Os Estados-membros da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP) vão adoptar uma resolução sobre a criação de uma plataforma para a promoção da pesca sustentável e combate à pesca ilegal, não declarada e não regulamentada. Pena é que não criem uma plataforma para acabar com a forme e com a pobreza. Angola, é claro, não necessita e se calhar é por isso mesmo. Só temos 20 milhões de pobres…
A medida foi anunciada pela secretária de Estado das Pescas de Angola, Esperança Costa, no âmbito de uma reunião com os embaixadores dos Estados da CPLP preparatória da 5.ª Reunião dos Ministros dos Assuntos do Mar da CPLP., agendada para 24, 25 e 26 de Maio, em Luanda.
“Vai haver uma resolução sobre o combate à pesca ilegal não declarada e não regulamentada e a criação de uma plataforma de cooperação para a promoção da pesca sustentável”, disse Esperança Costa, na abertura do encontro com os embaixadores da CPLP acreditados em Angola.
Segundo a governante angolana, a problemática da pesca ilegal não declarada e não regulamentada impõe grandes perdas económicas nos Estados-membros da organização e “limita a sustentabilidade dos recursos marinhos”.
“Iniciámos essa discussão em Fevereiro, no Namibe, e agora estamos em condições de aprovar uma resolução para a criação desta plataforma de promoção de pesca sustentável, que será analisada também nesta reunião de Luanda”, notou.
Segundo a secretária de Estado angolana, a reunião de Luanda vai definir igualmente mecanismos de concertação e actuação conjunta e serão analisados “meios de intervir para um melhor patrulhamento e vigilância” dos mares.
O encontro de Luanda vai decorrer sob o lema “Mobilizar Parcerias e Investimentos para o Desenvolvimento Sustentável dos Mares dos Estados Membros da CPLP, Desafios e Oportunidades”.
Para Esperança Costa, a mobilização conjunta de parcerias e investimentos a nível regional e internacional “é fundamental, sobretudo para se ter acesso aos fundos internacionais” que ajudem os países da CPLP numa transição para uma economia azul.
“Todos os países da CPLP são costeiros ou insulares e queríamos que no âmbito do desenvolvimento sustentável dos nossos mares pudéssemos contar com apoio de fundos internacionais”, salientou.
O secretário de Estado das Relações Exteriores e Cooperação angolano, Domingos Vieira Lopes, destacou a importância da reunião preparatória do encontro dos ministros dos Assuntos do Mar da comunidade por estes ocuparem “um papel relevante na agenda comum”.
“Esperamos ver reflectidos na declaração final e demais textos propostas concretas, com prazos exequíveis, e porque não um programa com acções e prazos definidos, de modo a atingir os objectivos preconizados e extrair vantagens mútuas”, apontou.
Cabo Verde vai cessar a presidência da reunião de ministros dos Assuntos do Mar da CPLP, nesta reunião de Luanda, e passar as pastas para Angola, que detém a presidência rotativa do bloco comunitário.
A economia azul, a promoção da pesca sustentável e a promoção e fortalecimento das economias sustentáveis baseadas no oceano e gestão, protecção, conservação e restauração dos ecossistemas marinhos e costeiros serão alguns dos temas que vão ser analisados na reunião de Luanda.
Gigante que nem pés de barro tem
Criada em 1996, a CPLP tem actualmente nove Estados-membros: Angola, Brasil, Cabo Verde, Guiné-Bissau, Moçambique, Portugal, São Tomé e Príncipe, Timor-Leste e Guiné Equatorial – cuja adesão, em 2014, criou polémica.
Teoricamente a CPLP tem como objectivos prioritários a concertação político-diplomática entre os seus estados membros, nomeadamente para o reforço da sua presença no cenário internacional; a cooperação em todos os domínios, inclusive os da educação, saúde, ciência e tecnologia, defesa, agricultura, administração pública, comunicações, justiça, segurança pública, cultura, desporto e comunicação social.
Mas será que existe uma estratégia comum em matéria, por exemplo, de educação? Não. Não existe. Será que existe uma estratégia comum em matéria, por exemplo, de saúde? Não. Não existe. Será que existe uma estratégia comum em matéria, por exemplo, de ciência e tecnologia? Não. Não existe. Será que existe uma estratégia comum em matéria, por exemplo, de defesa? Não. Não existe.
Não vale a pena continuar a pôr estas perguntas porque, de facto não existe nenhuma estratégia comum, seja em que matéria for. Comum a todos, comum como se existisse uma verdadeira comunidade. Existem casos pontuais, entre alguns dos estados-membros, mas nada em sentido comunitário.
Três países lusófonos – Guiné-Bissau, Angola e Moçambique – estão entre os que têm a pior taxa de mortalidade infantil, de acordo com o relatório sobre a Situação da População Mundial relativo a 2011. Segundo o relatório do Fundo das Nações Unidas para a População (FNUAP), em cada 1.000 nascidos vivos, morrem 192,6 na Guiné-Bissau (só ultrapassada pelo Afeganistão e pelo Chade), 160,5 em Angola e 141,9 em Moçambique.
Entre os países de língua portuguesa, seguem-se São Tomé e Príncipe, com 77,8 crianças, e Timor-Leste, com 56,4. Mais abaixo, surgem Cabo Verde, com 27,5, e Brasil, com 20,6. Portugal apresenta uma taxa de 3,7.
Ainda no capítulo da saúde materno-infantil, 1.000 em cada 100.000 mulheres na Guiné-Bissau morrem no parto (pior registo só no Afeganistão e no Chade).
