E se fossem gozar com o…?

Em Portugal, o total de mortos por Covid-19 desde o início da pandemia já é maior que o da Guerra Colonial que durou 13 anos. Está a morrer uma pessoa a cada cinco minutos. Com a devida vénia, transcrevemos o artigo «Miranda do Corvo. Hospital “recusado” pelo SNS transformado em cenário para publicidade», publicado pelo jornal português Expresso em 19 de Outubro pela Jornalista Isabel Paulo.

«Multinacional francesa vai gravar esta semana, no Hospital Compaixão, um filme de tributo aos profissionais de saúde da linha da frente no combate à covid-19. Médico e líder da Fundação ADFP lamenta que o Governo prefira “esbanjar” dinheiro em instalações provisórias em Coimbra quando a tem 15 km um hospital moderno

O Hospital Compaixão, propriedade da Fundação Assistência, Desenvolvimento e Formação profissional (ADFP), situado em Miranda do Corvo, vai ser palco de uma co-produção publicitária de homenagem aos profissionais de saúde da linha da frente da pandemia, liderada por uma multinacional francesa. Jaime Ramos, antigo presidente da Câmara de Miranda do Corvo e presidente da Fundação sem fins lucrativos, lamenta que o hospital pronto há mais de um ano, disponibilizado desde Abril para receber doentes infectados ou não-covid, não tenha “merecido”, até ao momento “sequer uma resposta do Ministério da Saúde”. Nem inaugurado foi.

O pedido da produtora de cinema – que Jaime Ramos prefere seja a própria a revelar a identidade – para filmar o dia-a-dia dos profissionais de saúde em contexto hospitalar, foi feito há duas semanas, após ter “descoberto que nestes tempos de pandemia existia em Portugal um hospital, equipado com tecnologia de última geração, fechado, ou seja, ideal para as filmagens”. O ex-deputado do PSD considera ser um erro que num país onde diversos hospitais já accionaram o terceiro nível de contingência para responder à covid-19, onde há milhares de consultas, exames de diagnóstico e cirurgias em atraso, a tutela “se dê ao luxo de desperdiçar recursos”.

“No caso do hospital construído pela Fundação, são € 10 milhões que estão às moscas e por isso não hesitei em colaborar, associando-se assim a ADPF à homenagem a todos os profissionais de saúde que lutam diariamente para travar a epidemia ainda sem fim à vista”, salienta Jaime Ramos. As filmagens tiveram início esta segunda-feira e deverão prolongar-se pelo menos até sábado, tendo o estúdio sido montado este domingo.

Para o médico de profissão, “a bizarra” transformação do hospital, situado em Miranda do Corvo, no na zona do Pinhal Interior Norte do país a 15 km de Coimbra, em estúdio de cinema seria “até anedótica se não fosse trágica dada a manifesta falta de recursos do SNS”, que, lembra, obrigou diversos hospitais centrais como o São João, no Porto, ou o universitário de Coimbra (CHUC) a instalar tendas de campanha para colher doentes.

“Não se percebe que o Governo prefira gastar dinheiro em tendas ou transforme pavilhões em unidades de saúde e acolhimento de doentes e ignore um hospital com 54 camas, quartos com casas de banho individuais, bloco operatório com duas salas de cirurgia, área para de urgência, sector ambulatório, consultas externas e internamento, equipamentos de imagiologia e diagnóstico, ecografia, TAC ou RX, e ainda ventiladores, três dos quais foram disponibilizados gratuitamente para acudir doentes no IPO de Coimbra, na primeira fase da pandemia”, refere Jaime Ramos.

Para o candidato do PSD/CDS/PPM e PMT à Câmara de Coimbra, nas últimas autárquicas, a única razão que vislumbra para que o equipamento seja “menosprezado” nesta altura “será uma visão de sectarismo partidário” e não decorrente de constrangimentos financeiros, já que as instalações do hospital foram disponibilizado ao Estado “gratuitamente”.

A proposta feita ao Ministério foi a de um acordo de cooperação similar ao que o Estado estabelece com os hospitais da Santa Casa da Misericórdia. “Os exames requisitados pelos centros de saúde têm custos 10% abaixo do que os contratualizados com os privados”, assegura o médico, que justifica o desinteresse da tutela pela unidade clínica pela alegada “protecção governamental aos interesses das multinacionais privadas”.

Apesar de a Ministra nunca ter “visitado ou mostrado interesse pelas instalações”, o líder da ADFP vai de novo reforçar a disponibilidade do equipamento para reforçar o SNS, advertindo que o Hospital Compaixão foi construído para garantir 40 camas para cuidados continuados na zona deprimida da Lousão e Miranda do Corvo, “onde a oferta de camas é zero”, e as restantes para situações de emergência local ou de pressão dos hospitais mais próximos, como agora acontece devido à pandemia.»

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