Sou angolano (do MPLA)

O artigo “Sou angolano (do MPLA)”, aqui publicado no dia 26 de Dezembro de 2020, foi o mais lido e partilhado de todos os publicados pelo Folha 8. Sem comentários da nossa parte, vamos agora republicá-lo, na íntegra e “ipsis verbis”:

Um projecto cultural e filantrópico denominado “Sou angolano, sou da paz e lutarei pela paz”, destinado a promover o patriotismo e a cidadania, foi lançado hoje, sábado, no município de Viana (Luanda), numa iniciativa do músico angolano Chilola de Almeida.

Segundo o mentor do projecto, que tem o patrocínio da Câmara de Comércio Angola-China, a promoção do patriotismo e dignificação da identidade nacional, no âmbito dos seus objectivos, será feita por via das artes.

Para isso, perspectiva incentivar, por via das artes, a manutenção e conservação da paz, como maior ganho social dos últimos anos, e a transmissão de conhecimentos sobre os símbolos nacionais, com destaque para o hino nacional.

A estratégia para a concretização do projecto, segundo Chilola de Almeida, será a realização de concursos de música, teatro e dança para os fazedores de artes, além de conferências, workshop´s e palestras a serem realizadas em todo território nacional, a partir do primeiro trimestre do próximo ano.

Presente no acto de lançamento, realizado na casa da Juventude, o presidente da União Nacional dos Artistas e Compositores, Zeca Moreno, realçou a importância do projecto, e garantiu apoio da instituição, quer moral, quanto material, até à sua concretização, uma posição partilhada por André Araújo, representante do Conselho Nacional da Juventude na cerimónia.

Por sua vez, o director municipal da cultura de Viana, Melquim dos Santos, afirmou que o projecto é um contributo valioso à Nação, sustentando que aborda a paz, uma conquista que deve ser preservada por todos angolanos.

O representante da Câmara de Comércio Angola-China, Francisco Swami, realçou a importância do projecto, indicando que vai permitir também a ocupação dos tempos livres dos jovens, bem como despertar neles os valores patrióticos e de cidadania.

Marcaram presença na cerimónia, representantes da administração local, da sociedade civil, homens de cultura, entre outros convidados.

Símbolos nacionais do… MPLA

A lei que estabelece a deferência do uso da bandeira nacional, insígnia e hino nacional de Angola (leia-se do MPLA) foi aprovada no dia 9 de Agosto de 2018 pelo Parlamento, com 131 votos favoráveis do MPLA e de parte da oposição constituída pelos sipaios do MPLA, contando ainda com 56 abstenções dos sipaios assimilados da UNITA.

A proposta do Governo foi aprovada durante a terceira reunião plenária extraordinária da 1.ª sessão legislativa da quarta legislatura da Assembleia Nacional e visa, entre outras, “promover o conhecimento massivo, o respeito e a utilização uniforme dos símbolos nacionais”.

Em sede de votação final global do diploma legal, que tem ainda como fundamento densificar os dispositivos constitucionais sobre os símbolos nacionais, o MPLA (no poder desde 1975), considerou o documento como um “factor positivo sobre a valorização e reconhecimento histórico do país”.

“A aprovação da presente lei é o factor positivo desse esforço colectivo e só assim teremos a certeza da elevação da consciência patriótica dos cidadãos, da valorização e reconhecimento da nossa história e da nossa identidade cultural”, afirmou na altura o deputado do MPLA, Nuno Carnaval.

Apesar de “discordar” de um dos símbolos, a “bandeira nacional de Angola semelhante à bandeira do MPLA”, a CASA-CE votou favoravelmente o documento de acordo, aliás, com as ordens superiores recebidas do… MPLA.

“Votamos a favor porque entendemos que o que se traz aqui não é aprovarmos novos símbolos, mas é estabelecer um conjunto de regras no sentido da utilização e respeitabilidade dos símbolos nacionais. O Estado angolano tem símbolos nacionais e, enquanto existirem, temos a obrigação de os respeitar”, fundamentou o deputado Lindo Tito com, reconheça-se, um brilhantismo de raciocínio e de coerência política digna de ombrear com os mais célebres sipaios de era colonial.

No seio da UNITA, o maior partido na oposição que o MPLA permite, o deputado Adalberto da Costa Júnior argumentou que a actual bandeira de Angola, a insígnia e o hino “não são factores de consenso por carregarem representatividade partidária”.

“Por isso, não simbolizam a unidade nacional que todos permanentemente apelamos. Os símbolos nacionais não devem acarretar vantagens e privilégios para uns e penalidades para outros”, apontou.

