É FARTAR VILANAGEM!

João Lourenço, Presidente da República de Angola e recandidato pelo MPLA, para além de Titular do Poder Executivo, aprovou, em vésperas de o executivo entrar em gestão corrente, 230 milhões de euros de créditos não orçamentados, dos quais mais de metade para investimentos em Benguela, Luanda e Namibe. Merece bem o Prémio Nobel da vilanagem política.

Os créditos adicionais suplementares estão contemplados em decretos presidenciais publicados no Diário da República de 23 de Julho.

Em causa está o pagamento de despesas relacionadas com os projectos do governo provincial do Namibe, despesas de apoio ao desenvolvimento e do Programa de Investimento Público do governo provincial de Luanda e despesas relacionadas com os projectos de funcionamento e investimentos da província de Benguela.

Num outro decreto presidencial, o Presidente da República autorizou a abertura do crédito adicional suplementar no montante de 35 mil milhões de kwanzas (80 milhões de euros) para as despesas inerentes à concessão de subsídios a preços de produtos da cesta básica no âmbito da operacionalização da Reserva Estratégica Alimentar (REA).

Num outro diploma, João Lourenço, que se recandidata a um novo mandato e iniciou em 24 de Julho a campanha para as eleições de 24 de Agosto, autorizou a despesa para a contratação, por ajuste directo, de serviços de manutenção dos equipamentos de inspecção não intensiva da Administração Geral Tributária, no valor de 301 milhões de kwanzas (684 mil euros).

O objectivo é controlar o tráfego internacional de mercadorias, prevenir a evasão e fraude fiscal, bem como o tráfego ilícito de mercadorias.

É ISTO UM PRESIDENTE DA REPÚBLICA?

O líder do MPLA, Presidente da República de Angola, Titular do Poder Executivo e Comandante-em-Chefe das Forças Armadas, João Lourenço, usou no passado dia 23 de Abril, em Cabinda, metáforas futebolísticas para aludir aos seus adversários na corrida eleitoral, avisando os partidos que têm de estar preparados para marcar golos. Reeditou os cinco a zero de 2017 e os saltos de gazela de 2022.

Num discurso que durou uma hora e meia, sob um calor intenso que provocou alguns desmaios entre os muitos que acorreram ao Estádio Municipal do Tafe, o presidente do MPLA e cabeça-de-lista do partido às eleições apregoou obras e êxitos e reiterou o empenho do executivo do MPLA, no poder há 46 anos, que lidera desde 2017, em “corrigir o que está mal”, deixando também alguns recados à oposição “arruaceira” que, segundo o MPLA, tem a mania de dizer que Angola é o que não é: um Estado de Direito Democrático.

“Vamos ter eleições agora em Agosto. Os partidos políticos que se preparem, nós estamos a preparar-nos, fizemos um primeiro treino para o jogo na cidade de Ondjiva (Cunene) e continuamos a treinar aqui em Cabinda. Quem não está a preparar-se que não diga depois que quem ganhou, ganhou por que o árbitro facilitou. Os árbitros não marcam golo, quem marca golo são os jogadores, se o jogador não marca golo, o árbitro não pode inventar”, disse na parte final do discurso.

“Que cada partido faça o seu trabalho e que ganhe o melhor”, complementou João Lourenço, ciente de que o campo é do MPLA, a bola é do MPLA, o árbitro é do MPLA, o Vídeo Árbitro (VAR) é do MPLA e que as regras permitem que o MPLA jogue com o dobro dos jogadores.

Durante a longa intervenção, João Lourenço deu números e detalhes exaustivos sobre as obras realizadas no actual mandato, focando os recentes trabalhos no hospital e terminal marítimo em Cabinda, colónia onde fez várias inaugurações nas vestes de Presidente de Angola.

As deslocações do Presidente às províncias, onde tem promovido também acções de campanha na qualidade de líder do MPLA, têm sido alvo de críticas por parte do principal partido da oposição, a UNITA, que acusa o chefe de Estado de usar as inaugurações para promover o partido.

