O processo de registo eleitoral presencial e actualização de residência em Angola inicia-se em 15 de Setembro e deverá terminar em Março do próximo ano, anunciou hoje a Comissão Nacional Eleitoral (CNE, sucursal do MPLA para assuntos “eleitorais”) angolana.
A informação foi avançada pelo porta-voz da CNE, Lucas Quilundo, que falava no final do plenário do órgão, que se reuniu extraordinariamente para analisar e deliberar sobre um ofício do Ministério da Administração do Território (MAT) pedindo um pronunciamento relativamente ao início das actividades do registo eleitoral presencial e actualização de residência.
Segundo Lucas Quilundo, o plenário anuiu favoravelmente ao período de actualização do registo, que tem início na segunda quinzena de Setembro, porém, tendo em conta o período chuvoso, foi recomendando ao MAT que esse aspecto seja tido em conta.
“Considerando que o mesmo será desenvolvido nas administrações municipais, onde será instalado o Balcão Único de Atendimento ao Público (BUAP), que isso seja tido em consideração para que a mesma seja feita com o mínimo de constrangimentos possíveis”, referiu.
O plenário da CNE recomendou igualmente que esse processo seja acompanhado de uma ampla campanha de educação cívica dos eleitores, para que os cidadãos acorram massivamente aos postos de registo, devendo recorrer-se a todos os meios disponíveis para a maior divulgação da actividade.
“Por outro lado, com o início dessas actividades, o registo eleitoral presencial cria a necessidade de início, por parte da CNE, por imperativo legal, da actividade da supervisão do processo em si”, disse.
Lucas Quilundo frisou que a fiscalização de todo o processo pela CNE “não é uma actividade nova”, salientando que o órgão eleitoral tem já aprovado um plano de operacionalização da supervisão do registo eleitoral presencial.
“Foram anunciadas essas medidas e no quadro delas vão ser implementadas e transmitidas orientações aos órgãos locais a forma como esse processo vai se desenrolar”, afirmou o porta-voz, acrescentando que foi igualmente tornado público, a esse respeito, a aprovação pelo Presidente da República de um crédito adicional ao orçamento da CNE para fazer face às despesas da supervisão do registo eleitoral presencial e ao pré-mapeamento das assembleias de voto.
O comissário da CNE salientou que é a partir dos dados do registo eleitoral que é elaborado o mapeamento das assembleias de voto, ou seja, os locais em que serão instaladas as mesas das assembleias de voto, bem como extraídas as listas dos cidadãos eleitores, afixadas 30 dias antes das eleições.
“[Servem] igualmente de fonte para a elaboração dos cadernos eleitorais, que são uma ferramenta indispensável como meio de trabalho das mesas de voto”, sublinhou.
Quanto ao registo eleitoral no exterior, Lucas Quilundo disse que vai decorrer no mesmo período e será feito nos moldes em que vier a ser estabelecido na legislação em debate na Assembleia Nacional.
Questionado sobre como a CNE se está a preparar relativamente à nova divisão político-administrativa do país, em discussão no país, Lucas Quilundo considerou prematuro tecer qualquer comentário.
“A nova divisão político-administrativa é um processo ainda embrionário, está na fase de auscultação, não é ainda algo que seja definitivo, pelo que seria prematuro fazermos pronunciamentos relativamente a isso, deixemos que o processo seja concluído e, aí sim, a CNE poderá pronunciar-se oportunamente”, frisou.
Instado a comentar as suspeições levantadas por partidos da oposição quanto ao funcionamento da CNE e das acções do presidente do órgão eleitoral, Manuel Pereira da Silva “Manico”, Lucas Quilundo escusou-se a fazer comentários, reafirmando que “essas suspeições não têm razão de ser, porquanto a Comissão Nacional Eleitoral tal como a lei determina desenvolve o seu trabalho única e exclusivamente em respeito à lei, à Constituição e aos demais regulamentos que são aprovados pelo plenário, que é de composição heterogénea”.
“Não têm razão de ser e não temos nós, na CNE, por costume, fazer contraditório de declarações políticas de líderes políticos”, realçou.
Sobre o episódio ocorrido, terça-feira, na CNE, no final do encontro entre o presidente da CNE e o ministro da Administração do Território e Reforma do Estado, Marcy Lopes, para abordar aspectos relacionados com a Lei do Registo Eleitoral, em que o porta-voz foi impedido de prestar declarações à imprensa, Lucas Quilundo explicou hoje que a situação se deveu a questões de agenda.
