Petróleo ou… ouro negro, seis ou… meia dúzia

A conta corrente de Angola registou um superavit de 1.975 milhões de dólares (1.665 milhões de euros) no primeiro trimestre de 2021, justificado com o aumento das exportações de bens, nomeadamente o petróleo bruto.

Segundo uma nota do Banco Nacional de Angola, relativa às estatísticas externas dos primeiros três meses, hoje publicada, a conta corrente apresentou um saldo superavitário equivalente a 12,2% do Produto Interno Bruto (PIB).

O BNA justifica a melhoria com o “aumento as exportações de bens, com realce para o petróleo bruto, decorrente da recuperação do preço médio das ramas angolanas e pela redução das importações de bens e serviços”.

A conta financeira, analisada em termos de variação líquida de activos financeiros e passivos, apresentou um superavit de 1.236 milhões de dólares (1.042 milhões de euros), justificado com o aumento dos créditos comerciais, da moeda e depósitos, assim como dos activos de reserva e investimento directo.

O défice da posição líquida do investimento internacional desagravou-se também nos primeiros três meses deste ano, passando de – 32.612 milhões de dólares (-27.493 milhões de euros) para – 32.222 milhões de dólares (-27.165 milhões de euros) em resultado do aumento dos activos financeiros (créditos comerciais, depósitos e reservas internacionais) superior ao aumento dos passivos.

O stock das reservas internacionais brutas (divisas, ouro e outros instrumentos financeiros) aumentou ligeiramente, passando de 14.879 milhões de dólares (12.541 milhões de euros) no quarto trimestre de 2020 para 14.977 milhões de dólares (12.624 milhões de euros) entre Janeiro e Março de 2021, o que permite 11,7 meses de importação de bens e serviços.

Será mesmo? Ou é apenas troca de seis por meia dúzia… ou menos?

No passado dia 13 de Maio, os dados indicavam que Angola exportara 97,8 milhões de barris de petróleo bruto, no primeiro trimestre de 2021, e arrecadou 6,03 mil milhões de dólares (5 mil milhões de euros), o que representa uma redução de 5,96% nas exportações face ao trimestre anterior.

Segundo os resultados das exportações de petróleo bruto e gás de Angola, referentes aos primeiros três meses de 2021, tornados públicos nesse dia, em Luanda, o país registou igualmente uma queda no volume exportado de 17,42% face ao período homólogo de 2020.

O preço das ramas angolanas atingiu, neste período, o mínimo de 52,58 dólares/barril e o máximo de 69,09 dólares/barril, tendo alcançado a média trimestral de 61,68 dólares/barril.

O director do Gabinete de Estudos, Planeamento e Estatística do Ministério dos Recursos Mineiras, Petróleo e Gás, Alexandre Garreto, que apresentou os resultados, deu conta que as exportações neste período correspondem a cerca de 1,87 milhões de barris/dia.

“No período em análise os preços foram influenciados pelo surgimento das novas variantes da Covid-19, pelas preocupações em torno da procura do petróleo e bruto e pela propagação da pandemia de Covid-19 na Europa e na Ásia”, justificou o responsável.

Do volume total exportado, 25,89% pertencem à Agência Nacional de Petróleo, Gás e Biocombustíveis, concessionária angolana, e 18,20% pertencem à estatal angolana Sonangol.

Em relação às companhias internacionais que operaram em Angola, destacam-se a Total (11,81%), ESSO (9,71%), BP (8,66%), SSI (7,65%) e a Chevron (6,74%).

A China foi o principal destino do petróleo angolano neste período, absorvendo 70,14% do total das exportações, seguido pela Índia com 8,61% e a Singapura com 4,85%.

A nível da Europa, a França, com 1,01%, e Itália, com 0,97%, foram os principais destinos do petróleo de Angola nos meses de Janeiro, Fevereiro e Março de 2021.

Petróleo, petróleo e… petróleo

Certamente para apostar na diversificação económica, o verdadeiro “calcanhar de Aquiles” de Angola, o Governo continua a apostar (quase) tudo nas concessões petrolíferas (extra)ordinárias, desde que “devidamente fundamentadas”, como garantiu no dia 3 de Setembro de 2019 o ministro Diamantino Pedro Azevedo, reafirmando o compromisso do executivo com o aumento da produção de hidrocarbonetos.

Diamantino Pedro Azevedo, que na altura falava em Luanda na abertura da licitação das concessões petrolíferas das bacias de Benguela e do Namibe, assinalou que a estratégia governamental para o sector prevê a possibilidade de “lançar extraordinariamente” licitações não constantes do calendário previamente definido.

Terão de ser “devidamente fundamentadas e aprovadas pelo departamento ministerial responsável pelo sector dos petróleos”, acrescentou o governante, no primeiro de quatro “roadshows” que Angola estava a promover para apresentar aos investidores os blocos petrolíferos das bacias marítimas de Benguela e do Namibe, bem como o novo quadro jurídico-legal e as actividades inerentes ao processo de licitação.

“Estas licitações vêm dar corpo à estratégia de reforçar o lançamento da exploração por forma a materializarmos o nosso compromisso para a manutenção e crescimento da produção, bem como a sustentabilidade económica do país”, realçou o ministro. Foi a primeira licitação a ser realizada desde 2011.

