Entre a “sexta básica” financeira e a “cesta básica” educacional

O Ministério da Educação e a Agência Angolana de Regulação e Supervisão de Seguros (ARSEG) assinaram hoje, em Luanda, um protocolo de cooperação para a introdução de conteúdos de educação financeira no sistema de ensino angolano, a partir de 2022. E para quando a introdução de conteúdos sobre como escrever (mais ou menos) bem a língua portuguesa? Não basta ser general, ou ter um diploma da Universidade Agostinho Neto, para saber quando deve dizer “houver” e não “haver”, ou “cesta básica” e não “sexta básica”…

Estabelecer as premissas para inserção de matérias sobre literacia financeira no currículo do ensino secundário, ensino técnico profissional, bem como produção de conteúdos sobre educação financeira são alguns dos objectivos do protocolo. A ideia é boa. Mas há o tal problema de base. Antes é preciso combater a iliteracia linguística.

O director do Instituto Nacional de Investigação e Desenvolvimento da Educação (INEDE), Manuel Afonso e o administrador da ARSEG, Silvano Pinto Adriano, foram os signatários desse protocolo, cuja cerimónia decorreu na sede do Ministério da Educação.

Segundo o presidente do Conselho de Administração da ARSEG, Aguinaldo Jaime, o protocolo de cooperação institucional, que prevê também a formação dos professores, visa “munir os estudantes” de matérias sobre “melhor gestão das finanças pessoais e patrimoniais”.

“Efectivamente, matérias como a intermediação financeira, a gestão financeira, a protecção de pessoas e bens, acautelar o futuro através de esquemas de protecção social complementar, todas essas matérias vão passar a ser ministradas as crianças desde tenra idade”, disse.

Para o presidente da ARSEG, Angola “está a dar passos importantes” no sentido da diversificação e consolidação do sistema financeiro, mas, observou, “ainda temos pela frente um longo caminho a percorrer”.

“E por isso, devemos reforçar a nossa literacia financeira para que todos percebam a importância de bem gerir as nossas finanças”, realçou.

Por seu lado, o secretário de Estado da Educação para o Ensino Técnico e Profissional de Angola, Jesus Joaquim Baptista, valorizou o protocolo e apontou 2022 como meta para a inclusão de conteúdos financeiros no currículo do ensino angolano.

“Pensamos que haverá trabalho ainda por se fazer por parte dos técnicos de forma a podermos ver reflectidos os conteúdos sobre literacia financeira nos nossos manuais e pensamos que até 2022 teremos reflectido esses conteúdos”, sublinhou.

Nesta fase, referiu, “há ainda um trabalho do INIDE que se prende com a adequação curricular. O que consta do memorando será reflectido, fundamentalmente, no I e II ciclos do ensino a nível do país e a posterior noutros níveis de ensino”.

E o director do Instituto Nacional de Investigação e Desenvolvimento da Educação, Manuel Afonso, deu conta que aos conteúdos financeiros serão abordados de uma forma transversal em todas as disciplinas curriculares.

De acordo com o responsável, a inclusão de conteúdos financeiros no sistema de ensino angolano compreende duas etapas, sendo que a primeira vai de 2018 a 2021, preparação das condições “didáctico pedagógicas”, e 2022 a 2025, com a “implementação faseada dos conteúdos”.

“Estamos a preparar-nos para que, até 2022, tenhamos as condições criadas para os conteúdos façam parte do currículo escolar. Serão conteúdos abordados de forma transversal em todas as disciplinas”, frisou.

O protocolo visa igualmente promover a formação de qualidade para os professores de forma a atender às necessidades e a orientações específicas de cada subsistema de ensino, para concepção, elaboração e construção de conhecimentos.

A iliteracia implementada pelo MPLA

Em Angola, como mandam as regras do MPLA já que é o único partido que governa o país desde 1975, o regime prefere professores cubanos que nos ensinam a falar da “sexta básica” e não da “cesta básica”, de “marimbondo na cumeia” e não na colmeia ou, como se lê no site da Universidade Agostinho Neto (secção História), de “Repúbica”, “Silvicltura”, “Ectroténica”, “edífico”, “Ogânicas”, “orgãos”, “Senando”.

Segundo o encarregado de Negócios da Embaixada de Angola no Egipto, Francisco Leandro de Almeida, na sessão comemorativa do 14º aniversário da institucionalização do Dia da Língua Portuguesa e da Cultura da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP), o ensino da Língua Portuguesa na Faculdade de Al Alsun, na cidade do Cairo, Egipto, constitui uma iniciativa desafiante e de se encorajar, por se tratar de um país cuja língua oficial é o árabe.

