O especialista do sector da energia, Miguel Artacho, director de conferências internacionais da Energy Capital & Power, defende que a crise energética na Europa está a acelerar o desenvolvimento da indústria do gás e a criar mais oportunidades para Angola e para os produtores de petróleo e gás da África Subsaariana. A serem aproveitadas, essas oportunidades vão originar mais milhões para os mesmos de sempre, o MPLA, e mais pobres entre o Povo.
Em entrevista à Lusa, Miguel Artacho, diretor de conferências internacionais da Energy Capital & Power, que organiza a conferência e exposição Angola Oil & Gas, destacou que a segurança energética ganhou importância crucial devido à guerra na Europa e advogou uma transição energética justa para África, onde “a fome mata mais do que o aquecimento global”. Não está mal. É, aliás, fácil ter a barriga cheia e debitar palpites sobre os milhões que a têm vazia.
A 3ª edição da Angola Oil & Gas acontece entre 29 de Novembro e 1 de Dezembro é organizada pela Energy Capital & Power, juntamente com parceiros como o Ministério dos Recursos Minerais, Petróleo e Gás (Mirempet), Associação Nacional de Petróleo, Gás e Biocombustíveis (ANPG) e o Instituto Regulador dos Derivados do Petróleo, e traz a Luanda dezenas de especialistas, responsáveis das multinacionais mundiais e decisores políticos para debater o futuro desta indústria. Debater o futuro é, de facto, importante. Sobretudo para os que têm futuro. Para os outros, para os milhões em que o próprio presente é passado, bastaria um prato de fuba… no futuro que nunca terão.
O responsável do evento realçou que este acontece numa altura muito importante para Angola, num contexto pós-pandemia e em que os preços do petróleo estão em alta, lembrando que o sector da energia que representa mais de 95% das exportações, continua a ser estratégico para a economia angolana, apesar da orientação do executivo (do MPLA) que há 47 anos promete diversificar a economia.
Miguel Artacho frisou também que a crise da energia na Europa e as mudanças geopolíticas desencadeadas pela guerra entre Rússia e Ucrânia estão a obrigar todos os países a reavaliar, dizemos nós, os seus tão ambiciosos quanto falaciosos objectivos face à transição energética.
“Países como a Alemanha, que era altamente dependente do gás natural russo, e outros como países da Europa de Leste, tiveram de despertar para as necessidades de diversificar as suas fontes de gás natural devido às sanções que foram impostas”, notou.
O que oferece oportunidade não só para Angola, um dos maiores produtores de petróleo da África Subsaariana que tem também (para além do aumento do número de pobres que já é superior a 20 milhões) em curso grandes projectos na área do gás, como o Angola LNG, mas também para outros produtores africanos como a Nigéria, Guiné Equatorial, República do Congo, que assistem a um renovado interesse dos antropófagos internacionais nas suas capacidades para abastecer os mercados mundiais com gás natural.
Não será no imediato, admite Miguel Artacho, já que o défice de gás russo está a ser compensado pelos países mais avançados em termos de infra-estruturas e `pipelines` como os EUA, Qatar e Argélia.
“Mas não quer dizer que outros países como Angola não venham também a beneficiar, já que esta situação vem transformar radicalmente a possibilidade desses países se industrializarem. Mesmo países que não tinham terminais de LNG, como a Alemanha, aceleram drasticamente o ritmo das construções para concretizar essas infra-estruturas e Angola está preparada para atrair investimentos”, considerou o responsável, acrescentando que “o sector energético da África Subsaariana e a indústria do gás natural, em particular, estão num momento muito crítico em que podem ajudar o mundo a melhorar a segurança energética”.
Miguel Artacho, mostrando que em matéria de Angola é um especialista no achatamento polar das batatas, apontou algumas vantagens comparativas de Angola, entre as quais um governo pró-negócio, estabilidade política (só contaram para ele) e segurança enquanto outros grandes produtores tiveram problemas de `force majeure` (eventos extraordinários que não obrigam a compensação) ou insegurança, como raptos e roubos.
“Desde o início que o Governo de João Lourenço tem promovido iniciativas para reorganizar o sector de petróleo e gás e promover maior transparência e eficiência. Acho que há um enorme interesse e potencial para novos investimentos, não só no petróleo e gás, mas em todo o sector da energia, incluindo as renováveis”, realçou, lembrando que operam em Angola todos os grandes predadores (ele fala em operadores) do sector, como a Chevron, Exxon, Total Energies, e a nova Azule, `joint venture` da italiana Eni e a britânica BP, bem como outros `players` como a norueguesa Equinor e, claro, a petrolífera do MPLA, Sonangol.
Quanto ao ritmo da transição energética, defendeu que “não podem ser os europeus e os americanos a dizer a África o que deve fazer”, criticando alguma “hipocrisia”.
“Muitos países europeus estão a queimar mais carvão do que nunca. A Alemanha pôs em funcionamento uma série de centrais térmicas que usam lignite, o tipo de carvão mais poluente”, afirmou, acrescentando que não pode haver dois pesos e duas medidas.
“Temos de ter uma transição energética flexível e igualitária, ou seja, é importante que os países produtores de petróleo e gás mudem para energias mais limpas e sustentáveis, mas devem fazê-lo ao mesmo tempo que dão resposta a grandes problemas como a pobreza. A fome mata mais do que o aquecimento global”, disse, assinalando que os EUA e o Reino Unido se industrializaram à custa da queima de combustíveis fósseis, tal como a China, um dos grandes responsáveis pelas emissões de gases com efeito de estufa.
Enquanto isso, na África Subsaariana 600 milhões de pessoas não têm acesso a energia.
“Não estou a dizer que devem fazer a mesma coisa, mas é importante perceber que a tecnologia de petróleo e gás melhorou muito, e que o gás pode ser uma das fontes de energia com tecnologias mais eficiente em termos de custos e menos poluente”, salientou Miguel Artacho.
Para o responsável do Angola Oil & Gás, os produtores africanos de petróleo e gás não estão numa posição de fornecer energia aos seus países só com a solar e a eólica: “Não é prático, é impossível. Mas não significa que não haja espaço para isto. Há excelentes projectos na área solar em Angola e potencial também no hidrogénio, ainda que numa fase inicial”.
Quanto ao ambiente de negócios, admitiu que “Angola não é perfeita”, mas está no caminho certo. Isto significa que o MPLA deve continuar a trabalhar para os poucos que têm muitos milhões e não, como nos últimos 47 anos, para os muitos milhões que têm pouco ou… nada.
“É uma economia emergente. Há corrupção em toda a África Subsaariana, mas há esforços para continuar a promover a transparência, a apoiar a estabilidade económica e previsibilidade e continuar a trabalhar com as companhias que estão cá e que estão interessadas no sucesso a longo prazo deste sector e que têm o capital e conhecimento que podem ajudar Angola a desenvolver-se, integrando conteúdo local, promovendo a angolanização. É isso que precisa de ser feito para alcançar o máximo potencial”, rematou.
Folha 8 com Lusa