O senhor esteja convosco
– Ele está no meio de nós!

O Governo afastou hoje um cenário de recessão económica no país, este ano, apesar da forte contracção das receitas do sector petrolífero, admitindo apenas uma “ligeira desaceleração” do crescimento.

“T odas as economias têm ciclos altos e baixos. A boa notícia é que não haverá recessão, mas apenas uma ligeira desaceleração do crescimento da economia, sendo essa uma boa base de trabalho para o próximo ano”, anunciou no parlamento angolano o vice-Presidente da República.

Manuel Vicente proferia o anual discurso sobre o estado da nação, no arranque do novo ano parlamentar, em nome do Presidente José Eduardo dos Santos que sofreu uma “indisposição”, conforme anunciado momentos antes da sessão solene de hoje.

No mesmo discurso anual do chefe de Estado, um imperativo constitucional, foi anunciada uma revisão oficial em baixa, para quatro por cento, na previsão do crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) de 2015, face aos anteriores 6,6% apontados no Orçamento Geral do Estado.

Esta revisão assenta, disse o vice-Presidente, numa perspectiva de crescimento de 7,8% do sector petrolífero, devido ao aumento da produção (ronda os 1,8 milhões de barris de crude por dia) e ao aumento de 2,4% no sector não petrolífero.

No mesmo discurso, foi reconhecido que a crise actual provocou uma “subida generalizada de preços, incluindo o preço da moeda nacional face ao dólar norte-americano”, mas “também no rendimento disponível da grande generalidade da população, que sofreu uma quebra apreciável”.

Angola enfrenta uma crise financeira e económica devido à forte quebra da cotação do barril de crude no mercado internacional, o que provocou também uma crise cambial, pela redução de entrada de divisas no país, e fez disparar a inflação, que em termos acumulados, de um ano, já ultrapassa os 11%.

“Entretanto, convém frisar que esse indicador está sob controlo, pois têm sido levados a cabo amplos esforços para contrair este quadro”, disse Manuel Vicente, na leitura do discurso do chefe de Estado, sublinhando que depois das crises petrolíferas anteriores, a resposta de Angola, em termos de políticas económica, financeira e cambial, foi agora mais eficaz.

“Neste momento, os indicadores macroeconómicos mostram-nos alguma estabilidade e perspectivas mais animadoras para o futuro, embora exijam uma continuidade do trabalho que tem sido desenvolvido até aqui”, afirmou.

As receitas fiscais petrolíferas representaram para Angola, até 2013, mais de 70% do total, valor que em 2014, segundo anunciado hoje, caíram para um peso de 35%, o que levou o Governo a cortar um terço de todas as despesas públicas que previa realizar em 2015.

“Acreditamos que este período de maior fragilidade económica nos fará olhar para o futuro de forma ainda mais ambiciosa, porque é com o surgimento de desafios que se conseguem os feitos mais audaciosos e esse é o caminho do progresso”, enfatizou Manuel Vicente, na leitura do discurso.

Foi ainda anunciado que os rácios de cobertura de importações de Angola (reservas em divisas) estão num nível “confortável”, garantindo entre “seis a sete meses” das necessidades de compras ao exterior.

Segundo Manuel Vicente, citando as palavras de José Eduardo dos Santos, em termos políticos a situação da nação “é estável”.

Isto apesar de haver “entidades estrangeiras interessadas em instalar o caos e a desordem nalguns países do nosso continente para provocar a queda de partidos políticos ou de dirigentes com os quais não simpatizam”.

Assim sendo, disse Manuel Vicente no seu papel de leitor das palavras do Presidente, “os angolanos nunca vão ceder perante quem quer que seja, sempre que se tratar da defesa dos interesses essenciais e vitais”.

Essenciais e vitais para quem? Isso é irrelevante.

Angola terá, eventualmente, eleições dentro de cerca de dois anos, e Manuel Vicente passou, ou tentou passar (sem grande êxito, acrescente-se) uma mensagem de tranquilidade, numa altura em que em Luanda e Lisboa se fazem manifestações e vigílias de apoio aos activistas detidos desde Junho, em Luanda, acusados de quererem derrubar o governo.

“Neste momento, convém sublinhar que a situação política do nosso país é estável. Registamos por isso com satisfação que, na generalidade, tem havido o cumprimento dos preceitos constitucionais e da lei”, lê-se no discurso feito com os olhos e os ouvidos centralizados no umbigo e, por isso, muito longe da realidade do país.

Manuel Vicente, sempre como megafone de Eduardo dos Santos, disse que “as entidades competentes estão vigilantes e têm tomado as providências necessárias para se evitarem ou repararem todos os actos que significam abusos de poder, violação dos direitos humanos ou do ordenamento jurídico”.

Num Parlamento digno desse nome, numa democracia, num Estado de Direito, a gargalhada teria sido geral e tão sonora que se ouviria nos países vizinhos. Mas como é em Angola, os acólitos ajoelharam-se e os opositores calaram-se. É que, ao que consta, rir pode significar rebelião e golpe de Estado.

O vice-presidente não se esqueceu de, como acontece todos os anos, de falar dos 195 projectos estruturantes de prioridade nacional, centrados no reforço do sistema de abastecimento de água e saneamento, cobertura eléctrica do país, plataformas logísticas e, entre outros, redes de estradas, hospitais e escolas, sublinhando que eles estavam a avançar e a melhorar as condições de vida dos angolanos.

Por outras palavras, nua nova Angola prometida há 40 anos e sucessivamente adiada. Por culpa, obviamente, dos opositores, a começar em Nito Alves e terminando em Luaty Beirão.

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