BIOCOM AUMENTA PRODUÇÃO EM 8 MIL TONELADAS

A Biocom vai aumentar este ano a produção de açúcar em 8.000 toneladas, mais 16% do que em 2021, e espera alcançar a capacidade máxima em 2026, o que permitirá fornecer mais de 80% das necessidades do mercado angolano.

A Biocom, Companhia de Bioenergia de Angola, produz açúcar, etanol e energia eléctrica a partir de cana do açúcar e lançou hoje a sua safra de 2022, em Malanje, marcando a abertura do ano agrícola.

Angola consome actualmente cerca de 300.000 toneladas de açúcar/ano, das quais cerca de 40% são fornecidas pela Biocom, a partir da sua instalação do Cacuso, na província de Malanje, onde espera este ano alcançar as 128.000 toneladas.

O objectivo é aumentar a produção até ao limite da capacidade da fábrica – 250 mil toneladas – o que pode acontecer em três ou quatro anos, segundo o director-geral adjunto, Luís Bagorro.

Na apresentação da safra (a oitava), o responsável falou também sobre as dificuldades do último ano, devido à conjuntura internacional, que está a encarecer os equipamentos, adubos, fertilizantes e transportes, além das dificuldades logísticas de escoamento devido ao mau estado das estradas.

Questionado sobre se estes custos se vão reflectir no preço do açúcar, Luís Bagorro indicou que a empresa está a trabalhar para aumentar a produtividade e a “lutar” para que os preços não aumentem.

“O que temos de fazer é lutar para termos ganhos de produtividade, está tudo programado de forma a não aumentarmos o [preço do] açúcar. O açúcar é um produto da cesta básica, trabalhamos em coordenação com o programa do governo e temos apostado no melhoramento de processos e aumento da produtividade para ver se podemos manter ou até baixar os preços. Estamos a fazer tudo por tudo para que isso [aumento] não aconteça”, salientou.

Para o aumento da produção este ano foi também decisivo o alargamento da área de plantio.

Até ao ano passado, a Biocom dispunha de 26.000 hectares plantados dos quais 22.000 eram utilizados (a restante área era de replantio), enquanto este ano há 30.000 hectares plantados a partir dos quais serão colhidos 26.000 hectares de cana, disse Luís Bagorro, sem precisar os valores do investimento.

O mesmo responsável realçou que a área vai continuar a aumentar nos próximos anos até atingir a maturidade do projecto (250 mil toneladas) o que permitirá quase satisfazer em grande parte o consumo de açúcar dos angolanos, caso se mantenha próximo do actual.

É necessária uma tonelada de cana para produzir 104 quilos de açúcar, demorando todo o processo, entre a colheita e o produto final, 48 horas.

A Biocom produz totalmente para consumo interno e desde 2017 que deixou também de importar este produto. O etanol e a energia eléctrica são também totalmente absorvidos pelo mercado interno.

Em 2022, a empresa espera produzir 18.000 metros cúbicos de etanol neutro e 64.000 megawatts de energia eléctrica a partir de biomassa (cana-de-açúcar) que podem fornecer electricidade a cerca de 80.000 habitantes, segundo a directora de operações agro-industriais, Fernanda Andrade.

O etanol é usado na indústria de bebidas, cosmética, farmacêutica, higiene e limpeza, sendo mais de metade das necessidades de consumo em Angola garantidas pela Biocom.

A energia eléctrica é consumida na própria instalação industrial, sendo o excedente injectado na rede pública. O valor não foi revelado pelos responsáveis da Biocom.

A empresa, detida pela brasileira Odebreche (40%) e pela petrolífera estatal angolana Sonangol, tinha até ao ano passado na sua composição accionista a Cochan, ligada aos generais Dino e Kopelipa, cujos 40% são actualmente detidos pelo Instituto de Gestão de Activos e Participações do Estado (IGAPE) no âmbito da devolução de activos constituídos com fundos do Estado angolano. Questionado sobre o destino a dar a esta participação, Luís Bagorro, afirmou que tal decisão compete ao IGAPE.

