“ZECA MUTCHIMA” VAI APODRECER NA PRISÃO

A defesa do líder do Movimento Protectorado Português Lunda Tchokwe (MPPLT), José Mateus “Zeca Mutchima” denunciou constrangimentos para contactar o seu constituinte, detido há 10 meses, em Luanda, ainda sem data de julgamento.

Em declarações à agência Lusa, o advogado Salvador Freire disse que recebeu a pronúncia do tribunal há mais de um mês, aguardando pela marcação do julgamento.

O líder do MPPLT foi detido em 8 de Fevereiro deste ano, acusado dos crimes de associação de malfeitores e rebelião armada, na sequência dos incidentes registados em 30 de Janeiro, em Cafunfo, província angolana da Lunda Norte, na tentativa de realização de uma manifestação, da qual resultaram várias mortes provocadas pela repressão policial.

“Estamos à espera que o tribunal nos diga quando é que vai ser julgado, entretanto, até à presente data não há qualquer tipo de informação e ele continua mesmo em Luanda, embora doente, e agora estamos a ter dificuldade de o poder contactar”, realçou Salvador Freire.

Segundo o causídico, o Serviço de Investigação Criminal de Luanda não permite que visite “Zeca Mutchima”, atirando a responsabilidade para o Serviço de Investigação Criminal nacional.

“Há um mês, os serviços criaram-nos dificuldades para o podermos contactar, argumentando que só têm a guarda dele e o assunto não deve ser resolvido junto do Serviço de Investigação de Luanda, mas junto do serviço de investigação nacional, dirigimo-nos a eles, explicamos a situação e também dizem que não é responsabilidade deles, e até agora não sabemos quem devemos contactar”, frisou.

Inicialmente “Zeca Mutchima” foi detido pelo Serviço de Investigação Criminal nacional, mas devido à falta de condições e por se tratarem de cadeias temporárias, foi transferido para o serviço de Luanda, contou ainda o advogado.

Salvador Freire disse que o seu cliente se encontra em excesso de prisão preventiva e todas as diligências feitas até à data não resultaram.

“Nós já escrevemos para o tribunal, para o Ministério Público sobre o excesso de prisão preventiva dele, fizemos ‘habeas corpus’, infelizmente, nem um nem outro requerimento que fizemos fomos atendidos, apenas o silêncio e dizem que temos que aguardar o julgamento, isto demonstra claramente que estamos perante um processo com mãos invisíveis, deve haver alguém que dá ordens, e como tal é um processo político”, sublinhou.

Sem contacto também com “Zeca Mutchima”, prosseguiu o advogado, os seus familiares “estão extremamente preocupados, sobretudo com o seu estado de saúde”.

“O Serviço de Investigação de Luanda não tem condições para poder dar-lhe o tratamento em termos de medicação ou consultas, os familiares e a defesa, de quando em vez é que vamos levando alguns fármacos, mas achamos que não é suficiente, ele deve estar à disposição de um médico cardiologista para poder determinar e prescrever aquilo que necessita neste momento”, explicou.

Sobre o incidente, a polícia angolana informou, na altura, que cerca de 300 pessoas ligadas ao MPPLT, que há anos defende a autonomia da região rica em recursos minerais, tentaram invadir, na madrugada de 30 de Janeiro, uma esquadra policial de Cafunfo e em defesa as forças de ordem e segurança atingiram mortalmente seis pessoas.

A versão policial foi contrariada pelos dirigentes do MPPLT, partidos políticos na oposição e sociedade civil local e organizações internacionais que falam em bem mais do que uma dezena de mortos.

“Zeca Mutchima” é apontado pelas autoridades como cabecilha do alegado “acto de rebelião”, que para os cidadãos locais era uma “manifestação pacífica”.

Recorde-se que em 17 de Agosto a Procuradoria-Geral da República (PGR) decidiu prorrogar por mais dois meses a prisão de “Zeca Mutchima”, anunciou na altura o seu advogado, considerando a medida como “ilegal”.

Segundo Salvador Freire, a nota da prorrogação da prisão do seu cliente foi emitida pela PGR junto do Serviço de Investigação Criminal (SIC) na Lunda Norte.

“Essa nota que veio da PGR é desfasada de qualquer razão, porquanto Zeca Mutchima está detido há mais de seis meses, portanto já passa o prazo de prisão preventiva, e naturalmente surpreendeu-nos esta nota que veio da PGR junto do SIC na Lunda Norte”, afirmou o advogado em declarações à Lusa. Isto há mais de quatro meses.

O novo despacho “está já a vigorar”, porque segundo o Ministério Público (MP), disse Salvador Freire, “não se consegue encontrar os outros elementos que participaram na manifestação”.

“Esse mecanismo é ilegal. Se não encontram os outros elementos, naturalmente, tem de colocar o `Zeca Mutchima` em liberdade, não se pode prender para investigar, devia-se investigar primeiro e depois prender, isto são contra os princípios do direito”, notou.

Salvador Freire recordou que a prisão preventiva do seu cliente “expirou quatro meses após a sua detenção, à luz do novo Código Penal angolano, período em que deveria ser ouvido e caso não deveria ser posto em liberdade”. Mas como acima da Lei do país está a lei do dono do país (o MPLA)…

“Nunca nos responderam a todos os requerimentos que temos feito em função do excesso de prisão preventiva, último requerimento que fizemos, há mais de dois meses, não tivemos resposta e finalmente vem uma resposta como esta”, frisou.