Cerca de 60.000 pessoas terão estado no comício em Cabinda, multidão que, no entanto, não preenchia o recinto, com vários espaços vazios que deixaram à vista o estado degradado do tartan da pista da infra-estrutura desportiva. Luís Fernando, assessor de imprensa do MPLA/Presidente, deve ter feito outras contas sendo, por isso, de crer que estiveram presentes (os dedos não chegam para tantas contas) ou 600 mil ou 6 milhões de pessoas…

Entre os vivas a João Lourenço também se escutavam alguns apupos, enquanto alguns faziam um sinal de negação, expressando discordância com o discurso do senhor DDT (Dono Disto Tudo).

O deputado da UNITA Raul Tati denunciou na altura que o comício contou com militares recrutados as FAA e disfarçados de civis, funcionários públicos e alunos de escolas que disponibilizaram autocarros para transportar populares do interior da província. Tudo normal.

O deputado disse que esta é uma prática antiga em que os funcionários públicos são coagidos “com pressão psicológica” e os alunos “intimidados” com ameaças de falta ou reprovação em caso de ausência no acto de massas.

João Lourenço concentrou parte do seu discurso no suposto desenvolvimento de Cabinda, que disse encontrar-se “em franco desenvolvimento”, elogiando o facto de ter as ruas asfaltadas e não ter encontrado “nenhum buraco” durante o passeio nocturno que fez.

Justificou que, por vezes, o avanço das obras está condicionado pela negociação “nem sempre fácil” de linhas de crédito, já que nem todas são suportadas com recursos ordinários do Tesouro.

Realçou que ao longo do seu mandato travou um combate sem tréguas contra a corrupção (dos outros, entenda-se, já que a dos seus é sagrada) e chamou o sector privado para investir na economia, para que o Estado deixasse de ser “o actor principal”, insistindo na melhoria do ambiente de negócios e na diversificação da economia para acabar com a dependência das receitas do petróleo, prometendo para um próximo mandato maior “ambição” e mais “audácia”. Talvez isso aconteça quando o MPLA completar 100 anos de governação ininterrupta (já só faltam 54).

CINCO A ZERO… NO MÍNIMO

O segundo secretário do MPLA no Cuanza-Sul, Agostinho Miquinhos Cassessa, reiterou, no Sumbe, que o partido vai continuar a manter os tradicionais cinco a zero nas eleições gerais. E se este é resultado avançado pelo segundo secretário… imaginemos qual será o previsto pelo primeiro secretário (Job Capapinha), ou o do Presidente…

No dia 25 de Julho de 2017, João Lourenço, general, ministro da Defesa e candidato do MPLA a Presidente de Angola apelou ao “voto certo” dos angolanos em quem se apresentava como sendo o… único. Isto é, depois de Agostinho Neto e José Eduardo dos Santos, esse único é (vejam só!)… João Lourenço. E se ele ordenou… foi isso que aconteceu.

O então cabeça-de-lista do MPLA discursava na província do Huambo para “um banho de povo”, como o próprio classificou. João Lourenço apelou ainda ao “voto certo” aos militantes, amigos e simpatizantes do MPLA para que alcancem “uma vitória forte e convincente”, que contrarie o ambiente que as outras formações políticas concorrentes estavam a criar “de antecipadamente dizer que houve batota no jogo”.

O também, na altura, vice-presidente do MPLA criticava as suspeições levantadas por partidos da oposição sobre a preparação do processo eleitoral, que acusavam de não ter sido transparente.

É evidente, reconheça-se, que é um processo transparente. O problema só está no facto de que o significado de “transparente” não é o mesmo para a oposição e para quem está no Poder há 46 anos. Segundo o MPLA, haverá processos mais transparentes do que aqueles que, como em 2008 e 2012, até conseguiram que os mortos votassem no MPLA, ou que em algumas assembleias de votos fossem mais os votos do que os votantes?

“Não dá para confiar neles, não são sérios, o árbitro ainda não fez o seu trabalho e já está a ser condenado. (…) Não são sérios e a melhor forma de contrariá-los é dar cinco a zero”, disse João Lourenço, sublinhando que o MPLA não queria uma “vitória tímida”.

É claro que, como resultado do seu ADN, o MPLA não diz que o árbitro também joga na equipa de João Lourenço, que as regras de jogo foram estabelecidas pelo MPLA, que o MPLA é o dono do campo, da bola, do cronómetro etc..

