PELO SIM E PELO NÃO… BAJULAÇÃO

O Presidente cabo-verdiano, José Maria Neves, considerou hoje Angola como um exemplo da “África não submissa” desejado para o futuro do continente, apostando no reforço das relações bilaterais na visita de Estado que a partir de domingo realiza a Luanda.

“Angola tem uma perspectiva destemida, é a África não submissa que nós queremos para o futuro e, portanto, esta visita tem um forte valor simbólico e sobretudo pelo facto de ser o primeiro país também que visitarei enquanto Presidente da República”, destacou José Maria Neves, em declarações aos jornalistas na Praia.

O Presidente da República de Cabo Verde, José Maria Neves, que pertence ao PAICV, Partido Africano da Independência de Cabo Verde, partido irmão do MPLA, realiza de 9 a 12 de Janeiro uma visita de Estado a Angola, a primeira deslocação do género ao exterior desde que assumiu funções.

“Angola desempenha um papel de ‘player’ na região da África austral, na África central e em todo o continente africano e na CPLP (Comunidade de Países de Língua Portuguesa)”, destacou José Maria Neves.

De acordo com uma nota anterior da Presidência da República cabo-verdiana, trata-se da “primeira visita de Estado” de José Maria Neves a um país terceiro e “vem efectivar o convite efectuado” pelo Presidente angolano, João Lourenço, um dos chefes de Estado presentes na tomada de posse do Presidente cabo-verdiano, em Novembro passado.

“Uma visita extremamente importante, é a primeira visita de Estado que faço ao exterior, a Angola, um país africano, mas também que preside à Comunidade dos Países de Língua Portuguesa e vai ser um momento de reforço das relações de amizade e de cooperação entre Cabo Verde e Angola”, destacou hoje José Maria Neves.

Do programa da visita consta um encontro de José Maria Neves com o Presidente de Angola, João Lourenço, na segunda-feira, 10 de Janeiro, no Palácio Presidencial, seguido de uma declaração conjunta à comunicação social que, presume-se, não esteja limitada aos jornalistas escolhidos pelo MPLA.

“Há aqui enormes potencialidades. Angola já tem investimentos importantes em Cabo Verde no domínio da banca, no domínio das telecomunicações, no domínio dos combustíveis. Queremos alargar para outros sectores designadamente os transportes aéreos e marítimos, e também a questão do turismo e do ensino superior, ciência e inovação e toda a área da reforma do Estado e da Administração Pública”, descreveu José Maria Neves.

Ainda na segunda-feira, o chefe de Estado cabo-verdiano vai ser recebido na Assembleia Nacional de Angola, também em Luanda, numa sessão plenária extraordinária em alusão à visita.

“Esta visita será também uma oportunidade para falar ao Parlamento angolano e através do Parlamento ao povo angolano sobre a necessidade que todos temos de reforçarmos a cooperação entre os nossos países nestes tempos de pandemia”, afirmou, garantindo que a deslocação a Luanda representa um “sinal forte” para o “reforço” das “relações de amizade e de cooperação” entre Cabo Verde e Angola.

“Tem um forte simbolismo. Angola é um país muito amigo de Cabo Verde, com o qual, reafirmo, temos a intenção de reforçar e elevar o patamar das relações entre os dois países”, disse.

Durante a visita a Luanda está também previsto um encontro de José Maria Neves com a comunidade cabo-verdiana radicada em Angola.

“Nós precisávamos levar mais Cabo Verde a África e mais África a Cabo Verde. A zona de livre comércio que está em implementação [em África] precisa de ser efectivamente implementada, acelerada, para aumentarmos as trocas entre os países africanos. Isso é essencial é um pilar fundamental na construção do futuro do continente”, assumiu.

Integram a comitiva do Presidente cabo-verdiano representantes dos partidos políticos com assento parlamentar, nomeadamente do Movimento para a Democracia (MpD) e do Partido Africano da Independência de Cabo Verde (PAICV), bem como das duas câmaras de comércio do arquipélago.

“Queremos que haja mais parcerias, queremos um pouco que Angola transforme Cabo Verde numa plataforma de negócios nesta região e seria, portanto, importante essa troca”, apontou o chefe de Estado.

José Maria Neves, antigo primeiro-ministro (2001 a 2016) pelo PAICV (actualmente na oposição), tomou posse em 9 de Novembro de 2021 como quinto Presidente da República de Cabo Verde, após vencer na primeira volta as eleições presidenciais cabo-verdianas de 17 de Outubro.

E que tal ensinar ao MPLA o que é Democracia?

O Presidente da República de Angola elogiou a superação de barreiras e limitações naturais de Cabo Verde, considerando a nação, “bem-sucedida”. Será que João Lourenço sabe que, em Cabo Verde, o seu homólogo é nominalmente eleito, por exemplo? Ou que o Produto Interno Bruto de Angola é substancialmente superior ao de Cabo Verde, mas este país está 42 posições acima de Angola?

