Empossado como terceiro (nenhum foi nominalmente eleito) Presidente da República de Angola a 26 de Setembro de 2017, João Lourenço prometeu logo em Novembro combater o ADN do seu partido, o MPLA. Isto é, a corrupção. Resultados procuram-se. Alguns, poucos, mostraram-se cépticos e afirmaram que era impossível haver em Angola jacarés vegetarianos. Foi o nosso caso. A cada dia que passa mais razão o Folha 8 tem.
“Sei que existem inúmeros obstáculos no caminho que pretendemos percorrer, mas temos de reagir e mobilizar todas as energias para que esse cumprimento se efective nos prazos definidos”, apontou João Lourenço.
De definidos os prazos passaram a indefinidos, e a corrupção continua a ser procurada à noite com a ajuda de um candeeiro… apagado. Há quem diga que deveria ser procurada à luz do dia. Mas isso não resulta. É que à noite, e às escuras, sempre é possível matar um gato bravo e dizer que é uma onça ou arranjar um passaporte de uma potencial corrupta (Isabel dos Santos) assinado pelo ”militante” do MPLA que dá pelo nome de Bruce Lee.
Seguiram-se dezenas de exonerações de quadros ligados a Eduardo dos Santos, substituídos por quadros ligados a João Lourenço, e depois exonerados e também substituídos por outros quadros próximos de João Lourenço e por aí fora. Tudo normal. O MPLA continua a defender a tese de “todos a monte e fé em que estiver no Poder”. Até porque o actual Presidente da República é um “produto” do MPLA e, por isso, também tem telhados de vidro.
A onda de exonerações deu a João Lourenço uma popularidade que não tinha antes de, mesmo com recurso à corrupção, ir apenas formalmente a votos. Popularidade mas sobretudo poder para, a preços de saldo, comprar a fidelização eterna de muitos dos que tinham (ele incluído) o mesmo tipo de fidelidade em relação a José Eduardo dos Santos.
Aliás, o general João Lourenço sempre foi um homem do sistema, do regime:
1984 – 1987: 1º Secretário do Comité Provincial do MPLA e Governador Provincial do Moxico; 1987 – 1990: 1º Secretário do Comité Provincial do MPLA e Governador Provincial de Benguela; 1984 – 1992: Deputado na Assembleia do Povo; 1990 – 1992: Chefe da Direcção Politica Nacional das FAPLA; 1992 – 1997: Secretário da Informação do MPLA; 1993 – 1998: Presidente do Grupo Parlamentar do MPLA; 1998 – 2003: Secretário-geral do MPLA; 1998 – 2003: Presidente da Comissão Constitucional; Membro da Comissão Permanente; Presidente da Bancada Parlamentar; 2003 – 2014: 1º Vice-presidente da Assembleia Nacional.
Foi publicado no início do último trimestre de 2017 o Decreto Presidencial 258/17, de 27 Outubro, que aprovou o Plano Intercalar do Governo, contendo as medidas de Política e Acções a empreender até à aprovação do Plano Nacional de Desenvolvimento 2018-2022. O Plano, destinado a vigorar até ao fim do primeiro trimestre de 2018, identificava 88 acções, em que as principais eram:
Controlo da Despesa Pública; Revisão da Lei das Parcerias Públicas e Privadas; Criação de Parcerias Público-Privadas nos investimentos em infra-estruturas e na oferta de bens e serviços essenciais; Ajustamento do Sector Público e Administrativo; Aumento das Taxas de Imposto sobre o consumo de bebidas alcoólicas, casas nocturnas, jogos e lotarias, produtos de luxo, com a possibilidade de alocar-se parte destas receitas para financiamentos de saúde pública.
E ainda: Criação do Núcleo de Implementação do IVA (Imposto sobre o valor acrescentado); Fortalecimento do Sector Financeiro implementando-se novos mecanismos de supervisão; Avaliação da vulnerabilidade de todos e cada um dos bancos comerciais; Promoção das exportações e substituição de importações.
