O Governo angolano (ou seja, do MPLA desde 1975) garantiu hoje que a dotação para o sector da Agricultura, de 1,6% de todas as despesas inscritas no Orçamento Geral do Estado para 2019, vai concorrer para o “alcance da auto-suficiência alimentar”, promovendo diversas culturas. Foi assim descoberta a pedra filosofal, na sua vertente agrícola. É obra!
“A nossa prioridade continua a ser o alcance da auto-suficiência alimentar e procuramos com que consigamos a nível do país obter mais divisas, implantando culturas como o milho, cacau e café”, afirmou hoje (perante o espanto mundial em função da descoberta) o ministro da Agricultura e Florestas de Angola, Marcos Alexandre Nhunga.
Em declarações aos jornalistas, após a aprovação final no parlamento da proposta do OGE para 2019, o governante salientou que, com auto-suficiência alimentar, o país deve diminuir as importações e gastar menos divisas.
Que maravilha. Marcos Alexandre Nhunga é um dos melhores cérebros do MPLA. Então não é que diminuindo as importações o país vai gastar menos divisas? Quem diria? De facto, ao longo dos 43 anos de independência, ninguém tinha descoberto tal coisa. Está de parabéns o Governo e, é claro, o ministro.
No Orçamento de 2019, aprovado apenas com votos favoráveis do MPLA e votos contra e abstenções da oposição, o sector da agricultura absorve 1,6% de todas as despesas, um aumento face aos 0,4% do Orçamento de 2018.
“E vamos lutar para que se possa consignar mais verbas para o sector da agricultura, para podermos trabalhar muito mais”, indicou Marcos Alexandre Nhunga. Provavelmente para ser uma luta que leve à vitória, o ministro deve contar com o apoio das Forças Armadas. Isto porque não vão os agricultores dedicar-se antes à produção de marimbondos.
Mas, observou o ministro, houve “recomendações muito concretas, em relação ao sector da agricultura, de forma a diversificarmos melhor a nossa economia”. Ou seja: “Queremos aumentar a produção e a produtividade a nível da agricultura, pecuária e florestas”.
O trabalho manual das terras agrícolas, com recurso a enxadas, ainda é utilizado em 98% dos terrenos em Angola, em contraponto com o reduzido recurso à mecanização nos cerca de cinco milhões de hectares de cultivo.
A informação foi avançada no dia 11 de Maio de 2017 pelo então ministro da Agricultura de Angola, por sinal o mesmo Marcos Alexandre Nhunga, durante uma reunião com agentes económicos ligados à banca comercial, empresas do sector do agrícola, seguradoras e outros, tendo afirmado que apenas 2% dos hectares de cultivo do país são preparados com “recurso a mecanização e tracção animal”.
“A actividade de produção agrícola no país debate-se com o problema do baixo uso de mecanização na preparação de terras”, admitiu.
Provavelmente esta realidade enquadra-se, como tanto gosta o regime que (des)comanda o país desde 1975, no facto de Angola viver desde finais de 2014 uma profunda crise económica, financeira e cambial devido à queda do preço do barril de petróleo no mercado internacional, com o ministro a admitir consequências negativas no sector, como a falta de meios de apoio à produção agrícola.
“Com a retracção da actividade económica, vários meios e equipamentos de trabalho detidos pelas empresas de construção civil, tais como tractores, camiões e outros, incluindo a mão-de-obra, ficaram praticamente inactivos. Estando muitos deles parqueados nos estaleiros”, observou.
Nesse encontro, que juntou empresários angolanos e estrangeiros do agronegócio para apresentação de oportunidades de investimentos no sector, o governante admitiu que os meios “ociosos” de mecanização agrícola “podem ser, facilmente, reconvertidos para a realização de actividades agrícolas”.
“Diante da realidade que algumas empresas atravessam, imposta pela conjuntura económica, uma alternativa segura para as vossas empresas hoje seria o aproveitamento das oportunidades existentes no sector agrário investindo no agronegócio”, alertou, dirigindo-se aos empresários.
Marcos Alexandre Nhunga referiu ainda que apesar de Angola dispor de “solos de elevada aptidão agrária, abundantes recursos hídricos e uma expressiva faixa da população dedicada às actividades do campo”, actualmente “a produção interna ainda, em muitas culturas, não satisfaz as necessidades de consumo”.
“A realização plena do potencial do sector agrário nacional, como motor da segurança alimentar e promotor do desenvolvimento socioeconómico do país, depende, em grande medida, da eficiência e eficácia com que decorrem as actividades produtivas dentro de cada um dos seus subsectores”, concluiu.
