Metade das empresas angolanas, que ainda não viram o alcance mundial da tese do Presidente do MPLA (“melhorar o que está bem e corrigir o que está mal”) considera que as situações de fraude aumentaram desde 2019 e 61% acredita que o número de ocorrências vai aumentar no futuro, revela a primeira edição do “Fraud Survey Angola” da Deloitte agora divulgado.
O estudo, que avalia as percepções relativamente ao tema de fraude no mercado empresarial angolano, foi realizado entre 29 de Junho e 17 de Julho deste ano.
Quando inquiridos sobre a percepção e evolução da fraude no mercado angolano, 50% das empresas consideraram que o número de situações fraudulentas aumentou no último ano e mais de metade (60%) “teve conhecimento de algum evento de fraude no meio empresarial”, lê-se no documento. Além disso, 61% das empresas acreditam que o número de ocorrências vai aumentar no futuro.
Quase um terço (32%) dos inquiridos admitiram que a sua empresa enfrentou alguma situação de fraude no último ano, apontando “como principais custos associados a essas situações a perda de reputação (46%), o desvio de fundos (38%) e a realização de negócio (33%)”.
“Cerca de 65% dos inquiridos pertencentes ao segmento das grandes empresas referem ter conhecimento de empresas envolvidas em situações de fraude recentemente, comparando com os 57% das PME [pequenas e médias empresas]”, conclui o estudo.
Por sector de actividade, “podemos concluir que os inquiridos do sector de serviços não financeiros são aqueles que menos conhecimento têm de empresas envolvidas em situações de fraude (58%)”, lê-se no relatório da Deloitte.
Relativamente aos principais responsáveis e modalidades de fraude, mais de dois terços (69%) apontam “os quadros médios e superiores” das empresas.
A corrupção (59%), o desvio de fundos (53%) e o tráfico de influências (52%) são as principais formas de fraude identificadas pelas empresas angolanas inquiridas, de acordo com o estudo da Deloitte.
Todas as empresas do sector de bens de consumo “consideram a corrupção a forma de fraude mais comum nas empresas angolanas”.
Por sectores, os serviços financeiros são os que estão mais expostos, com mais de metade (57%) dos inquiridos a apontar esta área, seguida dos bens de consumo (16%) e de serviços não financeiros (15%).
Já as áreas comercial (43%), ‘procurement’ [aprovisionamento] (37%) e financiamento e actividades relacionadas (17%) “são consideradas as que apresentam um maior risco de fraude dentro de uma organização”.
Como principais causas da fraude, as empresas inquiridas apontam a “a inexistência de um sistema de controlo eficiente (45%) e a falta de valores éticos (32%)”.
No que respeita aos processos mais utilizados na identificação de situações de fraude, as empresas angolanas referem “os mecanismos de controlo interno (61%), a investigação interna (12 %%) e o canal de ‘whistleblowing’ [delação] (4%)”.
Por dimensão empresarial, “há uma maior percepção de que as ocorrências de fraude aumentaram entre as grandes empresas (57%) em comparação com as PME (39%)”, salienta o estudo, cujo inquérito obteve um total de 75 respostas.
O chefe manda, o líder dá o exemplo
A rota de Angola foi “belicamente dinamitada”, no dia 2 de Fevereiro, através de um microfone colocado pela DW diante do Presidente da República, João Lourenço. Os estilhaços verbais (atacar é a melhor defesa, a melhor forma de sacudir as responsabilidades) foram muitos e, voluntária ou involuntariamente, atingiram vários alvos: políticos, parlamentares, judiciais, partidários e da sociedade civil.
A maioria dos cidadãos, até os bajuladores (os de ontem, os de hoje e os que de ontem são agora de hoje), esperava maior contenção verbal, do mais alto magistrado do reino, mas a emoção, numa primeira fase e, noutra, o excesso de poder (todos os poderes do Estado), inibiram-no de navegar nas águas da humildade e do bom senso e ser politicamente correcto.
Definitivamente, com tantos anticorpos criados, em três anos de mandato, João Lourenço não está interessado (nem preocupado) em trilhar o caminho da democracia pois, mesmo perdendo as eleições de 2022, ele já as ganhou, no instituto da fraude eleitoral, capitaneada pela Comissão Nacional Eleitoral.
Na entrevista, a falta de polidez levou-o a atacar e mandar farpas, até mesmo contra a instituição Presidência da República, órgão solene, cujo titular temporário, não deve, por dever de ofício, andar em sentido contrário à Constituição, art.º 115.º, no acto de posse disse jurar: “Cumprir e fazer cumprir a Constituição da República de Angola e as leis do País (…) Defender a paz e a democracia e promover a estabilidade, o bem-estar e o progresso social de todos angolanos”.
