PARA FRANCÊS VER…

Álvaro Daniel, secretário-geral da UNITA, maior partido da oposição que o MPLA (ainda) permite em Angola, considerou hoje, em Luanda, que o Presidente da República (general João Lourenço) ao ter negado que o país está a viver uma crise institucional “seria motivo bastante para a impugnação do seu mandato”. Sim, seria exequível se Angola fosse o que não é, um Estado de Direito.

O secretário-geral da UNITA, Álvaro Daniel, falava na conferência de imprensa de lançamento das comemorações do 57.º aniversário da UNITA, a assinalar-se no próximo dia 13.

O político referia-se à crise no sistema judicial do reino do MPLA (vulgo Angola), mais concretamente no que diz respeito às lideranças do Tribunal de Contas (TdC) e Tribunal Supremo, citados em várias notícias da prática de corrupção, peculato, tráfico de influência, entre outros crimes.

“O país tem, sim, uma crise institucional sem precedentes, pois na tentativa de sanar a crise moral no Tribunal de Contas, o Titular do Poder Executivo teve uma interferência imprudente, nos termos constitucionais, ao forçar a demissão da veneranda juíza conselheira presidente do Tribunal de Contas”, referiu Álvaro Daniel.

Recorde-se que, provavelmente graças à miopia e estrabismo do Presidente do MPLA, por falta de meios de comunicação social no reino, o general João Lourenço foi obrigado a dar uma entrevista à rádio francesa RFI, na qual rejeitou a existência de uma crise institucional no país, quando questionado sobre a situação nesses dois tribunais, reconhecendo, entretanto, haver problemas no Tribunal de Contas e investigações que decorrem no Tribunal Supremo.

“Uma crise institucional no país é muito forte dizer isso, forte demais”, disse João Lourenço. E se ele o disse, a sua corte de eunucos subscreveu e, por isso, ele acha-se detentor da verdade.

A presidente demissionária do TdC, Exalgina Gambôa, apresentou a demissão na quarta-feira ao Presidente da República com conhecimento ao Conselho Superior da Magistratura Judicial, um dia após ser constituída arguida por crimes de extorsão, peculato e corrupção, num processo onde consta também o seu filho Hailé Vicente da Cruz, igualmente arguido.

Na segunda-feira, o general João Lourenço anunciou que convidou Exalgina Gambôa a renunciar ao cargo em 21 de Fevereiro devido a várias “ocorrências” que a envolviam, mas a juíza só se demitiu dois dias depois, após ter pedido jubilação antecipada e ter sido constituída arguida.

“O nosso país, sob regime do partido que governa há quase 48 anos, vive uma grave crise moral nas lideranças dos tribunais superiores”, afirmou o secretário-geral da UNITA. Errado. O MPLA, que comprou o reino em 1975 aos portugueses, nunca viveu uma crise moral porque, como todos os angolanos (escravos ou não) sabem, nunca teve moral. E, portanto, não pode haver crise em algo que não se tem.

Segundo Álvaro Daniel, “em países realmente democráticos de direito, este acto do Presidente João Manuel Gonçalves Lourenço seria motivo bastante para a impugnação do seu mandato”.

Para o secretário-geral da UNITA, “Angola enfrenta uma crise económica endémica para a qual o actual executivo não consegue encontrar soluções e manifesta-se surdo às opiniões de outras sensibilidades, como académicos, políticos e empresários”.

Para a UNITA, está instalada uma “crise de ausência de vontade política da parte do regime do Presidente João Lourenço, que se reflecte na recusa da institucionalização das autarquias locais”.

“O expediente da dita nova divisão político-administrativa é um absurdo e manobra dilatória que visa atirar para o esquecimento as autarquias locais”, considerou.

Para assinalar os 57 anos de existência do partido, as comemorações têm início hoje e termina no dia 31 deste mês, estando prevista a realização do V congresso da Juventude Unida Revolucionária de Angola (JURA), ala juvenil do partido, um ‘workshop’ sobre a trajectória de luta do partido e uma reflexão sobre o projecto político do Movimento, criado a 13 de Março, base do seu programa de sociedade.

