TIROS DA PGR SÃO DE PÓLVORA SECA

A Procuradoria-Geral da República (PGR) de Angola tentou interrogar (ou até mesmo deter) Isabel dos Santos, filha do ex-Presidente angolano, nos Países Baixos, ao que esta não acedeu, tendo abandonado o país.

“Tivemos conhecimento de que Isabel dos Santos estava na Holanda. Mediante carta rogatória, solicitámos que fosse notificada da sua qualidade de arguida e fosse interrogada”, disse uma fonte judicial.

O Jornal de Negócios (de Portugal) avançou, na quarta-feira à noite, que a justiça angolana tentou deter a empresária nos Países Baixos, em Junho, o que a PGR negou.

“Em nenhum momento se requereu detenção ou prisão”, indicou a fonte da PGR, informando que Isabel dos Santos, ao ser abordada pelas autoridades “não aceitou a notificação, nem audição, tendo abandonado o país”.

Na quarta-feira, o Procurador-Geral da República, general Hélder Pitta Gróz, recebeu, no Palácio da Justiça, o embaixador do Reino dos Países Baixos, Tsjeard Roelf Hoekstra, tendo sido abordados assuntos no domínio da justiça, numa ocasião em que o Procurador saudou “a excelente relação existente entre os dois países”.

Hélder Pitta Gróz assegurou, segundo um comunicado da PGR, “que os fluxos financeiros ilícitos têm sido veementemente combatidos, com medidas assertivas de recuperação de activos ilicitamente retirados do erário” e considerou que o reforço da cooperação internacional e a capacitação de quadros são “as grandes prioridades institucionais”.

A filha do antigo Presidente angolano, José Eduardo dos Santos, está na mira da justiça angolana e de outros países há vários anos, tendo as suas contas bancárias e participações sociais em várias empresas sido alvo de arresto.

Em Dezembro de 2019, o Tribunal Provincial de Luanda decretou o arresto preventivo de contas bancárias pessoais de Isabel dos Santos, do marido, o congolês Sindika Dokolo (entretanto falecido), e do português Mário da Silva, e de várias empresas nas quais a empresária detém participações sociais, por alegados negócios que terão lesado o Estado angolano. Foram também arrestadas participações relativas a várias empresas em Portugal.

Em Janeiro de 2020, o Consórcio Internacional de Jornalismo de Investigação revelou, também, mais de 715 mil ficheiros, sob o nome de ‘Luanda Leaks’, que detalham alegados esquemas financeiros da Isabel dos Santos e do marido, que lhes terão permitido retirar dinheiro do erário angolano através de paraísos fiscais.

Isabel dos Santos considera ser vítima de um “ataque com motivação política” e sustenta, por isso, que não terá um julgamento justo nem garantias de segurança pessoal se voltar a Angola para se defender das acusações. De facto, quem conhecer minimamente a (in)competência e a (in)dependência da PGR tem todos os motivos para dar razão a Isabel dos Santos.

Segundo a PGR de Angola, correm contra Isabel dos Santos vários processos de natureza cível e criminal, em que o Estado reivindica valores superiores a cinco mil milhões de dólares (4,8 mil milhões de euros).

“MPLA Leaks”? Só noutra era…

Apesar das revelações do ‘Luanda Leaks’, os problemas em Angola continuam por resolver. O general Hélder Pitta Gróz não… nem sai de cima. Navega ao sabor das instruções do Presidente do MPLA, João Lourenço, e diz que sim, não, talvez, antes pelo contrário, todavia…

“Raramente um bilionário caiu tanto e tão depressa; mas em Angola e noutras partes do mundo, os males sistémicos que a investigação ‘Luanda Leaks’ trouxe para a ribalta – corrupção, a saída de riqueza para centros ‘offshore’ e uma indústria de dinheiro sujo que cria e acelera o roubo de nações inteiras – continua largamente por resolver”, lê-se num texto de Will Fitzgibbon, coordenador das parcerias em África e no Médio Oriente do Consórcio Internacional de Jornalismo (dito) de Investigação (ICIJ) e publicado em Dezembro de 2020.

Agora só falta mesmo festejar com uma cabidela o fabrico de dinheiro voador, condecorando a Presidente do Tribunal de Contas Exalgina Gamboa, a cientista que inventou esse tipo de dinheiro ao transferir milhões da conta bancária do Tribunal de Contas de Angola para a conta bancária do filho, em Portugal,.

Anos depois da revelação de documentos que lhes caíram no colo, a “investigação” (no caso sinónimo de divulgação) jornalística conhecida por ‘Luanda Leaks’, e que incidiu principalmente (sem que quase ninguém tivesse estranhado) sobre os negócios da empresária Isabel dos Santos, o ICIJ usa as palavras da activista Laura Macedo para concluir que “os ‘Luanda Leaks’ foram uma lufada de ar fresco que entraram pela janela”. É pena que se esqueçam que Angola é uma casa sem janelas, em muitos casos até mesmo sem… paredes.