De acordo com o porta-voz da CNE, o órgão eleitoral angolano encontra-se num período de acções de formação de carácter regional, a nível da SADC [Comunidade de Desenvolvimento de Países da África Austral] dos seus membros, no quadro de um projecto com o Fórum das Comissões Eleitorais dos Países da SADC e o apoio do Centro Europeu de Estudos Eleitorais.
O porta-voz da CNE informou que nessas cações estão envolvidas as comissões nacionais de eleições de Moçambique e de Angola.
“E eu, entre outras tarefas na CNE, tenho igualmente a responsabilidade de supervisionar o grupo que acompanha a direcção de formação e educação cívica eleitoral”, explicou, realçando que “por falha de comunicação”, terá iniciado a entrevista, que teve de “interromper abruptamente”.
“No momento em que tínhamos iniciado a entrevista, devido a esse outro compromisso tivemos de nos ausentar, porque, na qualidade de coordenador desse projecto, tivemos de ir proceder, em nome da CNE, ao encerramento desse ciclo de acções de formação, que decorria numa outra dependência da CNE por via virtual”, adiantou.
“Pelo incidente pedimos as nossas sinceras desculpas e renovamos o nosso compromisso”, acrescentou Quilundo, realçando que a CNE encara os órgãos de comunicação social “como parceiros preciosos” e gostaria “de continuar a manter com esse segmento da sociedade relações cordiais, de boa colaboração”.
O dono (disto tudo) é que sabe
No dia19 de Fevereiro de 2020, o Presidente da República, do MPLA e Titular do Poder Executivo, João Lourenço, ordenou que a (sua) Assembleia Nacional devia dar posse ao presidente da (sua) Comissão Nacional Eleitoral (CNE) porque este foi indicado de acordo com a legislação. E assim aconteceu. Manuel Pereira da Silva “Manico” foi nomeado chefe de posto.
“Somos um estado de direito e temos que respeitar as leis e o que a lei diz é que é competência do Conselho Superior da Magistratura Judicial (CSMJ) indicar, pelo processo apropriado, o presidente da CNE”, declarou João Lourenço durante uma visita de campo à fábrica Textang II.
O presidente da CNE, Manuel Pereira da Silva “Manico”, que tomou nesse dia posse na Assembleia Nacional, foi uma escolha no mínimo controversa que mereceu o repúdio da oposição e de organizações da sociedade civil, que apontam irregularidades no concurso e no processo de nomeação. Mas… quem pode manda. E quem manda (desde 1975) é o MPLA e quem manda no MPLA é João Lourenço. Portanto, o MPLA continua a ser Angola e Angola continua a ser do MPLA.
A UNITA e outros quatro deputados independentes da oposição apresentaram no mesmo dia requerimentos contra a tomada de posse do novo presidente da CNE, que foram chumbados pela maioria parlamentar (MPLA), conforme ordens superiores baixadas pelo seu Presidente.
Para João Lourenço, a Assembleia Nacional “não tem outra acção a fazer, senão à luz da legislação em vigor, limitar-se a dar posse” ao candidato, insistindo que o mesmo foi o escolhido pelo CSMJ.
O nome de Manuel Pereira da Silva “Manico” foi alvo de um pedido de impugnação da UNITA, submetido ao Tribunal Supremo (do MPLA) que, como estamos – citando João Lourenço – num Estado de Direito, faz o que o Presidente manda.
Na providência cautelar, a UNITA pedia a suspensão da selecção de Manuel Pereira da Silva pelo Conselho Superior da Magistratura Judicial, devido a várias irregularidades registadas no concurso curricular para o provimento dos cargos de presidente da CNE e de presidente das Comissões Provinciais e Municipais Eleitorais.
Na resposta, o Tribunal Supremo argumentou que a providência cautelar não deveria ter sido proposta pela UNITA, atendendo ao facto de que o mesmo não foi parte no concurso que aprovou o candidato Manuel Pereira da Silva como presidente da CNE.
Entretanto, para relembrar a todos que Angola é um Estado de Direito (embora propriedade privada do MPLA), dois jornalistas da Palanca TV queixam-se de terem sido agredidos no mesmo dia por agentes da polícia (do MPLA), em Luanda, enquanto cobriam uma manifestação em protesto contra a tomada de posse do novo chefe de posto (ou presidente) da CNE.
Também o Folha 8 manifestou, publicamente, no dia 19 de Janeiro de 2020, a sua oposição à nomeação de Manico para exercer a presidência da CNE, por ser por muitos considerado não só um embuste, como um jurista parcial e cegamente comprometido com a ala mais radical do partido no poder desde a independência.
