MÉDICOS UNIDOS PELA (NOSSA) SAÚDE

Médicos angolanos, em greve desde 21 de Março, saíram hoje às ruas de Luanda, para manifestarem a sua insatisfação devido ao posicionamento do Governo no decurso das negociações. Posição que, aliás, está no ADN do MPLA: A razão da força, custe o que custar.

Em duas horas, os médicos percorrem algumas ruas da capital, até à Ordem dos Médicos de Angola, onde reiteraram o compromisso de realizarem manifestações, todos os sábados, até que as suas exigências sejam atendidas pela entidade patronal.

Em declarações à Lusa, a vice-presidente do Sindicato Nacional dos Médicos de Angola (Sinmea), Domingas Mateus disse que a greve correu bem e teve a adesão esperada.

A classe médica angolana submeteu em 2021 um caderno reivindicativo ao Ministério da Saúde, no qual exigem melhoria salarial, de condições sociais e de trabalho, tendo o Governo solicitado 90 dias, depois de alguns dias de paralisação dos serviços, para atender às solicitações, contudo, o prazo expirou e nada foi resolvido, tendo os médicos retomado a greve por tempo indeterminado.

Segundo Domingas Mateus, na manifestação de hoje os médicos reiteram a manutenção da greve “e que se quiserem cortar os salários, que cortem”. E, já agora, se quiserem despedir, despeçam. Se quiserem matar…

Na quarta-feira da semana passada, a ministra da Administração Pública, Trabalho e Segurança Social, Teresa Dias, anunciou no final de uma ronda de negociações que o Governo vai suspender os salários dos médicos grevistas, porque “cumpriu com os pontos do caderno reivindicativo”.

“Não se vai processar os salários das pessoas que estiverem em greve, porque já houve bastante tolerância do Governo, vamos preparar outras forças e aí onde estiver em falta vamos encaixar, porque é a vida do cidadão que está a ser posta em causa”, referiu a ministra, argumentando que a decisão tem fundamento legal pelo facto destes, à luz da Lei da Greve, estarem com o vínculo jurídico-laboral suspenso após declararem a greve.

Domingas Mateus disse que na manifestação ficou o compromisso de prosseguir com as manifestações todos os sábados, “com um grosso nas ruas”. “Desde vigílias, marchas, cada sábado teremos um tipo de manifestação”, sublinhou.

A sindicalista realçou que desde o último encontro entre as partes, na quarta-feira, não houve qualquer contacto, suspeitando que a esta altura o Governo deve já ter-se apercebido que os médicos não vão desistir da greve.

“Inclusive temos a assembleia dos médicos marcada terça-feira, já que as decisões devem ser em assembleia”, frisou a vice-presidente do Sinmea, avançando que foram convidados representantes dos ministérios da Saúde e da Administração Pública, Trabalho e Segurança Social, para ouvirem “a voz dos próprios médicos”.

“Eles já foram convidados a estarem presentes, porque eles pensam que é apenas a direcção do sindicato e eles precisam ver que não é uma decisão da direcção do sindicato, são os médicos no geral, e vamos mostrar isso em assembleia”, acrescentou.

A dirigente do Sinmea destacou que com a ameaça o Governo “conseguiu um efeito contrário”: “Queriam amedrontar, mas só conseguiram despertar a ira e os médicos querem mostrar isso em assembleia”.

De acordo com Domingas Mateus, a assembleia terá como ponto único uma decisão face às ameaças do Governo, “se os médicos estão realmente dispostos a perder os salários a favor à greve ou se vão recuar”.

Durante a manifestação, os médicos solicitaram que fossem também paralisados os serviços mínimos até agora assegurados durante a greve, tendo em conta a intenção do Governo em suspender os salários.

“Os médicos que ficaram estão aborrecidos, eles solicitam que se pare tudo já que não se vai pagar ordenados, não há trabalho nenhum. Outros ainda solicitam que se for para continuar a manter os serviços mínimos, que seja reduzida a força de trabalho de 25% para 10%. Todas essas sugestões serão apresentadas e avaliadas em assembleia”, frisou.

Recorde-se que o presidente do Sinmea, Adriano Manuel, disse que os médicos estão a ser ameaçados pelo Governo “única e simplesmente por reivindicarem condições de trabalho”. Talvez seja, antes, por (ainda) estarem… vivos.

Para Adriano Manuel, o posicionamento, na quarta-feira, do Governo de Angola demonstra que “não valoriza a classe médica (…) e acima de tudo não valoriza o povo angolano”. Não é bem assim. O Governo valoriza e reconhece o povo angolano que é do MPLA. Quanto aos outros, são apenas uma nova espécie de escravos E se antes foi o tempo dos contratados e escravos ovimbundus ou bailundos irem para as roças do Norte, seguindo-se o enxovalho (mesmo que mitigado e maquilhado) dos que tiveram, e têm, de transportar pedras à cabeça para ter “peixe podre, fuba podre… e porrada se refilarem”, agora é a dos médicos que, como Sílvio Dala, são mortos nas esquadras do regime.

O dirigente sindical realçou que o primeiro caderno reivindicativo foi apresentado à entidade patronal (Governo/Estado/MPLA) em 2018 e três anos depois um outro com o mesmo conteúdo, e até à presente data não têm visto “vontade por parte do Governo em melhorar as condições de trabalho”.

“O que nós estamos a pedir não é muito. Para terem ideia, um glucómetro, aparelho para medir a quantidade de açúcar no organismo, na Europa é um aparelho que é oferecido nas farmácias, o Governo não é capaz de colocar isso nos nossos hospitais”, contou o médico.

Durante as negociações, segundo Adriano Manuel, o Governo alegou falta de dinheiro para o aumento salarial, tendo os médicos sugerido algumas fontes de financiamento, entre as quais um seguro de saúde obrigatório, que não foi aceite, bem como o pedido de subvenção a medicamentos de doenças crónicas.

“A chantagem que o Governo está a fazer na classe médica nós não vamos aceitar, vamos preferir perder esses trabalhos, ainda que para isso morramos de fome. Se com esse objectivo nós vamos salvar a vida de milhares de angolanos, nós vamos fazer”, disse.

Adriano Manuel sublinhou que a posição da entidade patronal só veio “activar a ira da classe médica”, repetindo que enquanto não houver aumento salarial e melhoria de condições de trabalho, a greve vai continuar.

“Nós temos um plano que vamos começar a realizar agora, a partir de amanhã [sábado] vamos fazer uma série de manifestações que não vão parar, vamos ter a primeira amanhã, o próximo sábado, a segunda, vamos ter a terceira, a quarta e a quinta, que vamos denominar o êxodo da população médica para Luanda, todos os médicos das províncias de Angola virão para Luanda para a manifestação”, informou.

Folha 8 com Lusa

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