Apesar disso, o coordenador do ICIJ para África elogiou João Lourenço (pudera!) por ter agido rapidamente do ponto de vista judicial contra antigos responsáveis do Governo anterior, mas lamentou que seja “menos receptivo ao auto-exame”. E que tal alguém perguntar ao ICIJ se nos documento que recebeu não constam sobejas informações e provas relativas a João Lourenço, então vice-presidente do MPLA e ministro da Defesa do pai de Isabel dos Santos, José Eduardo dos Santos?

A queda da filha do antigo Presidente José Eduardo dos Santos, afirma-se, foi “cataclísmica”, tendo em conta que Isabel dos Santos “chegou a jantar com presidentes de empresas globais e posou em carpetes vermelhas com presidentes, príncipes e com a elite de Hollywood”, deu entrevistas (algumas por encomenda) a impolutos “jornalistas” (de “investigação”?) estrangeiros, “mas depois o seu círculo privado e as empresas relacionadas estão sob investigação criminal em vários países, estando impedida de aceder a activos avaliados em centenas de milhões de dólares e entre os seus principais investimentos, foi forçada a ceder o controlo em três companhias, pelo menos sete foram bloqueadas no âmbito dos processos judiciais e outra está em falência”.

Os advogados, conselheiros e contabilistas “afastaram-se depois de assinarem as auditorias e gizado estratégias de contorno de pagamento de impostos”, e as “reportagens” do ICIJ mostraram como os conselheiros profissionais nas nações ocidentais tornaram possível que Isabel dos Santos desviasse a riqueza do seu país para contas pessoais.

O jornalista Will Fitzgibbon citou, na altura, a directora da Transparência Internacional em Portugal para sustentar que ainda há muito por resolver, e não só em Angola. Isto, é claro se alguém tiver coragem de, como fez o Folha 8, dizer que quem viu (como João Lourenço) roubar, ajudou a roubar e beneficiou do roubo é… ladrão.

“Os ‘Luanda Leaks’ foram a chave para o aumento do activismo anticorrupção em Angola e trouxeram nova atenção para os contabilistas e outros que foram cúmplices no desvio sistemático de fundos públicos para ganho privado”, considerou Karina Carvalho, acrescentando: “Mas também vejo a continuidade das estruturas de poder que impedem a devolução dos activos roubados ao povo angolano e protegem os lucros da lavagem da dinheiro e da evasão fiscal; estes facilitadores têm uma parte da responsabilidade pelas pobres condições de vida, incluindo fome e morte que afectam milhões de pessoas em todo o mundo”. Vinte milhões são angolanos.

Para levar a bom termo o seu desiderato de poder unipessoal, João Lourenço, justa ou injustamente, está a ser acusado de ter comprado, subornado, corrompido, a nata do MPLA, nomeadamente os seus deputados, através de mordomias e avenças por baixo da mesa. Desta forma, a corrupção passou de endémica a sistémica (faz parte do sistema), alojando-se no centro da maioria do poder legislativo.

Enquanto uma sociedade sã faz aumentar a riqueza e dessa forma diminuir a exclusão, que se sustenta na corrupção em geral e na sistémica e particular, não cria riqueza mas apenas ricos. É exactamente o que se passa no nosso país. Quando agentes públicos e privados, todos gravitando na esfera do MPLA/Estado, desviam milhões e milhões de dólares destinados à saúde, educação, saneamento, habitação e infra-estrutura, estão a trabalhar para os poucos que têm milhões e não para os milhões que têm pouco… ou nada. A corrupção está incrustada em nossa sociedade há 46 anos.

A perseguição cega de castigar, prender e discriminar (alguns) dos ricos que estavam do lado de José Eduardo dos Santos esquecendo os demais, atenta contra a estabilidade de emprego de milhões e afasta investimentos externos, avessos à instabilidade interna e à balbúrdia bancária. Mais grave em tudo isso é querer-se enveredar para uma reforma, tendo a corrupção no epicentro, amedrontando-se o dinheiro.

Quando um regime amedronta o dinheiro a corrupção passa a actuar, com mais intensidade no submundo, atentando contra todos os direitos da maioria. Por outro lado, reconheça-se ser a actual estratégia (considerando ser estratégia) do presidente João Lourenço, a melhor forma de, honestamente, se dar razão ao músico e activista irlandês, Bob Geldof, quando, no dia 06.05.2008, em Lisboa disse: “Angola é um país gerido por criminosos. As casas mais ricas do mundo estão na baía de Luanda, são mais caras do que em Chelsea e Park Lane. Angola tem potencial para ser um dos países mais ricos do mundo, com potencial para influenciar as decisões da China. Estamos (os cidadãos europeus) a poucos quilómetros de África, como podemos não nos questionar?”

Hoje quando a indignação aponta que os corruptos e demais ladroagem está concentrada num único partido (o MPLA), apresentado como o que têm mais ladrões por metro quadrado no mundo, isso significa, ser exímio o projecto de João Lourenço, para num futuro próximo, talvez, nas próximas eleições gerais, os povos, não continuem a votar, num bando de criminosos ou numa quadrilha, que diante da imparcialidade, não haverá lugar, nas fedorentas masmorras do próprio regime.

Folha 8 com Lusa

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