentos à lei do investimento privado, processo que já estava em curso.
Reparemos, com a devida e merecida atenção, nesta descoberta que vai revolucionar a economia mundial, sendo certo que nada será igual a partir de agora. Disse o ministro que o aumento da produção nacional e a diversificação da economia são um imperativo nacional, porque se Angola não tiver uma economia forte, sustentada e diversificada não conseguirá resolver de modo satisfatório os sérios problemas sociais do país.
Manuel Júnior lembrou que de 2002 a 2008 (ainda nem ele, presume-se, estava a pensar “regressar” a Angola) o país registou taxas médias anuais de crescimento de dois dígitos e integrou a lista dos países que mais cresceram no mundo nesse período, um desempenho fortemente influenciado pela dinâmica do sector petrolífero. Quem sabe… sabe. Mas se alguém tivesse dúvidas, o ministro arrasou-as. Pedagogicamente, é óbvio.
No período em referência, a produção petrolífera conheceu um crescimento médio anual de 14 por cento e o preço desta matéria-prima aumentou, em média, 25 por cento/ano, sendo que em 2008 se abateu sobre o mundo uma profunda crise económica e financeira que teve como uma das suas consequências a redução drástica do preço do petróleo no mercado internacional.
Como consequência, no período 2009/2017 a economia angolana continuou a crescer, porém com taxas mais brandas. Quem diria, não é senhor ministro? Se não fosse Vossa Excelência e ainda estaríamos todos na idade das trevas, da ignorância.
Em função das ilações tiradas da história económica recente, o ministro Manuel Nunes Júnior salientou algo que só uma mente brilhante consegue: O país continua a ter ainda uma economia muito vulnerável a choques externos, sobretudo das oscilações do preço do petróleo no mercado internacional.
E por falar em cesta básica. É louvável a filantrópica preocupação do regime com a alimentação das populações. Para melhor eficácia na sua decisão, o grupo técnico intersectorial esmiuça todos os pormenores desta estratégica decisão depois de algumas faustosas refeições. Sim, que essa velha máxima de peixe podre e fuba podres (panos ruins e 50 angolares), bem como porrada para quem refilar, só é válida para os escravos do reino.
Portanto, ao que tudo indica, haverá alguma fartura propagandística, perdão, alimentar, sobretudo ao nível da farinha de trigo e de milho, arroz, feijão, açúcar ou sal.
Para os donos do regime, a cesta básica é composta – compreensivelmente – por outros alimentos: coisas do tipo trufas pretas, caranguejos gigantes, cordeiro assado com cogumelos, bolbos de lírio de Inverno, supremos de galinha com espuma de raiz de beterraba e uma selecção de queijos acompanhados de mel e amêndoas caramelizadas, com cinco vinhos diferentes, entre os quais um Château-Grillet 2005…
Folha 8 com Lusa