Aquando da discussão na generalidade oposição (isto é, a UNITA) centrou o debate na necessidade de alterar a bandeira do país, adoptada a 11 de Novembro de 1975… pelo MPLA, dada a semelhança à do partido no poder desde a mesma data, o MPLA, mas também do hino nacional, que “apenas reconhece heróis do 4 de Fevereiro”, data histórica do início da luta armada para a independência de Angola.

No relatório de fundamentação, o MPLA/Estado/executivo sublinhou que os símbolos nacionais são sinais distintivos de importante valor histórico que, para além de expressarem a dimensão patriótica mais profunda de Angola (a Angola do MPLA, entenda-se), representam a soberania, a independência nacional, a unidade nacional e a integridade do Estado.

Segundo o documento, o objectivo principal deste diploma, entre outros associados ou complementares, é “densificar os dispositivos constitucionais sobre os símbolos nacionais, bem como promover o conhecimento massivo, o respeito e a utilização uniforme dos símbolos nacionais”.

No final do debate, o presidente da Assembleia Nacional, Fernando da Piedade Dias dos Santos “Nandó” (do MPLA), chamou a atenção para o facto de “a maioria” ter estado “deslocada” do assunto, sublinhando que análise da proposta era para a “deferência aos símbolos nacionais, quaisquer que eles sejam, os actuais ou os futuros”.

“Qualquer que seja o teor da bandeira, nós vamos ter que respeitá-la, vamos ter que hasteá-la nos palácios, nos órgãos de soberania nacional. Nós vamos no fim, mesmo depois das discussões na especialidade, com uma nova bandeira ou um novo hino, nós vamos aprovar as deferências, os actos de respeito, de homenagem, pelos símbolos”, disse o presidente do Parlamento do MPLA, certo que está que – nesta como em todas as outras questões – o MPLA é Angola e Angola é do MPLA.

O MPLA e a sua liderança, enquistada nos ensinamentos perenes e nobres dos tempos de partido único (que se mantêm), engravidada pelas não menos nobres qualidades da ditadura, corrupção, branqueamento e exploração de escravos, continua a mostrar que se está nas tintas para a democracia. E tem razão.

A democracia foi, segundo o ex-presidente do MPLA, imposta. E para derrotar tudo o que é imposto, dizem que a luta continua e a que a vitória é certa. E essa luta faz-se contra um Povo que, consideram, por ser ignorante continua a não perceber o que verdadeiramente é relevante: que o MPLA é Angola e Angola é do MPLA.

Aliás, o MPLA (seja o de Eduardo dos Santos ou o de João Lourenço) não tem a mínima noção do que é o país. Para ele, Angola é tão-somente o que o partido e os seus dirigentes entenderem que deve ser. E nessa equação não entra a opinião das pessoas pois, como se sabe, para pensar por elas é que existe o partido.

Por alguma razão, como todos sabemos, os símbolos ditos nacionais são iguais, ou até os mesmos, aos do MPLA. As personalidades relevantes da sociedade são as do MPLA, os heróis são os do MPLA, tudo é do MPLA.

Nem mesmo a moeda, dita nacional, escapa a essa visão mesquinha, retrógrada e tumoral do guia supremo do Povo, o MPLA.

A bandeira Nacional não é mais do que uma cópia da do MPLA, não representa todas as matizes da sociedade. Mas isso é irrelevante no contexto das democracias mais avançadas e nas quais se inspira o MPLA. São os casos da Coreia do Norte e da Guiné Equatorial. Aliás, basta dar uma volta pelo mundo para ver que as bandeiras de quase todos os país reflectem a imagem do partido dominante…

Recorde-se que em 2003, a Comissão Constitucional ficou de propor novos símbolos nacionais, acabando por apresentar em 28 de Agosto de 2003 uma proposta para a nova bandeira de Angola.

Recordam-se? Seria uma bandeira dividida em cinco faixas horizontais. As faixas inferior e superior azuis escuras, representariam a liberdade, a justiça e a solidariedade. As duas faixas intermédias, de cor branca, representariam a paz a unidade e a harmonia. A faixa central de cor vermelha, representaria o sacrifício, tenacidade e heroísmo. No meio da faixa vermelha ficaria um sol amarelo com 15 raios, composto de três círculos irregulares concêntricos. A imagem era inspirada nas pinturas rupestres de Tchitundo-Hulu, na província do Namibe. O sol simbolizaria a identidade histórica e cultural e a riqueza de Angola.

O Hino Nacional é também do tempo de partido único e a letra é de visão socialista e, como seria inevitável, é da autoria de dois militantes do… MPLA (Manuel Rui Monteiro e Rui Mingas): “Angola, avante! Revolução, pelo Poder Popular! Pátria Unida, Liberdade, Um só povo, uma só Nação!”