Com números acima das 500 mortes estavam Angola (610) e Moçambique (550). O relatório não apresenta dados sobre São Tomé e Príncipe, enquanto em Timor-Leste 370 em 100.000 mulheres morrem no parto. Os números descem em Cabo Verde (94), no Brasil (58) e em Portugal (7).
No que diz respeito à taxa de partos entre adolescentes (15 a 19 anos), é Moçambique que lidera, com 185 (em cada 1.000), 170 na Guiné-Bissau, 165 em Angola, 92 em Cabo Verde, 91 em São Tomé e Príncipe, 59 em Timor-Leste, 58 no Brasil e 17 em Portugal.
Os indicadores faziam ainda referência à percentagem de “partos atendidos por pessoal qualificado em saúde”, sendo esta menor, entre os países da CPLP, em Timor-Leste (18), inferior apenas no Afeganistão, Chade e Etiópia.
Na Guiné-Bissau (39) e Angola (47) menos de metade das mulheres beneficiaram deste atendimento especializado. Acima dos 50 por cento surgem Moçambique (55), Cabo Verde (78), São Tomé (82) e Brasil (97).
Na saúde sexual e reprodutiva, é em Angola que as mulheres entre os 15 e os 49 anos menos usam contraceptivos, seja através de que método for. Apenas 6% o fazem, seguidas por 10% das guineenses e 17% das moçambicanas.
Em Timor-Leste, 22% das mulheres usam contraceptivos, taxa que aumenta para 38% em São Tomé e Príncipe, 61% em Cabo Verde, 80% no Brasil e 87% em Portugal.
Apenas quatro dos países da CPLP apresentam dados sobre a taxa de prevalência do vírus VIH/SIDA entre a população dos 15 aos 24 anos, com Moçambique a distanciar-se pela negativa, com percentagens de 3,1% nos homens e de 8,6% nas mulheres (apenas menor do que em países como Botswana, Lesotho, África do Sul, Swazilândia e Zâmbia).
Na Guiné-Bissau, o vírus VIH/SIDA afecta 0,8% de homens e 2% de mulheres, em Angola, 0,6% de homens e 1,6% de mulheres e, em Portugal, 0,3% de homens e 0,2% de mulheres.
Nos indicadores relativos à educação, a taxa de alfabetização da população entre os 15 e os 24 anos é de 78% nos rapazes e 62% nas raparigas tanto na Guiné-Bissau como em Moçambique, e de 81% e 65% em Angola.
Taxas de alfabetização totais ou quase totais verificam-se em São Tomé e Príncipe (95% dos rapazes e 96% das raparigas), no Brasil e em Cabo Verde, com os mesmos números para rapazes e raparigas (97 e 99%), e em Portugal (100% para os dois sexos).
Não havia dados sobre a alfabetização em Timor-Leste, mas o relatório indica que 79% dos rapazes e 76% das raparigas em idade escolar estão matriculados no “ensino fundamental”.
Esta é, apesar de pálida, a realidade dos países da CPLP. Estes dados têm onze anos. No entanto, de substancial para melhor nada se passou desde então. Basta, por exemplo, ver que em Angola, para uma população de 33 milhões de cidadãos, tem mais de 20 milhões de pobres.
Durante anos o argumento da guerra serviu às mil maravilhas para que esse “elefante branco” que dá pelo nome de CPLP, enquanto organização que congrega os países lusófonos, dissesse que só podia – quando podia – mandar algum peixe. Para ensinar a pescar era imprescindível a paz. Angola está em paz (ausência de tiros) há 20 anos…
E agora? Há muito que existe paz, nomeadamente em Angola e mais ou menos na Guiné-Bissau. Será que as canas de pesca são mais caras que as Kalashnikov? Será que os angolanos só vão ter direito à cana de pesca quando o rio Kwanza nascer na foz?
Segundo declarações de José Eduardo dos Santos, feitas em 2008, existia a esperança de que “a vontade política que norteia a CPLP, bem como as excelentes relações entre os seus membros dêem lugar a programas concretos que fomentem o crescimento económico, a erradicação da pobreza e a integração social, para que a médio/largo prazo pudéssemos estar todos no mesmo patamar de desenvolvimento”. Isto foi dito há 14 anos.
E acrescentava: “deve-se, por isso, pensar muito a sério na criação de facilidades financeiras para a promoção recíproca do investimento e da cooperação económica”.
Todos estão de acordo. Só que… continua a não fazer sentido pedir aos pobres dos países ricos para dar aos ricos dos países supostamente pobres. Em vez de se preocupar com o povo que não pode tomar antibióticos (e não pode porque eles, quando existem, são para tomar depois de uma coisa que o povo não tem: refeições), a CPLP mostra-se mais virada para questões políticas, para o suposto aprofundamento da democracia.
Que adiantará ter uma democracia (e em Angola nem isso existe) quando se tem a barriga vazia? Valerá a pena pedir, ou exigir, que se respeite a legitimidade democrática se o povo apenas quer deixar de morrer à fome?
Ainda não foi desta, e seguramente nunca será, que a CPLP – organização agora presidida por um país lusófono cujo presidente nunca foi nominalmente eleito e cujo partido (o MPLA) está no poder há 46 anos, vai perceber a porcaria que anda a fazer em muitos países lusófonos.
De facto, a dita CPLP é uma treta, e a Lusofonia é uma miragem de meia dúzia de sonhadores. O melhor é mesmo encerrar para sempre a ideia de que a língua (entre outras coisas) nos pode ajudar a ter uma pátria comum espalhada pelos cantos do mundo.
E quando se tiver coragem para oficializar o fim do que se pensou poder ser uma comunidade lusófona, então já não custará tanto ajudar os filhos do vizinho com aquilo que deveríamos dar aos nossos próprios filhos.
Folha 8 com Lusa