Setembro de 2016. Às sétimas eleições autárquicas concorreram seis partidos políticos e cinco grupos de cidadãos independentes, totalizando 57 candidatos à presidência das câmaras.

Tudo isto significa duas coisas. Por um lado que no país, ao contrário de Angola, há eleições autárquicas. Por outro que, ao contrário de Angola, os presidentes suspendem o seu mandato assim que anuncia a recandidatura ao cargo.

O empresário e filantropo Mo Ibrahim afirmou em 2019 estar “muito surpreendido” com as mudanças políticas em Angola implementadas (consta) por João Lourenço. Bastou ao jacaré dizer que era vegetariano e ele (como muitos outros) acreditou. Ninguém cuida em verificar se, no remanso do seu esconderijo, ele não continua a ser carnívoro. É assim que se “elegem” os ditadores.

Vejamos o Índice Ibrahim de Boa Governação Africana 2018. A governação global dos países africanos continuava, em geral, numa numa trajectória ascendente, mas o progresso estava a ser impulsionado por um grupo de 15 entre 54 países, indicava o referido relatório em que Angola estava em 45º lugar, dando sinais preocupantes.

Entre os países lusófonos, Cabo Verde continuava a ser aquele com melhor classificação, tendo inclusive subido novamente ao terceiro lugar, sendo apenas superado pelas Ilhas Maurícias (79,5 pontos) e Seicheles (73,2 pontos).

O segundo país lusófono mais bem classificado é São Tomé e Príncipe, em 12.º lugar, reflectindo um progresso ligeiro, seguindo por Moçambique, que, apesar do 25.º lugar, é considerado também estar em deterioração acelerada.

Em 42.º lugar, a Guiné-Bissau mostrava uma melhoria significativa, mas Angola, em 45.º, dava (continua a dar) sinais preocupantes, e a Guiné Equatorial, no 48.º, revelava que a tendência negativa desde 2008 se acentuou nos últimos anos.

O relatório concluía que os principais factores da governação pública são um equilíbrio entre as dimensões de governação e um “foco mais forte na responsabilidade, nos direitos dos cidadãos e no bem-estar social”.

Outra dedução feita é que a dimensão da economia não determina a governação, pois o Produto Interno Bruto (PIB) de Angola é substancialmente superior ao de Cabo Verde, mas este país está 42 posições acima dos angolanos.

“Os factores mais associados a pontuações elevadas de governação são centrados no cidadão, evolvendo direitos sólidos de propriedade, direitos e liberdades civis, um governo responsável e um serviço público eficiente, além de políticas voltadas para redes de segurança social e meio ambiente”, referem os autores.

Relatório do Índice Ibrahim

Eis, na íntegra e para que o Departamento de Informação e Propaganda do MPLA, a ERCA do MPLA, a PGR do MPLA, o Governo do MPLA, não venham falar de “notícias falsas”, o relatório do Índice Ibrahim de Boa Governação Africana 2018:

«O Índice Ibrahim de Governação Africana (IIAG) de 2018, publicado hoje pela Fundação Mo Ibrahim, realça que o progresso da governação pública está a perder terreno em relação às necessidades e expectativas de uma população em crescimento, composta sobretudo por jovens.

Em média, ao longo da última década, a Governação Global manteve uma trajectória ascendente moderada, com três em cada quatro cidadãos africanos (71,6%) a viverem num país em que a governação melhorou.

Os governos africanos não conseguiram converter o crescimento económico em melhorias no Desenvolvimento Económico Sustentável para os seus cidadãos

Desde 2008, a classificação média africana em termos de Desenvolvimento Económico Sustentável aumentou 0,1 pontos, o equivalente a apenas 0,2%, apesar de um aumento continental do PIB de quase 40% durante o mesmo período. Não se têm praticamente registado progressos na criação de Desenvolvimento Económico Sustentável, o que significa que esta se mantém como a categoria com pior desempenho e progresso mais lento do Índice. Analisando a medida em que os governos possibilitam aos seus cidadãos a prossecução de objectivos económicos e prosperidade nos mesmos, a tendência de quase estagnação do Desenvolvimento Económico Sustentável traça um contraste preocupante com o crescimento demográfico e as expectativas dos jovens. A população africana aumentou 26% nos últimos 10 anos e 60% dos 1,25 mil milhões de habitantes do continente têm agora menos de 25 anos.

Os países africanos apresentam divergências de desempenho crescentes em termos de Governação Global. O progresso continental é impulsionado sobretudo por 15 países que conseguiram acelerar o seu ritmo de evolução nos últimos cinco anos. O progresso é mais notável na Costa do Marfim, em Marrocos e no Quénia. Esta divergência também se reflecte nas variações de resultado do Desenvolvimento Económico Sustentável. Embora 27 países de África tenham demonstrado alguma melhoria, em 25 países, que representam 43,2% dos cidadãos africanos, o desempenho em termos de Desenvolvimento Económico Sustentável piorou nos últimos 10 anos.