A indicação, num processo denunciado, “ab-initio”, inter-pares e não só, como viciado, foi e continua a ser uma verdadeira afronta à sociedade civil, aos eleitores e aos partidos políticos, comprometidos com a transparência, rigor, imparcialidade, boa-fé e clara demonstração de já haver um vencedor no pleito eleitoral de 2022.
Por isso não nos calaremos ante uma vergonha institucional, que elegeu um ex-juiz comprometido com a mentira, com a batota e com a ideologia partidária. Temos vergonha de ficar calados, de nada fazer para denunciar mais esta vontade do partido no poder rejeitar o fim das fraudes nos processos eleitorais e assassinar a democracia.
Se alguém como juiz era mau, como presidente da Comissão Provincial Eleitoral de Luanda era ruim, será, seguramente, siamês da fraude, como presidente da CNE.
O seu curriculum sinuoso nunca mentiu desde o tempo em que foi membro do Conselho Confederal da UNTA-CS, por recomendação do (é claro) MPLA. Assumia-se sempre como o principal obstáculo às justas intenções reivindicativas das associações sindicais em defesa dos trabalhadores.
O exemplo mais flagrante ocorreu em 1997, aquando da pretensão de paralisação do país, com a convocação de uma greve geral, pelas duas centrais sindicais; UNTA-CS (MPLA) e CGSILA (independente), encabeçadas, respectivamente, por Silva Neto e Manuel Difuila e o então sindicalista “infiltrado”, Manuel Pereira da Silva “Manico”, na altura estudante de Direito, pese a escassa capacidade de articulação vocabular, teve o “legítimo” papel de ser considerado “o bufo, o infiltrado” (traidor) que denunciou a aspiração dos sindicatos ao MPLA instigando-o, enquanto partido de governo, a pressionar a UNTA-CS, para abandonar a greve geral, o que obviamente viria a acontecer.
Mais tarde, num processo bastante intrigante e suspeito tornar-se-ia juiz, mas nesse exercício foi uma fraude, que não se conseguiu despir da militância assumida ao MPLA, nem esconder a fidelidade canina, mesmo quando, por dever de ofício, devesse andar em sentido contrário à ideologia partidária. Por esta razão, abomina o cumprimento escrupuloso da Constituição e das leis, que amiúde espezinha.
Recorde-se que o nosso Director, William Tonet, foi uma das vítimas de Manico que, no julgamento realizado em 10.10.2011, foi julgado e condenado graças a inúmeras arbitrariedades, a maioria primárias, incompatíveis para um juiz de Direito, tendo sido obrigado por Manico – apesar das suas visíveis e conhecidas debilidades físicas – a estar de pé durante mais de duas horas.
Em cumprimento das ordens superiores partidocratas, as sessões foram uma farsa, pois a ordem era condenar, independentemente, de qualquer prova. Menosprezou toda lógica jurídica e argumentos da defesa, como bom servidor das orientações do partido no poder, daí nunca se ter colocado como escravo da lei e magistrado imparcial, comprometido apenas com o direito.
Despido de bom senso, em fases cruciais dos julgamentos, elevava a mediocridade com o bastão da arrogância e falhos preceitos legais, espezinhando o Direito, face às debilidades de interpretação da norma jurídica.
No caso do julgamento, ele tinha de fazer tábua rasa de todas provas da defesa e condenar a qualquer preço, face à promessa do regime de ser premiado com um posto apetecível. Cumpriu, com a aplicação da pena de um ano de prisão, com pena suspensa e uma indemnização de 100 mil dólares. Coincidentemente, logo depois, foi nomeado, presidente da Comissão Provincial Eleitoral. Coincidência? Não! É a lógica da batota na lei da batata.
Infelizmente, para os angolanos amantes da transparência, da paz e da democracia, a CNE sempre foi dependente do partido no poder, com a sabida táctica de batotar, através da fraude os processos eleitorais, quer corrompendo a maioria dos seus membros, quer viciando o sistema informático, beneficiando sempre a mesma força política: MPLA.
Com base nisso, a oposição está condenada, antes mesmo de entrar em qualquer pleito eleitoral, de os perder, principalmente, se ousar ganhá-los, com os votos da maioria dos eleitores. E, as reclamações sobre eventuais fraudes e irregularidades, serão sempre rejeitadas, sem qualquer análise e sustentação legal, porque o partido do poder, no pensamento retrógrado de alguns dos seus dirigentes, não pode perder, durante os próximos 100 anos.
Continuar a assistir de forma cúmplice a esse estado de coisas é, não só uma grande cobardia, como traição ao país e à sua estabilidade futura, por parte dos políticos de bem (muitos até são do MPLA), que devem estar comprometidos com a verdade, a transparência e a democracia.
Folha 8 com Lusa