EXCELENTE GOVERNO, MAS… VEJAM SE PAGAM!

A dívida às empresas portuguesas em Angola ultrapassa os 500 milhões de euros, dos quais cerca de 25% estão ainda por pagar, segundo o delegado da AICEP em Angola, Miguel Fontoura, que assinalou, no entanto, os “progressos consideráveis” que têm sido feitos.

Em declarações à Lusa, o representante da Agência para o Investimento e Comércio Externo de Portugal (AICEP) em Luanda, Miguel Fontoura, explica que não é possível determinar um montante exacto para a dívida certificada – ou seja a que é reconhecida pelo Estado angolano -, devido aos efeitos cambiais, tendo em conta que uns contratos foram celebrados em dólares, outros em kwanzas e outros em euros, mas é “certamente superior a 500 milhões de euros”.

Do valor certificado, o montante que foi efectivamente pago, também não é fácil de contabilizar pois “há pagamentos em espécie, através de créditos fiscais e de obrigações do tesouro, mas andará à volta de 70 a 75%”, estimou.

Miguel Fontoura destacou o “esforço sério” do executivo angolano no sentido de “ir desbastando esta dívida”, com progressos “consideráveis”, apesar das dificuldades causadas pela pandemia de Covid-19 e pela crise económica, com Angola a viver o seu sexto ano de recessão consecutivo.

“Apesar de isto complicar a tesouraria das empresas portuguesas, essas empresas nunca puseram em causa o estar em Angola e compreendem que com dificuldade, mas com seriedade, as coisas vão ser resolvidas”, declarou o responsável da AICEP, dizendo que “não é expectável que tudo se resolva da noite para o dia”.

Sobre os créditos que poderão ser recuperados no próximo ano, afirmou que é difícil antecipar pois vai depender do impacto de três variáveis: o facto de o país ir viver um ano eleitoral e o novo acordo que as autoridades angolanas poderão vir a celebrar com o Fundo Monetário Internacional (FMI), mas, sobretudo, o preço do petróleo, que poderá dar mais ou menos folga para que o Estado angolano vá regularizando as suas dívidas.

Assinalou ainda que o Estado angolano nunca pôs em causa o pagamento da dívida certificada.

Quanto à não certificada, o problema é mais complexo, admite. Há dívidas contraídas por empresas públicas e órgãos da administração local, dívidas com contrato do Estado, mas ainda por certificar, num processo que Miguel Fontoura reconhece ser moroso, e “outra área mais cinzenta”, a da dívida que não está assente em contratos, mas sim em promessas de contratos ou manifestações de interesse, cujo valor total não é possível contabilizar.

“Houve um risco”, por parte das empresas, admite o delegado da AICEP, considerando que deve ser visto à luz do contexto e da altura em que foram assumidos esses riscos.

“Era uma altura de crescimento económico de 15 e 20%, o Estado angolano tinha uma solidez financeira muito grande e havia uma grande necessidade de recuperar infra-estruturas”, justificou.

O Estado angolano tinha pressa e as empresas portuguesas foram “neste caminho de confiança” que dificilmente voltarão a percorrer.

Miguel Fontoura sublinha que esta dívida, que não foi assente em contratos, “tem de ser objecto de análise muito cuidada”, mas acrescenta que se vivem “tempos novos” em que o próprio Estado angolano se mostra mais cauteloso e se apresenta como “bom pagador”.

“São tempos novos, de abertura, de clarificação e isso é bom para as empresas portuguesas que sabem com o que podem contar”, declarou.

Por isso, acredita que não se vai voltar ao que acontecia no passado: “As orientações do executivo são muito claras” no sentido de que os contratos sejam visados pelo Tribunal de Contas e não dependam de “boa vontade” ou “caprichos”, o que é “um excelente sinal para as empresas”, concluiu.

Angola acelera, Portugal trava

O investimento angolano em Portugal era, em Junho deste ano, superior ao português em Angola em 241 milhões de euros, de acordo com dados do Banco de Portugal, divulgados pela AICEP. Amigos, amigos… negócios à parte.

Segundo os dados cedidos pela Agência para o Investimento e Comércio Externo de Portugal (AICEP), o Investimento Directo Estrangeiro de Angola em Portugal (IDE) ascendia, em Junho deste ano, a 2.214 milhões de euros, face aos 1.973 milhões de euros de Investimento Directo Português no Estrangeiro (IDPE) em território angolano registados no mesmo mês.

O IDE tem-se mantido mais ou menos estável desde 2017, sendo que em Dezembro de 2019 totalizava 2.249 milhões de euros e um ano depois fixava-se nos 2.176 milhões de euros.

Já o IDPE registou uma queda assinalável nos últimos anos. Em Dezembro de 2017 ascendia a 4.547 milhões de euros e em 2020 já tinha descido para 1.944 milhões de euros.

No que diz respeito às exportações para Angola, os dados enviados pela AICEP, do Instituto Nacional de Estatística (INE) apontam para uma redução de 2,8% no primeiro semestre deste ano, em termos homólogos, tendo as importações caído por seu turno quase 78%, numa altura em as trocas internacionais foram fortemente afectadas pela pandemia.

