Divórcio foi só temporário

O Jornal de Angola, órgão do MPLA, dedicou hoje um editorial em que destaca a “nova era” nas relações com Portugal, depois de um passado com um “divórcio temporário” que serviu para evidenciar “mais as desvantagens que as vantagens do distanciamento”. A provar a reconciliação, o Presidente João Lourenço afirmou hoje que os investimentos directos portugueses em todos os sectores em Angola são “bem-vindos” e que Portugal pode assumir um papel relevante no desenvolvimento dos dois países.

Intitulado “As Relações Portugal-Angola”, o editorial refere que, embora na actualidade os laços políticos “não sejam determinantes” entre os Estados, a normalização das relações políticas “representam uma espécie de ‘alfa e ómega’ para que se estruture e se fortaleçam os demais vínculos”.

Depois de “um passado recente em que o ‘divórcio temporário’ entre Luanda e Lisboa serviu para evidenciar mais as desvantagens do que as vantagens do distanciamento, as duas partes ganham tempo agora com a renovação de compromissos ao mais alto nível. E isto é bom para Angola, tanto quanto para Portugal”, escreve-se no editorial.

Para o jornal do MPLA, é também “importante” reter o facto de que a gestão do que as autoridades portuguesas consideravam como “irritante” ter sido feita “sem o agravamento das relações bilaterais”, numa referência às acusações judiciais contra – na altura do factos – o PCA da Sonangol e que depois viria a ser vice-presidente angolano, Manuel Vicente, que foram transferidas da justiça portuguesa para a espécie de justiça angolana (que é apenas do MPLA) em Junho.

“Essa é uma das notas positivas que marcou as desavenças, mais na política do que noutras esferas, que envolveram as autoridades políticas angolanas e portuguesa, que souberam sempre preservar o que demais útil, secular e estratégico une os dois países”, considera o jornal.

Para o passado, prossegue o texto, ficam situações que serão analisadas por historiadores, pesquisadores e estudantes e, ao contrário do Jornal de Angola, também pelos Jornalistas que tenham memória.

O encontro entre as duas delegações e a audiência que o Presidente da República, João Lourenço concede ao chefe do Governo português, António Costa “constituem os pontos altos desta importante viragem de página” nas relações entre os dois países”.

“É expectativa generalizada que, além dos apelos habituais para a compreensão e respeito mútuos, os acordos que venham a ser assinados sirvam para fazer avançar os dois Estados na base das vantagens recíprocas. Como tinha defendido, há mais de dez anos, o antigo primeiro ministro português António Guterres, é preciso que os laços económicos e comerciais entre os dois países ‘transcendam a simples materialização de negócios de circunstância’”, sublinha o jornal do MPLA.

“Hoje, Angola precisa de investimentos no seu sector produtivo, necessita de transferência de ‘know-how’ até onde os desafios se multiplicam, e nada melhor do que contar com os Estados e entidades, públicas e privadas, que conheçam melhor o país. Angola não pode transformar-se apenas numa espécie de plataforma para viabilizar as exportações de bens e serviços no país, sob pena de contribuir para a contínua exportação de mão-de-obra”, sustenta-se no editorial do JA.

Para o autor, é “oportuna” a assinatura de acordos que venham incidir na inviabilização da evasão fiscal, que contribuam para o combate à corrupção, entre outros, como deverá suceder, em princípio, com a rubrica do compromisso para evitar a dupla tributação.

“Em suma, esperamos todos que o Programa Estratégico de Cooperação reforce a dimensão estratégica e diversifique as áreas de intercâmbio, envolvendo sectores tradicionais como a Saúde e Educação, se efective sempre nos marcos do respeito mútuo, da reciprocidade de vantagens, da protecção dos investimentos e da não interferência nos assuntos internos”, conclui o Jornal de Angola.

Reconciliação até ao próximo divórcio

Enquanto isso, o Presidente João Lourenço afirmou hoje que os investimentos directos portugueses em todos os sectores em Angola são “bem-vindos” e que Portugal pode assumir um papel relevante no desenvolvimento dos dois países.

Ao intervir antes do início de um encontro a sós com o primeiro-ministro português, António Costa, João Lourenço salientou que os investimentos na indústria transformadora, com base em matérias-primas e em materiais locais, a agricultura e a agro-indústria são fundamentais para o mercado interno e para as exportações angolanas.

“Vemos com bons olhos a implantação de pequenas e médias empresas portuguesas no mercado angolano, dentro de uma lógica em que se estabeleçam no nosso país para produzir riqueza que resulte em benefícios importantes para ambos”, destacou João Lourenço.

Nesse sentido, o Presidente angolano, dirigindo-se a António Costa, encorajou-o a sensibilizar os investidores portugueses para aceitarem o desafio, “criando-lhes facilidades por via de linhas de crédito que os ajudariam a realizar negócios em Angola”.

“Do nosso lado, estamos a fazer uma aposta decidida na criação de um ambiente de negócios seguro e atractivo, no âmbito do qual os investidores deixam de se confrontar com obstruções resultantes de procedimentos exageradamente burocráticos para estabelecerem uma empresa ou negócio em Angola”, sublinhou.

Para João Lourenço, porém, há que ter em conta que, para todos esses objectivos, que “prevaleçam sempre o bom senso, pragmatismo e sentido de Estado”, para que as relações entre os dois países saiam “continuamente robustecidas” e possam fazer face, “e vencer” as “visões pessimistas” que, de quando em quando, se procuram afirmar.

“Encorajo, pois, a mantermos uma linha de diálogo permanente entre nós”, recomendou.

Segundo João Lourenço, os acordos assinados entre os dois países, com realce para o programa Estratégico de Cooperação 2018/2022 e a Convenção para eliminar a Dupla Tributação em matéria de impostos e prevenir a fraude e a evasão fiscais, “vão dar certamente solidez e substância” à visita de António Costa.

“Espero que estes instrumentos ajudem a criar sinergias que nos conduzam ao pragmatismo na realização de todos os actos que dão sustentação às relações de cooperação” entre os dois países, frisou.

“Há entre Angola e Portugal uma relação entre dois Estados independentes e soberanos, que respeitam e cujos Governos têm a responsabilidade de traçar políticas que garantam uma cooperação sólida em variados domínios e o estreitamento dos laços de amizade e de cooperação económica”, lembrou.

Segundo João Lourenço, Luanda tem consciência de que se “impõe a necessidades de se transformar os vastos recursos de que Angola dispõe em “riqueza real”, para se garantir o progresso e a melhoria significativa das condições de vida das populações.

Na intervenção, João Lourenço destacou também que Angola e Portugal, na qualidade de membros da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP), têm procurado em conjunto “desempenhar um papel que contribua para a estabilidade, paz e segurança global”.

Folha 8 com Lusa

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