A Biocom emprega actualmente cerca de 3.700 trabalhadores e está implantada no polo agro industrial de Capanda, numa área superior a 81 mil hectares dos quais 70 mil são cultiváveis e os restantes destinam-se à preservação da vegetação.

Tem uma capacidade instalada para produzir 2,2 milhões de toneladas de cana-de-açúcar numa área de 38 mil hectares, 250 mil toneladas de açúcar cristal branco, 37 mil metros cúbicos de álcool neutro e para fornecer 136 mil megawatts de energia.

2014. Estado financia Estado a bem do regime (*)

Em Angola, o Governo autorizou um empréstimo de 300 milhões de dólares à Biocom, uma empresa privada detida em 40% por figuras ligadas ao Presidente.

José Eduardo dos Santos terá emitido uma garantia soberana por considerar o projecto “estratégico”. A emissão da garantia, em termos práticos, significa que se o projecto falhar o Estado assume os 70% da dívida perante os bancos comerciais que cedem o dinheiro.

“Tratando-se de iniciativas e empreendimentos privados, não tem de haver esta garantia de 300 milhões de dólares. Creio que esta empresa já está a injectar dez megawatts de energia aumentando a capacidade de fornecimento de electricidade do país… São negócios que não são claros, nem transparentes”, adianta o economista angolano, Alves da Costa.

“Isso é possível porque a Oderbrecht tem uma enorme liberdade para fazer o que quer. O seu acesso ao poder político é muito facilitado. E isso também pode vir a estar respaldado na linha de crédito. Não foi por acaso que o Brasil aumentou a linha de crédito para Angola em cinco mil milhões de dólares”, acrescenta Alves da Costa.

A Biocom é uma parceria entre o Estado angolano, através da Agência Nacional de Investimento Privado, e da Sonangol Holding, com 20%. O grupo angolano Damer detém 40%, tal como a empresa brasileira Odebrecht. Altos funcionários da Presidência angolana têm também participações na Biocom.

“A Sonangol é um instrumento do poder político e do poder económico instalado. Não sei se poderemos interpretar esta participação da Sonangol como uma garantia e uma defesa dos interesses nacionais”, comenta o economista.

“A Sonangol ao fazer isso tenta defender mais os seus interesses do que os interesses da população. Para mim não é o facto da Sonangol, enquanto empresa estatal, participar dessas operação que me dá garantias de que os interesses nacionais serão salvaguardados. Todos estes projectos da Biocom foram feitos sob pressão da Oderbrecht e das empresas brasileiras em Angola”, frisa.

No Parlamento, a UNITA, principal partido da oposição, já pediu esclarecimentos ao Governo sobre o negócio, mas o Executivo escusa-se a comentar.

A UNITA reclama ainda o facto do ministro das Finanças, Armando Manuel, ter omitido os nomes dos accionistas quando fez saber que concedeu a garantia soberana à referida empresa.

Adriano Sapinala, membro da UNITA, não tem dúvidas de que se trata de mais uma caso de falta de transparência, tráfico de influências e abuso de poder.

“A entrada do Estado nesta mesma empresa traz claramente nepotismo, porque estão a fazer-se negócios entre os agentes do Estado e o próprio Estado. É aqui onde reside o perigo quanto à segurança do fundo, na medida em que depois ninguém cobra nem fiscaliza ninguém”, alerta.

“À medida que as empresas vão falindo, o Estado está sempre presente para dar garantias. É isso que tem estado a prejudicar a economia do país”, lamenta o membro da UNITA.

A Biocom tem uma licença de exploração de energia de 20 anos. Com o aval do Presidente, o Estado angolano aparece mais uma vez como proteccionista ao subsidiar, também, a diferença entre o preço do quilowatt do contrato entre a Biocom e a Empresa Nacional de Electricidade, e o preço do quilowatt a ser praticado ao público.

“Infelizmente é o Estado que vai subsidiar é essa diferença”, conclui Adriano Sapinala.

(*) Texto publicado no Folha 8 em 22 de Novembro de 2014

Folha 8 com Lusa

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