Muangai, a UNITA , a crítica e o elogio

A 13 de Março de 1966, um grupo de nacionalistas liderado por Jonas Malheiro Savimbi, começou a escrever uma importante parte da história de Angola. Será que a UNITA não enterrou, depois da morte de Savimbi, o espírito que deu corpo ao que se decidiu no Muangai? A dúvida, ou incerteza, permanece. Como acontece com o MPLA, também a corte dos eunucos da UNITA não tem dúvidas.

Pouco, ou nada, adianta hoje continuar a defender que a UNITA deve ser salva pela crítica e não assassinada pelo elogio. Apesar disso, temos um compromisso moral com a memória o que nos leva a recordar que Jonas Savimbi dizia: “A UNITA, tal como Angola, não se define – sente-se”.

Foi no Muangai, Província do Moxico. Daí saíram pilares como a luta pela liberdade e independência total da Pátria; Democracia assegurada pelo voto do povo através dos partidos; Soberania expressa e impregnada na vontade do povo de ter amigos e aliados primando sempre os interesses dos angolanos.

Resultaram também a defesa da igualdade de todos os angolanos na Pátria do seu nascimento; a busca de soluções económicas, priorização do campo para beneficiar a cidade; a liberdade, a democracia, a justiça social, a solidariedade e a ética na condução da política.

Alguém, na UNITA, se lembra de quem disse: ”Eu assumo esta responsabilidade e quando chegar a hora da morte, não sou eu que vou dizer não sabia, estou preparado”?

Alguém se lembra de que, como estão as coisas, nunca será resgatado o compromisso de Muangai firmado em 13 de Março de 1966?

A UNITA mostrou até agora, é verdade, que sabe o que é a democracia e adoptou-a definitivamente. Tê-lo-á feito de forma consciente? Temos algumas dúvidas, sobretudo depois das manipulações e vigarices eleitorais e do medo de reagir, sem temor, ao facto de ter ganho as últimas eleições e acabar de joelhos e aceitar ser derrotada.

Adalberto da Costa Júnior, tal como antes Isaías Samakuva, mostrou ao mundo que as democracias ocidentais estão a sustentar um regime corrupto e um partido que quer perpetuar-se no poder. E de que lhe valeu isso?

Agora estamos a ver que ao Ocidente basta uma UNITA mais ou menos submissa para dar um ar democrático à ditadura do MPLA. Aliás, por alguma razão o Ocidente não reage às vigarices, às fraudes protagonizadas pelo MPLA. E não reage porque não lhe interessa que a democracia funcione em Angola. É sempre mais fácil negociar com as ditaduras.

Se calhar, em função do que se está a passar em diversas partes do Mundo, as perspectivas estão a mudar. Quem sabe se, um dia destes, também não vamos ver as ruas de Luanda cheias de gente de barriga vazia a exigir que o dono do país parta de vez.

Jonas Malheiro Savimbi dirigiu a Resistência contra o expansionismo russo-cubano e o mono-partidarismo. Mas foi uma dura batalha.

Aos 16 de Outubro de 1992, Jonas Savimbi, em nome da UNITA aceitou os resultados das eleições para evitar o impasse e o regresso a guerra. Mas como as maquinações no sentido de voltar a impor o cenário de 1975/76 tinham amadurecido, o MPLA pôs em marcha a sua estratégia de genocídio politico-tribal, massacrando dirigentes e quadros, assaltando e espoliando todo o património da UNITA.

Jonas Malheiro Savimbi tinha uma visão clara e convicta da dinâmica da sociedade e da necessidade de se ajustar a prática política à evolução inevitável da história.

Foi ele o único dirigente nacionalista angolano que circunscreveu nos ideais do seu Movimento, aquando da sua fundação em 1966, a democracia assegurada pelo voto do Povo através de vários partidos políticos. Impregnado deste valor, Jonas Savimbi, lutou com ele contra o colonialismo e o exclusivismo do sistema monopartidário.

Folha 8 com Lusa

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