Quanto à diversificação da Economia: Agricultura, Pescas, Hotelaria e Turismo, Construção, Indústria Transformadora e Serviços Mercantis; Crédito fiscal para actividades como a agricultura de média e grande escala e pesca; Redução das tarifas portuárias; Aprovação da Nova Pauta Aduaneira Harmonizada; Investimentos em Refinarias e Petroquímicas; Simplificação do processo de outorga de direitos de propriedade e títulos de imóveis.
Com essas acções a ideia/promessa era introduzir de forma imediata medidas de política económica, que alterassem positivamente as expectativas dos agentes económicos, gerassem credibilidade e confiança no novo Governo e conduzissem à estabilidade macroeconómica e instauração de um clima propício ao crescimento económico, à geração de emprego e à mitigação dos problemas sociais mais prementes do país.
O Plano foi definido a partir de um “diagnóstico da situação macroeconómica e social”, que avaliou os principais factores de influência sobre o crescimento económico, tais como a inflação, o sistema fiscal e as políticas monetária e cambial, a balança de pagamentos e o sector social.
O diagnóstico concluiu que, fruto de políticas monetárias e fiscais expansionistas ineficazes e de um mercado cambial segmentado e um sistema bancário, concentrado e ineficiente, a economia angolana atingira um estado de “quase estagflação”.
Estabilização macroeconómica, reunificação do mercado cambial, redução das taxas de inflação, potenciação e incentivo do investimento privado e melhoria dos indicadores sociais, foram os vectores de consolidação da Política Económica pretendida para o último trimestre de 2017 e 1.º de 2018 e a “receita” para o relançamento da economia do país.
A par destas acções, destacou-se a antevisão da necessidade de depreciação da Moeda Nacional que continuava sobrevalorizada face à taxa de câmbio real, o que gerando a sua apreciação em termos reais, reduzia a competitividade da economia nacional e era um constrangimento para o processo da diversificação da economia e das exportações.
Assim, o Plano preconizava um ajuste cambial eficaz a obter por via de uma combinação adequada de medidas que propiciem a desinflação, a redução do spread cambial entre os mercados primário e informal e a eliminação da sobrevalorização da Moeda Nacional. A opção foi por um regime cambial de flutuação, definida dentro de um intervalo, ao invés de um valor fixo, em que as bandas serão por um lado a inflação e por outro o nível das RLI (Reservas Líquidas Internacionais).
De assinalar também a indicação de que a melhoria do ambiente de negócios passaria pela elaboração da Política Migratória Nacional, incluindo um novo regime de concessão de vistos, que promovesse o investimento estrangeiro e a entrada de força de trabalho expatriada altamente qualificada. Neste âmbito, previa-se a criação de uma comissão visando avaliar a possibilidade de concessão do estatuto de Residente a todos os cidadãos expatriados com contratos de trabalho de duração superior a 12 meses.
Ainda neste particular, previa-se a implementação de Tribunais especializados para a resolução de litígios de natureza económica e financeira e o reforço da Procuradoria-Geral da República, Tribunal de Contas e AGT com recursos humanos especializados de combate ao crime económico e à corrupção.
O Plano Intercalar redefinia o papel do Estado na Economia e elegia as Parcerias Público-Privadas como meio privilegiado para assegurar o crescimento económico, em contrapartida da desaceleração do investimento do Estado na Economia e aumento do investimento pelo sector privado, alicerçado na concessão de crédito pelos Bancos Privados Comerciais, associado à concessão de benefícios fiscais e isenções tributárias.
A Execução do Plano ficou a cargo dos respectivos Ministérios e das Entidades reguladoras, com especial destaque para o BNA. E a prova de que em matéria de Economia e Finanças Públicas “todos os caminhos iam dar a Roma” é que das 88 acções, 58 foram retiradas do documento «Premissas para o OGE de 2018» do documento «Angola Caminhos Para o Futuro», do documento «Programa de Fomento e Diversificação de Exportações e Substituição de Importações» e do «Programa de Governação do MPLA 2017-2022».
