A consultora Oxford Economics Africa considerou hoje que o aumento da inflação em Angola, em Abril face ao mês anterior, vai acentuar-se na segunda metade deste ano, embora abaixo dos níveis historicamente altos dos últimos anos.
Escrevem os analistas, num comentário à evolução dos preços no reino do MPLA, que “ao contrário da maior parte do resto do mundo, Angola registou uma sólida desinflação no ano passado, e baixou as suas taxas de juro, principalmente devido a um fortalecimento da moeda nacional no ano passado, em comparação com 2021, e um declínio geral nos preços mundiais dos alimentos desde Maio de 2022”.
“O kwanza, no entanto, tem depreciado nos últimos trimestres devido à queda global dos preços do petróleo, e prevemos que vá continuar a depreciar-se para 568,5 kwanzas por dólar no final de 2023”, lê-se.
No comentário, enviado aos clientes, o departamento africano da Oxford Economics considera que “o impacto desta desvalorização vai começar a mostrar-se numa inflação moderadamente mais alta no segundo semestre deste ano, ainda que bem melhor que o aumento de preços de 21,3% em 2021 e 12,1% em 2022”, escrevem os analistas.
Segundo as mesmas fontes, o abrandamento da inflação vai sustentar um corte na taxa de juro directora, que “deverá chegar ao final deste ano nos 15,5%”.
A inflação em Angola voltou a descer em Abril em termos homólogos, para 10,59%, mas registou uma variação mensal de 0,92%, a mais elevada dos últimos doze meses, segundo dados do Instituto Nacional de Estatística.
O Índice de Preços no Consumidor Nacional (IPCN) registou uma variação de 0,92% entre Março e Abril de 2023, sendo necessário recuar a maio de 2022 para encontrar uma variação mais acentuada (0,93%).
Quanto às classes de consumo, a Saúde foi a teve o maior aumento de preços (1,91%), destacando-se também os aumentos dos preços verificados nas classes Vestuário e Calçado” (1,55%), Bens e serviços diversos (1,45%) e Hotéis, Cafés e Restaurantes (1,22%).
A classe Alimentação e bebidas não alcoólicas foi a que mais contribuiu para o aumento do nível geral de preços com 0,53 pontos percentuais durante o mês de Abril, seguindo-se as classes Bens e Serviços Diversos, com 0,10 pontos percentuais, Saúde, com 0,07 pontos percentuais e Vestuário e Calçado com 0,06 pontos percentuais, enquanto as restantes classes tiveram contribuições inferiores a 0,06 pontos.
A variação homóloga situou-se em 10,59%, um decréscimo de 15,20 pontos percentuais face à observada no mesmo período do ano anterior.
Comparando a variação homóloga atual com a registada no mês anterior verificou-se uma desaceleração de 0,22 pontos percentuais, enquanto em termos mensais se notou uma aceleração de 0,02 pontos.
Morrer da doença ou da cura?
O resultado mais imediato da desvalorização do kwanza é o aumento dos preços. Uma moeda fraca é uma moeda sem circulação monetária fora das fronteiras de Angola, longe de afectar exclusivamente os preços dos bens e serviços importados, afecta também todos os preços internos, inclusive dos bens produzidos nacionalmente. A razão é óbvia: se a moeda enfraquece face a outras moedas congéneres estrangeiras, isso significa, por definição, que passa a ser necessário ter uma maior quantidade de moeda nacional para adquirir o mesmo bem ou serviço importado.
Bens produzidos nacionalmente também encarecem, pois as indústrias produtoras utilizam bens e serviços importados ou, no mínimo, peças importadas. Uma simples empresa que utiliza computadores e precisa continuamente de comprar peças de reposição vivenciará um grande aumento de custos.
Pior ainda: os preços dos alimentos são directamente afectados pela desvalorização da moeda. Com a desvalorização do Kwanza, no mercado internacional, a aquisição de petróleo, café, bananas, diamantes, etc. ficou muito mais barata para os estrangeiros com moeda mais forte.
Consequentemente, as empresas e produtores angolanos dessas matérias-primas passaram a vendê-las em maior quantidade para o mercado externo, gerando uma diminuição da sua oferta no mercado interno e um aumento dos seus preços pela escassez de bens e serviços em Angola.