Já na altura (Agosto) o causídico entendia existir uma “mão política” (leia-se MPLA) neste processo “que faz com que `Zeca Mutchima` continue na prisão em Luanda sem que tenha sido encaminhado para a Lunda Norte para responder em juízo das acusações que lhe foram feitas”.

“Considero isso como um caso político, porque, evidentemente, não há justiça nisso. Estamos diante da denegação da justiça por isso é que `Zeca Mutchima` continua detido”, concluiu Salvador Freire.

Recorde-se, para bem do anedotário nacional e internacional (na vertente dos criminosos), que o Comandante-Geral da Polícia (do MPLA), Paulo de Almeida, defendeu o uso de “meios desproporcionais” para responder efectivamente contra ameaças ao Estado. E assim sendo, disse Paulo de Almeida, a resposta da polícia no caso de Cafunfo, bem como nos massacres de 27 de Maio de 1977, foi em legítima defesa.

O Comandante-Geral da Polícia Nacional afirma (como aliás fez o seu primeiro presidente, Agostinho Neto, ao mandar massacrar milhares de angolanos em 27 de Maio de 1977), que na defesa da soberania de um Estado não pode haver proporcionalidade, como defendem as… pessoas.

“Isso é muito bom na teoria jurídica, nós aprendemos isso no Direito. O Estado não tem proporcionalidade, você quando está a atacar a unidade, o Estado, o símbolo, está a atacar o povo“, disse Paulo de Almeida, numa conferência de imprensa destinada a supostamente esclarecer os incidentes na região do Cafunfo, onde o MPLA mostrou mais uma vez – como já fizera Agostinho Neto em 1977 – que não está para perder tempo com julgamentos, razão pela qual mata primeiro e interroga depois.

Paulo de Almeida avisou que “aqueles que tentarem invadir as esquadras ou qualquer outra instituição para tomada de poder, vão ter resposta pronta, eficiente e desproporcional da Polícia Nacional” do MPLA. Por alguma razão a Polícia é tão forte com os fracos mas bate com as patas no mataco a fugir velozmente quando o adversário é forte.

“Você está a atacar o Estado angolano (leia-se MPLA) com faca, ele responde-te com pistola, se você estiver a atacar com pistola ele responde com AKM, se você estiver a atacar com AKM, ele responde com bazuca, se você estiver a atacar com bazuca, ele responde com míssil, seja terra-terra, terra-mar ou ainda que for um intercontinental, vai dar a volta depois vai atacar”, referiu com o brilhantismo de um gorila anão (sem ofensa para este primata) o Comandante Paulo de Almeida.

Compreende-se que o Presidente tenha dificuldades em encontrar alguém com o mesmo nível de Paulo de Almeida para pôr a comandar a sua polícia. Estamos, contudo, em crer que qualquer descendente do Nkan Daniel conseguiria falar do míssil “intercontinental que vai dar a volta depois vai atacar”.

O Comandante-Geral da Polícia Nacional rejeitou que haja conflito com o Movimento do Protectorado Português Lunda Tchokwe, que luta pela autonomia da região, afirmando que conflito só existe “com alguma coisa legalmente existente”.

“O que aconteceu foram elementos que foram atacar a nossa unidade, às quatro horas da manhã. Não foram fazer uma participação de uma ocorrência, não foram a um banco de urgência, que são as unidades que têm piquete para atendimento ao público. Foram com catanas, armas, meios contundentes, feiticeiros, para atacar a unidade“, disse Paulo de Almeida. Isto, é claro, sem referir os ataques dos catuituís que estavam nas mangueiras próximas e que foram avisados que Paulo de Almeida iria disparar mísseis intercontinentais, os tais que dão a volta (ao bilhar grande) e depois voltam a atacar…

“Eles não foram lá com lenços brancos, ninguém aqui perguntou como é que estão os nossos feridos, o oficial da polícia que apanhou machadada e catanada (…) o oficial das FAA que lhe deram catanadas, queimaram-lhe, ninguém pergunta, não são pessoas”?, questionou.

Por isso, se justificou o fuzilamento já que, segundo Paulo de Almeida, a acção da polícia foi de legítima defesa e “foi assim que houve essas mortes”. Registe-se que, apesar do seu brilhantismo oratório (tipo míssil intercontinental), o Comandante não esclareceu que antes de serem assassinados os angolanos estavam… vivos.

O Comandante-Geral da Polícia Nacional angolana disse que pelo lado das autoridades não estava a decorrer nenhum inquérito, apenas o processo-crime que foi aberto. Bem visto. Se, até prova em contrário (que só o MPLA pode determinar) todos somos culpados, não há necessidade de inquéritos. Isso só acontece em estados ditatoriais. Nas democracias e estados de Direito que são referência para o MPLA, os inquéritos não existem. Vejam-se os casos da Coreia do Norte e da Guiné Equatorial.

“Vou inquirir o quê? Eu não fui lá [Cafunfo] para fazer inquérito, fui lá para constatar a situação que ocorreu. Há um processo-crime que está a correr os seus trâmites legais, é aí e ponto final, não há inquérito. Se algumas organizações querem fazer isso já é um outro assunto, connosco não há inquérito, fique bem claro”, afirmou Paulo de Almeida. Eventualmente melhor do que Paulo de Almeida para chefiar a Polícia só mesmo uma reencarnação de Idi Amin Dada.

Folha 8 com Lusa

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