O novo modelo de organização do sector angolano do petróleo, aprovado em Agosto de 2018, previa a criação da Agência Nacional de Petróleo, Gás e Biocombustíveis (ANPG), que foi criada em Fevereiro de 2019 e assume já a função de concessionária nacional.

“Impulsionar e intensificar a substituição de reservas visando atenuar o declínio acentuado na produção de hidrocarbonetos” é um dos objectivos do Executivo para os próximos anos, tendo sido aprovada neste âmbito uma estratégia de concessões petrolíferas para o período 2019-2025 que contempla também estudo de novas áreas, referiu o mesmo responsável.

A estratégia supõe também a reavaliação de blocos devolvidos à esfera do estado e “incentivar a recolha de dados adicionais em zonas produtivas na bacia do Congo”.

Diamantino Azevedo assinalou que África representa 7% da produção mundial de hidrocarbonetos e Angola “contribui substancialmente para essa produção”, realçando que a aposta tem sido criar um ambiente de negócio atractivo, o reforço da transparência, o combate à corrupção e a desburocratização.

“Continuamos a trabalhar nas condições para garantir o reforço da estabilidade contratual e o compromisso com os nossos parceiros com vista à reformulação do sector produtivo que inclui medidas como a separação da concessionária (ANPG)”, reforçou.

Esta reafirmação da importância do sector para a economia nacional, constitui a seu ver “evidência inequívoca” de que o país está “no caminho certo”.

Angola chegou a atingir uma produção recorde de um milhão e 900 mil barris de petróleo por dia, em finais de 2008, recordou na altura a administradora da ANPG, Natacha Massano.

Um dos motivos para o declínio da produção desde 2009, como salientou o presidente da ANPG, Paulino Jerónimo, foi precisamente a falta de licitações para novos blocos.

A actividade petrolífera em Angola começou em 1910, no “onshore” da bacia do Cuanza, tendo a primeira descoberta de “offshore” acontecido na década de 1960.

Natacha Massano sublinhou então que um dos grandes problemas da indústria petrolífera em África está relacionado com as incertezas na regulamentação, corrupção e transparência do sector, pelo que Angola “está a trabalhar no sentido de criar condições propícias para que a indústria continue a crescer num ambiente saudável e apropriado aos investidores”.

Surge neste contexto a ANPG, “cuja missão é gerir de forma eficiente e responsável os recursos de petróleo e gás do país e garantir o rendimento do estado”, continuou a mesma responsável.

“Precisamos de impulsionar a actividade de exploração em Angola. A exploração é a base da produção, é importante expandir o conhecimento geológico, para realizar a substituição e preservação das reservas” e incentivar o investimento, disse.

Segundo Natacha Massano, as autoridades angolanas estavam optimistas quanto ao potencial da bacia do Namibe, embora Namibe e Benguela não tenham tradicionalmente actividade petrolífera. “Acreditamos que estamos perante um novo paradigma da história da produção petrolífera em Angola”, reforçou.

A Agência Nacional de Petróleo, Gás e Biocombustíveis, criada ao abrigo do Decreto Presidencial nº 49/19 de 6 de Fevereiro, é uma pessoa colectiva de direito público, do sector económico ou produtivo, que goza de personalidade e capacidade jurídica e é dotada de autonomia administrativa, financeira e patrimonial.

A ANPG tem por objecto a regulação da actividade de exploração do petróleo e gás, sendo a Concessionária Nacional que tem por finalidade regular, fiscalizar e promover a execução das actividades petrolíferas, nomeadamente as operações e a contratação, no domínio dos petróleos, gás e biocombustíveis.

A mesma está sujeita à superintendência do Titular do Poder Executivo, exercida pelo Titular do Departamento Ministerial responsável do Sector dos Recursos Minerais e Petróleos.

A ANPG pretende ser numa entidade de referência internacional, promovendo um ambiente de negócio de excelência e local de escolha para os investidores, maximizando a criação de valor para o Estado através de uma gestão eficiente e responsável dos recursos de petróleo e gás.

Com a estratégia de atribuição definida para as concessões de 2019, o Governo de Angola e a ANPG esperavam, sobretudo, expandir o conhecimento geológico do país em áreas que, embora com pouca actividade de exploração, têm um significativo potencial petrolífero; comprovar o sistema petrolífero de ambas as bacias marítimas (Benguela e Namibe), designadamente da do Namibe; substituir as reservas produzidas; e incentivar o investimento neste sector de actividade, por forma a que se mantenha como um dos motores da economia e do desenvolvimento económico do país.

O regime legal e contratual existente em Angola, associado à evolução legislativa registada ao longo dos últimos anos, teve um impacto significativo na indústria e na relação dos operadores petrolíferos com o país e com as suas autoridades, tendo originado uma nova dinâmica no sector. Estas alterações criaram maior dinamismo na gestão do processo de concessões; maior flexibilidade contratual e fiscal; maior estabilidade contratual e maior eficiência na cadeia das operações petrolíferas.

Folha 8 com Lusa

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