Do ponto de vista político, João Lourenço reconheceu, o óbvio: “De facto eu trabalhei debaixo da orientação do Presidente José Eduardo dos Santos. Todos nós trabalhámos. Um Presidente que ficou quase 40 anos no poder. Ninguém pode dizer que não fazia parte do sistema. Todos nós fizemos parte do sistema. Mas quem está em melhores condições de corrigir o que está mal e melhorar o que está bem são precisamente aqueles que conhecem o sistema por dentro. Isso foi assim em todas as revoluções, se assim quisermos chamar”.
Uma verdade incontornável, num misto de cinismo, que não afasta o Presidente dos crimes de negligência, pois, reconhece, que tinha ciência da prática de ilícitos e nunca os denunciou, pelo contrário, fez parte do festim, condenados pelo art.º 13.º do Código Penal: “Age com negligência quem, por não proceder com o cuidado a que, segundo as circunstâncias, está obrigado e de que é capaz: (…) b) não chegar sequer a representar a possibilidade de realização do facto”.
Infelizmente não se conhece que, no passado, o Presidente João Lourenço tenha tido algum procedimento de denúncia, legislativa, judicial, junto do Tribunal Supremo ou mesmo nas reuniões da cúpula partidária, logo é suspeito, à luz do Direito, mais a mais ao não contornar a verdade, requeridas pelo cargo, ao dizer “que (JES) ficou quase 40 anos no poder”, quando a precisão e honestidade, levam-nos ao conhecimento de terem sido, 38 anos (1979-2017) de intensa cumplicidade, tornando, num julgamento justo e imparcial, o actual Presidente da República, como agente do crime, art.º 25.º do Código Penal (Cumplicidade):
“1. É punível como cúmplice quem, fora dos casos previstos no artigo anterior, prestar, directa e dolosamente, auxílio material ou moral à prática por outrem de um facto doloso.
2. É aplicável ao cúmplice a pena fixada para o autor, especialmente atenuada”.
Aqui chegados, podemos verificar o grau de engajamento, não individual, mas de toda cúpula do MPLA, no desfalque do erário público, como reconheceu o Presidente à DW: “Todos nós trabalhámos”!
Trabalharam com JES e a referência TODOS, é direccionada, exclusivamente, à cúpula do MPLA, acusada de actuar ao longo dos 45 anos de independência, como uma espécie de organização criminosa, talhada para a prática do mal, contra a maioria dos angolanos. Logo, o combate à corrupção só terá, só teria, mérito mediante um Pacto de Regime, onde todas as forças políticas e da sociedade civil se revejam num sério combate, que deve ser sistémico e não endémico.
O que se passa em Angola não pode ser comparado às revoluções ocorridas, no passado ou mesmo presente, de outras latitudes, como afirmou: “Quem fez as grandes mudanças não são pessoas de fora, são as que conhecem o sistema. Quem fez as reformas na Rússia foram os russos; quem fez as reformas na China foram os chineses. Quem fez as reformas em todos os países da antiga Europa do leste foram os povos e políticos desses países (…) quem fez a Revolução dos Cravos em Portugal foram os portugueses”.
Exacto. Mas existe uma flagrante diferença, entre Angola e os países citados por João Lourenço, porquanto lá houve mudanças radicais, através de revoluções, que levaram à ruptura contra os regimes anteriores.
Infelizmente, essa realidade (reformas; revoluções; mudanças) é avessa aos pergaminhos do MPLA, que fala de uma coisa, escreve outra e continua, no presente, a combater, com armas, granadas, cães, gás lacrimogénio quem no espírito da legítima, pacífica e sem armas, pretenda reivindicar, nas ruas. A essa legitima pretensão cidadã, o regime do Presidente João Lourenço, quando se augurava o contrário, impõe aos manifestantes, a lei do bastão e da bala, em flagrante violação ao art.º 47.º CRA. A Constituição e as leis para a Polícia Nacional (ou será do MPLA?), são uma porcaria, logo não a respeitam nem cumprem…
Ademais, “as mudanças ou grandes mudanças”, propaladas, pelo líder do MPLA, não passam de um mero exercício de diversão, ao existir uma velada resistência bélica contra a alteração ou revogação da Constituição atípica, que estatui o controlo do Estado, por uma força partidária.
Na verdade, a grande mudança de que Angola carece é da retirada dos poderes absolutos, concentrados num homem só (presidente do MPLA, igualmente, Presidente da República, Titular do Poder Executivo, Chefe de Estado, Comandante-em-chefe das Forças Armadas, Titular do poder judicial, para os transferir, na totalidade, aos órgãos de soberania, porquanto: o legislativo (não legisla nada); o executivo (é um órgão individual, não colegial) e o judicial (está na bota da partidocracia), todos esvaziados desde 11 de Novembro de 1975, pelo Conselho da Revolução do MPLA (na prática o primeiro órgão do Estado), para desgraça da maioria dos angolanos.
