A Endiama, diamantífera estatal angolana, e a RGS Holding, empresa privada, vão investir mais de quatro mil milhões de dólares (3,3 mil milhões de euros), em projectos agro-industriais em três províncias do leste de Angola. Espera-se, com a ingenuidade que nos é genética, que não aconteça com os projectos em que se investiram milhões para produzir mandioca e em que a colheita revelou a produção de carros.
Na sua intervenção, no acto de assinatura do acordo, o ministro dos Recursos Minerais, Petróleo e Gás de Angola, Diamantino de Azevedo, disse que não é intenção da Endiama “desviar-se do seu objecto social primário, que é a actividade diamantífera”.
Segundo Diamantino de Azevedo, a Endiama pretende com isso assumir uma responsabilidade histórica, que devia ter sido assumida há já bastantes anos. Há 45 anos, mais exactamente.
“A actividade económica nas províncias das Lundas é muito dependente da indústria diamantífera e a actividade de recursos minerais é sempre uma actividade não renovável, ou seja, com o avanço da produção nós exaurimos as reservas e poderemos no futuro deixar de ter esta actividade por este motivo, mas também por motivos económicos a nível mundial”, referiu Diamantino Azevedo, na sua intervenção divulgada pela rádio pública angolana.
Por sua vez, o presidente do Conselho de Administração da Endiama, Ganga Júnior, disse que não se trata exclusivamente da produção agrícola, embora seja este o enfoque principal na província diamantífera da Lunda Norte, com a produção de palma.
Ganga Júnior disse que nas províncias da Lunda Sul e Moxico fruteiras e árvores de florestação de valor económico significativo são o foco e que, de forma intercalar, está também contemplada a produção de produtos alimentares que fazem parte da cesta básica.
Já o director-geral da RGC Holding, Mohamed Rajal, disse que o projecto vai atingir até 260 mil postos de trabalho directos, com impacto nos agregados familiares de quase 1.6 milhões de habitantes.
Segundo o empresário, só na parte agrícola estarão garantidos 165 mil postos de trabalho, havendo igualmente a parte industrial e de serviços.
Por outro lado, o director do Instituto Geológico angolano, Canga Xiaquivuila, diz que Angola tem potencial para abrir pelo menos cinco minas de diamantes, duplicando o número actual.
“Mais de metade da área de Angola tem potencial petrolífero, mas não temos ainda informação geológica, é preciso estudar mais, mas com a informação que temos agora, é seguro dizer que há oportunidade de abrir pelo menos mais cinco depósitos primários”, disse Canga Xiaquivuila durante o fórum “Angola Global Diamond e Conclave 2021”, que decorreu de forma virtual a partir de Luanda.
“Só há três minas de kimberlitos”, a rocha onde potencialmente estarão os diamantes, apontou o responsável, notando que o potencial de exploração é enorme e suficiente para colocar o país no topo dos produtores de diamantes.
Antes, já o ministro dos Recursos Naturais e Petróleo de Angola, tinha convidado os investidores a apostarem no país, destacando as reformas implementadas pelo Governo e as boas condições para as empresas privadas.
“Os recursos de Angola são reconhecidos internacionalmente como um dos que têm mais potencial no mundo, e a indústria diamantífera desempenha um papel importante no desenvolvimento da economia”, disse Diamantino Azevedo, vincando estar “confiante que a indústria mineira pode contribuir mais para o crescimento e desenvolvimento da economia angolana”.
Na conferência, organizada para apresentar as oportunidades de negócio, o governante destacou “a introdução de reformas para melhorar o ambiente de negócios para a exploração, verificação, gravação e exportação de diamantes” e acrescentou que, depois do petróleo, este é o recurso natural mais importante do país.
“A nova política implementada por este Governo e o modelo de governação para o sector são o nosso compromisso para melhorar o sector, mas precisamos de mais esforços e de impulsionar as reformas”, disse o ministro, convidando os privados a investir.
“Angola está aberta para os negócios, e estamos empenhados em trabalhar em conjunto com o sector privado para o desenvolvimento do sector”, concluiu o governante.
Angola é o terceiro maior produtor mundial de diamantes em bruto em termos de valor, e os diamantes representam a segunda maior exportação do país, a seguir ao petróleo.
Mandioca ao poder, já!
Recorde-se que quase todos os dias o Governo anuncia projectos. No dia 10 de Março anunciou a escolha do polo de Cacuso, na província de Malanje, para lançar o processo de industrialização da mandioca, com foco na produção de amido. A informação foi avançada pelo ministro da Indústria e Comércio de Angola, Victor Fernandes, à margem de um ‘webinar’ sobre “As Oportunidades e desafios na Cadeia de Valor da Mandioca em Angola”, que contou com participação de especialistas nacionais, do Brasil, da Argentina e da Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura (FAO).
