O departamento de estudos económicos do Standard Bank considerou hoje que Angola está a enfrentar “severos ventos contrários” e apontou que a redução na produção petrolífera está a complicar a recuperação económica. Com que então… a descoberta do caminho, mesmo que mais se pareça com uma picada, para o paraíso que nos foi prometido por João Lourenço está em risco. Será que alguém se vai lembrar que, afinal, o Folha 8 já avisara há muitos meses?
“A economia angolana continua a enfrentar severos ventos contrários, contraindo 7,4% no segundo trimestre deste ano, depois de uma contracção de 4,7% no primeiro trimestre em termos homólogos”, escrevem os analistas.
Numa nota enviada hoje aos investidores, os analistas dizem que o Produto Interno Bruto (PIB) deste ano “parece estar encaminhado para cair mais do que os 0,1% do ano passado e os 2,6% de 2016”.
“Dada a tendência de declínio na produção de petróleo, que caiu para 1,54 milhões de barris diários em Março e 1,43 milhões em Junho, de uma média de 1,66 em 2017, isto não devia constituir uma surpresa”, argumentam os economistas do Standard Bank.
“A redução na produção de petróleo é um factor fundamental que está a complicar a recuperação económica e a normalização da oferta de moeda estrangeira no país”, concluem.
A recessão que se verifica em Angola desde 2016 agravou-se no primeiro semestre deste ano, em que a actividade económica teve uma quebra média de 6,05%, de acordo com os dados do Instituto Nacional de Estatística (INE) divulgados na semana passada.
Na nota de imprensa sobre a evolução do PIB (toda a riqueza produzida no país), com base em dados do Departamento de Contas Nacionais e Coordenação Estatística, a actividade económica caiu 4,6% no primeiro trimestre do ano, e agravou a queda para 7,4% no segundo trimestre face aos trimestres homólogos do ano passado, resultando numa quebra semestral de 6,05%.
Houve uma queda de 7,4% no PIB no segundo trimestre face ao período homólogo de 2017, uma quebra motivada sobretudo por sectores como as pescas (-10,0%), indústria transformadora (-8,8%), extracção e refinação de petróleo (-8,4%) e extracção de diamantes e outros minerais (-6,1%).
Trata-se da terceira quebra homóloga (-7,4%) no PIB mais acentuada no histórico disponibilizado pelo INE, desde 2010, apenas ultrapassada pela queda de 11,33% no quarto trimestre de 2015 e pela descida de 7,55% no terceiro trimestre de 2016.
No ano passado, de acordo com o INE, o segundo maior produtor de petróleo na África subsaariana registou uma contracção na actividade económica de 0,1%, o que contrasta com as previsões do Fundo Monetário Internacional feitas há uma semana, no `World Economic Outlook`, que apontavam para uma contracção de 2,5% no ano passado e de 0,1% este ano.
Neste contexto, importa reter que já não falam só, como prometia João Lourenço sempre que se sentava à mesa dos financiadores para pedir mais e mais fiado, em variações de crescimento. A recessão voltou ao léxico da realidade. O Governo ainda se mostra alérgico em adoptar essa palavra e, sobretudo, o que ela significa.
De facto, Isabel dos Santos (mas não só) deve estar-se a rir quando lê que o baixo desempenho do sector do petróleo continua a ser um problema para a economia, com a produção petrolífera em baixa, investimento abaixo do potencial e condições de operação desafiantes, apesar dos preços do petróleo estarem mais favoráveis desde o princípio do ano.
Por outras palavras, a guitarra até está afinada mas os nossos tocadores não têm unhas para a tocar. E, como se isso não bastasse, alguns tentam tocá-la com as unhas dos pés… sem descalçarem os sapatos Louis Vuitton comprados em Londres ou em Nova Iorque e que, depois do alarido exonerativo de João Lourenço, já saíram do armário e voltaram à ribalta dos areópagos políticos internacionais.