Nos últimos dez anos, muita coisa mudou nas relações entre empresários angolanos e portugueses, com os exemplos mais evidentes a serem a queda da influência de Isabel dos Santos, na sequência do Luanda Leaks, e as consequências do desaparecimento do Grupo Espírito Santo.

A década de 90 marcou a entrada dos bancos portugueses em Angola com a normalização do sistema financeiro do país, depois das nacionalizações pós-independência (1975).

Dos bancos que compõem o sector bancário angolano, cinco concentram a maioria do mercado. Destes, dois têm capitais de origem portuguesa: o Banco de Fomento Angola (BFA), de que o BPI é accionista, e o Banco Económico, antigo Banco Espírito Santo Angola (BESA), do grupo Espírito Santo, que acabou por ser arrastado na derrocada do grupo. O Novo Banco mantém uma posição nesta instituição angolana, que é dominada pela Sonangol.

Estão ainda no país o BCP, através do Banco Millennium Angola (BMA) e a Caixa Geral de Depósitos, no Banco Caixa Geral, onde chegou a ter uma parceria com o Santander Totta, que vendeu a sua posição em 2015. Também o Montepio está presente nesta nação africana, através de uma participação, de 51% no Finibanco Angola.

A presença de Angola na banca portuguesa é mais recente e foi alvo de muitas mudanças nos últimos anos, depois do Luanda Leaks.

Em 2008, a Sonangol (petrolífera do MPLA, partido que está no Poder há 46 anos) comprou 9,99% do capital do BCP e, em 2009, foi vez da ‘holding’ Santoro (de Isabel dos Santos) entrar no BPI, ao adquirir 9,67% do capital do banco ao BCP.

A Sonangol é actualmente o segundo principal accionista do BCP, com 19,49%.

No BPI, a Santoro vendeu a sua participação na OPA (Oferta Pública de Aquisição) do CaixaBank, em 2017.

Por sua vez, o BIC Portugal comprou o BPN por 40 milhões de euros ao Estado português, mas depois do Luanda Leaks, a instituição (agora EuroBic) anunciou que a empresária Isabel dos Santos iria abandonar a estrutura accionista do banco português, uma medida para “salvaguardar a confiança na instituição”, segundo a entidade financeira.

No entanto, esta venda ainda não avançou e para já a empresária mantém-se no banco, através da Finisantoro (17,5%) e da Santoro Financial Holding (25%), segundo a última informação disponível no ‘site’ do banco, sendo que a participação está arrestada.

A ‘holding’ Esperaza, uma ‘joint venture’ em que a Sonangol detém 60% das acções e a Exem (de Isabel dos Santos) detém os restantes 40%, controla 45% da Amorim Energia que, por sua vez, é accionista de referência da Galp. No entanto, a petrolífera estatal angolana anunciou em Julho deste ano ter sido declarada como única proprietária do investimento feito na Galp, segundo a sentença final de um tribunal holandês que arbitrou o litígio que opunha a petrolífera à Exem, que, por sua vez, recorreu da decisão.

Já a relação da petrolífera portuguesa com Angola remonta a 1982, dedicando-se à actividade de produção e exploração de petróleo.

Na área industrial, com ligações à energia, a posição de Isabel dos Santos na Efacec era, até ao ano passado, maioritária, mas acabou por ser nacionalizada pelo Governo depois da saída da empresária, devido ao Luanda Leaks e à incompetência estratégica do governo do MPLA para manter, como deveria, a empresa sob o seu controlo. Está agora em processo de reprivatização.

A presença mais emblemática de empresas portuguesas em Angola no sector da construção pertence à Mota-Engil. A empresa liderada por António Mota e Gonçalo Moura Martins está no país desde a sua fundação, em 1946, mas tem vindo a reforçar e diversificar a sua presença nos últimos anos, acompanhando o desenvolvimento económico daquele mercado.

A Mota-Engil Angola, a filial criada em 2010 pelo grupo para este país, conta com accionistas como a Sonangol (20%), sendo que o Estado angolano planeia vender esta posição.

A Teixeira Duarte é outra das construtoras portuguesas que marcam presença no mercado angolano. As dificuldades de empresas como a Soares da Costa, historicamente com grande presença em Angola, ditaram a redução dos interesses portugueses no mercado angolano, neste sector.

Nas telecomunicações, a participação de Isabel dos Santos na Zon, através da ZOPT, está arrestada pelo tribunal, sendo que, em Março, a presidente executiva da Sonae, Cláudia Azevedo, afirmou que está “na expectativa” que “seja corrigido” o arresto de bens da ZOPT para que a parceria com a empresária angolana seja dissolvida.

Questionada sobre o processo de dissolução da ZOPT – detida em 50% pela Sonaecom e a restante metade por Isabel dos Santos -, Cláudia Azevedo disse estar a aguardar que a situação esteja resolvida.

Nos meios de comunicação social, a angolana Newshold detém ainda, na Impresa, 2,4% do grupo fundado por Pinto Balsemão, tendo abandonado outras posições nos media portugueses.

Folha 8 com Lusa

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