As prioridades do re(i)gime
No dia 19 de Setembro de 2017, o Presidente inaugurou o Memorial à (suposta) vitória do (MPLA) da Batalha do Cuito Cuanavale, na província do Cuando Cubango. José Eduardo dos Santos descerrou a placa daquela infra-estrutura que simboliza a célebre batalha.
A infra-estrutura em forma de pirâmide, erguida num espaço de 3,5 hectares, é constituída por um monumento em memória aos soldados do MPLA que participaram nessa batalha, outro monumento dedicado à bandeira, um museu a céu aberto, com a exposição de equipamentos militares utilizados e capturados aos opositores durante a batalha, e a chama eterna do memorial.
No texto da adjudicação da obra era referido que o Governo angolano pretendia “conferir maior dignidade” ao local daquela batalha, “assim como facilitar o seu acesso à população, bem como homenagear todos aqueles que participaram da mesma”.
Todos os que participaram na batalha? Não. Segundo o regime do MPLA na batalha participaram, entre outros, angolanos bons e angolanos maus. Tal como ainda hoje divide a sociedade angolana. E, claro está, a homenagem era só para os angolanos bons, os das FAPLA, os do MPLA.
A batalha do Cuito Cuanavale foi considerada o maior combate militar em África após a segunda guerra mundial. A região insere-se no chamado “Triângulo do Tumpo”, considerado o ponto principal dos combates do Cuito Cuanavale.
O Governo do MPLA, que se declarou vencedor da batalha do Cuito Cuanavale, propôs em 2016, na reunião do conselho de ministros da Comunidade de Desenvolvimento da África Austral (SADC), a instituição de 23 de Março como Dia da Libertação da África Austral.
O Governo do MPLA, que está no poder desde 1975, continua a fazer de todos nós uns matumbos e, por isso, teima em mandar enxurradas de mentiras contra a nossa chipala. Em 2017, num país com 20 milhões de pobres, aprovou uma dotação de 2.240 milhões de kwanzas (12,3 milhões de euros) para pagar a conclusão do memorial sobre a histórica batalha do Cuito Cuanavale.
A rapaziada dirigente do MPLA (na sua maioria generais) continua a não tomar a medicação correcta para a sua crónica megalomania fantasista, ou anda a fumar coisas estranhas. Indiferentes aos 20 milhões de pobres, prepararam a fanfarra, os palhaços e os restantes bobos da corte para inaugurar o que chamam de “Memorial sobre a Vitória da Batalha do Cuito Cuanavale, província do Cuando Cubango”, em homenagem – dizem – à bravura dos heróis de 1988.
Este Memorial, tal como foi concebido e idolatrado pelos mercenários do MPLA, mais não é do que uma (mais uma) enorme mentira do regime e restantes malandros que, assim, continuam a tentar reescrever a história.
Não se sabe, embora eles saibam, onde é que o regime do MPLA (por sinal no poder desde 1975) quis e quer chegar ao construir monumentos que enaltecem o contributo dos angolanos que consideram de primeira (todos os que são do MPLA) e, é claro, amesquinham todos os outros.
Talvez fosse oportuno, e aí sim verdadeiro, construir um monumento aos milhares e milhares de vítimas do massacre que o MPLA levou a cabo no dia 27 de Maio de 1977.
Importa, contudo, desmistificar as teses oficiais que não têm suporte histórico, militar, social ou qualquer outro, por muito letrados que sejam os mercenários contratados para vender lussengue por jacaré. Apenas têm um objectivo: idolatrar uma mentira na esperança de que ela, um dia, seja vista como verdade.
Diz o Pravda do MPLA que a batalha do Cuito Cuanavale terminou “com uma retumbante vitória das FAPLA e das FARC (Forças Armadas Revolucionárias de Cuba)”. Importa por isso, ontem como hoje e amanhã, perceber o que leva o MPLA a comemorar esta batalha.