Depois surge a bestialidade, a mediocridade, o anacronismo do Bilhete de Identidade. Mais uma vez o reverencial canino, o culto da personalidade, levaram o regime a nele colocar as fotos dos presidentes (do MPLA), uma clara postura ditatorial monárquica.

O patriotismo dos assimilados

Em tempos o então ministro das Relações Exteriores de Angola, Manuel Domingos Augusto, declarou que África deve deixar de olhar para a Europa como “eterna culpada dos seus problemas” e que os dois continentes devem evolui para parcerias mutuamente benéficas. Fazendo fé em quem manda (presume-se que seja João Lourenço), esta nova tese do MPLA tem duas excepções – Angola e Portugal.

E das duas uma. Ou, segundo MPLA, Portugal não faz parte da Europa, ou Angola não se localiza em África. É que, para os ortodoxos do partido que nos (des)governa desde 1975, capitaneados por João Lourenço, Portugal é culpado de tudo… nomeadamente dos fracassos criminosos do MPLA.

Recordemos, por exemplo, que o inquérito para apurar causas do desabamento, em 2008, do edifício da investigação criminal, em Luanda, responsabilizou a administração colonial portuguesa, por ter permitido a construção sobre um lençol de água.

E essa estratégia de tornar Portugal no mais pacífico e invertebrado bode expiatório integra, goste-se ou não, o ADN do MPLA. Faria, aliás, todo o sentido que a administração colonial portuguesa (mesmo que em abstracto) fosse levada ao Tribunal Penal Internacional. Desde logo por ser responsável pelos dirigentes do regime que nasceram no tempo colonial.

Talvez até o massacre do 27 de Maio de 1977, seja responsabilidade da administração colonial que não cuidou de evitar a existência de supostos fraccionistas.

Em 2008, o edifício da antiga Direcção Nacional de Investigação Criminal (DNIC) desabou tendo causado 24 mortos entre as 180 pessoas que se encontravam no edifício.

À questão, colocada em 24 de Novembro de 2015 pela deputada da UNITA, Mihaela Weba, sobre os resultados do inquérito, Eugénio Laborinho (então secretário de Estado dos Serviços de Protecção Civil e Bombeiros do Ministério do Interior e Ministro do Interior) disse que o mesmo “está em curso”.

“Já são muitos anos que se passaram. O prédio da DNIC estava numa área de erosão hídrica, porque ali várias fontes de água passavam, por aí e porque também é uma área complicada em termos de vulnerabilidade de risco, uma vez que já houve algumas réplicas naquela direcção”, explicou o governante do MPLA.

Eugénio Laborinho disse ainda que na altura não faltaram os alertas para aquela situação, frisando que o prédio desabou em segundos.

“Deu a primeira réplica, a segunda e à terceira o prédio desabou e tinha detidos na altura. O que é que nós podíamos fazer?”, questionou.

O então secretário de Estado lembrou que na altura, enquanto comandante da Protecção Civil e Bombeiros, dirigiu as operações de resgate, que “já lá vão muitos anos” e que o inquérito está em curso.

“Agora vamos julgar quem? O Ministério da Construção, o ministro do Interior na altura? O director da DNIC, na altura? Quem?”, devolveu as perguntas à deputada.

“Aquilo aconteceu, aquilo o construtor é o colono, que nós temos que ir buscar lá. É verdade, foi o que aconteceu. É o colono que construiu mal, construiu por cima de um lençol de água. Isto é perigoso e nós temos estado a alertar do ponto de vista preventivo que isso não é assim”, sublinhou brilhantemente Eugénio Laborinho. Tão brilhante que foi estagiar como governador da colónia de Cabinda para depois tomar posse como ministro.

O dirigente fez uma analogia do caso às construções realizadas junto de encostas, morros e linhas de água, que “depois quando vem o azar é um problema” e querem culpabilizar o Governo.

“Contributo” do Folha 8

No sentido de ajudar Eugénio Laborinho e todos aqueles que o mandam dizer este chorrilho de asneiras a elaborar um dossier contra a administração colonial, que deverá ser apresentado em Haia ao TPI, o Folha 8 deixe aqui o seu modesto contributo.

Assim, como introdução, tudo o que de mal se passou em Angola, sobretudo nos últimos 45 anos, tem raízes nos quatrocentos e tal anos anteriores.

Todos sabemos que a administração colonial portuguesa (não confundir com a do regime) foi responsável pelos milhares (40 mil? 80 mil?) de angolanos torturados e assassinados em todo o país depois dos acontecimentos de 27 de Maio de 1977, acusados de serem apoiantes de Nito Alves ou opositores ao regime.