Numa intervenção de cerca de uma hora para milhares de pessoas (há quem diga que foram milhões), João Lourenço afirmou que dos partidos concorrentes, o único com obra para mostrar era o MPLA.

João Lourenço é um político de rara inteligência intestinal. Então o MPLA que está no Poder deste a independência, em 1975, “é o único com obra para mostrar”? É obra. E a conclusão é de uma sagacidade digna de um Prémio Nobel. Aliás, também poderia dizer – já agora – que os massacres do 27 de Maio de 1977 foram praticados pela Oposição. Seria na mesma aplaudido pelos seus escravos que pensam apenas com a cabeça que têm mais perto dos joelhos.

“Só o MPLA tem obra importante para mostrar, em benefício de Angola e dos angolanos”, disse o na altura candidato, lembrando que o partido investira, nos últimos 15 anos de paz, em estradas, portos, energia, água, escolas, hospitais, habitação social, entre outros.

Também investiu, diga-se em abono da verdade, noutras coisas. Com o MPLA, Angola tornou-se um dos países mais corruptos do mundo, consegue liderar o ranking mundial da mortalidade infantil e investiu tanto, mas tanto, nos angolanos que o país hoje só tem… 20 milhões de pobres.

A título de exemplo, João Lourenço realçou que em 15 anos de paz o Governo do MPLA investiu “seriamente” na construção de infra-estruturas de construção e distribuição de energia. Os candeeiros apagados, mesmo em Luanda, são prova disso. O lixo e falta se saneamento básico reflectem, e muito bem, a excelente política do MPLA.

“Foram construídas barragens hidroeléctricas, que o colono (português) em 500 anos não conseguiu fazer. O que é que eles faziam do nosso diamante, do nosso café? Nós sabemos, o dinheiro que era ganho aqui, mandavam para a metrópole, por isso é que as barragens hidroeléctricas que deixaram no nosso país, em comparação com estas que nós construímos, aquilo são brinquedos autênticos”, disse.

Brilhante. Já então, e mais uma vez, João Lourenço mostrava o seu nanismo cerebral e o seu nano-quociente intelectual. Então não é que ele queria que os portugueses tivessem deixado em 1973/74 barragens hidroeléctricas similares às que o seu regime construiu 30 anos depois?

O dirigente do MPLA, sublinhando as inúmeras “coisas boas” feitas até então, admitiu que há “noção” de que nem tudo está feito e que é preciso “fazer muito mais”.

“É preciso que reconheçamos as nossas falhas, só há progresso, evolução, se nós reconhecermos as nossas falhas. Vimos pedir aos eleitores o vosso voto para ‘melhorar o que está bem e corrigir o que está mal’ (lema da campanha) e temos a certeza de que, com o vosso apoio, vamos vencer mais esse grande desafio”, referiu com a visível convicção de quem tem a certeza de que já ganhara.

“Que fique claro que, se falharmos neste combate à corrupção, então falharemos também na melhor organização da nossa economia”, observou João Lourenço.

Segundo o político, melhorar o ambiente de negócios é importante para atrair o investimento privado estrangeiro, do qual Angola necessita “como quem precisa do ar para respirar”, para a criação de empregos e diminuição da pobreza.

“O investimento estrangeiro é bem-vindo, mas temos noção de que um dos grandes entraves é que nós temos, primeiro, de fazer um combate muito sério à corrupção e vamos fazê-lo com o apoio do povo”, frisou perante os aplausos dos escravos domesticados e dos acólitos formatados.

“O desafio actual é olhar para a frente, com a esperança e certeza de que 2022 a vitória seja uma certeza. Por isso, espero de todos os quadros, militantes e amigos do MPLA trabalhar com abnegação e desempenho para fortalecer a unidade interna do partido e conquistas no ponto político e partidário”, reforçou Agostinho Cassessa.

O segundo secretário do MPLA no Cuanza-Sul esteve em bom nível. Tinha a esperança de que a certeza seja uma… certeza e, ainda, que o partido some conquistas… “no ponto político e partidário”.

Folha 8 com Lusa

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