Visivelmente, o regime continua a ter medo da verdade e aposta na criação de focos de tensão na sociedade angolana, eventualmente com o objectivo de levar acabo uma das suas especialidades: massacres gerais (tipo 27 de Maio de 1977) ou selectivos como entre Janeiro de 1993 e Novembro de 1994, bombardeou indiscriminadamente a cidade do Huambo, a Missão Evangélica do Kaluquembe e a Missão Católica do Kuvango, tendo morto mais de 3.000 civis.
Sabendo que a UNITA considera ter vencido essa batalha, comemorá-la como se fosse uma vitória das forças do MPLA, russas e cubanas visa provocar a UNITA, para além de ser um atentado contra a verdade dos factos.
Além disso, é hábito do MPLA tentar adaptar a História às suas necessidades. Se alterar a História resultou parcialmente no passado, com a globalização e os trabalhos científicos que vão surgindo, não funciona. O regime ainda não aprendeu. Continua a seguir a máxima nazi de que se insistir mil vezes numa mentira ela pode ser vista como uma verdade. Mas não funciona.
A batalha do Cuito Cuanavale começou em Setembro de 1987, com uma ofensiva das forças coligadas FAPLA/russos/cubanos tentando chegar à Jamba. Um exército poderosamente armado, com centenas de blindados e tanques pesados, artilharia auto-transportada e outra, apoiado por helicópteros e aviões avançaram a partir de Menongue.
Depois da batalha, o General França Ndalu, veio dizer a um jornalista que o objectivo não era esse, mas sim cortar o apoio logístico à UNITA. O que é visivelmente uma fraca desculpa, porque o apoio logístico era feito de sul e do leste para a Jamba e nunca entre o Cuito Canavale e o rio Lomba.
Pela frente a coligação comunista encontrou a artilharia e a infantaria da UNITA (FALA), organizada em batalhões regulares e de guerrilha, apoiados por artilharia pesada das forças sul-africanas. Com o avolumar da ofensiva, a África do Sul colocou na batalha mais infantaria, blindados e helicópteros.
A batalha durou mais ou menos seis meses. As forças FAPLA/russos/cubanos, com dezenas de milhares de homens na ofensiva, não conseguiram passar do Cuito Cuanavale.
As consequências foram diversas. O exército cubano aceita retirar-se de Angola. A África do Sul aceita que a Namíbia ascenda à independência, desde que os seus interesses económicos não sejam tocados.
O MPLA aceita finalmente entrar em negociações com a UNITA (o que viria a acontecer em Portugal), aceita o pluripartidarismo, aceita as eleições.
E a UNITA, o que teve de ceder? Nada. Os seus bastiões continuaram intocados, nenhuma linha logística foi tocada, o seu exército não teve perdas, em homens e material, significativas.
Mais ou menos um ano mais tarde, e já na mesa das negociações, o MPLA tentará uma segunda ofensiva, de novo com milhares de homens, tanques, veículos, helicópteros e aviões. Foi a chamada operação “Ultimo Assalto”, e mais uma vez foi derrotado, desta vez sem os sul-africanos estarem presentes.
Em resumo, se houve vencedores, não foram as forças do MPLA e os seus aliados. Então o que comemora o MPLA? Nada a não ser o que a sua propaganda inventa.
Enquanto ministro angolano da Defesa, João Lourenço, homenageou o povo cubano no Triângulo de Tumpo, província de Cuando Cubango, pela sua permanente solidariedade e contribuição na vitória de Cuito Cuanavale.
“Agradeço em nome de todo o povo angolano ao povo cubano, pois nos momentos mais difíceis esteve sempre, ombro a ombro, com o povo angolano”, disse João Lourenço.
João Lourenço, hoje presidente nomeado, destacou a participação dos internacionalistas cubanos nas principais batalhas travadas no país, acrescentando que o povo cubano esteve na luta pela independência e defesa da soberania nacional, que lhe conferiu o direito natural de ser parte do diálogo quadripartido até aos acordos de Nova Iorque. Ou seja, o Presidente da República pode mudar, mas a filosofia da mentira continua a ser a grande máxima do regime. É caso para dizer que podem mudar as moscas mas que tudo o resto ficará na mesma.