Victor Fernandes referiu que há cerca de um ano que começou a aposta na transformação industrial da mandioca e que a realização do ‘webinar’ tinha por objectivo lançar as bases técnicas e científicas para que este desiderato se venha a concretizar.
“Reunimos vários especialistas, operadores do sector privado, dirigentes de várias organizações internacionais que tratam do tema da mandioca”, referiu o ministro, acrescentando que foram analisados todos aspectos, desde a produção, transformação e comercialização.
O governante frisou que o país tem polos industriais rurais, alguns dos quais localizados em centros de maior produção de mandioca, e, nesse sentido, para “adiantar trabalho e aproveitar aquilo que já está feito” será usado o polo de Cacuso, em Malanje, como projecto-piloto.
“É a partir daí que vamos começar, de facto, o processo de industrialização da mandioca no sentido de, criando o projecto-piloto em Cacuso, partirmos daí para o resto do país, porque, felizmente, a mandioca produz-se no país inteiro”, frisou.
O ministro salientou que este produto agrícola tem um conjunto de derivados, mas o país ainda não tem capacidade instalada industrial para fazer a sua produção, destacando que a aposta vai para o amido.
“É um subproduto que está também no milho, mas principalmente na mandioca, e que neste caso em particular, já tem inclusive quem pode ficar com essa produção. Porque nós inaugurámos há pouco tempo indústrias têxteis e os têxteis precisam de muito amido para fazerem as gomas dos tecidos. Temos aqui já quem compra, falta quem produz o amido”, salientou.
Victor Fernandes vincou a necessidade do envolvimento de parceiros privados, tendo em conta que o objectivo é garantir que sejam eles os agentes de facto a participarem do processo produtivo.
Por sua vez, a representante da FAO em Angola, Gherda Barreto, lembrou que a organização das Nações Unidas está a promover a mandioca como alimento do século XXI, cultura que tem respondido às crises globais, nomeadamente a seca e os preços dos alimentos.
“Angola é um dos dez países do mundo produtores de mandioca, que tem uma grande oportunidade de industrializar a mandioca, com a inclusão dos agricultores familiares”, referiu a responsável, frisando que os mesmos são apoiados pela FAO, através das escolas de campo, em cooperação como Ministério da Agricultura e Pescas de Angola.
“Esses agricultores nós apoiamos para que trabalhem modelos associados que estão a ser formados, capacitados, para passarem de agricultores familiares a agricultores comerciais”, indicou.
Através do Programa AGRO-PRODESI, prosseguiu Gherda Barreto, a FAO está a apoiar o desenvolvimento de cadeias de valor, entre os quais a cadeia de valor da mandioca, onde os diferentes atores, que vão desde os agricultores aos comerciantes, serão capacitados.
Angola tem uma área cultivada de 1,1 milhões de hectares de mandioca, tendo na época agrícola passada sido colhidos 928.512 hectares, representando uma produção anual de 92%, com uma taxa de crescimento de 2,4% anual e uma produtividade média de 11,9 toneladas, liderando a produção a região norte com 66,2%, seguida do centro (29,1%) e o sul (4,7%).
À frente da produção estão as províncias do Uíje, com cerca de 20% da produção total, Malanje (14,6%), Cuanza Sul (9,1%), Moxico (8,7%) e Lunda Sul (6,8%).
Na sua intervenção, o director-geral do Instituto de Desenvolvimento Agrário de Angola (IDA), David Tunga, disse que o país continua muito aquém da sua capacidade de produção da mandioca, tendo em conta as suas potencialidades, sendo necessário encontrar estratégias e alguma visão para impulsionar este sector.
Segundo David Tunga, o país enfrenta desafios na produção deste tubérculo, um dos quais a degeneração dos clones existentes, a presença de pragas, que causam baixos rendimentos, a variedade de longo ciclo vegetativo e com baixo teor de amido, bem como a necessidade de se disseminar e trazer variedades melhoradas para se alcançar a produtividade esperada.
O responsável frisou a importância de se actualizar as actuais variedades cultivadas no país, que precisam ser melhoradas relativamente à pesquisa sobre a sua resistência a doenças e pragas.
“Nos cultivados presentes no país vamos observar com muita frequência muitas viroses, bacterioses e a mosca branca”, disse David Tunga, apontando perdas na produtividade à volta dos 14% a 24%, devido à presença de doenças e pragas, como por exemplo a podridão, doença muito disseminada no país, nas regiões do Bengo, Uíje, Malanje, Lundas Norte e Sul.