Para 2019, os analistas esperam um crescimento de 2,4%, divergindo das mais recentes previsões do FMI, que estimou uma ligeira recessão de 0,1% este ano e um crescimento de 3,1% em 2019.
A negociação de um acordo com o FMI, que o ministro das Finanças disse durante os Encontros Anuais do FMI e Banco Mundial que deverá estar concluída até final do ano, “é encarada como um desenvolvimento importante para ajudar a acelerar as reformas estruturais e melhorar o sentimento dos investidores”.
Para o Standard Bank, houve duas grandes reformas este ano com o potencial de estimular o investimento: a aprovação da nova lei de investimento privado e a criação da Agência Nacional do Petróleo e Gás.
No que diz respeito à evolução da produção de petróleo, a principal fonte de receita para Angola, estima-se que Angola vá bombear 1,54 milhões de barris por dia, o que representa uma redução de 5,5% face aos níveis de 2017, ano em que Angola produziu 1,63 milhões de barris diários.
“As estimativas preliminares mostram que a melhoria dos preços contribuiu para um aumento de 21% nas receitas de exportação no ano passado, para 31 mil milhões de dólares, e estimamos que este número suba 30% este ano, para 40 mil milhões de dólares, o que representa 96% do total das exportações”, vincam os analistas do Standard Bank.
O Governo deverá apostar numa melhoria do défice orçamental deste ano, de 5,3% em 2017 para 3% este ano, “o que é consistente com a necessidade de restabelecer a estabilidade macroeconómica”.
O Standard Bank antecipa um empenho do Governo no aumento da cobrança de impostos, “alargando a base e introduzindo novos impostos, como é o caso da implementação faseada do IVA a partir de 2019”.
O acordo de financiamento de 4,5 mil milhões de dólares por parte do FMI “deve ajudar a implementar as necessárias reformas, já que mais consolidação orçamental é imperativa para a estabilidade macroeconómica”, dizem os economistas do Standard Bank.
Mais uma vez se torna claro que estas previsões servem para tudo e mais alguma, desde logo porque num espaço curto de tempo dizem tudo e o seu contrário.
Hoje falam de recessão para este ano mas, em Fevereiro, consideravam que Angola iria crescer 1,2% este ano e que a expansão económica não ultrapassaria os 2% “nos próximos tempos”, acrescentando que as previsões governamentais “são optimistas”.
“O Orçamento do Governo para 2018 mostra que o Produto Interno Bruto permaneceu em território positivo em 2016, com um crescimento de 0,1%, evitando a recessão que todos consideravam que tinha ocorrido, tal como indicado pelos dados do Instituto Nacional de Estatística, que mostrava uma contracção de 4,3% até Setembro”, escrevem os analistas.
“A nossa visão é que a actividade económica vai muito provavelmente ficar limitada, com o Produto Interno Bruto a crescer menos de 2% nos próximos tempos”, segundo um relatório do Standard Bank.
No documento, que analisa os números recentes e as perspectivas de evolução da economia angolana, os analistas dizem que “apesar de uma melhoria na previsão de evolução dos preços do petróleo, a procura agregada vai provavelmente continuar a ser negativamente influenciada pela necessidade de manter uma política monetária restritiva para combater a subida da inflação e acomodar as alterações desejadas para o mercado da moeda externa”.
As limitações na diversificação também deverão pesar negativamente na economia, com o sector petrolífero a continuar exposto às fracas condições de operação e as quotas da Organização dos Países Exportadores de Petróleo a restringirem também a produção petrolífera.
Angola espera aumentar a produção de petróleo em 6% entre 2018 e 2023 para 1,6 milhões de barris por dia, mas isto “requer um impressionante nível de investimentos para acrescentar 536 mil barris por dia à capacidade de produção dos campos em declínio, que retiram 635 milhares à capacidade actual.
Este cenário ilustra a necessidade de imprimir mais diversificação na economia, o que parecia ser uma grande prioridade para o novo Governo, mas o país está a ver que é difícil diminuir a dependência do petróleo, cujas exportações continuam a valer mais de 90% do total.
Folha 8 com Lusa