Brincar ao Carnaval no Natal não tem piada

O ministro do Interior de Angola, Ângelo Veiga Tavares, pediu hoje aos cidadãos que denunciem “indícios de factos criminais” decorrentes da gestão da coisa pública, para “permitir um maior combate à corrupção, ao peculato e ao branqueamento de capitais”. Se fosse Carnaval ninguém levaria a mal. Mas, mesmo sendo Natal, a “coisa” não tem piada.

 ngelo Veiga Tavares, que discursava na cerimónia de cumprimentos de fim de ano, referiu que pretende a colaboração dos cidadãos em “crimes que incidem de forma directa nas condições de vida da população e reduzem a capacidade do Estado, para dar resposta às suas principais necessidades”.

O titular da pasta do interior de Angola assegurou que as acções da Polícia Nacional, em 2018, estarão voltadas, sobretudo, para o combate aos crimes de natureza económica, no “cumprimento das orientações do Presidente da República, João Lourenço”.

“Nomeadamente, o combate à criminalidade e à imigração ilegal, bem como melhorar o controlo das nossas fronteiras e no quadro do combate à criminalidade violenta e aos crimes de natureza económica”, observou. O governante angolano alertou que dentro das prioridades o combate aos crimes cibernéticos não será descurado.

No próximo ano, salientou, a Polícia Nacional deverá estar mais próxima do cidadão e melhorar a sua prestação no exercício das actividades, bem como ter sempre presente que são servidores públicos.

Na sua alocução, Ângelo Veiga Tavares anunciou ainda que “finalmente, Angola vai contar com um novo passaporte em 2018”, ano em que também será revista a Lei sobre o Regime Jurídico de Estrangeiros, “com vista à remoção dos preceitos que colidam com a perspectiva de criação de um melhor ambiente de negócios e o desenvolvimento do turismo”.

“Deveremos aprovar uma adequada política migratória e criminal e melhoraremos os mecanismos de tratamento dos actos migratórios”, garantiu.

O ministro referiu ainda que a nível dos serviços penitenciários, 2018 será o ano virado para a melhoria do sistema de reeducação dos reclusos, das suas condições técnico-profissionais e académicas, bem como da sua dieta alimentar.

Segundo o governante, com a introdução do Sistema Integrado de Segurança Pública, uma resposta mais eficaz será dada aos cidadãos, para que na prevenção, esclarecimento de crimes, bem como nas calamidades, sinistralidade rodoviária e outras necessidades mais prementes da população, possa haver “melhor capacidade de resposta”.

“Deveremos, em 2018, prestar maior atenção à esfera social, devendo melhorar significativamente a nossa resposta neste domínio. Papel de destaque deverá desempenhar a Caixa de Protecção Social e os Cofres de Providência”, referiu.

Para o efeito, o ministro considerou necessário melhor a capacitação dos efectivos, além de um maior rigor na selecção para o ingresso nas carreiras do regime especial, no domínio disciplinar e das tecnologias de informação.

Sobre o ano que agora finda, o ministro do Interior considerou-o “difícil”, manifestando, contudo, “orgulho pelo asseguramento com brio” das eleições gerais de 23 de Agosto, reiterando felicitações a todos os efectivos que trabalharam, nas distintas fases do processo eleitoral.

Como elemento negativo, Ângelo Veiga Tavares focou a sinistralidade rodoviária, lamentando que alguns dos cidadãos que não acataram os conselhos da polícia, por ocasião do natal, hoje “já não fazem parte do mundo dos vivos”.

Até João Lourenço o “comprou”

Quando visitou Moçambique no dia 12 de Fevereiro de 2016, o ministro do Interior de Angola, Ângelo Veiga Tavares, descobrir a pólvora, se bem que a patente pertença a José Eduardo dos Santos. Ao melhor estilo do embaixador itinerante Luvualu de Carvalho, o ministro disse, em Maputo, que o caso dos 15+2 activistas reflectia uma tentativa externa de colocar “governos dóceis” no poder.

O governante angolano falava aos jornalistas à saída da audiência concedida pelo Presidente moçambicano, Filipe Nyusi, no âmbito da visita que realizou ao país, para – segundo a agenda oficial – reforço da cooperação no domínio da segurança e ordem pública.

