O Governo angolano vai financiar com um milhão e 250 mil euros (coisa pouca, é claro!) serviços de consultoria para apoiar (ensinar) o Ministério da Economia e Planeamento na elaboração do Plano de Desenvolvimento Nacional (PDN) de Angola.
Segundo o despacho presidencial, publicado em Diário da República, o contrato de prestação de serviços será feito através de um procedimento de contratação simplificada (ajuste directo, como em qualquer ditadura), tendo em conta “a necessidade e urgência de concepção e implementação deste importante instrumento de planeamento de âmbito territorial”.
O novo PDN, em teoria “um dos principais documentos de gestão de médio prazo do Governo de Angola”, irá abranger o quinquénio 2023-2027, após as eleições gerais de 24 de Agosto terem renovado (embora de forma fraudulenta) o mandato do actual Presidente angolano, general João Lourenço, e legitimado o programa de Governo 2022-2027.
O Velho Jeremias só sorri. Já não consegue chorar
Em 20 de Junho de 2018, o então ministro da Economia e Planeamento de Angola, Pedro Luís da Fonseca, afirmou que o Plano de Desenvolvimento Nacional (PDN) 2018-2022 tinha como “eixo nuclear o desenvolvimento do homem e o seu bem-estar”. O velho Jeremias, sentado num adobe à porta da sua cubata, numa sanzala do Huambo, sorriu. Já não conseguia chorar. Entretanto já morreu.
O posicionamento oficial foi expresso durante a cerimónia de apresentação pública do documento, que constitui (como centenas de outros que a propaganda nos impinge desde 1975) o principal instrumento de governação do executivo do general João Lourenço, e que suporta igualmente mais sete eixos ditos de “fulcrais” de desenvolvimento.
“Importa aqui relevar um dos eixos, por sinal o eixo nuclear, que é o do desenvolvimento humano e bem-estar, porque o PDN (2018-2022) está focado no homem angolano por se constituir o objecto e o sujeito do desenvolvimento”, disse o então ministro.
De acordo com o governante, o desenvolvimento humano e o bem-estar “é o eixo primordial” do plano porque nele “convergem as restantes macropolíticas de desenvolvimento neste período de cinco anos”.
“Para esse eixo concorrem outros eixos, como o do desenvolvimento económico, sustentável e inclusivo e das infra-estruturas necessárias para o crescimento económico. São eixos tão importantes focados no homem devido ao seu conjunto de necessidades que preconizamos satisfazê-las”, apontou.
O auxiliar do Titular do Poder Executivo (general João Lourenço) admitiu, na sua intervenção, a necessidade de criação de condições de financiamento para dar corpo ao PDN, sobretudo para a satisfação das necessidades das populações.
Necessidades das populações? Que necessidades? Estando o MPLA no governo desde 1975, ninguém acredita que as populações tenham necessidades. Desde logo porque, sejamos sérios, os nossos 20 milhões de pobres não integram a população angolana, a mortalidade infantil não é um problemas dos angolanos… do MPLA, a corrupção não é igualmente um problema angolano.
Para tal, acrescentou o auxiliar, o “Governo angolano vai prestar uma atenção particular ao sector da economia não petrolífera, por ser aquela que mais empregos garante”, e por isso o “que pode vir a reduzir a pobreza”.
Economia não petrolífera? Mas isso não foi já garantido há dezenas de anos pelo nosso primeiro “escolhido de Deus”? Será preciso dizer sempre que se vai fazer o que já foi feito? O MPLA/Estado bem poderia ser mais modesto, não querendo fazer sempre mais e melhor. Descansem um pouco. Cometam alguns erros para parecerem humanos.
“De forma sustentável pela via de emprego é este sector que vamos prestar mais atenção”, assegurou Pedro Luís da Fonseca (que depois de exonerado foi liderar o Conselho de Administração do Banco Económico), murmurando baixinho algo quase imperceptível que os mais cépticos traduziram por: “Olhai para o que dizemos e não para o que fazemos”.
O Executivo também prometeu dotar o Sistema Nacional de Ciência e Tecnologia e Inovação de um mecanismo de financiamento para que as instituições e actores singulares possam candidatar-se à execução de projectos, acções e actividades de suporte ao Plano de Desenvolvimento Nacional, como garantiu o nosso segundo “escolhido de Deus”.
O general João Lourenço adiantou que a falta deste mecanismo de financiamento tem sido um dos maiores constrangimentos da prática da investigação científica em Angola, onde se verifica uma falta gritante de quadros altamente qualificados e com experiência comprovada.
Fica bem, de vez em quando, ser também o Titular do Poder Executivo a “inventar” a pólvora. E para constatar o óbvio não é necessária muita investigação científica. Basta olhar para o que o MPLA prometeu ao longo de dezenas de anos e nunca cumpriu.
Recém-chegado ao poder (só lá está há… 47 anos) o MPLA descobre quase todos os dias pérolas. A de Angola precisar de mais qualidade nas instituições universitárias. Quem o diz foi – só podia ser – o general João Lourenço.
Estávamos em Outubro de 2016. Segundo o boletim oficial do partido, Jornal de Angola (JA), João Lourenço fez numa reunião com a comunidade académica de Luanda e Bengo o aviso de que o país “continua a exportar as suas riquezas em estado bruto para o exterior” (exportar para o exterior não está mal, não senhor), para depois comprar de volta os produtos transformados a preços exorbitantes.
Diante de milhares de académicos, segundo as contas do JA, o general João Lourenço pediu atenção à qualidade do ensino superior, numa altura em que existiam 24 instituições de ensino superior públicas e 40 privadas, surgidas num espaço de 14 anos. Até 2002, Angola tinha apenas uma única universidade pública, a Universidade Agostinho Neto, e duas privadas que, no total, formaram no mesmo período 62.407 quadros.
“Precisamos de encontrar o ponto de equilíbrio entre a necessidade da formação massiva de quadros que o país precisa e o rigor na qualidade desses mesmos quadros superiores”, disse João Lourenço, para acrescentar: “Devemos encorajar e promover a cultura de premiar o mérito no ensino, o mérito no trabalho e em tudo o que fazemos”. Na altura ainda não tinha aprendido a dizer se “haver” necessidade…
Ou seja, João Lourenço disse que os angolanos devem olhar para o que o MPLA diz mas não, é claro, para o que faz. Isto porque se no regime existisse de facto a cultura do mérito, muitos dos seus quadros, ditos superiores, estariam a apanhar minhocas.
O general disse na altura, continuamos a citar o boletim oficial, que o crescimento que o país vive na construção de estradas, caminhos-de-ferro, barragens hidroeléctricas, fábricas, portos e aeroportos, hospitais e fazendas agrícolas, deve ser acompanhado de formação de quadros que possam garantir a continuidade e manutenção dos projectos. “Apesar da maior necessidade que o país tem na formação de quadros é necessário assegurar a sua qualidade a todos os níveis de ensino”, disse João Lourenço.
O general João Lourenço recordou (numa manifesta passagem de um atestado de matumbez aos angolanos) que o MPLA sempre estabeleceu como prioridade a educação e o ensino nos seus programas de governação, através de atribuição de bolsas de estudo para países como Cuba, Rússia, Portugal, França, Reino Unido, Itália, EUA, Nigéria e Marrocos.
“Foram milhares os quadros angolanos superiores formados em diferentes áreas do saber nesses países e que hoje contribuem para o desenvolvimento do nosso país”, disse.