“A podridão muitas vezes resulta do excesso de tempo que as raízes permanecem no solo. Se nós pudermos encetar estratégias que viabilizem a sua extracção, transformação e comercialização vamos melhorar a renda das famílias e também contribuir para o aumento de divisas para o país, tendo em contra a possibilidade de exportação”, disse.
O Governo traçou como meta atingir até 25 milhões de toneladas de mandioca nos próximos cinco anos, mas para isso deverá introduzir novas variedades da mandioca, aumentando assim o rendimento por hectare para pelo menos 20 toneladas.
“A mandioca é uma cultura de segurança alimentar em Angola, pelo comportamento e pela cultura das nossas populações, [porque] enquanto na produção de cereais a população faz a colheita de uma só vez, no caso da mandioca extrai do solo apenas as raízes para o seu consumo num determinado período, o que faz com que a sua conservação assegure a disponibilidade desse alimento durante muito tempo, entre um a dois anos”, explicou.
Com governos que semearam a incompetência
No dia 29 de Novembro de 2017 o Governo de João Lourenço passou um atestado de criminosa incompetência ao Governo de Eduardo dos Santos (do qual fez, aliás, parte como ministro) ao desafiar as autoridades e empresários japoneses a assumirem as unidades de produção de arroz que estavam paralisadas em Angola, de forma a aumentar o actual volume produtivo, inferior a 30.000 toneladas anuais.
O repto foi lançado, em Luanda, pelo secretário de Estado da Agricultura e Pecuária, Carlos Alberto Jaime Pinto, durante a quarta reunião do comité de coordenação conjunta do projecto de desenvolvimento de cultivo de Arroz em Angola, que conta com o financiamento da Agência de Cooperação Internacional do Japão.
Segundo o governante angolano, o arroz era o quarto produto da cesta básica mais procurado no país, depois do milho, da mandioca e do feijão, com necessidades anuais de 400.000 toneladas, em contraponto – repita-se – com a “incipiente” produção interna, que foi de 24.576 toneladas na campanha agrícola de 2015/2016, entre empresas agrícolas familiares (12.191 toneladas) e agricultura empresarial (12.385 toneladas).
O resultado é um consumo dependente das importações, que Angola sistematicamente diz que quer inverter, introduzindo, com o apoio em curso do Japão, as “melhores variedades” de arroz em cultivo.
“Se conseguirmos atingir sementes de alta qualidade, significa que teremos de produzir cerca de 300.000 hectares de arroz, para cobrir as necessidades internas do país”, apontou Carlos Alberto Jaime Pinto, que esperava a colaboração japonesa na expansão deste cultivo.
Nesse sentido, o Governo angolano comunicou nesse dia a autorização da extensão por mais um ano dos ensaios com diferentes variedades de sementes de arroz que decorrem, ao abrigo da colaboração com o Japão, nas províncias do Huambo e do Bié.
“Que consigamos passar da experimentação a uma acção mais expandida, de produção de arroz em Angola”, enfatizou o governante.
Os governos de Angola e do Japão acordaram em 2013 um programa de assistência técnica japonesa à produção de arroz em território angolano, sendo conhecidas as condições naturais favoráveis para esse cultivo, nomeadamente, nas províncias da Lunda Norte, Lunda Sul, Moxico, Malanje, Bié e Uíge.
Contudo, o abandono ou reduzidos níveis de produção em várias áreas do país dificultam um volume de cultivo que seja “rentável e significativo”, com o secretário de Estado da Agricultura e Pecuária a apontar como exemplo a Fazenda Longa, na província do Cuando Cubango, no sul do país, com 2.000 hectares, mas então paralisada.
Resultou de um projecto conjunto com empresas chinesas, que chegou a produzir, na campanha agrícola de 2013/2014, mais de 4.000 toneladas de arroz, mas a crise financeira e cambial dificultou a aquisição de insumos e travou a produção, que passaria na era João Lourenço a ser apoiada pelo Fundo Soberano de Angola.
“Mas gostaríamos de lançar um repto que, todas aquelas unidades de produção que neste momento não se encontram em grande produção poderíamos pedir a cooperação do Japão, para que pudéssemos ocupar algumas dessas unidades com o objectivo de começar a fazer um programa de maior intensidade da produção de arroz”, apelou Carlos Alberto Jaime Pinto.
Juntamente com o financiamento e apoio técnico japonês, o projecto de desenvolvimento de cultivo de arroz em Angola envolve o Ministério da Agricultura e o Instituto de Desenvolvimento Agrário angolano.
Folha 8 com Lusa