Tal como foi responsável pelo massacre de Luanda que visou o aniquilamento e de cidadãos Ovimbundus e Bakongos, onde morreram 50 mil angolanos, entre os quais o vice-presidente da UNITA, Jeremias Kalandula Chitunda, o secretário-geral, Adolosi Paulo Mango Alicerces, o representante na CCPM, Elias Salupeto Pena, e o chefe dos Serviços Administrativos em Luanda, Eliseu Sapitango Chimbili.

Foi igualmente responsável pelo massacre do Pica-Pau em que, no dia 4 de Junho de 1975, perto de 300 crianças e jovens, na maioria órfãos, foram assassinados e os seus corpos mutilados no Comité de Paz da UNITA em Luanda, ou do massacre da Ponte do rio Kwanza, em que no dia 12 de Julho de 1975, 700 militantes da UNITA foram barbaramente assassinados, perto do Dondo.

A administração colonial portuguesa (não confundir com a do regime) foi também responsável pelo facto de entre 1978 e 1986, centenas de angolanos serem fuzilados publicamente, nas praças e estádios das cidades de Angola, uma prática iniciada no dia 3 de Dezembro de 1978 na Praça da Revolução no Lobito, com o fuzilamento de 5 patriotas e que teve o seu auge a 25 de Agosto de 1980, com o fuzilamento de 15 angolanos no Campo da Revolução em Luanda.

Ou por, em Junho de 1994, a aviação (provavelmente da… UNITA) ter bombardeado e destruído a Escola de Waku Kungo, tendo morto mais de 150 crianças e professores, e de entre Janeiro de 1993 e Novembro de 1994, ter bombardeado indiscriminadamente a cidade do Huambo, a Missão Evangélica do Kaluquembe e a Missão Católica do Kuvango, tendo morto mais de 3.000 civis.

A administração colonial portuguesa (não confundir com a do regime), é igualmente responsável por:

– Todos os dias, a todas as horas, a todos os minutos haver angolanos que morrem de barriga vazia, sendo que 70% da população passa fome;

– 45% das crianças angolanas sofrem de má nutrição crónica, e que uma em cada quatro (25%) morrer antes de atingir os cinco anos;

– No “ranking” que analisa a corrupção mundial, Angola ainda não ter atingido o pódio do mais… corrupto (embora ande perto);

– A dependência sócio-económica a favores, privilégios e bens, ou seja, o cabritismo, se o método utilizado pelo MPLA para amordaçar os angolanos e que o silêncio de muitos, ou omissão, deve-se à coacção e às ameaças do partido que está no poder desde 1975.

– A corrupção política e económica ser hoje, como ontem, utilizada contra todos os que querem ser livres, que 76% da população vive em 27% do território, que mais de 80% do Produto Interno Bruto é produzido por estrangeiros; mais de 90% da riqueza nacional privada foi subtraída do erário público e está concentrada em menos de 0,5% de uma população;

– O acesso à boa educação, aos condomínios, ao capital accionista dos bancos e das seguradoras, aos grandes negócios, às licitações dos blocos petrolíferos, estar limitado a um grupo muito restrito de famílias ligadas ao regime no poder.

Voltemos ao ministro Manuel Domingos Augusto. “A aproximação entre Europa e África é incontornável. A Europa é o principal parceiro económico de África e África é depositária de grandes reservas de matérias-primas, algumas delas fundamentais para a indústria europeia, por isso, há aqui uma relação de interdependência”, disse o então chefe da diplomacia do MPLA, no 1º EurAfrican Fórum.

Manuel Augusto apelou a que os dois continentes acompanhem “o movimento dos tempos” e abandonem “paradigmas que já foram ultrapassados” e “tabus psicológicos” prejudiciais para ambos.

Tal como o paternalismo da Europa em relação a África ainda acontece, “às vezes, ainda que de forma involuntária”, também África “deve deixar de olhar a Europa como eterno culpado dos seus males e única fonte para resolução dos seus problemas”.

Para o governante do MPLA, é preciso “evoluir” para aquilo que todos afirmam querer: “uma parceria justa, com benefícios mútuos” para os dois continentes.

Questionado sobre a criação de zonas de comércio livre em África, o ministro concordou que é preciso partir para a criação de “mecanismos próprios”, pois “não é concebível que a banana produzida no Benim tenha de ir para a Europa para depois ser comprada por Angola”.

A “parceria com a Europa” é importante para resolver problemas como a falta de vias de comunicação ou um tecido industrial desenvolvido e deve ser encarada de forma positiva.

“É preciso consolidar a noção que o facto de Angola e outros países africanos quererem fábricas para transformar os seus produtos não significará menos negócio para os países europeus. Aliás estamos a convidar os países europeus para virem para um mercado quase virgem para investirem e fazerem as fábricas”, salientou.

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