Descoberta da pólvora seca… na versão molhada
Recorde-se que, tal como o seu colega das Finanças, também o novo ministro da Agricultura, Marcos Nhunga, descobriu a pólvora que, por sua vez, fora inventada pelo seu antecessor, Afonso Pedro Canga.
Então, como grande novidade, Marcos Nhunga, apela à participação activa dos intervenientes no sector agrário para o processo de diversificação da economia, tendo em vista melhorar as condições de vida da população.
Originalidade não falta. O ministro da Agricultura diz que pelo facto de o país estar a atravessar um momento de crise financeira, precisa de buscar força e inteligência para concretizar os objectivos que o país se propõe, a criação das melhores condições de vida. Quem diria?
De acordo o governante, deve-se prestar atenção especial a todos os quadros desta área e moralizá-los, de modo a trabalhar mais para o cumprimento dos objectivos traçados.
Marcos Nhunga diz que deve haver maior motivação a nível dos quadros do Ministério, um diálogo interno e permanente nos órgãos internos, assim como com os empresários, para que todos se revejam nos programas deste sector.
Marcos Nhunga, refere ainda que o sector da agricultura é chamado para arranjar soluções. Apelou aos membros do Ministério a não se aproveitar das respectivas funções para a resolução dos problemas pessoais. Boa!
“Vamos pautar por uma gestão rigorosa e transparente para que os poucos e parcos recursos que forem arrecadados possam ser aplicados para o alcance dos objectivos traçados”, disse Marcos Nhunga, acrescentando que deve haver união entre todos os que trabalham para a mesma causa.
Em Angola, depois do milho o arroz é o segundo cereal mais consumido, mas a sua produção interna, apesar dos esforços para o seu incremento, ainda não satisfaz as necessidades, obrigando a reforçar a sua importação.
Há muito que se sabe que quando o petróleo espirra Angola entra em estado de coma. Mesmo assim, os peritos dos peritos do regime olham sempre para o lado, não vão ser contaminados com essa epidemia da diversificação da economia.
As ligações económicas de Angola ao petróleo ilustram, aliás, um problema mais amplo em África; as nações produtoras que ligaram as suas fortunas exclusivamente ao crude encontram-se agora reféns da turbulência dos preços, correndo muitas o risco de um desastre colectivo de larga escala.
Como antídoto, o regime angolano esperava que novos empréstimos e investimentos da China, o maior parceiro comercial de Angola, conseguissem ajudar a conduzir a economia dependente do petróleo por entre as águas revoltas. Mas essa opção não está a resultar e o barco mete água por todos os lados.
Do ponto de vista da propaganda, Luanda e Pequim apresenta-se ao mundo como “irmãos e parceiros estratégicos de longo prazo”. No entanto, a verdade é que os importadores angolanos estão agora em dificuldades para pagar artigos básicos como medicamentos ou cereais.
No tempo colonial (português)
Por mera curiosidade registe-se que, enquanto província ultramarina de Portugal, até 1973, Angola era auto-suficiente, face à diversificação da economia.
Era o segundo produtor mundial de café Arábico; primeiro produtor mundial de bananas, através da província de Benguela, nos municípios da Ganda, Cubal, Cavaco e Tchongoroy. Só nesta região produzia-se tanta banana que alimentou, designadamente a Bélgica, Espanha e a Metrópole (Portugal) para além das colónias da época Cabo-Verde, Moçambique, Guiné-Bissau e Sã Tomé e Príncipe.
Era igualmente o primeiro produtor africano de arroz através das regiões do (Luso) Moxico, Cacolo Manaquimbundo na Lunda Sul, Kanzar no Nordeste Lunda Norte e Bié.
Ainda no Leste, nas localidades de Luaco, Malude e Kossa, a “Diamang” (Companhia de Diamantes de Angola) tinha mais 80 mil cabeças de gado, desde bovino, suíno, lanígero e caprino, com uma abundante produção de ovos, leite, queijo e manteiga.
Na região da Baixa de Kassangue, havia a maior zona de produção de algodão, com a fábrica da Cotonang, que transformava o algodão, para além de produzir, óleo de soja, sabão e bagaço.
Na região de Moçâmedes, nas localidades do Tombwa, Lucira e Bentiaba, havia grandes extensões de salga de peixe onde se produzia, também enormes quantidades de “farinha de peixe”, exportada para a China e o Japão.
Folha 8 com Lusa