“Há tentativas de ter no poder governos dóceis e, nalguns casos, são utilizadas algumas pessoas, sobretudo jovens, na tentativa de verem implementado em Angola aquilo que se vê nos outros países”, apontou Ângelo Veiga Tavares, mostrando mais uma vez a sua capacidade de repetição em série dos recados encomendados pelo “querido líder” de um governo nada dócil… para com os fracos.

Ângelo Veiga Tavares aludia – recorde-se – ao processo que envolveu 15 angolanos em prisão domiciliária em Luanda, além de duas jovens em liberdade, acusados de actos preparatórios para uma rebelião e um atentado contra o então Presidente angolano.

“Nós temos estado atentos e quando a lei é violada as pessoas que o fazem devem sentir o peso da lei e das autoridades. Este processo destes jovens é um processo normal, teve o seu curso normal de ponto de vista da sua instrução, e agora está na fase judicial”, disse ainda aos jornalistas o ministro que foi de José Eduardo dos Santos e é agora de João Lourenço.

Recorde-se, neste contexto, que a NATO afirmou que nunca discutiu qualquer acção militar em Angola, desmentido as teses do Luvualu de Carvalho, camarada de Ângelo Veiga Tavares, que andou a correr os areópagos afectos ao regime para garantir que a actividade “conspirativa” dos jovens visava uma intervenção em Angola da Aliança Atlântica.

Crê-se que Luvualu de Carvalho, tal como Ângelo Veiga Tavares, descobriu que os jovens queriam provocar era uma intervenção do Pacto de Varsóvia. E apostavam tudo nessa versão. Acontece, contudo, que alguém os alertou que essa organização militar comunista tinha acabado em Junho de 1991. Estes dois peritos do regime corrigiram o tiro e substituíram Pacto de Varsóvia por NATO.

Tudo isto começou quando, socorrendo-se das afirmações feitas em Luanda exactamente pelo ministro do Interior do regime, Ângelo Veiga Tavares, o embaixador itinerante repetiu que os activistas pretendiam realizar uma marcha até ao Palácio Presidencial, “levando com que fossem quebradas as regras de segurança (…) para que a guarda presidencial ou a polícia presente reagisse, matasse crianças, matasse senhoras e matasse idosos para provocar a comoção internacional e justificar então uma intervenção vergonhosa”.

“É isto que se procurava. Que a Organização do Tratado do Atlântico Norte (NATO) ou alguns países que dela fazem parte fizessem um ataque a Angola, para que se verifique o horror que se verifica agora na Líbia ou se verificou e verifica na Tunísia”, acentuou o então diplomata itinerante fabricado à medida e por medida por José Eduardo dos Santos.

“Os dados são públicos, as afirmações e as contestações estão ser tratadas no quadro judicial e esperamos que o tribunal faça o seu trabalho”, disse ainda Ângelo Veiga Tavares. Desconhece-se se o ministro sabe qual é a diferença entre um Tribunal num Estado de Direito Democrático e um, como o de Luanda, que não passa de um palco circense.

“Isso [forças externas interessadas em desestabilizar a Angola], em certa medida, nunca deixou de existir desde as nossas independências”, apontou o ministro, certamente referindo-se à África do Sul mas pensando (e não é certo, reconhecemos, que Ângelo Veiga Tavares… pense) em Cuba e na União Soviética.

Quem não é dos nossos…

O ministro do Interior de Angola, Ângelo Veiga Tavares, entende desde o início deste caso dos activistas como “prudente” a detenção dos jovens para, diz, não permitir o desenvolvimento de planos apoiados por forças estrangeiras para a desestabilização do país, que previam “mortes”.

Quando Ângelo Veiga Tavares leu o improviso do “escolhido de Deus” na conferência de imprensa sobre o plano das comemorações dos 40 anos da independência de Angola, ficou a saber-se que a cartilha era a de sempre, a do partido único.

Nessa altura apontou, a título de exemplo, que o Governo convidou em 2014 uma cidadã europeia (italiana) a abandonar o país, porque esta se reuniria com aquele grupo, supostamente dando indicações para que nas manifestações de contestação ao regime deveriam ser provocados confrontos com a polícia, gerando entre 20 a 25 mortos.

“Por isso é que em alguns casos, a polícia prefere não permitir que tais manifestações atinjam um nível de confronto para atingir esse fim. Portanto, essa cidadã europeia foi convidada a abandonar o país”, frisou.