Nesta ceara, o Presidente da República comete um pecado capital, demonstrando ter maus conselheiros jurídicos ou não os escutar, quando, sub-repticiamente, expressou a intenção de ver nas barras do tribunal, em 2022, não só o ex-Presidente da República, como o seu vice, Manuel Vicente, a quem chegou a lançar farpas pouco éticas: “Este senhor, não é meu conselheiro”, para quem, hoje, desempenha o papel de deputado do próprio MPLA.
Ao ser questionado sobre a responsabilidade de José Eduardo dos Santos respondeu: “Tem de conhecer a nossa legislação” (…) “Os antigos Presidentes gozam de imunidade durante pelo menos cinco anos” (…); “Quem abre os processos-crime na Justiça não são os políticos. É a própria Justiça quem vai atrás de possíveis crimes. (…); “Portanto, não se pode pensar que é o Presidente da República quem mandou para tribunal A, B ou C. Nem teria tempo para isso”. (…); “Talvez fosse assim no passado. Hoje não. Hoje eles têm absoluta liberdade. Só isso justifica o facto de estar a haver “n” casos de julgamentos diversos, e particularmente nesta matéria da luta contra a corrupção”.
Vamos aos factos, primeiro, a imunidade, não é “pelo menos de cinco anos”, mas sim cinco anos. Num outro ataque a Dos Santos, acusa-o de, no seu tempo a justiça ter sido politizada, ao afirmar: “talvez fosse assim no passado”. Tem João Lourenço um caso a apontar? Verdade ou mentira, a Constituição no art.º 119.º, incrimina a fala presidencial, porquanto ele é, uma espécie de titular do poder judicial e judiciário, ao nomear todos magistrados Judiciais dos Tribunais Constitucional, Supremo, de Contas, Supremo Militar e da Procuradoria-Geral da República.
Ora, se no passado havia selectividade, ela, hoje, apenas diverge por só atingir adversários e inimigos do líder do partido no poder, logo era higiénico reconhecer, também, se, o actual Presidente da República, obteve ou não, a omissão de sectores bancários, de investigação criminal e judiciais, sobre eventuais vantagens materiais, na época, denunciada como de fanfarra financeira.
Por outro lado, é imperioso o conhecimento constitucional por parte dos actores políticos angolanos, que desconhecem a latitude do art.º 127.º (Responsabilidade criminal) da Constituição atípica, porquanto mesmo passados os cinco anos, infelizmente, José Eduardo dos Santos não poderá ser julgado:
“1. O Presidente da República não é responsável pelos actos praticados no exercício das suas funções”, isso quer dizer que, mesmo nos crimes que lhe são apontados, no “Despacho-sentença” de favorecer a filha e o genro, no caso dos diamantes e joalharia, JES não poderá, depois dos cinco anos (2017- 2022), ser julgado, por terem sido actos praticados no exercício das funções, logo com cobertura constitucional.
No entanto, houvesse fortes indícios da prática de ilícitos, ainda no exercício de funções (2012-2017), porque razão João Lourenço quer na qualidade de deputado (1984-1992), presidente do Grupo parlamentar do MPLA (1993-1998) ou 1.º vice-presidente da Assembleia Nacional (2003-2014), não accionou os mecanismos para intentar um processo-crime, contra José Eduardo dos Santos, segundo o n.º 1, art.º127.º CRA: “em caso de suborno, traição à Pátria e prática de crimes definidos pela presente Constituição como imprescritíveis e insusceptíveis de amnistia”.
Mesmo que fosse em tentativa, já seria um feito referenciável, do proponente, demonstrando verdadeiro comprometimento com o combate sistémico, aos vários crimes de Estado.
Os paliativos e “show-off”, para afirmação da nova elite, visam a manutenção no poder, caso contrário, não rejeitaria desafiar o comprometimento crónico da oposição, para reunir os votos requeridos no art.º 129.º CRA: “O Presidente da República pode ser destituído por crimes de suborno, peculato e corrupção”, com deliberação aprovada “por maioria de 2/3 dos deputados em efectividade de funções” (…) Estes processos têm prioridade absoluta sobre todos os demais e devem ser conhecidos e decididos no prazo máximo de 120 dias contados da recepção da devida petição”.
Foi accionado este articulado antes, ou aventado, por alguém? Houve integridade moral, no auge do poder absoluto de Eduardo dos Santos ou a pseudo-coragem só emergiu quando o homem está na lama, sem honra nem glória, inclusive sem direito a espaço no Jornal de Angola, onde os seus directores tratam o órgão público como se fosse do MPLA (e o é, na realidade).
Outrossim, o país ganharia se fossem divulgadas, as muitas actas produzidas, no tempo do ex-vice presidente da Assembleia Nacional, João Lourenço, espelhando o seu inconformismo contra a corrupção, peculato e nepotismo praticados, unicamente, por José Eduardo dos Santos favorecendo os filhos, família e excluindo camaradas do seu partido, que são miseráveis, rotos e esfarrapados, como os vinte milhões de pobres. Se sim, porque não se disponibilizam os actuais dirigentes em declarar o património imóvel, móvel e financeiro, que detém?