Não existe uma forte correspondência entre a dimensão da economia de um país e o seu desempenho em termos de Desenvolvimento Económico Sustentável. Em 2017, quatro dos 10 países com o PIB mais elevado do continente continuam a classificar-se abaixo da média africana em termos de Desenvolvimento Económico Sustentável e permanecem na metade inferior das tabelas, nomeadamente a Argélia, Angola, a Nigéria e o Sudão. Ao mesmo tempo, duas das mais pequenas economias do continente, Seicheles e Cabo Verde, alcançam as 5.ª e 6.ª posições mais elevadas na prestação de Desenvolvimento Económico Sustentável aos seus cidadãos.

A trajectória da classificação africana média em termos de Ambiente Comercial merece atenção especial. Com uma deterioração de quase -5,0 pontos nos últimos dez anos, esta é uma tendência preocupante tendo em conta que, para os próximos dez anos, se prevê um crescimento de quase mais 30% no número de africanos em idade activa (15-64 anos).

Tal crescimento aumentará a procura de emprego num contexto em que o progresso médio do Desenvolvimento Económico Sustentável é quase inexistente. Estes números demográficos criam um contraste ainda mais acentuado com a queda de -3,1 pontos na Satisfação com a Criação de Emprego desde 2008.

Além disso, o indicador que mede a Promoção da Integração Socioeconómica dos Jovens regista um declínio continental médio de -2,3 pontos na última década.

Há motivos adicionais para preocupação com a Educação. Embora o Desenvolvimento Humano seja uma das maiores histórias de sucesso do IIAG 2018, fruto das melhorias na Saúde, a estagnação do progresso na Educação a que se assistiu no Índice do ano passado converteu-se agora em declínio.

Para 27 países, as pontuações em termos de Educação registaram deterioração nos últimos cinco anos, o que significa que, para mais de metade (52,8%) da população jovem africana, os resultados em educação estão a piorar. Esse declínio é motivado por uma queda nos indicadores que avaliam a medida em que a Educação atende às necessidades da economia, a qualidade da educação e as expectativas dos cidadãos quanto ao ensino.

A Participação e Direitos Humanos tem progredido em média. Quase quatro em cada cinco cidadãos africanos (79,6%) vivem em países que progrediram nesta dimensão ao longo da última década. Porém, as eleições executivas “livres e justas” nem sempre se traduzem num ambiente participativo melhor. É alarmante que o espaço político e cívico dos cidadãos africanos esteja a diminuir, com tendências de agravamento nos indicadores que medem a Participação da Sociedade Civil, os Direitos e Liberdades Civis, a Liberdade de Expressão e a Liberdade de Associação e Reunião.

Embora a Segurança Pessoal e a Segurança Nacional continuem a apresentar um declínio médio ao longo da última década, o Estado de Direito e a Transparência e Responsabilização começaram a registar um progresso positivo. O Estado de Direito é a subcategoria do IIAG que regista a maior melhoria ao longo dos últimos cinco anos. O desempenho africano médio em termos de Transparência e Responsabilização também evoluiu, embora seja necessário fazer mais, já que continua a ser a subcategoria com pior desempenho do Índice.

O IIAG realça que os direitos e o bem-estar dos cidadãos são essenciais para o progresso da governação pública. As pontuações de Governação Global estão fortemente correlacionadas com as medidas centradas nos cidadãos, incluindo os direitos de propriedade, os direitos e liberdades civis, a responsabilização na governação e as políticas de bem-estar social.

Os resultados do IIAG confirmam ainda que o Estado de Direito e a Transparência e Responsabilização são pilares fulcrais da boa governação. Essas duas subcategorias apresentam as relações mais fortes com as pontuações de Governação Global em África, sendo o desempenho forte nestas áreas a componente mais comum nos países com bom desempenho. A Transparência e Responsabilização está também fortemente relacionada com a categoria Desenvolvimento Económico Sustentável e a subcategoria Ambiente Comercial, o que indica que as melhorias nestas áreas ajudarão ao progresso e ao desenvolvimento de oportunidades económicas em África.

Mo Ibrahim, Presidente da Fundação Mo Ibrahim, afirmou:

“Saudamos o progresso na Governação Global, mas a oportunidade perdida da última década é profundamente preocupante. África tem um enorme desafio por diante. A sua grande e jovem força de trabalho potencial pode transformar o continente para melhor, mas esta oportunidade está prestes a ser desperdiçada. Os dados são evidentes: os cidadãos jovens de África precisam de esperança, perspectivas e oportunidades. Os seus dirigentes têm de acelerar a criação de emprego para sustentar o progresso e impedir a deterioração. O momento de agir é agora.”»

Folha 8 com Lusa

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