Segundo o ministro, também em alguns círculos diplomáticos, alguns cidadãos com esse estatuto instigavam esses jovens “e coincidentemente sempre na mesma perspectiva”.

“Haver confrontos para permitir – era o termo que utilizavam – a intervenção do ocidente e, por caricato que pareça, a cifra era sempre a mesma, entre 20 e 25 mortos”, acrescentou.

“Portanto, o que se estava a passar não era aquela habitual tentativa de simples manifestação, era coisa bem diferente, era coisa bastante ousada. Ou seja, no meu entendimento, havia sim alguém por trás a arregimentar e a aproveitar o estado de alma desses jovens para fins diferentes daqueles que estão mais desenvolvidos do ponto de vista democrático”, acusou o ministro.

Ainda sobre as investigações, Ângelo Veiga Tavares disse que em finais de 2013 transmitiu à UNITA, o maior partido da oposição, que alguns núcleos daquela força política estavam, naquela altura, a procurar localizar a casa dos ministros da Defesa e do Interior, do chefe do Serviço de Inteligência, do Comandante Geral da Polícia Nacional e do Chefe de Estado-Maior General das Forças Armadas.

O titular da pasta do Interior frisou ainda que havia também informações sobre a preparação de alguma desordem na capital angolana, com a ocupação de novas centralidades habitacionais, a destruição de viaturas e de multibancos.

“Nós, confrontados com esses dados que tínhamos do passado, com essa ingerência de fora, que perspectivava que se criasse condições de confronto e mortes para que houvesse intervenção do ocidente, achamos prudente ter algumas atitudes que permitissem cortar e não permitir o desenvolvimento de acções dessa natureza”, afirmou o ministro.

O ministro sublinhou que as autoridades angolanas não têm “o prazer de prender quem quer que seja”, realçando que o processo de paz em Angola ainda “não está totalmente consolidado”, por isso há necessidade de algumas cautelas na abordagem de certos assuntos.

Novamente sobre a ingerência externa nos assuntos de Angola, e sem concretizar (acusar sem provar está no ADN do regime), Ângelo Veiga Tavares frisou a necessidade de os angolanos preservarem “um ganho muito importante”, que foi terem conseguido alcançar a paz “metendo de fora os estrangeiros”.

“Hoje, há a tentativa e o agrado do estrangeiro, porque estamos a abrir outra vez uma brecha para que esses estrangeiros venham determinar e voltar ao passado de desentendimento”, realçou.

Admitindo “problemas por resolver” no país, sublinhou que o tempo é dos políticos resolverem internamente.

“Porque há uma tendência muito grande de dar espaços muito bem desejados por alguns estrangeiros, para desvirtuarem e criarem situações de muitas dificuldades, que podem ser muito graves e trazer-nos consequências muito perigosas”, concluiu.

Ângelo Veiga Tavares foi, apesar de tudo, modesto no enquadramento. Mas ainda está a tempo… Esqueceu-se de dizer que foi descoberto em poder dos jovens diverso material bélico, altamente letal, a saber: 12 esferográficas BIC (azuis), um lápis de carvão (vermelho), três blocos de papel (brancos) e um livro sobre como derrubar de forma pacífica as ditaduras.

Sabe-se, igualmente, que a Polícia Nacional do regime descobriu que os jovens activistas tinham mísseis escondidos nas lapiseiras, Kalashnikovs camufladas nos telemóveis e outro armamento pesado e letal disfarçado nos blocos de apontamentos. São, reconheça-se, provas mais do que suficientes para provar que estavam a preparar um golpe de Estado.

Os jovens estavam (era isso, não era senhor ministro Ângelo Veiga Tavares?) no seu quartel-general, por sinal uma residência em Luanda, numa reunião dos seus estrategas militares que planeavam o golpe a partir da leitura do livro “Da ditadura à democracia — Uma estrutura conceptual para a libertação”, do norte-americano Gene Sharp.

No quintal, debaixo de uma mangueira, o exército mobilizado por esses jovens (talvez uns milhões de guerrilheiros) afinava os códigos para lançamento dos mísseis e, talvez, até de ogivas nucleares contra a residência de Eduardo dos Santos…

Perante este manancial de provas, o Ministério Público do regime provou que os jovens activistas estavam envolvidos numa conspiração para a “destituição do Presidente da República e de outros órgãos de soberania”, plano que estava a ser congeminado há muito, muito tempo. Cerca de três meses.

Folha 8 com Lusa

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