Sim, não, talvez (antes pelo contrário), diz a Moody’s

A agência de notação financeira Moody’s considerou hoje que a dívida pública de Angola (ou seja, o que o Estado deve) vai crescer para 72,8% e o crescimento económico vai acelerar para 2,2% este ano e 2,8% em 2019.

No relatório detalhado que explica a degradação do “rating” de Angola, no final da semana passada, os analistas da Moody’s dizem que “o perfil de crédito é limitado pela contínua deterioração das métricas da dívida, em que a dívida pública deverá provavelmente ultrapassar os 70% em 2018”.

Os riscos de falta de liquidez “aumentaram significativamente e o stock de dívida permanece vulnerável a desvalorizações adicionais da moeda nacional”, acrescentam os analistas, sublinhando ainda que “o crescimento da economia [de 2,2% este ano e 2,8% em 2019] deverá continuar limitado num contexto de alta inflação”.

Os principais desafios que o perfil de crédito apresenta relacionam-se com os “riscos elevados de falta de liquidez e vulnerabilidade da dívida a desvalorizações adicionais, uma estrutura económica que continua altamente vulnerável a choques petrolíferos e capacidade institucional muito fraca”.

Entre os aspectos positivos do país, do ponto de vista da análise da qualidade do crédito soberano, os analistas da Moody’s apontam “a recuperação económica apoiada nos sectores do gás e do petróleo, em desenvolvimento, um ambicioso plano para diversificar a economia, provavelmente apoiado num programa do Fundo Monetário Internacional (FMI), e a consolidação orçamental numa fase avançada”.

A agência de notação financeira Moody’s desceu na sexta-feira, 27 de Abril, o “rating” de Angola, de B2 para B3, mudando a Perspectiva de Evolução de Negativa para Estável, concluindo o processo de revisão em baixa iniciado em Fevereiro passado.

As principais razões para a descida do “rating”, que se afunda ainda mais em território de “Não Investimento”, ou “lixo”, como é normalmente conhecido, são “os riscos de refinanciamento interno e externo, que se manterão altos pelo menos nos próximos dois anos, e as métricas orçamentais e o peso da dívida, que já não estão em linha com os pares avaliados em B2”.

A Perspectiva de Evolução do “rating” de Angola subiu para Estável, uma semana depois de ter assinado com o FMI um Instrumento de Coordenação de Políticas, e de a agência Standard & Poor’s (S&P) melhorar o “rating”, e na mesma semana em que o Ministério das Finanças estava a apresentar aos investidores a intenção de lançar uma emissão de dívida pública de dois mil milhões de dólares em Maio.

No relatório detalhado sobre esta descida do “rating”, a Moody’s nota que a dívida pública deverá ter chegado a 74 mil milhões de dólares, equivalente a 66,2% do PIB no final do ano passado, o que representa uma subida face aos 56,9% de 2016.

“O aumento significativo é explicado pela dívida externa angariada pelo Governo e pelo empréstimo à Sonangol (9,2% do PIB) e uma política orçamental expansionista, com um défice perto de 6% do PIB nas vésperas das eleições de Agosto de 2017”, lê-se no documento.

“Para 2018, esperamos que o défice melhore para 2% do PIB e permaneça abaixo de 2% daí em diante, num contexto de contínuos esforços de consolidação orçamental e de uma subida dos preços do petróleo, para 60 dólares por barril, neste ano”, escrevem os peritos da Moody’s.

Em Janeiro deste ano, a Moody’s avisou que uma reestruturação da dívida soberana de Angola que implique perdas para os credores terá consequências no “rating” (nota de risco) do país, argumentando que a renegociação dos empréstimos bilaterais evidencia os riscos.

“Se se tornar claro que as renegociações foram de facto contempladas, isso poderia levar a um evento que a Moody’s consideraria um incumprimento financeiro, [e nesse caso] a Moody’s asseguraria que a avaliação do perfil de crédito era consistente com o aumento da probabilidade de um incumprimento financeiro”, escrevem os analistas, numa nota de análise.

O comentário, que não é uma acção de “rating”, serviu de alerta para o Governo que tem manifestado intenção de entrar em negociações com os credores para alterar as condições da dívida, mas sem apontar especificamente os contornos dessa intenção.

“As declarações ambíguas nos documentos oficiais em Janeiro deixaram pouco claro o perímetro que se aplicaria às intenções do Governo de renegociar a dívida”, escrevem os analistas na nota hoje enviada aos investidores.

“Baseados parcialmente em discussões com o Governo, assumimos que apesar de o executivo querer realmente gerir mais activamente as suas vulnerabilidades em 2018, não existe actualmente uma intenção de entrar em discussões com quaisquer credores para engendrar um resultado que a Moody’s poderia considerar um evento de incumprimento financeiro”, escrevem os analistas.

Nas definições metodológicas da Moody’s, um evento de crédito considerado um “default” (incumprimento) acontece sempre que o Governo propõe aos credores uma renegociação da dívida que implique alterações nos prazos ou nos montantes do pagamento, à semelhança do que aconteceu com Moçambique em 2016, quando propôs aos credores receberem juros mais elevados e um alargamento do prazo de pagamento do montante investido inicialmente.

No comentário de 11 de Janeiro, a Moody’s explica que não antecipa que isto vá acontecer, notando que encara como provável que o Governo tente apenas renegociar os empréstimos, o que, na definição metodológica da agência de notação financeira, não implica um “default” e consequente descida do “rating”.

Devido ao fim da indexação do kwanza ao dólar, a moeda angolana deve desvalorizar-se e aumentar o rácio da dívida pública face ao Produto Interno Bruto, o que aumenta automaticamente o custo da dívida.

“Confrontado com a perspectiva de um aumento do peso da dívida e dos custos de refinanciamento, o Governo quer melhorar a composição e o perfil da sua dívida, tentando, sempre que possível, trocar dívida de curto prazo e dívida em moeda estrangeira por instrumentos de longo prazo”, diz a Moody’s.

Folha 8 com Lusa

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