A desvalorização cambial mexe com toda a estrutura de preços da economia, aumentando a taxa de inflação, reduz o poder de compra dos consumidores, gera aumento das taxas de juro do banco central, encarecendo o preço do dinheiro na banca comercial, entre outras consequências directas e indirectas.
Qualquer moeda é antes de tudo um meio de troca, substituindo a troca directa de bens por bens, como era feita há muitos séculos. É através da moeda corrente que permite os cálculos de custos e proveitos de projectos e investimentos.
Sendo o Kwanza uma moeda de circulação fechada, instável, sendo das moedas que mais caiu em valor, influencia negativamente a vontade de investir num país com este critério depreciativo.
Quando investidores investem — principalmente os estrangeiros —, eles estão, na prática, a comprar um fluxo de renda ou lucro futuro. Para que investidores (nacionais ou estrangeiros) invistam capital em actividades produtivas, eles têm de ter um mínimo de certeza e segurança de que terão um retorno positivo.
Mas se a unidade de conta é diariamente distorcida e desvalorizada, se a sua definição é flutuante, há apenas incerteza no lado do investidor, independentemente da sua origem. Se um investidor não faz a menor ideia de qual será a definição da unidade de conta no futuro (sabendo apenas que seu poder de compra certamente será bem menor), o mínimo que ele irá exigir serão retornos altos num curto espaço de tempo, também por isso os preços e margens aplicadas em Angola terão que ser necessariamente maiores para compensar possíveis desvalorizações da moeda.
E há outro factor: uma moeda estável cria as condições necessárias para a transferência de conhecimento. O conhecimento acompanha o investimento: o capital estrangeiro vem acompanhado de conhecimento estrangeiro.
Se um país desvaloriza continuamente a sua moeda, ele está a dar um sinal claro aos investidores estrangeiros: mantenham o vosso capital e conhecimento noutros países.
O máximo a que um país de moeda fraca pode aspirar é utilizar para fins de curto prazo o capital puramente especulativo (o chamado “hot money”).
Um país de moeda forte e estável envia um sinal bem diferente ao mundo: “tragam o vosso dinheiro; mandem para cá os vossos especialistas; construam as vossas fábricas aqui; ensinem-nos tudo o que vocês sabem; e riqueza que vocês criarem aqui voltará para vocês multiplicada e numa moeda que mantém o seu valor”.
E é exactamente por isso que uma moeda forte e estável é indispensável para o crescimento económico. Quando a moeda é estável, investidores têm mais incentivos para se arriscar e financiar ideias novas e ousadas; eles têm mais disponibilidade para financiar a criação de uma riqueza que ainda não existe. O investimento em tecnologia é maior. O investimento em soluções ousadas para a saúde é maior. O investimento em infra-estruturas é maior.
Quando a moeda é instável — ou passa por períodos de forte desvalorização, os investidores preferem refugiar-se em investimentos tradicionais e mais seguros, como títulos do governo, ouro, etc.. Neste cenário, não há segurança para investimentos de longo prazo, que são os que mais criam riqueza.
É exactamente por isso que, em países cuja moeda tem histórico de alta desvalorização, (alta inflação de preços), são raros os investimentos vultosos de longo prazo. É por isso que, em países cuja moeda tem histórico de alta desvalorização, os juros são altos. É por isso que, em países cuja moeda tem histórico de alta desvalorização, os bens produzidos são de baixa qualidade. É por isso que, em países cuja moeda tem histórico de alta desvalorização, as pessoas são mais pobres.
Segundo alguns economistas, a desvalorização do câmbio é o segredo para impulsionar a indústria e o sector exportador de qualquer país.
Ao desvalorizar-se o câmbio, segundo eles, as exportações são estimuladas e, liderada por um aumento nas exportações, a indústria volta a produzir e, por conseguinte, toda a economia volta a crescer.
O primeiro grande problema é que, no mundo globalizado em que vivemos, vários exportadores são também grandes importadores. Para fabricar, com qualidade, os seus bens exportáveis, eles têm de importar máquinas e matérias-primas de várias partes do mundo. Uma mineradora e uma siderúrgica têm de utilizar maquinaria de ponta para fazer seus serviços. E elas também têm de comprar, continuamente, peças de reposição. O mesmo vale para qualquer indústria.
Se a desvalorização da moeda fizer com que os custos de produção aumentem – e irão aumentar -, então o exportador não mais terá nenhuma vantagem competitiva no mercado internacional.
Folha 8 com Lusa