Francisco Leandro de Almeida acrescentou não ser possível dissociar o ensino de qualquer língua em instituições superiores sem que se faça um estudo exaustivo da sua literatura e o português não foge à regra.

Por este facto, aconselhou os estudantes presentes a recorrem em consultas obrigatórias a textos de algumas renomadas figuras da literatura da CPLP, como Agostinho Neto, Viriato da Cruz, Pepetela, Raul David, António Jacinto, Alda Lara e Maria Eugénia Neto (angolanos), Luís de Camões e Eça de Queiroz (portugueses), Jorge Amado, do Brasil, José Craveirinha, de Moçambique.

Por sua vez, a embaixadora de Portugal no Egipto, Madalena Fisher, anunciou que no próximo ano lectivo a Faculdade de Al Alsun contará com um Departamento de Língua Portuguesa.

A diplomata agradeceu a oportunidade que as autoridades egípcias concederam com este gesto, que considerou ser de mais-valia para a difusão da língua portuguesa e da cultura dos países da CPLP.

Para compor o ramalhete da fantochada, o embaixador da Guiné-Equatorial, Eustáquio Nseng, agradeceu o apoio prestado por todos os países da CPLP à adesão do seu país à comunidade, em 2014, explicando que, apesar de ser um país de língua oficial espanhola, a adesão à CPLP deveu-se ao facto de terem sido os portugueses, através do navegador Fernão Pó, os primeiros a chegarem ao actual território da Guiné-Equatorial, na Ilha de Bioko.

Por cá, até o Presidente em vez de houver diz haver

Por cá, a aposta continua a ser nos professores cubanos ou em angolanos formados por cubanos, sendo fácil concluir que na sua maioria esses professores e, consequentemente, os alunos têm de se descalçar se quiserem contar até 12.

Em Outubro de 2018 ficou a saber-se que Angola vai contratar expatriados cubanos para instituições de ensino superior públicas, de forma a “suprir a falta de especialistas com conhecimento e experiência necessária”, indicava um despacho presidencial. Boa! Quem melhor do que professores cubanos para diplomar quem quer ter acesso à “sexta básica” ou correr com os marimbondos que estão na “cumeia”?

O despacho assinado pelo Presidente da República, João Lourenço, autorizava o lançamento do procedimento de contratação simplificada para a assinatura “de dois contratos de aquisição de serviço docente de especialistas de nacionalidade cubana”, para ministrarem aulas em universidades públicas.

A 3 de Março de 2017, o então vice-Presidente de Angola, Manuel Vicente, exortou as 65 instituições de ensino superior do país a promoverem a qualidade e valorização do corpo docente como objectivo para o novo ano académico, que arrancou oficialmente nesse dia.

“O ensino superior tem conhecido um crescimento quantitativo notório. É de salientar, no entanto, que o crescimento quantitativo que se verifica deve ser acompanhado de um esforço que promova a qualidade”, exortou Manuel Vicente.

Em 2015 saíram das universidades e institutos superiores angolanos mais de 14.000 licenciados, um crescimento de 18,9% face ao ano académico anterior, com o governante a sublinhar a necessidade de uma aposta na “valorização dos recursos humanos”, nomeadamente ao nível dos professores.

“É essencial dotar cada instituição de ensino superior de um corpo docente forte, engajado e comprometido, técnica e profissionalmente, que se desenvolva com os demais níveis do sistema de educação e ensino”, disse Manuel Vicente.

“Para que os resultados sejam, a breve trecho, cada vez mais evidentes e significativos”, acrescentou.

Num universo em que o país tem 20 milhões de pobres, cerca de 10 milhões de angolanos frequentam actualmente – de acordo com dados oficiais – as escolas e universidades do país, nos vários níveis de ensino.

Na famosíssima entrevista de João Lourenço à RTP, por duas vezes o Presidente cometeu a (sejamos benevolentes) mesma gafe. “Há algum aspecto no dialecto de Luanda em que as pessoas digam Haver quando deveriam dizer Houver?”, perguntaram na altura muitos dos nossos leitores. A resposta foi e é simples. Há de facto um dialecto. Chama-se ignorância pura e dura ou, se preferirmos, analfabetismo crónico e altamente contagioso.

Folha 8 com Lusa

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